AS BOAS NOVAS
Gálatas, Versículo a
Versículo
E. J. Waggoner
SUMÁRIO
Prefácio
Introdução
Capítulo 1 – O evangelho autêntico: A revelação de Jesus Cristo
Capítulo 2 – A vida pela fé de Cristo
Capítulo 3 – Redimidos da maldição
Capítulo 4 – A adoção
Capítulo 5 – O Espírito torna fácil a salvação
Capítulo 6 – A glória da cruz
PREFÁCIO
Assim como Carta aos
Romanos, As Boas Novas é um comentário versículo a versículo, desta
vez da epístola aos Gálatas.
Somente no final de seu
ministério, o Espírito permitiu que se cumprisse o desejo de Paulo de visitar
pessoalmente os irmãos da igreja em Roma. Se Deus lhe houvesse concedido antes
a ”próspera viagem” que descreve os capítulos 27 e 28 de Atos, hoje não
teríamos aquela soberba e inspirada passagem do evangelho, tal qual a
encontramos escrita na epístola aos Romanos. Realmente, só através de carta
pôde Paulo comunicar-lhes o evangelho que recebeu diretamente de Jesus Cristo,
e graças a essa providência divina, está também hoje à nossa
disposição.
Outra circunstância bem
mais triste, nos permite ter a epístola aos Gálatas, que tanto inspirou os
mensageiros de Mineápolis. Os irmãos na Galácia estavam partindo para outro
evangelho, e como consequência, as discordâncias os levaram a uma situação na
qual estavam a ponto de devorarem-se uns aos outros. Não só Paulo, mas
principalmente o evangelho em sua essência, estavam em tela de juízo.
Se a carta aos Romanos
é a explicação do evangelho, a carta aos Gálatas é a defesa do
evangelho.
Em seu livro, Waggoner
reconstrói versículo a versículo a realidade de Cristo, como o Crucificado.
Quando Paulo O apresentou pela primeira vez ante seus olhos, os gálatas
receberam o Espírito Santo. Interessante! Agora apresenta-o novamente como o único,
universal e poderoso remédio para o problema do pecado, manifesto na igreja sob
a forma de imoralidade e disputas. O apóstolo sabia que ao pé do Cruz se fundem
os corações; as discordâncias desaparecem, porque ”a carne e seus efeitos” são
crucificados. Somente Cristo vive, e ”Cristo não está dividido".
Um bom livro para
nossas igrejas? Ou, se preferir, um bom livro para nossa
Igreja?
O literalismo da
linguagem com que E. J. Waggoner descreveu em algumas ocasiões o trabalho da
graça no pecador, tal como se encontra no original publicado pela primeira vez
em 1900, não foi incorporado na edição que a Pacific Press publicou em 1972.
Esta tradução segue o mesmo critério, e se baseia fundamentalmente em tal
revisão.
A não ser quando
indicado de outra maneira, como por exemplo (BJ – Bíblia de Jerusalém) os
textos da Bíblia, são tomados da tradução João Ferreira de Almeida – Corrigida
e Revisada – Fiel ao Texto original – 1994.
Oxalá que neste livro meus olhos possam ver claramente descrito a Jesus Cristo crucificado, como o
eterno presente de amor de Deus. ”A Ele seja a glória pelos séculos dos
séculos. Amém. “(Gál. 1:5).
INTRODUÇÃO
Ao escrever sobre um livro da Bíblia, é
muito comum que se dedique algum tempo à introdução, descrevendo sua natureza,
circunstâncias em que foi escrito, e o suposto propósito do autor, assim como
outros elementos, alguns próximos à conjetura e outros derivados mais
objetivamente do próprio texto. O leitor deve aceitar todas essas declarações
baseando-se na palavra e autoridade de quem as expõe.
Devido a isto, é preferível ingressar o
leitor diretamente no estudo do livro, e se este é diligente e verdadeiro,
entenderá por si mesmo o conteúdo. Aprendemos mais sobre uma pessoa
relacionando-se com ela que atendendo aos sentimentos que se desperta em outros.
Então, procedamos ao estudo de Gálatas, e permitamos que o livro fale por si
mesmo.
Nada pode tomar o lugar da Escritura. Se
todos estudassem a Bíblia com oração e com a devida devoção, dando ouvido a
toda a palavra e recebendo-a como vindo mesmo de Deus, não haveria a necessidade
de qualquer outro livro religioso. Todos os escritos deveriam ter o propósito
fervente de dirigir a atenção das pessoas para a Escritura.
Qualquer opinião que substitua a própria
Bíblia, por meio da qual alguém se sente satisfeito e sem necessidade de
aprofundar-se no estudo pessoal do Santo Livro, é pior que inútil: é
prejudicial.
Por esse motivo, encorajo
urgentemente o leitor a estudar primeiramente o texto bíblico com aplicação e
esmero, de um tal modo que toda referência posterior lhe resulte familiar. Deus
permita que esta modesta ajuda para o estudo de sua Palavra possa lhe
familiarizar com a Escritura, a qual pode fazê-lo sábio para a salvação.
E.J.Waggoner
Capítulo 1
O EVANGELHO AUTÊNTICO:
A REVELAÇÃO DE JESUS CRISTO
1 Paulo, apóstolo (não da
parte de homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo, e por Deus Pai, que
o ressuscitou dos mortos),
2 E todos os irmãos que estão
comigo, às igrejas da Galácia,
3 Graça e paz da parte de
Deus Pai e da de nosso Senhor Jesus Cristo,
4 O qual se deu a si mesmo
por nossos pecados, para nos livrar do presente século mau, segundo a vontade
de Deus nosso Pai,
5 Ao
qual seja a glória para todo o sempre. Amém!
Os primeiros cinco versículos constituem a saudação, e eles contêm a totalidade do Evangelho. Se não houvesse nenhum outro escrito, teríamos aqui o suficiente para a salvação do mundo. Se estudássemos esta seção reduzida com tal diligência e fervor como se fosse o único texto Santo disponível, nossa fé, esperança e amor seriam infinitamente fortalecidos. Ao ler os versos, tentemos perder de vista os Gálatas, e consideremos essas palavras como a voz de Deus que nos fala direta e pessoalmente por meio do apóstolo.
O apostolado - “Apóstolo" significa alguém que é enviado. A confiança de Paulo estava em proporção à autoridade dAquele que o enviou, e dependia da confiança que colocasse nessa autoridade e poder. “Porque o enviado de Deus fala as palavras de Deus" (S. João 3:34). Paulo falou com autoridade, e as palavras eram “ordens” do Senhor (1 Cor. 14:37). Assim, ao ler esta epístola, ou qualquer uma outra na Bíblia, não devemos pensar em peculiaridades e condições pessoais do autor. É verdade que cada escritor conserva sua própria individualidade, uma vez que Deus escolhe diferentes homens para fazer obras diferentes; mas sempre é, e em cada caso, a Palavra de Deus.
Uma comissão divina - Não só aos apóstolos, mas a cada um na igreja foi determinada a comissão que fala de acordo com as Palavras de Deus (1 Ped. 4:11). Todos os que estão em Jesus Cristo são novas criaturas, reconciliadas com Deus por meio deste mesmo Jesus; e todos os que foram reconciliados receberam a palavra e o ministério da reconciliação, de forma que são embaixadores de Cristo, como se Deus pedisse aos homens, no nome de Cristo, que se reconciliem com Deus (2 Cor. 5:17-20). Para aqueles que comunicam a mensagem de Deus, isso é uma poderosa salvaguarda contra a depressão e o medo. Os embaixadores dos reinos terrestres têm autoridade proporcional ao poder do rei ou governante a quem representam, e o Cristão representa o Rei dos reis e Senhor dos senhores.
Não dos homens - Todo ensino do evangelho descansa sobre a divindade de Cristo. Tão impregnados estavam dessa verdade os apóstolos e profetas que ela aparece por todo lugar em seus escritos. “Cristo é a imagem do Deus invisível” (Col. 1:15). “É o esplendor de sua glória, a mesma imagem de Seu ser real. “(Heb. 1:3). “No princípio era Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus” (S. João 1:1; ver também 17:5). “Existiu antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem nele” (Col. 1:17).
O Pai e o Filho - “De Jesus Cristo e de Deus o Pai que O ressuscitou dos mortos”. O Pai e o Filho aparecem aqui unidos em termos de igualdade. “Eu e o Pai somos um” (João 10:30). Ambos se sentam no trono (Heb. 1:3; Apoc. 3:21). O conselho de paz será entre ambos (Zac. 6:12 e 13). Jesus foi o Filho de Deus toda sua vida, sendo da semente de Davi de acordo com a carne; mas era para a ressurreição dos mortos, de acordo com o Espírito de santidade, como foi demonstrado seu caráter de Filho (Rom. 1:3 e 4). Esta epístola tem a mesma autoridade que o apostolado de Paulo: dAquele que possui o poder de ressuscitar aos mortos, dAquele que ressuscitou dos mortos.
As igrejas da Galácia - Galácia era uma cidade da Ásia menor, chamada assim por ser habitada pelos galos que vieram do território que hoje conhecemos por França. Se estabeleceram por ali pelo terceiro século a.C., dando nome àquela região (Gal-atia). Claro que eles eram pagãos, com uma religião muito parecida com a dos druidas da Inglaterra. Paulo foi o primeiro que lhes pregou a Cristo (Atos 16:6; 18:23). O país da Galácia também inclui Iconio, Listra e Derbe, cidades que Paulo e Barnabé visitaram em sua primeira viagem missionária (Atos 14).
“Graça e paz a vós de
nosso Pai Deus, e do Senhor Jesus Cristo” - Encontramos perante a
Palavra de Deus: significa muito mais que a palavra do homem. O Senhor nunca
formula elogios vazios. Sua palavra é criativa, e aqui achamos a forma imperativa
ampliada por Deus para crer por meio de sua palavra.
Deus disse: “Haja luz”.
E houve luz. E agora, quando pronuncia a frase: “Graça e paz a vós”,
acontece deste modo. Deus enviou graça e paz e trouxe justiça e salvação para
todos os homens. Também para ti, ou aquem quer que seja, e também a mim. Quando ao ler
este verso, de maneira nenhuma o tomes como uma forma de cortesia ou de uma
simples saudação, mas como a palavra criativa que te traz pessoalmente todas as
bênçãos da paz de Deus. Representa para nós a mesma palavra que Jesus
pronunciou dirigindo-se àquela mulher: "Seus pecados te são perdoados.
Vai-te em paz. “(Luc. 7:48, 50).
Esta graça e paz vêm de
Cristo que “se deu a si mesmo por nossos pecados”. “A cada um de nós foi
determinada a graça de acordo com a medida do Dom de Cristo” (Efe. 4:7). Mas se
trata da “graça de Cristo Jesus” (2 Tim. 2:1). Portanto, podemos ter a
segurança de que Cristo mesmo foi dado a cada um. O fato de que o homem vive, é
uma evidência de que Cristo tenha sido dado, e que Cristo é a “vida”, e essa
“vida” seja a luz dos homens. Essa luz e vida “ilumina todo o homem que vem a
este mundo" (João 14:6; 1:4, 9). “Todas as coisas subsistem nele” (Col.
1:17). Desde que “não perdoou nem seu próprio Filho, mas o entregou por todos
nós, como também não nos dará gratuitamente com ele, todas as coisas?” (Rom.
8:32). “Pois que o seu divino poder nos deu todas as condições necessárias para
a vida e para a piedade, mediante o conhecimento daquele que nos chamou pela
sua própria glória e virtude” (2 Ped. 1:3).
Em Cristo nos é dado o
universo inteiro, e se nos concede toda a plenitude do seu poder para que
vençamos o pecado. Deus concede tanto valor a cada alma individualmente, como a
toda a Sua criação. Por meio da graça, Cristo provou a morte por todos, de
forma que todo o homem no mundo recebeu o “dom inefável” (Heb. 2:9; 2 Cor.
9:15). “Muito mais copiosamente abundantemente se derramou sobre muitos, a
graça e o dom, pela graça de um só homem, Jesus Cristo”. O “muitos” significa todos,
já que assim como “pelo crime de um veio a condenação para todos os homens,
assim também pela justiça de um só, veio a todos os homens a justificação que
dá vida” (Rom. 5:15, 18).
Cristo é dado a todo o
homem. Então, cada um recebe a totalidade de Cristo. O amor de Deus abrange o
mundo inteiro, ao mesmo tempo que chega individualmente a cada pessoa. O amor
de uma mãe não é diminuído quando dividido para cada uma de seus filhos, de
forma que estes eles não recebem mais que a terça, quarta ou quinta parte dele.
Não: cada filho é objeto do amor pleno de sua mãe. Quanto mais será assim com
Deus, cujo amor é mais perfeito que o da melhor mãe imaginável! (Isa. 49:15).
Cristo é a luz do mundo, o Sol de justiça. Mas a luz que ilumina um homem em
nada diminui a que ilumina outros.
Se um quarto é iluminado perfeitamente, cada um de seus ocupantes é beneficiado pela luz existente, tanto como se fosse o único presente naquele lugar. Deste modo, a luz de Cristo ilumina a todo ser humano que vem a este mundo. No coração de todo aquele que acredita, Cristo mora em sua plenitude. Planta uma semente na terra e obterás muito mais sementes e cada uma delas terá tanta vida como daquela a qual procederam. Cristo, a verdadeira Semente, dá a todos a plenitude de sua vida.
Cristo nos comprou - Com
que frequência ouvimos pessoas lamentar-se nestes termos: ‘Eu sou tão pecador
que o Senhor não me aceitará’. Até mesmo alguns que professaram ser Cristãos
durante anos, expressam o desejo tristemente sem cumprir de alcançar a
segurança da aceitação de Deus. Mas o Senhor não apresenta razão nenhuma para
essas dúvidas. Nossa aceitação já está assegurada para sempre. Cristo nos
comprou, e já pagou o preço.
Qual é a razão para que
alguém vá à uma loja e compre um artigo? Porque está interessado nele. Se foi
pago o preço, depois de ter examinado, de forma que está ciente do que comprou,
o vendedor temerá que o comprador não aceite o artigo? Pelo contrário, se retém
o produto, o comprador protestará: ‘por que não me entrega aquilo que me
pertence?’. A Jesus faz diferença se nos entregamos a Ele ou não. Se interessa
com desejo infinito por cada alma que comprou com seu próprio sangue. “O Filho
do homem veio buscar e salvar o que tinha se perdido” (Luc. 19:10). Deus nos
escolheu antes da criação do mundo, para que fossemos santos e sem culpa ante
Ele em amor... para louvar sua graça gloriosa” (Efe. 1:4, 6).
Por que se entregou
Cristo a si mesmo pelos nossos pecados? “Para livrar-nos do presente século
mau”.
Conta-se que havia
certo homem famoso pelo seu temperamento irritável. Se punha bravo
frequentemente, lançando a culpa de tudo aos que o cercavam. De acordo com ele,
nenhum deles fazia bem as coisas. Então, decidiu “separar-se do mundo” e
transformar-se num ermitão.
Escolheu como casa uma
caverna na floresta, longe de qualquer habitante humano. Pela manhã, tomou uma
tigela e foi a um arroio prover-se de água para cozinhar. As pedras estavam
úmidas e escorregadias pelo crescimento de algas na sua superfície, debaixo do
efeito contínuo da água. Ao colocar a tigela debaixo do jato de água do
manancial, esta deslizou. Colocou-a novamente e a mesma tornou a deslizar. Por
duas ou três vezes voltou a colocá-la, mas tornava a deslizar.
A paciência do ermitão
se esgotou, e exclamou bravo: “Verás se paras ou não!” Ergueu a tigela, e
assentou-a com tal violência e energia que foi feita em pedaços. Não havia
ninguém a quem culpar, exceto ele mesmo, e teve o bom sentido de reconhecer que
o que o fazia pecar, não era o mundo exterior que o cercava, mas sim, aquilo
que levava em seu interior.
Onde vamos, levamos o
mundo (“este presente século mau”) connosco. Nós o levamos em nossos corações,
como uma carga pesada e opressiva. Embora queiramos fazer o bem, encontramos
que “o mal está em mim” (Rom. 7:21). Sempre está ali “este presente século
mau”, até, tomados pelo desespero, clamamos: “Miserável de mim! Quem me livrará
este corpo de morte?” (vers. 24).
Até mesmo Jesus
enfrentou grandes tentações no deserto, separado de qualquer ser humano. Todas
essas coisas nos ensinam que no plano de Deus não há nenhum lugar para a vida
de ermitão. O povo de Deus é o sal da terra; e o sal deve misturar-se com o
objeto a preservar.
A libertação é nossa.
Cristo foi enviado para abrir os olhos dos cegos, tirar do cárcere aos presos,
e da prisão aos que estão na escuridão (Isa. 42:7). Em consonância com isso,
proclama “liberdade para o cativo, e para os prisioneiros a saída da prisão”
(Isa. 61:1). Diz a todos os presos: “Saiam” (Isa. 49:9). É privilégio de cada
um dizer: “Oh Senhor, eu sou teu servo, seu criado, filho de tua serva,
rompeste minhas prisões” (Sal. 116:16).
É deste modo,
acreditemos ou não. Somos os criados do Senhor, ainda se recusamos
obstinadamente servi-Lo. Cristo nos comprou; e tendo nos comprado, esmagou toda
a atadura que poderia nos impedir de servir-lhe. Se realmente cremos, temos a
vitória que vence o mundo (1 João 5:4; João 16:33). A mensagem para nós é que
nossa “milícia terminou”, nosso “pecado é perdoado” (Isa. 40:2).
A vontade de Deus -
Esta libertação é “conforme a vontade de nosso Deus e Pai”. A vontade de Deus é
nossa santificação (1 Tes. 4:3). Sua vontade é que todos os homens sejam salvos
e venham ao conhecimento da verdade (1 Tim. 2:4). Ele “tudo faz de acordo com o
propósito de sua vontade” (Efe. 1:11). Buscamos ensinar a salvação universal,
alguém perguntará? Nós buscamos mostrar que a Palavra de Deus ensina
simplesmente que “a graça de Deus que traz salvação, se manifestou a
todos os homens” (Tito 2:11). Deus trouxe a salvação para todos os homens, e
deu isto a cada um deles; mas infelizmente, a maioria a rejeita. O juízo
revelará o fato de que para cada ser humano foi dada plena salvação, e também
que todo perdido o foi por rejeitar deliberadamente o direito de primogenitura
que era determinado como possessão.
A vontade de Deus é,
portanto, algo a ser desfrutado, e não algo a que suportar. Até mesmo quando
implica sofrimento, é para nosso bem, e deve trabalhar em nós “um eterno peso
de glória” que supera toda comparação (Rom. 8:28; 2 Cor. 4:17). Podemos dizer
com Cristo: “Meu Deus, me deleito em fazer a Tua vontade, e sua lei está em meu
coração” Sal. 40:8).
Nisto consiste o
conselho de conhecer a vontade de Deus. Consiste na libertação de nossa
escravidão do pecado; então, podemos orar com a mais absoluta confiança, e com
pleno agradecimento, já que “esta é a confiança que temos nele, que se pedimos
algo de acordo com sua vontade, ele nos ouve em qualquer coisa que pedimos,
sabemos que temos o que lhe pedimos” (1 João 5:14 e 15).
A Deus seja a glória,
por essa libertação! A glória inteira é Sua, reconheça o homem ou não. O dar a
glória a Ele não consiste em dar nada, e sim, reconhecer o fato. Damos-lhe
glória reconhecendo que todo o poder é dele. ”Reconheceis que o Senhor é Deus.
Ele nos fez, e não nós a nós mesmos” (Sal. 100:3).
O poder e a glória
estão relacionados, como vemos na oração modelo do Senhor. Quando Jesus, com seu
poder, transformou a água em vinho, nos diz que aquele milagre “revelou sua
glória” (João 2:11). Deste modo, quando dizemos “ao Senhor seja a glória”,
reconhecemos que todo o poder vem dEle. Não nos salvamos a nós mesmos, porque
somos “fracos”. Se confessamos que toda a glória pertence a Deus, não cederemos
ao espírito de jactância e ostentações.
A proclamação final do “evangelho eterno” que anuncia que é chegada a hora de seu juízo, é expressado deste modo: “Temei a Deus e dai-lhe glória” (Apoc. 14:7). Então, a epístola aos Gálatas que atribui a Deus toda a glória, constitui o estabelecimento do evangelho eterno. É definida uma mensagem durante os últimos dias. Se estudamos isto e damos ouvido, podemos contribuir para acelerar o tempo no qual “a terra estará cheia do conhecimento da glória de Jeová, como as águas cobrem o mar” (Hab. 2:14).
6
Maravilho-me de que tão depressa passásseis daquele que vos chamou à graça de
Cristo para outro evangelho,
7 O qual
não é outro, mas há alguns que vos inquietam e querem transtornar o evangelho
de Cristo.
8 Mas,
ainda que nós mesmos um anjo do céu vos anuncie outro evangelho além do que já
vos tenho anunciado, seja anátema.
9 Assim como já vo-lo dissemos, agora também vo-lo digo. Se alguém vos anunciar outro evangelho além do que já recebestes, seja anátema.
O apóstolo vai sem
demora ao tema fundamental. Seu espírito se agita dentro de si, e lançando-se à
pena, escreve como somente é capaz de fazê-lo aquele que sente amor pelas almas
que estão avançando depressa para a destruição.
Os irmãos de Paulo
estavam em perigo mortal, e não havia tempo a perder em elogios. Era necessário
abordar o problema de modo tão imediato como fosse possível.
Quem “chamou” aos
homens? “Fiel é Deus que os chamou à comunhão com o Filho, Jesus Cristo, nosso
Senhor” (1 Cor. 1:9). “E o Deus de toda a graça que nos chamou à glória eterna
em Jesus Cristo...” (1 Ped. 5:10). “Porque a promessa é para vós, para seus
filhos, e para todos os que estão distantes, para todos quantos o Senhor, nosso
Deus chama” (Atos 2:39). Para os que estão perto e para os que estão distantes:
isso inclui todos os habitantes do mundo. Então, Deus chama a todo o homem
(porém, nem todos vêm!).
Acaso estava Paulo referindo-se a si mesmo, como se ele fosse quem chamou aos irmãos da igreja de Galácia, e como se pertencesse a ele, de quem se estavam separando? Alguma reflexão nos demonstrará a impossibilidade de tal coisa. O mesmo Paulo disse que a apostasia seria o resultado do trabalho de homens que tentariam arrastar os discípulos após si (Atos 20:30). Ele, como servo de Cristo, seria o último na terra atraindo as pessoas a si mesmo. Embora Deus use agentes humanos como Paulo, é Deus mesmo quem chama. Nós não somos mais que embaixadores de Cristo. É Deus quem pede por nosso meio, para que os homens se reconciliem com Ele (2 Cor. 5:20). Podem haver muitas bocas, mas uma só é a voz.
Separando-se de Deus -
Como os irmãos da Galácia estavam separando-se dAquele que os chamou, e desde
que é Deus quem chama misericordiosamente aos homens, é evidente que eles
estavam abandonando o Senhor. Unir-se ou separar-se de um homem é uma questão
relativamente pequena, mas estar unido a Deus é algo de importância vital.
Muitos parecem pensar
que se simplesmente são ‘membros em normalizada situação’ nesta ou naquela
igreja, podem estar seguros. Mas a única consideração decisiva é: Estou unido
ao Senhor, e estou andando na sua verdade? Se a pessoa está unida ao Senhor,
achará lugar depressa entre o povo de Deus, já que aqueles que não constituem
seu povo, não tolerarão durante muito tempo entre eles um zeloso seguidor de
Deus. Quando Barnabé foi para Antioquía, exortou os irmãos a “permanecer com
coração firme, unidos ao Senhor” (Atos 11:22 e 23). Era tudo o que fazia falta.
Se assim fizermos, encontraremos muito cedo a cidade que é propriedade de
Deus.
Os que estavam abandonando o Senhor, estavam certamente “sem Deus no mundo”, na mesma medida em que estavam se separando dEle. Mas os que estão nesta situação são gentios, ou dizer, pagãos (Efe. 2:11 e 12). Era assim que os irmãos gálatas estavam regressando ao paganismo. Não podia ser de outro modo, já que toda vez que o cristão deixa de ir ao Senhor, cairá na velha vida da qual havia sido salvo. É impossível imaginar uma situação mais desesperadora que estar “sem Deus” neste mundo.
"Outro evangelho”
- Como pôde abrir caminho “outro evangelho”? O verdadeiro evangelho “é poder de
Deus para salvação a todo o que crê” (Rom. 1:16). Deus mesmo é o poder, e
abandoná-lo significa abandonar o evangelho de Cristo.
Para que algo possa
passar por “evangelho”, têm que prometer salvação. Se não oferece mais que
morte, nunca poderá ser identificado com “evangelho” que significa “boas
novas”, ou “alegres novas”. Uma promessa de morte nunca se ajustaria a este
conceito. De forma que para uma falsa doutrina passar por evangelho, tem que
buscar ser o caminho de vida. De outro modo não pode enganar ninguém. Os
gálatas estava sendo seduzidos a apartar-se de Deus, para algo que lhes
prometia vida e salvação, mas por meio de outro poder, diferente do que vem de
Deus. Aquele outro evangelho não era mais que um evangelho de homens. Uma falsa
coisa é o aparecimento de algo que de fato não existe. Uma máscara não é um ser
humano. Deste modo, aquele outro evangelho para o qual os gálatas estavam sendo
seduzidos não era mais que um evangelho pervertido: uma falsificação, um
engano. Não tinha nada a ver com o evangelho autêntico.
Pense na pergunta: Qual
é o evangelho autêntico? É o que Paulo pregou, ou o que os oponentes dele
pregaram?
Tão certamente como
Jesus Cristo é para nós o poder de Deus, e não há outro nome debaixo do céu em
que possamos ser salvos, não há mais que um único e autentico evangelho. É o
que Paulo pregou aos gálatas, e também aos coríntios: o evangelho de “Jesus
Cristo, e... este crucificado”, o mesmo que pregaram Enoque, Noé, Abraão,
Moisés e Isaías. “A estes dão testemunho todos os profetas, de que todos os que
nele creem receberão o perdão dos pecados pelo seu nome” (Atos 10:43). Se um
homem, ou mesmo um anjo do céu, pregar o oposto do que Paulo e os profetas
ensinaram, se estaria colocando a si mesmo debaixo da condenação. Não há duas
normas para o bem e o mal. O que traria hoje condenação é a mesma coisa que
teria trazido isto cinco mil anos atrás. O plano da salvação é exatamente o
mesmo em todo o tempo. O evangelho dado a Abraão (Gál. 3:8) era genuíno, e foi
assistido por anjos. Os profetas do passado pregaram o mesmo evangelho (1 Ped.
1:11 e 12). Se o evangelho que pregaram foi outro evangelho diferente do que
Paulo pregou, até eles teriam sido “condenados”.
Mas, por que é
merecedor de condenação o que prega outro evangelho? Porque é o modo de dirigir
outros à condenação, levando-os a confiar na salvação em algo falso.
Considerando que os gálatas estavam se separando de Deus, estavam pondo a
certeza de serem salvos no poder que supostamente tem o homem. Mas nenhum homem
pode salvar a outro (Sal. 49:7 e 8). E “maldito o homem que confia no homem, e
que se apoia na carne, e seu coração se aparta do Eterno” (Jer. 17:5). O
que traz maldição certamente torna-se maldito ele mesmo.
“Maldito o que desvie o cego do caminho” (Deut. 27:18). Se maldito é o que desvia o que é fisicamente privado da visão, quanto mais certo será de quem leva outro à ruína eterna! Enganar as pessoas com uma falsa salvação; poderia haver algo pior? É induzir que outros construam sua casa sobre um abismo sem fundo.
Um anjo do céu - Mas é talvez possível que “um anjo do céu” possa pregar outra coisa que não seja o verdadeiro evangelho? Certamente, embora não se trate de um anjo que tenha descido recentemente do céu. ”E não é de estranhar, porque o mesmo Satanás se mascara em anjo de luz. Deste modo, não é muito se os ministros também se mascaram em ministros de justiça” (2 Cor. 11:14 e 15). Refere-se aos que aparecem dizendo ser os espíritos dos mortos, e que buscam trazer mensagens do além. Estes, invariavelmente pregam “outro evangelho” diferente ao de Jesus Cristo. Guarda-te deles. “Amados, não creais a todo o espírito, mas provai se são de Deus” (1 João 4:1). "A Lei e ao Testemunho! Se não falam de acordo com isto, é porque não verão o amanhecer” (Isa. 8:20). Ninguém que possua a Palavra de Deus necessita ser enganado. De fato, é impossível que o seja, enquanto agarra-se à Palavra.
10 Porque, persuado eu agora a homens ou a Deus? Ou procuro agradar a homens? Se estivesse ainda agradando aos homens, não seria servo de Cristo.
Nos primeiros três
séculos, a igreja foi fermentada pelo paganismo, e apesar das reformas, ainda
persiste muito dele. Tal foi o resultado de tentar “agradar os homens”. Os
bispos pensaram que poderiam ganhar influência entre os pagãos (que reduzem a
elevada norma de alguns princípios do evangelho) e assim fizeram. O resultado
foi a corrupção da igreja.
O amor ao eu sempre
está no fundo dos esforços de agradar os homens. Os bispos quiseram (talvez
muitas vezes sem dar-se conta disto) atrair os discípulos ao redor de si (Atos
20:30). Comprometiam e pervertiam a verdade para ganhar o favor de pessoas.
Aconteceu deste modo em
Galácia. Os homens estavam pervertendo o evangelho. Mas Paulo procurava agradar
a Deus, e não aos homens. Ele era o servo de Deus, e somente a Ele tinha de
agradar. Este princípio é efetivo em todo ramo de serviço. Os trabalhadores que
tentam agradar os homens nunca serão bons trabalhadores já que trabalham bem
somente quando sua obra pode ser vista, e minimizarão todo o trabalho que deve
ser objeto de avaliação. Paulo exorta nestas condições: “Criados, obedecei em
tudo a seus mestres terrestres, não para ser visto, como os que desejam agradar
os homens, mas com sinceridade de coração, por respeito a Deus. E tudo o que
fizeres, façais de coração, como para o Senhor, e não para os homens” (Col.
3:22-24).
Há uma tendência em suavizar a extremidade da verdade para não perder o favor de alguém poderoso ou influente. Quantos não sufocaram a convicção, por temer perder dinheiro ou posição! Que todos se lembrem: “Se ainda tentasse agradar os homens, não seria servos de Cristo”. Mas isso não significa que devemos ser rudes ou descorteses. Não significa que temos que causar a alguém uma ofensa desnecessária. Deus é amável com os desagradecidos e incrédulos. Devemos ser ganhadores de almas, assim nós temos que manifestar um humor premiado. Nós temos que demonstrar as subjugadoras qualidades dAquele que é todo amor, do Crucificado.
11 Mas
faço-vos saber, irmãos, que o evangelho que por mim foi anunciado não é segundo
os homens.
12 Porque não o recebi, nem aprendi de homem algum, mas pela revelação de Jesus Cristo.
O evangelho é divino,
não humano. No primeiro verso diz o apóstolo que não foi enviado por homens, e
que não tem desejo de agradar a eles, mas a Cristo. Está claro que a mensagem
que trouxeram veio inteiramente do céu. Por nascimento e por educação era
contrário ao evangelho, e quando se converteu, mediou uma voz que veio do céu.
O Senhor mesmo apareceu no caminho, enquanto respirava ameaças e morte contra
os santos de Deus (Atos 9:1-22).
Não há duas pessoas
cujas experiência na conversão seja idêntica. Porém, os princípios gerais
sempre são os mesmos. Como Paulo, devem ser convertidos. Poucos terão uma
experiência surpreendente como a dele; mas se é genuína, será uma revelação do
céu tão certamente quanto foi a de Paulo. “Todos seus filhos serão ensinadas
pelo Eterno” (Isa. 54:13). “Todos serão ensinados por Deus. Deste modo, todo o
que ouve, e aprende do Pai, venha à mim” (João 6:45). “A unção que recebestes
dele, permaneça em vós, e não necessitais que ninguém vos ensine” (1 João 2:27).
Mas, não vamos supor
por isso que na comunicação do evangelho seja demais o agente humano. Deus pôs
na igreja apóstolos, profetas, os professores e outros (1 Cor. 12:28). É o
Espírito de Deus que trabalha em todos eles. Não importa por meio de quem a pessoa
ouviu a verdade pela primeira vez, deve receber isto como vindo diretamente do
céu. O Espírito Santo qualifica os que querem fazer a vontade de Deus de forma
que eles reconheçam a verdade, assim que vejam ou ouçam; e estes aceitarão e
não se apoiarão na autoridade da pessoa que a apresentou, mas na autoridade de
Deus realmente. Podemos estar tão seguros da verdade que sustentamos e
ensinamos, como esteve o apóstolo Paulo.
Mas quando alguém menciona o nome de algum erudito tido em grande estima, para justificar uma crença ou dar mais peso ante outro ou outros a quem busca convencer, pode estar seguro que não sabe a verdade que professa. Pode ser verdade, mas não conhece por si mesmo o que é verdadeira. Porém, é privilégio de todos o conhecê-la (João 8:31 e 32). Quando a pessoa mantém uma verdade que vem diretamente de Deus, dez mil vezes dez mil grandes nomes a favor dela, não somariam o peso de uma pena para sua autoridade; como nem isto diminuiria o mínimo que fosse em oposição a todos os grandes homens da terra.
A revelação de Jesus
Cristo - Observe que a mensagem de Paulo não é simplesmente uma revelação que
vem de Jesus Cristo, mas sim a “revelação de Jesus Cristo”. Não se trata
simplesmente de que Cristo comunicou algo à Paulo, mas sim de que Ele se
revelou a si mesmo ao apóstolo. O mistério do evangelho é Cristo no crente, a
esperança de glória (Col. 1:25-27). Somente assim pode ser conhecida, e ser
dada a conhecer, a verdade de Deus. Cristo não fica longe, sendo limitado para
enunciar princípios de certa forma que nós o sigamos, mas basta Ele mesmo
influenciar-nos, toma possessão de nós na medida que nos submetemos à Ele,
manifestando a vida Dele em nossa carne mortal. Sem a fragrância de Sua
presença, não pode haver pregação do evangelho. Jesus foi revelado em Paulo de
forma que poderia pregá-lo entre os pagãos. Não iria pregar sobre Cristo, mas a
Cristo mesmo. ”Porque não pregamos a nós mesmos, mas a Jesus Cristo o Senhor”
(2 Cor. 4:5).
Deus anela intensamente
revelar Cristo em todo o homem. Lemos sobre homens “que suprimem a verdade com
sua injustiça”. E que “o que se pode conhecer de Deus, é revelado a eles... seu
eterno poder e Divindade... de forma que não têm desculpa” (Rom. 1:18-20).
Cristo é a verdade (João 14:6) e também o poder de Deus (1 Cor. 1:24); ele é
Deus (João 1:1). Então, o Cristo mesmo é a verdade que os homens suprimem. Ele
é a palavra Divina de Deus dada a todos os homens, de forma que eles podem
cumpri-la (Deut. 30:14; Rom. 10:6-8).
Mas em muitos, Cristo é
tão “suprimido”, que é difícil reconhecê-lo. O fato de que eles vivem é prova
que Cristo quer salvá-los, mas é forçado a esperar pacientemente o momento em
que recebam a Palavra, de forma que a vida perfeita de Cristo se manifeste
neles.
Isso pode acontecer a todo aquele que assim O queira, agora, não importa quão degradado e pecaminoso seja. Permita a Deus fazer isto; então toda a resistência cessará.
13 Porque
já ouvistes qual foi antigamente a minha conduta no judaísmo, como sobremaneira
perseguia a igreja de Deus e a assolava.
14 E na minha
nação excedia em judaísmo a muitos da minha idade, sendo extremamente zeloso
das tradições de meus pais.
15 Mas
quando aprouve a Deus, que desde o ventre de minha mãe me separou, e me chamou
pela sua graça,
16 Revelar
seu Filho em mim, para que o pregasse entre os gentios, não consultei nem a
carne nem o sangue,
17 Nem tornei a Jerusalém, a Ter com os que já antes de mim eram apóstolos, mas parti para a Arábia, e voltei outra vez a Damasco.
Por que Paulo perseguiu
deste modo a igreja e tentou destruí-la? Ele mesmo nos informa: simplesmente,
porque era zeloso das tradições de seus pais! Ante Agripa, declarou: “Acreditei
que era meu dever fazer muitas coisas contra o Nome de Jesus de Nazaré. O que
também fiz em Jerusalém. Com a autoridade recebida os principais sacerdotes,
encarcerei muitos dos santos; e quando foram mortos, dei meu voto. E muitas
vezes, castigando-os por todas as sinagogas, os forcei a blasfemar; e
sobremaneira enfurecido contra eles, procurei-os até nas cidades estrangeiras”
Atos 26:9-11.
Manifestando aquele
zelo insensato pelas tradições de seus pais, Paulo pensava que era “zeloso de
Deus” (Atos 22:3).
Parece incrível que
alguém que professava pregar ao verdadeiro Deus pudesse abrigar idéias tão
falsas sobre Ele como supor que O agradava um serviço assim; porém, aquele
perseguidor amargo e implacável dos Cristãos poderia dizer anos depois: “Eu com
toda a boa consciência me comportei perante Deus até ao dia de hoje” (Atos
23:1). Embora tentando sufocar a convicção crescente que sobre ele se formava
ao testemunhar a paciência dos cristãos e quando ouvia seus testemunhos em
favor da verdade, às portas da morte, de fato Saulo não estava sufocando
sua consciência voluntariamente. Pelo contrário, estava fazendo um esforço para
preservar uma consciência impecável!
Tão profundamente tinha
inculcadas as tradições farisaicas que estava seguro que aquelas convicções
eram malévolas e deveriam ser sugeridas por um espírito ruim, contra o que
tinha o dever de lutar. Daquele modo, as convicções do Espírito de Deus,
durante algum tempo, não fizeram mais que dobrar seu zelo contra os cristãos.
Se alguma pessoa carecia de palavras favoráveis para simpatizar com os
cristãos, era Saulo, o fariseu cheio de justiça própria. Verdadeiramente era um
jovem excelente, a quem os líderes judeus olhavam com orgulho e expectativa,
confiando que contribuiria em grande parte à restauração da velha grandeza da
nação e religião judia. Do ponto de vista do mundo, ante Saulo apresentava-se
um futuro promissor. Porém, o que era lucro para ele, considerou perda por amor
de Cristo, por quem tudo perdeu (Fil. 3:7 e 8).
Mas o Judaísmo não era
a religião de Deus nem a de Cristo. Era tradição humana. Muitos cometem um erro
enorme ao considerar o Judaísmo a religião do Antigo Testamento. O Antigo
Testamento ensina tanto Judaísmo quanto o Romanismo ensina o Novo. A religião
do Antigo Testamento é a religião de Jesus Cristo.
Quando Paulo pertencia
ao Judaísmo, de fato ele não acreditou no Antigo Testamento que lia e ouvia
diariamente, pois não o entendia. Doutra forma, teria acreditado prontamente em
Cristo. ”Porque os habitantes de Jerusalém e seus governantes, ignorando Jesus,
e as palavras dos profetas que são lidas todos os sábados, as cumpriram ao
condená-Lo (Atos 13:27).
As tradições dos pais
os levaram a transgredir os mandamentos de Deus (Mat. 15:3). Deus declarou ao
povo judeu: “Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de
mim. Em vão me honram, pois o que ensinam são mandamentos de homens” (Mat. 15:8
e 9). Mas Jesus não teve palavra alguma de condenação que dirigir contra Moisés
ou aos seus escritos. Disse aos judeus: “Se acreditassem em Moisés,
acreditariam em mim; porque ele escreveu de mim” (João 5:46). Tudo aquilo que
os escribas leram e ordenaram a partir dos escritos, era necessário seguir, mas
não o exemplo que deram, pois não obedeceram as Escrituras. “Na cadeira de
Moisés, estão assentados os escribas e fariseus. Observai, pois, e praticai
tudo o que vos disserem; mas não procedais em conformidade com as suas obras,
porque dizem e não praticam” (Mat. 23:2 e 3). Cristo acrescentou: “Pois atam
fardos pesados e difíceis de suportar, e os põem aos ombros dos homens; eles,
porém, nem com o dedo querem movê-los“ (vers. 4).
Não se tratava dos mandamentos
de Deus, já que “seus mandamentos não são pesados” (1 João 5:3). Tampouco
eram cargas impostas por Cristo, pois ele diz: “minha carga é leve” (Mat.
11:30). Os mestres judaizantes não estavam apresentando aos novos convertidos a
Bíblia, nem parte alguma dela, nem estavam tentando os levar a seguir as
Escrituras ditadas por Moisés. Ao contrário, estavam levando-os para longe
da Bíblia, e estavam substituindo os ensinos dela por mandamentos de homens.
Isto foi o que indignou a Paulo. A religião dos judeus era algo completamente
diferente à religião de Deus, tal como ensina a lei, os profetas e os
salmos.
Em seu caminho para
Damasco, “ainda respirando ameaças de morte”, Saulo tinha autorização para
capturar e encarcerar todos os cristãos, homens e mulheres, quando foi detido
subitamente, não por mãos humanas, mas pela excelsa glória do Senhor. Três dias
depois o Senhor disse a Ananías, ao enviá-lo para que devolvesse a visão a
Paulo: “Vê, porque este homem é um instrumento escolhido por mim, para levar
meu Nome aos pagãos, para os reis e ao povo de Israel” (Atos 9:15).
Desde quando Saulo
tinha sido escolhido para ser mensageiro do Senhor? Ele mesmo nos diz: “Desde o
seio de minha mãe”. Paulo não é o primeiro de quem nós sabemos ter estado
separado desde o nascimento para o trabalho de sua vida. Recordemos o caso de
Sansão (Juízes 13). João Batista foi escolhido, e seu caráter e obra tinham
sido descritos antes do nascimento. O Senhor disse a Jeremias: “Antes de seres
formado eu te conheci, e antes que nascesses te separei, e o designei para
profeta entre as nações” (Jer. 1:5). Ciro, o rei pagão, foi chamado pelo nome
mais de cem anos antes de nascer, e foi feito saber sobre seu papel no trabalho
de Deus (Isa. 44:28; 45:1-4).
Não são casos isolados.
Assim como os Tessalonicenses, todo ser humano pode ter a segurança de que
“Deus o escolheu desde o princípio para salvação, por meio da obra
santificadora do Espírito e a fé na verdade” (2 Tes. 2:13). A cada um
corresponde confirmar esta vocação e eleição. Aquele “que quer que todos os
homens sejam salvos e venham ao conhecimento da verdade” (1 Tim. 2:4), também
recomendou o próprio trabalho para cada um (Mar. 13:34). Deste modo, aquele que
tem ciência de que até a criação inanimada dá testemunho, espera que o homem –
a obra-prima de sua criação na terra – lhe renda voluntariamente este
testemunho, tal como somente a inteligência humana pode fazê-lo.
Todo homem foi
escolhido para testificar de Deus; a todos é designada essa tarefa. Ao longo da
vida, o Espírito combate com todo o homem para induzi-lo ao trabalho para
o qual Deus o chamou. Somente o dia do juízo revelará as oportunidades
maravilhosas que os homens desperdiçaram temerariamente. Saulo, o violento
perseguidor, veio a ser apóstolo poderoso. Quem pode imaginar todo o bem
que poderiam fazer outros homens cujo grande poder sobre seus semelhantes se
tem exercido somente para o mal, se eles também houvessem se submetido a
influência do Espírito Santo? Nem todos podem ser Paulo; mas a verdade que cada
um, de acordo com a capacidade que Deus lhe deu, foi escolhido e chamado por
Deus para testemunhar em seu favor, dará um significado novo à vida.
Que pensamento tão
maravilhoso, alegre e ao mesmo tempo solene, que a todos os seres humanos que
vemos ao nosso redor, Deus recomendou um trabalho peculiar! São todos servos do
Deus Todo Poderoso, sendo nomeado a cada um seu próprio serviço. Deveríamos ser
extremamente cuidadosos em não bloquear qualquer pessoa no mínimo que seja, no
desempenho de seu trabalho divinamente designado.
Desde que é Deus quem nomeia cada pessoa no trabalho de sua obra, cada um deveria receber os Mandamentos de Deus, e não dos homens. Porque deveríamos ser mais que cautelosos com qualquer pessoa, com relação ao seu dever. O Senhor pode expor o dever deles, tão claramente quanto nós, para eles; e se eles não O ouvem, dificilmente nos ouvirão, até mesmo a quem pudéssemos dirigir ao caminho correto. ”Não pertence ao homem determinar seu caminho” (Jer. 10:23). quanto menos determinar o caminho dos outros!
Combatendo com carne e
sangue - Paulo foi para Jerusalém somente três anos depois de sua conversão.
Permaneceu quinze dias lá, e viu apenas dois dos apóstolos. Os irmãos estavam
assustados por sua causa, e recusavam acreditar que fosse realmente um
discípulo. É, então, evidente que Paulo não recebeu o evangelho por qualquer
homem.
É necessário aprender
sobre o fato de que Paulo não combateu com carne e sangue. Para falar a
verdade, não tinha necessidade disto, porque teve a palavra do próprio Senhor.
Mas um proceder tal é absolutamente incomum. É mais comum que alguém leia algo
na Bíblia, e imediatamente peça a opinião de outro homem, antes de ousar
acreditar. Se nenhum dos amigos acredita, então teme aceitar. Se o pastor, ou
certo comentário, explicam o texto de um certo modo, se prendem a ele. Se dá
crédito à “carne e sangue”, mais que para o Espírito e a Palavra.
Pode acontecer que o
mandamento esteja tão claro que não exista desculpa razoável para ir à procura
de seu significado. A pergunta, então, simplesmente é: 'Eu posso me permitir
aceitar isso? Não me custará um sacrifício muito grande?'. A “carne e sangue”
mais perigosa com que a pessoa pode combater, é a própria. Não é bastante o ser
independente de outros; em matéria de verdade deve manter-se independente de si
mesmo. “Confia em Jeová com todo teu coração, e não te apoies em tua própria
sabedoria” (Prov. 3:5).
Um papa é alguém que busca ocupar – no conselho –, o lugar que por direito só corresponde a Deus. Aquele que se tem eleito papa – ao seguir seu próprio conselho –, é tão reprovável como o que dita a outro; e é mais fácil que se perca, que aquele que segue a outro papa diferente de si mesmo. Se tratasse de se seguir a um papa, seria mais sensato aceitar o de Roma, por possuir mais experiência no papado que qualquer outro. Agora então, nenhum deles é necessário, pois temos a Palavra de Deus. Quando Deus fala, a única coisa razoável é obedecer sem esperar outro conselho, nem mesmo o que vem do próprio coração. O nome do Senhor é “Conselheiro” (Isaías 9:6), e Ele é “maravilhoso” aconselhando. Ouça-O!
Em seguida - Não havia
tempo a perder. Ao perseguir a igreja, Paulo acreditava estar servindo a Deus,
e no momento que compreendeu o erro, retificou. Ao ver a Jesus Cristo de
Nazaré, reconheceu como seu Senhor, e clamou imediatamente: “Senhor, que queres
que faça?”. Estava disposto a iniciar o trabalho sem demora, e do modo correto.
A atitude corresponde ao descrito pelo Salmo 119:60 verdadeiramente: “Me
apresso a guardar teus mandamentos”. “Pelo caminho de teus mandamentos
correrei, porque aumentaste meu coração” (Vers. 32).
Paulo diz que Cristo se
revelou nele para que pudesse pregar entre os gentios, ou dizer, os pagãos. Em
I Coríntios 12:2 lemos: “Vós bem sabeis que éreis gentios, levados aos ídolos
mudos”. Observe que os coríntios tinham sido “gentios”, mas deixaram de ser ao
tornarem-se cristãos!
"Simão contou como
Deus interveio para oferecer entre os pagãos um povo para seu Nome” (Atos
15:14), e Tiago se referiu aos crentes em Antioquia e seus arredores, como “os
pagãos que se converteram a Deus” (Vers. 19). O povo de Deus é tomado dentre os
gentios, mas uma vez que tenham sido tomados, deixam de ser gentios. Abraão, o
pai de Israel, foi levado dentre os pagãos (Josué 24:2), do mesmo modo que
Israel é levado de entre os pagãos. É desse modo que “todo Israel será salvo”
ao entrar a plenitude dos pagãos (Rom. 11:25 e 26).
No Salmo 2:1-3, lemos:
“Por que se revoltam as nações, e os povos imaginam coisas vãs? Se levantam os
reis da terra, e os príncipes junto se consultam contra o Eterno e contra o seu
Ungido, dizendo: Deixe-nos quebrar os laços, livremo-nos de suas cordas!”. Com
que freqüência vemos cumprida a Escritura em certas pessoas que exclamam com ar
vitorioso: 'Me mostre algum lugar em que é ordenado aos pagãos que guardem os
Mandamentos!', insinuando que eles são gentios, e que então, estão isentos da
lei de Deus. Mas colocando-se como pagãos (gentios), não estão se colocando em
qualquer classe precisamente honrada.
É certo que aos pagãos
não lhes era ordenado guardar os mandamentos, pagãos como tal, já que isso
seria impossível: tão logo aceitem a Cristo, e a lei do Espírito de vida nEle,
deixarão de ser pagãos. O grande desejo que Deus tem de salvar os pagãos de seu
estado, trazendo-os a Ele, está demonstrado claramente pelo mesmo ministério de
Paulo (por não dizer nada de Cristo).
O Senhor estava tão desejoso da conversão dos gentios há três mil anos atrás, como está hoje. Pregou-lhes o evangelho antes da primeira vinda de Cristo, tanto quanto depois dela. O Senhor foi dado a conhecer a todas as nações por meio de muitas e diferentes formas. Jeremias foi eleito especialmente como o profeta dos pagãos. “Antes que te formasse no ventre te conheci, e antes que saísses da madre te santifiquei: às nações te dei por profeta” (Jer. 1:5). A palavra hebraica que se traduz por ”nações” é a que ordinariamente se traduz por ”pagãos”. Ninguém imagine que Deus limitou sua verdade a qualquer povo, judeu ou pagão. “Não há diferença entre judeu e grego; já que um mesmo é Senhor de todos, e é generoso com todos os que o invocam” (Rom. 10:12).
A pregação do novo
converso - Assim que Paulo se converteu, “em seguida começou a pregar nas
sinagogas a Jesus” (Atos 9:20). Não é surpreendente que durante a noite pôde
pregar tão poderosamente? Verdadeiramente, já é algo maravilhoso que alguém
possa pregar a Cristo. Mas não é necessário supor que Paulo obteve o
conhecimento dele de um modo instantâneo, sem estudo algum. Lembre-se de que
Paulo tinha estudado as Escritas diligentemente durante toda sua vida. Paulo
que estava mais avançado que qualquer outro em seus dias, estava tão
familiarizado com as palavras da Bíblia como está o primeiro da classe com a
tabuada. Mas a mente tinha sido encoberta pelas tradições dos pais que
lhe tinham simultaneamente sido inculcadas. A cegueira que sobreveio ao ser
cercado daquela luz ofuscante no caminho de Damasco, não era mais que uma
representação da cegueira de sua mente; e as escamas que caíram dos olhos,
antes da mensagem de Ananias, indicavam que se fazia nele a luz da palavra,
desaparecendo a escuridão da tradição.
Desde que a pregação constituiu o núcleo de sua atividade incessante, podemos estar seguros que não deveriam dedicar a totalidade de meses passados na Arábia ao estudo e a contemplação. Havia sido um perseguidor tão implacável, e tanto da graça tinha recebido, que contava como perdido todo o tempo durante o qual não havia podido revelar a graça a outros, sendo este seu sentir: “Ai de mim, se não anunciasse o evangelho!” (1 Cor. 9:16). Pregou nas sinagogas – em Damasco –, assim que se converteu, antes de ir para a Arábia. Então, é lógico concluir que pregou o evangelho para os árabes. Lá poderia pregar sem ser importunado pela oposição que sempre teve que enfrentar quando estava entre os judeus; então, os obras na pregação não deveriam interferir significativamente na meditação sobre o novo mundo que ante ele se abria.
18 Depois,
passados três anos, fui a Jerusalém para ver Pedro, e fiquei com ele quinze dias;
19 E não
vi a nenhum outro dos apóstolos, senão a Tiago, irmão do Senhor.
20
Ora, acerca do que vos escrevo, eis que diante de Deus testifico que não minto.
21 Depois
fui para as regiões da Síria e da Cilícia.
22 E não
era conhecido de vista das igrejas da Judeia, que estavam em Cristo;
23 Mas
somente tinham ouvido dizer: Aquele que já nos perseguiu anuncia agora a fé que
antes destruía.
24 E glorificavam a Deus a respeito de mim.
Nunca tenhas por
incorrigível um oponente do evangelho. É necessário instruir com mansidão aos
que se opõem, pois quem sabe se Deus lhes dará arrependimento para o
conhecimento da verdade?
Se poderia dizer muito
bem de Paulo: ‘Teve a luz com tanta claridade quanto qualquer outro. Foi-lhe
dado toda a oportunidade; não só ouviu o testemunho inspirado de Estevão, mas
também as confissões de muitos mártires nos últimos momentos da vida. É inútil
esperar qualquer coisa boa dele’. Porém, aquele mesmo Paulo veio a ser o maior
pregador do evangelho. Tal qual perseguidor sangrento fora antes.
Há algum oponente mau contra a verdade? Você não o combate, nem lhe reprova. Deixe que ele mantenha para si toda amargura e inimizade, enquanto você se agarra à Palavra de Deus e à oração. Pode estar muito próximo o momento em que Deus, que agora é blasfemado, resulte nele glorificado.
Glorificando a Deus -
Quão diferente do caso de Paulo foi o daqueles a quem foi dito: “o Nome de Deus
é blasfemado entre os pagãos, por vossa causa” (Rom. 2:24). Todo aquele que faz
profissão de seguir a Deus, deve ser um meio de glorificar Seu nome; no
entanto, muitos fazem que seja blasfemado. Como podemos fazer que Seu nome seja
glorificado? ”Deste modo alumie sua luz ante os homens, de forma que vejam suas
boas obras, e glorifiquem a vosso Pai que está no céu” (Mat. 5:16).
Capítulo 2
VIDA PELA FÉ DE CRISTO
Muitos lerão este
livro, não por simples curiosidade, para saber o que outro pensa sobre a
epístola aos gálatas, mas com o firme propósito de obter ajuda nesta parte tão
controversa da Escritura. Gostaria, amado leitor, de fazer algumas poucas
considerações pessoais antes de avançar no estudo.
Cada porção da Bíblia
está relacionada com todo o restante. Assim que entendamos bem algo e fazemos
disto uma parte de nós, se incorpora a nossa vida e nos ajuda na procura de
mais conhecimento, da mesma maneira que cada bocado de comida que ingerimos e
assimilamos contribui para gerar atividade na procura de mais pão diário. Se
estudarmos com proveito a epístola aos gálatas, uma grande porta se abrirá ante
nós para a totalidade da Bíblia.
O caminho para o
conhecimento é algo tão simples que muitos o desconsideram. Mas é uma caminho
franco, aberto a todos: “Meu filho, se receberes minhas palavras, e mantiveres
meus Mandamentos dentro de ti, se emprestares ouvido à sabedoria, se inclinares
teu coração à sabedoria, se clamares à inteligência, e à sabedoria deres sua
voz, se a procurares como à prata, e a buscares como a tesouros escondidos,
então entenderás a respeito do Eterno, e achará o conhecimento de Deus. Porque o
Senhor dá a sabedoria, de Sua boca nasce o conhecimento e a inteligência”
(Prov. 2:1-6).
Deus apareceu em sonho
a Salomão, e lhe prometeu sabedoria. Mas não foi por meio de um sonho
descuidado que lhe veio a sabedoria. Salomão não foi para cama numa noite, para
se levantar no dia seguinte como o mais sábio de todos os homens. Quis a
sabedoria tão ardentemente que verdadeiramente sonhou à noite com ela. Mas
trabalhou na procura dela durante o dia.
Se queres entender a Palavra de Deus, estude-a. Nenhum homem na terra pode lhe emprestar seu conhecimento. Pode ajudar-te no sentido de que não leve tanto tempo como a ele custou; pode guiar-te em como e onde ir; mas seja o que for que alguém saiba realmente, depois de ter transitado mil e uma vezes por certa rua, você acaba conhecendo cada um dos portais e cantos, e podes trazer à sua mente a totalidade da área. De um mesmo modo, quando meditas repetidas vezes em certa porção da Escritura, poderá chegar a vê-la rapidamente em seu conjunto, como também nas diversas facetas, e uma vez alcançado tal nível, poderá apreciar nela o que ninguém na terra poderia explicar-te.
1 Depois,
passados quatorze anos, subi outra vez a Jerusalém com Barnabé, levando também
comigo a Tito.
2 E
subi por uma revelação, e lhes expus o evangelho, que prego entre os gentios, e
particularmente aos que estavam em estima; para que de maneira alguma não
corresse ou não tivesse corrido em vão.
3 Mas nem ainda Tito, que estava comigo, sendo grego, foi constrangido a circuncidar-se;
"Passados quatorze
anos”. Seguindo o curso natural da narrativa, significa quatorze anos depois da
visita de Gálatas 1:18 que por sua vez aconteceu três anos depois da conversão
de Paulo. Então, aquela visita aconteceu dezassete anos depois de sua conversão,
ou se preferir, no ano 51 D.C., data que coincide com o conselho de Jerusalém,
referido em Atos 15. O segundo capítulo de Gálatas fala sobre aquele conselho,
dos tópicos que lá foram debatidos, e o que derivou deles.
No primeiro capítulo
somos informados que alguns estavam perturbando os irmãos por meio de uma
perversão do evangelho de Cristo, por meio da introdução de um falso evangelho
que tentava se fazer passar pelo verdadeiro. Em Atos 15:1 lemos que vieram da
Judeia alguns que ensinaram aos irmãos: 'Se não os circuncidais de acordo com o
rito de Moisés, não podeis ser salvos”. Nisso consistia o outro evangelho que
estavam tentando pregar aos irmãos, em vez do verdadeiro - em realidade não era
outro, desde que não há mais que um.
Paulo e Barnabé não estavam de modo algum dispostos a apoiar esta nova pregação, resistiram a ela “de forma que a verdade do evangelho permanecesse entre vós” (Gál. 2:5). Os apóstolos “tiveram uma severa discussão e contenda” com os falsos irmãos (Atos 15:2). A controvérsia foi entre o evangelho autêntico e sua falsificação.
Uma negação de Cristo -
Um olhar à experiência da igreja de Antioquia que estava sofrendo a incursão
daquele evangelho novo, mostrará que significava a negação mais categórica
do poder de Cristo para salvar.
O evangelho foi levado
primeiramente pelos irmãos que vinham da Diáspora que continuou a perseguição
iniciada com o martírio de Estevão. Estes irmãos “chegaram a Antioquia, falaram
aos gregos, e lhes anunciaram o evangelho do Senhor Jesus. A mão do Senhor
estava com eles. E grande número acreditou e tornaram ao Senhor” (Atos 11:20 e
21). Naquela igreja havia profetas e mestres, e enquanto eles pregaram o Senhor
e jejuaram, o Espírito Santo os moveu para que separassem Barnabé e Saulo para
o trabalho ao qual Deus os tinha chamado (Atos 13:1-3). Não há nenhuma dúvida,
pois, que a igreja tinha tido uma experiência profunda nas coisas de Deus. Eles
se familiarizaram com o Senhor, e com a voz do Espírito Santo.
E agora, depois de tudo
o que aconteceu, chegaram esses irmãos dizendo: “Se não os circuncidais
conforme o rito de Moisés, não podeis ser salvos”. Isso era o mesmo que dizer:
“Toda vossa fé em Cristo e todo o testemunho do Espírito são nada, sem o sinal
da circuncisão. Pretendiam exaltar o sinal da circuncisão sem fé, sobre a fé em
Cristo sem sinais externos. Esse “outro evangelho” constituiu um ataque em toda
a regra do evangelho autêntico, e uma negação clara de Cristo.
Não surpreende que Paulo definisse aos que ensinavam deste modo “falsos irmãos”:
4 E
isto por causa dos falsos irmãos que se tinham entremetido, e secretamente
entraram a espiar a nossa liberdade, que temos em Cristo Jesus, para nos porem
em servidão;
5 Aos quais nem ainda por uma hora cedemos com sujeição, para que a verdade do evangelho permanecesse entre vós.
Paulo tinha afirmado,
no primeiro capítulo, que os falsos irmãos “os perturbam e querem perverter o
evangelho de Cristo” (vers. 7). Em sua carta às igrejas, apóstolos e anciãos,
disse deles: “Nós soubemos que sem nossa autorização, alguns nos deixaram, e
perturbaram e têm turvado seu ânimo com suas palavras” (Atos 15:24).
Posteriormente
continuaram havendo muitos mais daquela classe. Tão negativa era sua obra, que
o apóstolo afirmou que todo aquele que a ela se entregasse: “seja condenado”
(ver Gál. 1:8 e 9). Esses pregadores estavam procurando, de forma deliberada,
minar o evangelho de Cristo, e destruir deste modo os crentes.
Os falsos irmãos
estavam dizendo: “Se não os circuncidais de acordo com o rito de Moisés, não
podeis ser salvos” (literalmente: não tens poder para ser salvos).
Degradavam a salvação ao nível de algo meramente humano, algo dependente do
poder humano. Eles não sabiam em que realmente consiste a circuncisão: “Não é
judeu o que é exteriormente, nem é circuncisão o que faz exteriormente, na
carne, pelo contrário, o verdadeiro judeu é o que o é em seu interior, e a
verdadeira circuncisão é a do coração, por meio do Espírito, não em palavra.
Este recebe elogio, não dos homens, mas de Deus” (Rom. 2:28 e 29).
Depois de ter confiado
em Deus, Abraão deu ouvidos em certa ocasião à voz de Sara, em vez de ouvir ao
Senhor, e tentou cumprir as promessas de Deus por meio do poder de sua própria
carne (Gên. 16). O resultado foi o fracasso: em vez de obter um herdeiro, obteve
um escravo. Deus lhe apareceu então novamente, exortando-lhe a que caminhasse
diante dEle com coração íntegro, e lhe repetiu seu pacto. A fim de que se
lembrasse do fracasso, e o fato de que “a carne nada aproveita”, Abraão recebeu
o selo da circuncisão, o despojamento de uma porção da carne. Isso havia de
mostrar que, desde que na carne “não habita o bem”, as promessas de Deus podem
ser feitas em realidade quando “nos despojamos dos pecados” (Col. 2:11), por
meio do Espírito. “Nós somos a verdadeira circuncisão, nós que adoramos de
acordo com o Espírito de Deus, e não confiamos na carne” (Fil. 3:3).
Então, quando Abraão
recebeu o Espírito pela fé em Deus, verdadeiramente foi circuncidado. “E
receberam a circuncisão por sinal, como selo da justiça pela fé que teve quando
era incircunciso” (Rom. 4:11). A circuncisão externa jamais foi outra coisa que
um mero sinal externo da autêntica circuncisão do coração. Se esta
última faltava, o sinal era uma fraude; mas se a circuncisão autêntica era uma
realidade, então fazia sentido o sinal externo. Abraão é o “pai de todos os que
acreditam, embora não sejam circuncidados” (Rom. 4:11). Os falsos irmãos
estavam tentando substituir a realidade pelo símbolo vazio. Para eles contava a
casca da noz mais que a noz sem casca.
Jesus disse: “O
Espírito é o que dá vida, a carne nada aproveita. As palavras que vos tenho
falado são espírito e vida” (João 6:63). Os irmãos de Antioquia e Galácia
tinham confiado em Cristo para a salvação; agora, alguns tentaram os induzir a
confiar na carne. Não lhes falaram que eles estavam em liberdade para pecar,
isso não, eles lhes falaram que tinham de guardar a lei! Mas eles teriam que
guardar por eles mesmos; teriam que se fazer justos à eles mesmos, sem Jesus
Cristo. A circuncisão significava guardar a lei. Mas a circuncisão autêntica
era a lei escrita no coração pelo Espírito, e os falsos irmãos buscaram os
crentes para confiar na forma externa da circuncisão, por via de
substituto do trabalho do Espírito. Aquilo que tinha sido provido como sinal da
justiça que vem pela fé, se tornou um sinal da Justiça própria. A pretensão dos
falsos irmãos era que se circuncidassem para ser justificados e salvos. Mas
“com o coração se crê para ser justificado” (Rom. 10:10), e “tudo aquilo que
não vem da fé, é pecado” (Rom. 14:23). Por conseguinte, os esforços do homem
para guardar a lei de Deus por meio do próprio poder, pouco importa quão
ferventes e sinceros possam ser, terão um único resultado: a imperfeição, o
pecado.
Quando essa questão foi
levantada em Jerusalém, Pedro disse aos que pretendiam que os homens se
justificavam por suas próprias obras, em vez de fazê-lo pela fé em Cristo:
“Agora pois, por que tentais a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos um
jugo que nem nossos pais, nem nós pudemos levar”? (Atos 15:10).
Era um jugo de
escravidão, como mostram as palavras de Paulo para os falsos irmãos que
“encobertos entraram para espiar a liberdade que nós temos em Cristo Jesus,
para reduzir-nos a escravidão” (Gál. 2:4). Cristo liberta do pecado. Sua vida é
“a Lei perfeita – da liberdade ". “Pela Lei se alcança o conhecimento do
pecado” (Rom. 3:29), mas não a libertação (liberação) do pecado. “A Lei é
santa, e o Mandamento santo, justo e bom” (Rom. 7:12), já que provê o
conhecimento do pecado e o condena. É como um indicador que nos informa o
endereço correto, mas não nos leva para o lugar. Pode nos fazer saber que não
estamos no caminho certo, mas Jesus Cristo somente pode fazer que andemos nele,
já que Ele é o caminho. O pecado é escravidão. Só os que mantêm os Mandamentos
de Deus estão em liberdade (Sal. 119:45), e só é possível guardar os
Mandamentos pela fé em Cristo (Rom. 8:3 e 4).
Portanto, o que induz
as pessoas a confiar na lei para obter justiça sem Cristo, está pondo-os um
jugo, aprisionando-os em escravidão. Quando um condenado de acordo com a lei é
encarcerado, não pode achar libertação das prisões por essa mesma lei que o
condenou. Mas isso não implica que haja na lei imperfeição. É precisamente por
tratar-se de uma lei justa, que não declarará inocente ao que é culpado.
O apóstolo relata que enfrentou o falso ensino que estava agora desviando aos irmãos da Galácia “de forma que a verdade do evangelho permanecesse” com eles. É de ponto todo evidente que a epístola aos gálatas contém o evangelho em sua mais pura expressão. Muitos tem compreendido mal e não obtêm proveito algum, pensam que é simplesmente uma contribuição a mais “as contenções e aos debates sobre a lei” (Tito 3:9) contra os que o mesmo Paulo preveniu.
6 E,
quanto àqueles que pareciam ser alguma coisa (quais tenham sido noutro tempo,
não se me dá; Deus não aceita a aparência do homem), esses, digo, que me
pareciam ser alguma coisa, nada me comunicaram;
7 Antes, pelo contrário, quando viram que o evangelho da incircuncisão me estava confiado, como a Pedro o da circuncisão
De acordo com Atos, em Antioquia se tomou a determinação de que Paulo, Barnabé e alguns outros fossem para Jerusalém, com relação ao tópico debatido. Mas Paulo afirma que era “para uma revelação” (Gál. 2:2). Não só era para a recomendação dos irmãos, mas o mesmo Espírito o moveu a isto, a ele e a eles. Não foi com o propósito de aprender a verdade, mas para salvaguardá-la. Não se tratava de descobrir em que consistia o evangelho, mas comunicar o evangelho que estavam pregando entre os pagãos. Os que pareciam importantes naquela assembleia, não lhe acrescentaram nada. Paulo não recebeu o evangelho de nenhum homem, e não precisava do testemunho de qualquer homem para estar seguro da autenticidade do mesmo. Quando é Deus quem fala, a confirmação buscada, por parte de um homem, constitui uma impertinência. O Senhor dispôs que os irmãos em Jerusalém ouvissem o testemunho de Paulo, e que os que recentemente tinham se convertido, souberam que os que Deus havia enviado falaram as palavras de Deus, e portanto, todos falaram a mesma coisa. Depois de afastarem-se dos “muitos chamados deuses” para servir ao único Deus, eles precisavam ter a segurança de que a verdade é uma só, e um só o evangelho para todos os homens.
O evangelho não é superstição - Nada há neste mundo capaz de conferir graça e justiça ao ser humano, e nada há que o homem possa fazer, que traga salvação. O evangelho é poder de Deus para salvação, não o poder do homem. Qualquer ensino que induz o homem a confiar num objeto que seja, uma imagem de um quadro ou qualquer outra coisa, ou ainda confiar em qualquer esforço, no próprio trabalho para a salvação, mesmo que tal esforço vá dirigido para a mais louvável das metas, é uma perversão da verdade do evangelho. É um falso evangelho. Na igreja de Cristo não há sacramentos que, em virtude de certa operação mágica, confira graça especial a quem os recebe. Porém, haverá obras que aquele que crê no Senhor Jesus Cristo, e portanto, é justificado e salvo, fará como uma expressão de sua fé. “Pela graça haveis sido salvos, através da fé. E isto não vem de vós, mas é Dom de Deus. Não por obras, de forma que ninguém se glorie. Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para boas obras, que Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (Efe. 2:8-10). Essa é “a verdade do evangelho” que Paulo defendeu. É o evangelho para todos os tempos.
Não há monopólio da
verdade - Nenhum homem, nenhum corpo de homens, tem nesta terra o monopólio da
verdade. Não existe um canto ou lugar para onde devam ir aqueles que desejam
conhecê-la, para recebê-la das mãos de outros homens. A verdade é independente
do ser humano. Vem de Deus, porque Cristo que é o esplendor da glória e a
mesma imagem do ser real (Heb. 1:3), é a verdade (João 14:6). Quem queira obter
a verdade, obterá de Deus, e não do homem. Assim como Paulo recebera o
evangelho. Deus pode usar, e usa, seres humanos como instrumentos ou canais,
mas só Ele é o doador. Nem o nome nem o número significam qualquer coisa, para
efeito de determinar o que é a verdade. Não é mais poderosa, nem deveríamos
aceitá-la melhor ao ser apresentada por dez mil príncipes, que quando um
simples e humilde operário a sustêm. E não há a menor razão para supor que
devam ser os dez mil príncipes quem tenham de possuí-la, antes que o humilde
obreiro. Todo homem na terra pode possuir tanto da verdade como esteja disposto
a usar, e não mais (ver João 7:17; 12:35 e 36). O que atua como um papa,
acreditando possuir o monopólio da verdade, e compele aos demais que o ajudem a
encontrá-la, concede isto aqui e retém isto lá, perde a totalidade da verdade
que uma vez poderia possuir (se é que em algum momento teve algo dela). A
verdade e o espírito papal jamais podem coexistir. Nenhum papa, nenhum homem
com disposição papal, tem a verdade. Tão logo receba a verdade, deixa de ser
papa. Se o papa de Roma se convertesse e se tornasse discípulo de Cristo,
naquela mesma hora estaria desocupado o assento papal.
Assim como não há homem
que possua o monopólio da verdade, tampouco há lugares a que se deva ir, (além
da bíblia), os que a procuram, a fim de achá-la. Os irmãos de Antioquia não
precisavam ir a Jerusalém para aprender a verdade, ou para descobrir se o que
possuíam era artigo genuíno. Pelo fato de que a verdade tenha sido
primeiramente proclamada em um certo lugar, não implica que só ali seja
possível encontrá-la. De fato, os últimos lugares no mundo onde a pessoa pode
esperar encontrar ou aprender a verdade, são precisamente as cidades em que o
evangelho foi proclamado primeiramente nos primeiros séculos da era Cristã:
Jerusalém, Antioquia, Roma ou Alexandria.
O papado surgiu em
parte dessa maneira. Se assumiu que os lugares onde os apóstolos, ou alguns
deles, tinham pregado, deveriam possuir a verdade em sua pureza, e que todos os
mortais teriam que obtê-la de lá. Era igualmente o propósito determinado que os
da cidade deveriam conhecer melhor que os do ambiente rural. Deste modo, dentre
todos os bispos que tinham ocupado um lugar de igualdade no princípio, aconteceu
logo que 'os bispos do campo' (chorepiscopoi) se consideraram
secundários em relação aos que oficiavam nas grandes cidades. Uma vez que este
espírito tomou força, o passo seguinte foi necessariamente uma disputa entre os
próprios bispos das cidades, para deixar claro quem seria o maior. Essa briga
ímpia continuou até que Roma ganhou a preeminência desejada.
Mas Jesus nasceu em Belém, “pequena entre as milhares de Judá” (Miq. 5:2), e passou quase toda sua vida em uma população pequena cuja ”reputação” era tal, que alguém nascido nela ficava merecedor de comentários assim: “De Nazaré pode sair algo bom?” (João 1:45-47). Jesus fez mais tarde sua habitação na próspera cidade de Cafarnaum, mas foi conhecido sempre como “Jesus de Nazaré”. O céu não está mais longe do povoado mais insignificante, ou até da choça mais solitária, que da maior cidade, ou do palácio episcopal mais rico. Deus, “o Sublime e Excelso, o que habita a eternidade, e cujo nome é Santo, habita com o pobre e humilde de espírito” (Isa. 57:15).
As aparências enganam - Deus olha o que o homem é, não o que aparenta ser. O que aparenta ser depende em grande medida dos olhos que o contemplam; o que realmente é, demonstra a medida do poder e a sabedoria de Deus que há nele. Deus não se inclina ante a posição oficial. Não é a posição o que confere autoridade, e sim a autoridade que dá a autêntica posição. Não poucos homens humildes, sem posições nesta terra, carentes de todo reconhecimento oficial, ocuparam posições realmente superior, e de maior autoridade que a de todos os reis da terra. A autoridade advém da presença de Deus na alma, livre de restrições.
8 (Porque aquele que operou eficazmente em Pedro para o apostolado da circuncisão esse operou também em mim com eficácia para com os gentios),
A palavra de Deus é viva e eficaz (Heb. 4:12). Seja qual for a atividade no trabalho do evangelho, tudo quanto se faz vem de Deus. Jesus “andava fazendo o bem” porque “Deus estava com ele” (Atos 10:38). Ele mesmo dissera: “de mim mesmo nada posso fazer” (João 5:30), “o Pai que vive em mim, Ele faz as obras” (João 14:10). Deste modo, Pedro se referiu a Ele como “varão aprovado entre vós com milagres, prodígios e sinais, que Deus realizou por meio dEle” (Atos 2:22). Não é maior o discípulo que seu Senhor. Paulo e Barnabé, então, na Assembleia de Jerusalém, contaram as grandes maravilhas e sinais que Deus tinha feito por meio deles entre os pagãos” (Atos 15:12). Paulo afirmou que ele tinha feito um esforço para “apresentar a todo o homem perfeito em Cristo”, “lutando com a força de Cristo que age poderosamente em mim” (Col. 1:28 e 29). Os mais humildes crentes podem possuir aquele mesmo poder, “porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade” (Fil. 2:13). O nome de Jesus é Emanuel: “Deus connosco”. Deus com Ele lhe fez com que andasse fazendo o bem. Mas Deus é inalterável; então, se tivermos verdadeiramente a Jesus – Deus connosco –, andaremos também fazendo o bem.
9 E
conhecendo Tiago, Cefas e João, que eram considerados como as colunas, a graça
que se me havia dado, deram-nos as destras, em comunhão comigo e com Barnabé,
para que nós fôssemos aos gentios, e eles, à circuncisão;
10 Recomendando-nos somente que nos lembrássemos dos pobres, o que também procurei fazer com diligência.
Os irmãos, em Jerusalém, demonstraram sua comunhão com Deus e viram “a graça que” tinha sido dada a Paulo. Os que são guiados pelo Espírito de Deus sempre estarão prontos a reconhecer o trabalho do Espírito Santo nos outros. A evidência mais segura de que alguém não conhece pessoalmente nada do Espírito Santo é a inabilidade em reconhecer sua obra. Os outros apóstolos tiveram o Espírito Santo, e apreciaram como Deus tinha escolhido Paulo para um trabalho especial entre os pagãos; e embora sua forma de trabalhar fosse diferente da deles, Deus havia lhe concedido dons especiais para esse trabalho especial e não duvidaram em estender-lhe sua mão direita, em sinal de companheirismo, só lhe pedindo que se lembrasse dos pobres entre seu próprio povo, “no que (foi) também solícito em cumprir”.
Perfeita unidade -
Notemos que não existia diferença de opinião entre os apóstolos, nem na igreja,
com respeito ao que era o evangelho. Havia falsos irmãos, é certo; mas desde
que eram falsos, não eram parte da igreja, o corpo de Cristo, que é a verdade.
Muitos professos cristãos, pessoas sinceras, supõem que constitui pouco menos
que uma necessidade em que haja diferenças na igreja. 'Todos não podem ver as
coisas da mesma maneira', é o comentário frequente. Interpretam mal Efésios
4:13, deduzindo que Deus nos concedeu dons “até que todos cheguemos à unidade
da fé”. Mas o ensino da Palavra é que “na unidade da fé e no conhecimento do
Filho de Deus”, cheguemos “a um estado perfeito, na maturidade da plenitude de
Cristo”. Há apenas “uma fé” (Vers. 5), a fé de Jesus. Como também há um só
Senhor, e aqueles que careçam dessa fé, necessariamente estarão desprovidos de
Cristo.
A Palavra de Deus é Verdade, e sua Palavra é luz. Só um homem cego pode deixar de apreciar o esplendor da luz. Embora um homem não tenha conhecido qualquer outro tipo de luz artificial, exceto a que vem de uma luminária, reconhecerá imediatamente que é luz o que emite uma lâmpada elétrica que lhe é mostrada pela primeira vez. Está claro que há graus diversos de conhecimento, mas não há nenhuma controvérsia entre os graus de conhecimento. A verdade inteira é uma.
11 E, chegando
Pedro à Antioquia, lhe resisti na cara, porque era repreensível.
12 Porque,
antes que alguns tivessem chegado da parte de Tiago, comia com os gentios; mas,
depois que chegaram, se foi retirando, e, se apartou deles, temendo os que eram
da circuncisão.
13 E os outros judeus também dissimulavam com ele, de maneira que até Barnabé se deixou levar pela dissimulação deles.
Não é necessário
estender-se nos enganos de Pedro, nem de qualquer outro homem piedoso. Não há
nenhum lucro nisto. Mas deveríamos prestar atenção àquele teste irrefutável
como que Pedro nunca foi considerado como “o principal dos apóstolos', e que
nunca foi, nem se teve, por papa. Que se atreva um padre, bispo ou cardeal a
'resistir cara a cara' ao papa, ante uma assembleia pública!
Mas Pedro cometeu um
erro, e fez isto com relação a um assunto vital, pela razão que não era
infalível. Aceitou com mansidão a repreensão que Paulo o dirigiu; aceitou isto
como cristão sincero e humilde que era. A vista do relato, se é que devesse
existir uma coisa tal como uma cabeça visível (humana) da igreja, essa honra
deveria ter correspondido a Paulo evidentemente, e não a Pedro. Paulo foi
enviado aos pagãos, e Pedro aos judeus; mas estes últimos constituíam uma parte
muito pequena da igreja. Os convertidos gentios os superaram depressa em
número, de forma que a presença de crentes de origem judia apenas se fazia
notar. Todos os cristãos eram em grande medida fruto das obras de Paulo, para
quem se dirigiam de modo natural os olhares, mais que para os outros
discípulos. É por isto que Paulo poderia dizer que nele pesava “diariamente, a
preocupação por todas as igrejas” (2 Cor. 11:28). Mas a infalibilidade não é a
porção de qualquer ser humano, e nem Paulo a buscou. O maior na igreja de
Cristo, não tem domínio sobre o mais fraco. Jesus disse: “Um é vosso mestre, e
todos vós sois irmãos” (Mat. 23:8). E Pedro nos exorta a estar “todos submissos
um ao outro” (1 Ped. 5:5).
Quando Pedro estava na Assembleia de Jerusalém, ele referiu a forma em que os pagãos tinham recebido o evangelho por meio de sua pregação: “Deus, que conhece os corações, os reconheceu dando-lhes o Espírito Santo assim como a nós. Nenhuma diferença fez entre nós e eles, porque pela fé purificou seus corações” (Atos 15:8 e 9). Por que? Porque conhecendo os corações, souberam que todos pecaram, e estão privados da glória de Deus”, então, só poderiam ser justificados gratuitamente pela graça, por meio da redenção realizada por Cristo Jesus” (Rom. 3:23 e 24). Porém, depois que o Senhor tinha dado prova dele ante os olhos de Pedro – depois que este tinha pregado aos pagãos e depois de ter testemunhado a concessão do dom do Espírito Santo para os crentes gentios, tanto quanto aos judeus; depois de ter comido com eles e de tê-los defendido fielmente; depois de ter dado um testemunho firme na Assembléia sobre aquele Deus que não fez diferença entre judeus e gentios; e inclusive depois de não ter feito diferença ele mesmo –, Pedro, de repente, tão logo como “viessem alguns” que ele supôs não aprovariam uma tal liberdade, começou a fazer diferença! ”Se retirou e partiu, por temor aos circuncidados”. Isso era ”simulação”, “hipocrisia”, como disse Paulo, e não só era ruim em si mesmo, mas confundiria e desviaria os discípulos. Pedro estava naquela ocasião controlado pelo temor, e não pela fé.
Contrário a verdade do evangelho - A onda de medo parecia também alcançar os crentes judeus, desde que “os outros crentes judeus participaram de sua simulação, tanto que até Barnabé foi levado pela hipocrisia deles”. Certamente, “não caminharam justamente de acordo com a verdade do evangelho” (Vers. 14); mas o simples ato da simulação não era a totalidade da ofensa contra a verdade do evangelho. Naquele contexto significou uma negação pública de Cristo, tanto quanto foi naquela outra ocasião quando Pedro, debaixo da pressão súbita do medo, caiu em tentação. Temos frequentemente caído no mesmo erro como meninos, para nos erguermos como juízes, mas podemos observar o fato e suas consequências como advertência.
14 Mas, Quando vi que não andavam bem corretamente conforme a verdade do evangelho, disse a Pedro, na presença de todos: Se tu, sendo judeu, vives como os gentios, e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como judeus?
Observe como a ação de Pedro e os que o acompanharam eram uma virtual – embora não deliberada – negação de Cristo. Uma controvérsia sobre a circuncisão tinha tomado lugar há pouco. Era uma pergunta de justificação e salvação: o homem se salva somente pela fé em Cristo, ou pelas formas externas? O testemunho era inequívoco, no sentido de que a salvação é pela fé somente. E agora, estando ainda viva a controvérsia, estando ainda os “falsos irmãos” propagando seus erros, esses irmãos leais começaram a fazer discriminação em prejuízo dos crentes gentios, devido a não estarem circuncidados. De fato, eles estavam falando: “Se você não se circuncidar de acordo com o rito de Moisés, não te salvarás”. Sua forma de ação dizia: 'Nós também questionamos o poder de que somente a fé em Cristo pode salvar os homens. Realmente acreditamos que a salvação depende da circuncisão e das obras da lei. A fé em Cristo é boa, mas é necessário fazer algo mais. Ela mesma não é suficiente'. Paulo não pôde consentir com tal negação da verdade do evangelho, e foi sem rodeios à raiz do problema.
15 Nós
somos judeus por natureza e não pecadores dentre os gentios.
16 Sabendo que o homem não é justificado pelas obras da lei, mas pela fé em Cristo Jesus, temos também crido em Cristo Jesus, para sermos justificados pela fé de Cristo, e não pelas obras da lei; porquanto pelas obras da lei nenhuma carne será justificada.
Queria Paulo dizer que
por serem judeus não eram pecadores? Impossível, pois tinham acreditado em
Jesus Cristo para serem justificados. Simplesmente, eram pecadores judeus, não
pecadores gentios. Seja do que for que pudessem se gloriar como judeus, tiveram
que reputar como perda por causa de Cristo. Não havia nada que lhes valesse,
exceto a fé em Cristo. E sendo deste modo, é evidente que os pecadores gentios
também pudessem ser salvos diretamente pela fé em Cristo, sem ter que se seguir
pelas formalidades vazias que não tinham sido útil aos judeus, e que lhes foram
dadas, em grande medida, devido à sua incredulidade.
"Palavra fiel e
digna de ser recebida por todos, que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os
pecadores, dos quais eu sou o principal” (1 Tim. 1:15). Todos pecaram, e
são igualmente culpados perante Deus. Mas todos, da raça ou classe que sejam,
podem aceitar esta verdade: “Recebe aos pecadores, e come com eles" (Luc.
15:2). Um pecador circuncidado não é melhor que um incircunciso. Um pecador que
é membro da igreja não é melhor que um que não é. O pecador que passou pela
forma do batismo não é melhor que o pecador que nunca fez profissão de
religião. Pecado é pecado, e os pecadores são pecadores, dentro ou fora da
igreja. Mas, graças a Deus, Cristo é o sacrifício pelos nossos pecados, tanto
quanto pelos pecados do mundo inteiro (1 João 2:2). Há esperança para o infiel
que faz profissão de religião, como também para aquele que nunca invocou o nome
de Cristo. O mesmo evangelho que é pregado para o mundo, deve ser pregado na
igreja, pois não há mais que um evangelho. É útil tanto para converter os
pecadores no mundo, como aos membros da igreja. E ao mesmo tempo, renova os que
estão verdadeiramente em Cristo.
O significado da
palavra “justificado” é “feito justo”. Deriva do latim justitia. Ser é
ser reto. A isso somamos a terminação ficar, também do latim,
significando “fazer”. Magnificar: fazer grande. Dignificar: fazer digno, etc.
Justificar: fazer justo.
Em alguns casos
aplicamos o termo “justificar” ao que é inocente de um fato que é acusado
injustamente. Mas o tal não precisa de justificação, posto que já é justo.
Agora, desde que “todos pecaram”, não há nenhum justo – ou reto – perante Deus.
Então, todos necessitam ser justificados, ou feito justos.
A lei de Deus é justiça
(ver Rom. 7:21; 9:39 e 31, Sal. 119:172). Paulo apreciou tanto a lei, que
acreditou em Cristo para obter a justiça que ela exige, mas que por si mesma é
incapaz de proporcionar: “O que era impossível à Lei, visto como estava enferma
pela carne; Deus ao enviar seu próprio Filho em semelhança da carne do pecado,
e como sacrifício pelo, condenou o pecado na carne; para que a justiça da lei
se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas de acordo com o
Espírito” (Rom. 8:3 e 4). A lei que declara pecadores a todos os homens, só
poderia justificá-los afirmando que o pecado não é pecado. Mas isso não seria
justificação, mas contradição.
Então, anulamos lei? Os
que persistem no pecado fariam com alegria, porque é uma lei que os declara
culpados. Mas é impossível abolir a lei de Deus, já que a mesma é a vida e
caráter dEle. “Deste modo, a Lei é santa, e o Mandamento santo, justo e
bom” (Rom. 7:12). Ao ler a lei escrita, vemos ali nosso dever claramente
especificado. Mas não temos cumprido. Portanto, somos culpados.
Também, ninguém possui
a força necessária para guardar a lei, devido à magnitude das exigências.
Embora seja certo que ninguém pode ser justificado pelas obras da lei, não é
porque a mesma lei está defeituosa, mas porque o indivíduo está. Quando Cristo
mora no coração pela fé, a justiça da lei mora também ali, porque Cristo disse:
“Deus Meu, me deleito em fazer tua vontade, a tua Lei está em meu coração”
(Sal. 40:8). Quem descarta a lei, porque esta não considera o mal como se fosse
bem, também rejeita a Deus “que de nenhum modo terá por inocente ao culpado”
(Êxo. 34:7). Mas Deus remove a culpa e converte o pecador em justo; quer dizer,
coloca-o em harmonia com a lei. A lei que antes o condenava, dá agora
testemunho de sua justiça (ver Rom. 3:21).
Perdemos muito se não
aceitamos a Escritura tal como é. No original, o verso 16 contém a expressão
“fé de Jesus”, igual a que encontramos em Apocalipse 14:12. Jesus é o “autor e
consumador da fé” (Heb. 12:2). “A fé vem pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de
Deus” (Rom. 10:17). No dom de Cristo à todo homem, achamos “a medida de fé que
Deus repartiu a cada um” (Rom. 12:3). Tudo vem de Deus. É Ele quem concede o
arrependimento e perdão dos pecados.
Então, ninguém pode
reclamar por ter uma fé débil. Talvez não haja aceitado nem usado o dom, mas
não existe algo como “fé débil”. A pessoa pode ser “débil na fé”, pode temer
apoiar-se na fé. Mas a fé, nela, é tão firme quanto a Palavra de Deus. Não
existe outra fé diferente da fé de Cristo. Qualquer outra coisa que pretenda
sê-lo, é uma falsificação. Só Cristo é justo. Ele tem vencido o mundo, e só Ele
tem poder para fazer isto. NEle habita toda a plenitude de Deus, já que a lei
está em seu coração. Somente Ele guardou e pode guardar a lei em sua perfeição.
Então, somente por sua fé – a fé viva –, quer dizer, sua vida em nós, podemos
ser feito justos.
Isso é plenamente
suficiente. Ele é a “pedra provada” (Isa. 28:26). A fé que nos dá é a sua
própria, provada e aprovada. Não nos falhará em qualquer circunstância. Não
somos exortados a que tentemos fazer também como Ele fez, nem que tentemos
exercer tanta fé quanto Ele exerceu, mas simplesmente tomemos sua fé, e permitamos
que trabalhe por amor, e purifique o coração. Ele fará!
"A todos os que o
receberam, aos que creram em seu Nome, lhes deu o poder de serem Filhos de
Deus” (João 1:12). Os que o recebem são os que creem em Seu nome. Crer em seu
nome é acreditar que Ele é o Filho de Deus. E isso, por sua vez, significa crer
que tenha vindo na carne, em carne humana, em nossa carne. Assim deve
ser, pois seu nome é “Deus connosco”.
Crendo em Cristo, somos justificados pela fé de Cristo, desde que nós o tenhamos morando pessoalmente em nós, exercendo sua própria fé. Em suas mãos está todo o poder, no céu e na terra. Reconhecendo isto, simplesmente permitimos que possa exercer seu próprio poder, de seu próprio modo. Cristo é poderoso para fazê-lo ”infinitamente mais que tudo quanto pedimos ou pensamos, pelo poder que opera em nós” (Efe. 3:20).
17 Pois, se nós, que procuramos ser justificados em Cristo, nós mesmos também somos achados pecadores, é porventura Cristo ministro do pecado? De maneira nenhuma.
Jesus Cristo é o Santo
e o Justo (Atos 3:14). “Cristo veio para remover nossos pecados” (1 João 3:5). Ele
não só “não cometeu pecado” (1 Ped. 2:22), mas que não conheceu pecado (2 Cor.
5:21). Então, é impossível que algum pecado venha dEle. Cristo não dá o pecado.
No manancial de vida que flui de seu lado ferido, de seu coração traspassado,
não há nenhum vestígio de impureza. Ele não é ministro de pecado: não ministra
o pecado a ninguém.
Se alguns que procuraram – e acharam – a justiça por meio de Cristo, pecam mais tarde, é porque obstruíram a corrente, fazendo que se estanque a água. Não deram livre curso à Palavra, de forma que resultem glorificados. E onde falta a atividade, a morte aparece. Não é necessário acusar qualquer pessoa por isso, a não ser a própria pessoa. Que nenhum professo cristão tome conselho das próprias imperfeições e diga que é impossível que o crente viva uma vida sem pecado. Para um verdadeiro cristão, para aquele que tenha fé plena, o que é impossível é viver outra classe de vida, “porque nós que estamos mortos para o pecado, como ainda viveremos nele”? (Rom. 6:2). “Todo o que é nascido de Deus não continua pecando, porque a vida de Deus está nele. Não pode continuar pecando, porque nasceu de Deus” (1 João 3:9). Portanto, “permaneça nEle”
18 Porque, se torno a edificar aquilo que destruí, a mim mesmo me constituo transgressor.
Se um cristão derruba –
descarta – seus pecados por meio de Cristo, para reedificá-los depois, é
constituído novamente em transgressor; está novamente em falta e necessidade de
Cristo.
É necessário lembrar
que o apóstolo está se referindo aos que acreditaram em Jesus Cristo, que foram
justificados pela fé de Cristo. Paulo diz em Romanos 6:6: “Nosso velho homem
foi crucificado junto com ele, de forma que o corpo do pecado seja destruído,
para que não sejamos mais escravos do pecado”. Também lemos: “Vós estais
completos nele, que é a cabeça de todo o principado e potestade. Nele também
fostes circuncidados uma circuncisão feita sem mão, ao despojares do corpo dos
pecados, por meio da circuncisão feita por Cristo” (Col. 2:10 e 11).
O que fica destruído é o corpo do pecado, e é só a presença pessoal da vida de Cristo que o destrói. Faz isto com o propósito de livrar-nos do poder do pecado, e de impedir que o tenhamos de servir novamente. É destruído para todos, desde que Cristo aboliu na própria carne “a inimizade”, a mente carnal. Não a sua – pois nunca a teve -, mas a nossa. Levou nossos pecados, nossas fraquezas. Obteve a vitória para toda a alma; o inimigo ficou desarmado. Temos que aceitar a vitória que Cristo ganhou. A vitória sobre todo pecado já é uma realidade. Nossa fé nisto, o converte em realidade para nós. A perda da fé nos coloca fora daquela realidade, e reaparece o velho corpo dos pecados. Aquilo que a fé demoliu, é reedificado pela incredulidade. É necessário lembrar que aquela destruição do corpo dos pecados, embora já realizada por Cristo a todos, pertence ao presente, em cada um como indivíduo.
19 Porque eu pela lei estou morto para a lei, para viver para Deus.
Muitos parecem supor que a frase “morto para a Lei” significa a mesma coisa que 'morra a lei'. São coisas absolutamente diferentes. A lei deve estar em toda sua força para que alguém possa morrer por ela. Como alguém pode estar “morto para a lei”? Recebendo a plenitude de sua penalidade, que é a morte. O indivíduo está morto, mas a lei que o condenou é tão efetiva e disposta condenar à morte outro criminoso, como o fez com o primeiro. Vamos agora supor que a primeira pessoa executada por cometer grandes crimes, de algum modo milagroso possa ser devolvida à vida. Não estaria morta à lei? Certamente. A lei não lhe poderia então reprovar nenhum de seus atos passados. Mas, se cometesse crimes novamente, violando a lei, esta voltaria a executá-lo, como se fosse outra pessoa. Ressuscito da morte que – devido a meu pecado – me impôs a lei, e agora entro em “novidade de vida”: estou vivo para Deus. Como se pode dizer de Saul nos primeiros dias, o Espírito de Deus me “mudou em outro homem” (1 Sam. 10:6). Tal é a experiência do cristão, como demonstra o próximo versículo:
20 Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim.
A menos que sejamos
crucificados com Ele, sua morte e ressurreição não nos aproveitará em nada. Se
a cruz de Cristo permanece longe e fora de nós, mesmo que só por um momento, ou
pela espessura de um fio de cabelo, para nós é como se não houvesse sido
crucificado. Quem quiser ver a Cristo crucificado, não deve olhar atrás ou para
adiante, mas para cima; uma vez que os braços da cruz levantada no Calvário
alcançam desde o Paraíso perdido até o Paraíso restaurado, e alcançam todo o
mundo de pecado. A crucificação de Cristo não é algo restrito a um só dia.
Cristo é o “Cordeiro que foi morto desde a criação do mundo” (Apoc. 13:8). As
angústias do Calvário não cessarão enquanto houver um único pecado ou pecador.
Agora mesmo Cristo está levando os pecados do mundo inteiro, pois “todas as
coisas subsistem nEle”. E quando finalmente se vê obrigado a enviar ao lago de
fogo os malvados impenitentes, a angústia que sofrerão não será maior que a que
sofreu na cruz o Cristo que rejeitaram.
Cristo levou nossos
pecados em Seu corpo sobre o madeiro (1 Ped. 2:24). Foi feito “maldição” por
nós, quando pendurado na cruz (Gál. 3:13). Na cruz, não somente levou as
enfermidades e o pecado da humanidade, mas também a maldição da terra. Os
espinhos são um estigma da maldição (Gên. 3:17 e 18), e Cristo levou a coroa de
espinhos. Cristo, Cristo crucificado, leva todo o peso da maldição.
Onde quer que vejamos
um ser humano perdido na miséria, levando as cicatrizes do pecado, também temos
de ver a Jesus crucificado por ele. Cristo na cruz leva tudo, incluindo os
pecados desse ser humano. Devido a sua incredulidade, pode ser que sinta o peso
lastimoso de sua carga. Mas se crê, pode ser livrado deste peso. Cristo leva,
na cruz, os pecados do mundo inteiro. Então, onde vemos pecado, podemos estar
seguros de que lá está a cruz de Cristo.
O pecado é uma questão
pessoal. Está no coração do homem. “De dentro, do coração dos homens, saem os
maus pensamentos, adultérios, fornicações, homicídios, roubos, avareza,
maldade, decepção, hábitos ruins, inveja, fofocas, arrogância, loucura; todas
essas maldade saem de dentro, e contaminam o homem” (Mar. 7:21-23). “Enganoso é
o coração mais que todas as coisas, e perverso, quem o conhecerá”? (Jer. 17:9).
O pecado está, por natureza, em cada fibra de nosso ser. Somos nascidos nele, e
nossa vida é pecado, de forma que não é possível extirpar o pecado sem tirarmos
também a vida nele. O que preciso é libertação de meu próprio pecado pessoal:
não só aquele pecado que tenho cometido pessoalmente, mas também o que mora no
coração, o pecado que constitui o todo em minha vida.
Sou eu quem comete o
pecado, cometo em mim mesmo, e não posso separá-lo de mim. Devo colocá-lo sobre
o Senhor? Sim, é deste modo, mas como? Posso juntá-lo em minhas mãos e lançá-lo
fora de mim, de forma que seja Ele quem o leve? Se pudesse separa-lo de mim, no
mínimo que fosse, então seria salvo, seja onde for que o pecado vá parar, desde
que não se encontrasse em mim. Nesse caso poderia prescindir de Cristo, pois se
não encontrasse pecado em mim, pouco importaria onde se encontrasse, estaria
livre dele. Mas nada que eu faço pode salvar-me. Todos os meus esforços para
separar-me do pecado são vãos.
O que estudamos
anteriormente revela que quem queira levar meus pecados, têm que vir até onde
eu estou, deve vir a mim. É exatamente isso que Cristo faz. Cristo é a Palavra,
e diz à todos os pecadores que pretendem desculpar-se alegando que não têm como
saber o que Deus requer deles: “A palavra vos está muito próxima, em sua boca e
em seu coração, para que a cumpras” (Deut. 30:11-14). Ainda: “Se com vossa boca
confessais que Jesus é o Senhor, e em vosso coração acreditais que Deus o
ergueu dos mortos, serás salvo” (Rom. 10:9). Que confessaremos sobre o Senhor
Jesus? Confesse a verdade, admita que Ele está muito perto de você, em sua boca
e em seu coração, e crê que aí está, ressuscitado dos mortos. O Salvador
ressuscitado é o Salvador crucificado. Tanto quanto a Cristo ressuscitado,
achamos a Cristo crucificado. Caso contrário, não haveria esperança para
ninguém. A pessoa pode acreditar que Cristo foi crucificado há dois milênios
atrás, e ainda assim morrer em seus pecados. Mas aquele que crê que Cristo está
nele crucificado e ressuscitado, tem a salvação.
Tudo quanto tem que
fazer qualquer ser humano para ser salvo, é crer na verdade; quer dizer,
reconhecer os atos, ver as coisas da forma como realmente são, e confessá-las.
Todo aquele que crê que Cristo está nele crucificado e ressuscitado, que mora
nele pelo poder da ressurreição, é salvo do pecado. Estará salvo enquanto crê.
Esta é a única e verdadeira confissão de fé.
Que verdade gloriosa,
que lá onde o pecado abundou, lá está Cristo, o Salvador do pecador. Ele leva o
pecado, todo o pecado, o pecado do mundo.
No décimo capítulo de
Romanos, como já foi dito, vemos a Cristo vindo a todo homem por meio do
Espírito, “nosso pronto auxilio nas tribulações” (Sal. 46:1). Vem ao pecador
para proporcionar-lhe todo o incentivo e facilidade para que volte do pecado
para a justiça. Ele é “o caminho, a verdade e a vida” (João 14:6). Não há outra
vida, a não ser a Sua. Mas embora Cristo venha a todo o homem, nem todo homem
manifesta a justiça dEle, porque alguns “suprimem a verdade com sua injustiça”
(Rom. 1:18).
O inspirado anelo de
Paulo é que possamos ser fortalecidos no homem interior por seu Espírito, “que
habite Cristo pela fé em vosso coração”, “de forma que sejais cheios de toda a
plenitude de Deus” (Efe. 3:16-19).
No pecador podemos ver
a Cristo crucificado, já que onde havia pecado e maldição, está Cristo
levando-o. Tudo que é necessário é que o pecador seja crucificado com Cristo,
que permita que a morte de Cristo seja sua própria morte, a fim de que a vida
de Jesus possa manifestar-se em sua carne mortal. A fé no eterno poder e
divindade de Deus, que se mostram em toda a criação, colocará essa verdade ao
alcance de todos. A semente semeada, não germina ”se não morrer” antes (1 Cor.
15:36). “Se o grão de trigo não cai na terra e morre, está só. Mas ao morrer,
leva muito fruto” (João 12:24). Assim, quem é crucificado com Cristo que comece
a viver como um novo homem. “Já não vivo eu, mas Cristo vive em mim”.
Se Cristo foi
crucificado a uns dois mil anos atrás, como então pode assumir sobre si meus
pecados pessoais hoje? E também, como eu posso ser crucificado agora junto com
Ele? Pode ser que não possamos entender, mas isso não altera a veracidade do
fato. Quando lembramos que Cristo é a vida, “porque a Vida que estava com o
Pai, se manifestou” (1 João 1:2), podemos entender mais que isto. “A vida
estava nele, e essa vida era a luz dos homens”. “Aquele Verbo era a verdadeira
Luz, que ilumina todo o homem que vem a este mundo” (João 1:4, 9).
A carne e o sangue (o
que os olhos veem) não podem revelar a “Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mat.
16:16 e 17), porque “como está escrito: 'Coisas que o olho não viu, nem ouvido
ouviu, nem subiram ao coração humano, são as coisas que Deus preparou para os
que o amam'. Mas Deus nos revelou pelo Espírito” (1 Cor. 2:9 e 10). Nenhum
homem, não importa quão familiarizado esteja com o Carpinteiro de Nazaré,
poderia reconhecê-lo como o Senhor, se não pelo Espírito Santo (1 Cor. 12:3).
Por meio do Espírito,
sua própria presença pessoal, podem vir a todo o homem na terra, como também
encher o céu, algo que Jesus na carne não pôde fazer. Então, importava que Ele
se fosse, e enviasse o Consolador. “Cristo existia antes de todas as coisas, e
todas as coisas subsistem nele” (Col. 1:17). Jesus de Nazaré era Cristo na
carne. O Verbo que estava no princípio, aquele em quem todas as coisas
subsistem, é o Cristo de Deus. O sacrifício de Cristo, pelo que a este mundo
respeita, governa “desde a criação do mundo”.
A cena do Calvário foi
a manifestação do que vinha acontecendo desde a entrada do pecado no mundo, e
do que continuará acontecendo até que seja salvo o último pecador que queira
sê-lo: Cristo levando os pecados do mundo. Os leva agora. Foi suficiente para
sempre um ato de morte e ressurreição, porque a sua é uma vida eterna.
Portanto, não há necessidade da repetição do sacrifício. Essa vida é para todos
os homens em todo lugar, de forma que quem a aceita por fé, se apropria do pleno
benefício do sacrifício de Cristo. E efetua em si mesmo a purificação dos
pecados. Quem rejeita sua vida, perde o benefício de seu sacrifício.
Cristo viveu para o Pai
(João 6:57). Sua fé na palavra que Deus lhe recomendou chegou até o ponto de
lhe permitir manifestar de forma repetida e enfática que, depois de sua morte,
ressuscitaria ao terceiro dia. Morreu nessa fé, dizendo: “Pai, em tuas mãos
recomendo meu espírito” (Luc. 23:46). A fé que lhe deu a vitória sobre a morte,
também lhe deu vitória completa sobre o pecado. É a mesma que exerce quando
vive em nós pela fé, porque “Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje, e por todos os
séculos” (Heb. 13:8).
Não somos nós que
vivemos, mas é Cristo quem vive em nós, e por meio de sua própria fé nos livra
do poder de Satanás. Que devemos fazer? Permitir-lhe que viva em nós da forma
que Ele mostrou. “Há em vós o mesmo sentir que havia em Cristo Jesus” (Fil.
2:5). Como podemos permitir isso? Simplesmente reconhecendo-o, confessando-o.
"Quem me amou, e
se entregou a si mesmo por mim”. Que expressão tão pessoal! Sou o objeto do
amor! Toda pessoa no mundo pode dizer: “me amou, e se entregou por mim”. Paulo
morreu, mas as palavras dele continuam vivas. Estavam certas quando aplicadas à
ele, mas não mais que quando aplicadas a para qualquer outro ser humano. São as
palavras que o Espírito põe em nossos lábios, se consentirmos em recebê-las. A
plenitude do Dom de Cristo é para cada “eu” individual. Cristo não está
dividido, mas cada alma o recebe em sua plenitude, como se não existisse outra
pessoa no mundo. Toda pessoa recebe a totalidade da luz que brilha. O fato de
que haja milhões de pessoas que recebem a luz do sol, não diminui em nada a que
me ilumina. Obtenho pleno benefício dela. Não receberia mais, mesmo que fosse a
única pessoa que existisse no mundo inteiro. Deste modo, Cristo se deu a si
mesmo por mim, tanto como se eu fosse o único pecador que povoou em algum
momento a terra. E a mesma coisa é certa para todo o pecador.
Quando semeias um grão de trigo, você obtém muito mais grãos que o primeiro, cada um deles contém a mesma vida, e tanto dela, como a que teve a semente original. Desta mesma maneira acontece com Cristo, a autêntica Semente. Ao morrer por nós, de forma que também viéssemos a ser a verdadeira semente, concede a cada um a totalidade de sua vida. “Graças a Deus por seu dom inefável!” (2 Cor. 9:15).
21 Não anulo a graça de Deus; pois, se a justiça provém da lei, segue-se que Cristo morreu em vão.
Se pudéssemos, pela
lei, nos salvar, então Cristo morreu em vão. Mas isso é impossível. E Cristo
certamente não morreu em vão. Portanto, só nEle há salvação. É capaz de salvar
a todos os que por Ele se aproximam de Deus (Heb. 7:25). Se ninguém fosse
salvo, teria morrido em vão. Mas esse não é o caso. A promessa é segura: “Verá
a sua posteridade, prolongará os dias; e o bom prazer do Senhor prosperará na
sua mão. O trabalho de sua alma ele verá, e ficará satisfeito” (Isa. 53:10 e
11).
Todo aquele que quiser,
poderá ser parte dos frutos do trabalho de sua alma. Considerando que Cristo
não morreu em vão, não recebas ”em vão a graça de Deus” (2 Cor. 6:1).
Capítulo 3
REDIMIDOS DA MALDIÇÃO
Depois de terem aceito
o evangelho, os gálatas estavam extraviando-se seguindo falsos mestres que lhes
apresentavam “outro evangelho”, uma falsificação do verdadeiro e único, pois
nunca houve outro, em qualquer tempo, para todos os homens.
A falsificação do
evangelho se expressava nos seguintes termos: “Se não vos circuncidais de
acordo com o rito de Moisés, não podeis ser salvos”. Embora em nossos dias seja
irrelevante o assunto do rito da circuncisão; não obstante, com relação à
salvação mesmo, a polêmica sobre se participam as obras humanas ou é somente
por Cristo, está tão viva como sempre.
Em vez de atacar o erro
e combatê-lo com argumentos poderosos, o apóstolo se refere a uma experiência
que ilustra o tema em discussão. Em sua exposição lhes demonstra que a salvação
é somente pela fé para todos os homens, e de nenhuma forma pelas obras. Do
mesmo modo que Cristo provou a morte por todos, todo aquele que seja salvo há
de possuir a experiência pessoal da morte, ressurreição e vida de Cristo nele.
Cristo na carne, fez o que a lei não foi capaz de fazer (Gál. 2:21; Rom. 8:3 e
4). Mas o mesmo fato dá testemunho da justiça da lei. Se esta fora em algum
detalhe deficiente, Cristo não haveria cumprido suas exigências. Cristo mostra
a justiça da lei cumprindo-a, ou realizando o que pede a lei, não simplesmente por
nós, mas em nós. A graça de Deus em Cristo atesta a majestade e
santidade da lei. Não descartamos a graça de Deus: se a justiça pudesse ser
obtida pela lei, “então em vão morreu Cristo”.
Pretender que a lei possa ser abolida, que suas exigências podem ser tidas em pouca consideração, que podemos passá-la por alto, equivale a dizer que Cristo morreu em vão. Repitamos: a justiça não pode ser obtida pela lei, mas só pela fé de Cristo. Mas o fato de que a justiça da lei não possa ser alcançada de outra maneira que não seja pela crucifixão, ressurreição e vida de Cristo em nós, demostra a infinita grandeza e santidade da lei.
1 Ó insensatos gálatas! quem vos fascinou para não obedecerdes à verdade, a vós, perante os olhos de quem Jesus Cristo foi já representado como crucificado?
Paulo escreveu literalmente “quem os encantou”? “Obedecer é melhor que sacrificar, e o atender melhor que a gordura dos carneiros. Porque a rebelião é como pecado de feitiçaria e o porfiar é como iniquidade e idolatria” (1 Sam. 15:22 e 23). Em hebraico, literalmente se diz: “O pecado de rebelião é feitiçaria, e o porfiar é rebelião e idolatria”. Por que? Porque a rebeldia e o porfiar são rejeição para Deus. E aquele que rejeita a Deus fica sob o controle dos espíritos maus. Toda idolatria é adoração ao diabo. “O que os pagãos sacrificam, para os demônios sacrificam” (1 Cor. 10:20). Não há terreno neutro. Cristo disse: “O que não está comigo, está contra mim” (Mat. 12:30). Ou seja: a desobediência, rejeitando o Senhor, é o espírito do anticristo. Como já vimos, os irmãos gálatas estavam separando-se de Deus. Inevitavelmente, embora talvez sem perceber, estavam voltando à idolatria.
Uma proteção contra o
espiritismo - O espiritismo não é mais que outra forma de se referir à antiga
feitiçaria, ou bruxaria. É uma fraude, mas não o tipo de fraude que muitos imaginam.
Há nele uma realidade. É uma fraude, uma vez que pretendendo manter comunicação
com os espíritos dos mortos, a mantêm somente com os espíritos dos demónios,
dado que “os mortos nada sabem”. Ser um médium espírita é se render ao controle
dos demonios.
Há só uma forma de proteger-se dele, e é agarrar-se à Palavra de Deus. Quem considera com leviandade a Palavra de Deus, está perdendo sua comunhão com Deus, e fica sob a influência de Satanás. Até mesmo o que denuncia o espiritismo nas condições mais enérgicas, se deixar de apegar-se à Palavra de Deus, mais cedo ou mais tarde será enganado pela sedução poderosa da falsificação de Cristo. Somente mantendo-se firme na Palavra de Deus, o crente poderá ser guardado da hora de prova que está para vir a todo o mundo (Apoc. 3:10). “O espírito que agora opera nos filhos da desobediência” (Efe. 2:2) é o espírito de Satanás, o espírito do anticristo; e o evangelho de Cristo, que revela a justiça de Deus (Rom. 1:16 e 17) é a única salvação possível.
Cristo, crucificado
perante nós - Quando Paulo pregou aos gálatas, apresentou a Cristo crucificado.
Tão vívida foi a descrição, que os gálatas realmente puderam contemplá-lo ante
seus olhos como o Crucificado. Não era uma questão de mera retórica por
parte de Paulo, nem de imaginação por parte deles. Usando Paulo como
instrumento, o Espírito Santo os qualificou a ver Cristo crucificado.
Neste respeito, a experiência dos gálatas não pode ser
exclusiva deles. A cruz de Cristo é um fato atual. A expressão 'Ir à cruz', não
é uma mera forma de expressão, mas algo que você pode cumprir literalmente.
Ninguém pode saber a realidade do evangelho que veja a Cristo crucificado ante seus olhos, e até ver a cruz em cada parte. Poderá ser que alguém ache graça, mas o fato de que uma pessoa cega não veja o sol, e negue que este brilha, não convencerá ao que vê e recebe sua luz. Muitos há, que podem dar testemunho das palavras do apóstolo, referente a Cristo ter sido crucificado ante os olhos dos gálatas, é mais que uma simples figura de linguagem. Outros tem conhecido esta mesma experiência. Deus queira que este estudo da epístola possa ser o meio de abrir os olhos a muitos mais!
2 Só quisera saber isto de vós: recebestes o Espírito pelas obras da lei ou pela pregação da fé?
Só há uma resposta: pela pregação da fé. O Espírito é dado aos que creem (João 7:38 e 39; Efe. 1:13). Podemos também ver que os gálatas tinham recebido o Espírito Santo. Não há outra forma em que se pode iniciar a vida cristã. “Ninguém pode dizer: 'Jesus é o Senhor', se não pelo Espírito Santo” (1 Cor. 12:3). No princípio, o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas, gerando vida e atividade na criação, porque sem o Espírito não há nenhuma ação, não há vida. “Não por força nem por violência, mas pelo meu Espírito, diz o Senhor dos Exércitos” (Zac. 4:6). Somente o Espírito de Deus pode cumprir sua perfeita vontade. Nenhum trabalho que o homem possa fazer, pode trazer Deus à alma. É tão impossível quanto um morto ressuscitar produzindo seu próprio sopro de vida. Então, os destinatários da epístola tinham visto a Cristo crucificado perante seus olhos, e o tinham aceitado por meio do Espírito. Tens visto a Jesus e o aceitado, você também?
3 Sois assim insensatos que, tendo começado pelo Espírito, acabeis agora pela carne?
“Insensatos” é dizer
pouco. O que não tem poder para começar uma obra, acredita ter forças para
terminá-la! Alguém incapaz de pôr um pé após do outro, pensa que em si mesmo
tem como ganhar uma corrida!
Quem tem o poder para
gerar-se? Ninguém. Não viemos ao mundo gerando a nós mesmos. Nascemos sem
forças. Então, toda a força que podemos manifestar mais tarde, tem uma origem
externa a nós. Nos é dada em sua totalidade. O bebê recém nascido é o
representante do homem. “Um homem veio ao mundo”, dizemos. Toda a força que um
homem tem em si mesmo, não é maior que aquele grito do recém nascido com o qual
começa sua primeira respiração. De fato, até essa pequena força lhe foi dada.
O mesmo acontece no mundo espiritual. “Por sua vontade ele nos gerou pela Palavra de Verdade” (Tg. 1:18). Não podemos viver justamente por nossas próprias forças mais do que podemos gerar a nós mesmos. A obra que o Espírito começou, há de ser levada em sua plenitude pelo Espírito. “Porque nos tornamos participantes de Cristo, se retivermos firmemente o princípio da nossa confiança até o fim” (Heb. 3:14). “O que começou em vós a boa obra, a aperfeiçoará até ao dia de Jesus Cristo” (Fil. 1:6). Somente Ele pode fazê-lo.
4 Será em
vão que tenhais padecido tanto? Se é que isso também foi em vão.
5 Aquele, pois, que vos concede o Espírito e que obra maravilhas entre vós, o faz pelas obras da lei ou pela pregação da fé?
Essas perguntas mostram que a experiência dos irmãos da Galácia havia sido tão profunda e genuína como se espera de alguém cujos olhos tenham visto a Cristo crucificado. Haviam recebido o Espírito, foram efetuados milagres entre eles, e inclusive por eles mesmos, já que os dons do Espírito acompanham o dom do Espírito. E como resultado desse evangelho vibrante que haviam vivido, sofreram perseguição, pois “todos os que queiram viver piedosamente em Cristo Jesus, padecerão perseguições” (2 Tim. 3:12). Isso aumenta a gravidade da situação. Havendo participado dos sofrimentos de Cristo, estavam agora afastando-se dEle. E esse separar-se de Cristo, o único pelo qual pode vir a justiça, se caracterizava pela desobediência à lei da verdade. De forma inconsciente, porém inevitável, estavam transgredindo aquela lei pela qual esperavam ser salvos.
6 Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado como justiça.
As perguntas
apresentadas dos versículos três a cinco, trazem implícita a resposta. Lhes foi
ministrado o Espírito, e se produziram milagres, não pelas obras da lei, mas
sim por ouvir com fé; ou dizer, pela obediência da fé, posto que a fé vem pelo
ouvir a Palavra de Deus (Rom. 10:17). A obra de Paulo, e a experiência
dos gálatas, estavam em plena harmonia com a experiência de Abraão, a quem se
contou a fé por justiça. Convém lembrar que os “falsos irmãos” que pregavam
“outro evangelho”, o falso evangelho da justiça pelas obras, eram judeus, e
consideravam Abraão seu pai. Se orgulhavam em ser “filhos” de Abraão, e
apontavam sua circuncisão como prova. Mas precisamente aquilo em que
sustentavam sua pretensão de ser filhos de Abraão, provava que não eram, pois
que “Abraão creu em Deus, e isto lhe foi contado por justiça”. Abraão teve a
justiça da fé antes de ser circuncidado (Rom. 4:11). “portanto, sabei que os
que são da fé, esses são filhos de Abraão” (Gál. 3:7). Abraão não foi
justificado pelas obras (Rom. 4:2 e 3), mas sua fé efetuou justiça.
Ainda hoje existe idêntico problema. Se confunde o sinal com a substância, o fim com os meios. Posto que a justiça se materializa em boas obras, se deduz – falsamente – que as boas obras produzem justiça. Aos que assim pensam, a justiça que vem pela fé, as boas obras que não vem de “obrar”, lhes parecem sem sentido real e prático. Consideram-se pessoas “práticas” e creem que a única forma de lograr que se faça algo, é fazendo. No entanto, a verdade é que essas pessoas não são práticas. Alguém que carece absolutamente de força é incapaz de fazer qualquer coisa, nem sequer de levantar-se e tomar o remédio que lhe é oferecido. Qualquer conselho que se dê a ele a fim de que procure fazê-lo, será vão. Só em Deus está o poder e a justiça (Isa. 45:24). “Entrega o teu caminho ao Senhor, confia nele, e o mais Ele fará” (Salm. 37:5). Abraão é o pai de todos os que creem para justiça, e somente deles. A única coisa verdadeiramente prática é crer, tal como ele fez.
7 Sabei
pois que os que são da fé são filhos de Abraão.
8 Ora, tendo a Escritura previsto que Deus justificaria pela fé os gentios, anunciou primeiro o evangelho a Abraão, dizendo: Todas as nações serão benditas em ti.
Estes versículos merecem uma leitura com atenção. Sua compreensão nos guardará de muitos erros. E não é difícil entendê-los, basta atentar para o que dizem, isto é tudo.
(a)
Afirmam que o evangelho foi pregado, ao menos, do mesmo modo como nos dias de
Abraão.
(b)
Foi o próprio Deus que o pregou. Portanto, se trata do verdadeiro e único
evangelho .
(c)
Se tratava do mesmo evangelho que Paulo pregou. Portanto, não há outro
evangelho diferente do que possuiu Abraão.
(d) O evangelho não é hoje em nenhum particular diferente daquele que existiu nos dias de Abraão.
Deus requer hoje o
mesmo que antes, e nada mais do que isso. E tem mais: o evangelho foi então
pregado aos gentios, posto que Abraão era gentio, ou seja, pagão. Recebeu o
chamado sendo pagão, “Terá, pai de Abraão e Nacor, ... serviram a outros
deuses” (Jos. 24:2), e foi um pagão até ser-lhe pregado o evangelho. Deste
modo, a pregação do evangelho aos pagãos não era um fenômeno inédito nos dias
de Pedro e Paulo. A nação judia foi tomada dentre os pagãos, e é somente em
virtude da pregação do evangelho aos pagãos que Israel tem existência e
salvação (Atos 15:14-18; Rom. 11:25 e 26). A existência do povo de Israel era e
continua sendo uma prova do propósito de Deus em salvar pessoas, dentre os
pagãos. É em cumprimento deste propósito que Israel existe.
Vemos pois que o apóstolo leva os pagãos, e a nós, de volta às origens, lá onde Deus mesmo prega o evangelho a nós, “gentios”. Nenhum gentio pode esperar ser salvo de outro modo, ou por outro evangelho diferente daquele pelo qual Abraão foi salvo.
4 De sorte
que os que são da fé são benditos com o crente Abraão.
5 Todos aqueles pois que são das obras da lei estão debaixo de maldição; porque está escrito: Maldito todo aquele que não permanecer em todas as coisas escritas que estão escritas no livro da lei, para praticá-las.
Note a relação estreita que mantêm estes com o anterior. A Abraão foi pregado o evangelho nestas condições: “Por meio de ti serão abençoadas todas as nações”. “Pagão”, “gentil, e ”nações” (do verso 8), são traduzidos a partir do mesmo vocábulo grego. Essa bênção consiste no presente da justiça por meio de Cristo, como indica Atos 3:25 e 26: “Vós sois os filhos dos profetas, e do pacto que Deus fez com nossos pais, quando disse a Abraão: 'Em seu Descendente serão abençoadas todas as famílias da terra'. Havendo Deus ressuscitado a seu Filho, o enviou primeiro a vós para que os abençoe, “de forma que cada um se converta de sua maldade”. Visto que Deus pregou o evangelho para Abraão dizendo: “por meio de ti serão benditas todas as nações”, os que acreditam tornam-se benditos com o crente Abraão. Não há outra bênção para o homem, seja este quem for, exceto a que Abraão recebeu. E o evangelho que foi pregado é o único para todo ser humano na terra. Há salvação no nome de Jesus, no qual Abraão creu, e “em nenhum outro há salvação, porque não há outro Nome abaixo do céu, dado aos homens, em que possamos ser salvos” (Atos 4:12). NEle “temos redenção por seu sangue, o perdão dos pecados” (Col. 1:14). O perdão dos pecados trás consigo todas as bênçãos.
Um contraste: Debaixo
da maldição - Note o contraste apresentado nos versículos nove e dez: “os que
vivem pela fé são benditos”, enquanto que “os que dependem das obras da Lei,
estão debaixo da maldição”. A fé traz a bênção. As obras da lei trazem a
maldição; ou melhor dizendo, deixam-no debaixo da maldição. A maldição pesa
sobre todos, já que “o que não acredita, já está condenado, porque não creu no
nome do único Filho de Deus (João 3:18). A fé reverte essa maldição.
Quem está debaixo da
maldição? ”todos os que dependem das obras da Lei”. Imagine que não dissesse
que os que obedecem a lei estão debaixo da maldição, o que seria uma
contradição direta de Apocalipse 22:14: “Felizes os que guardam seus
Mandamentos, para que tenham direito à árvore da vida, e entrem pelas portas da
cidade!”. “Bem-aventurados os irrepreensíveis no seu caminho, que andam na lei
do Senhor!” (Sal. 119:1).
Os que são da fé, são guardadores da lei, posto que os que são da fé são benditos, e os que guardam os mandamentos também são benditos. Por meio da fé, guardam os mandamentos. Mas o evangelho é contrário à natureza humana: viemos a ser geradores da lei, não fazendo, mas crendo. Se obrássemos para obter justiça, estaríamos simplesmente exercitando nossa natureza humana pecaminosa, o que jamais nos traria a justiça, mas nos afastaria dela. Por contraste, crendo nas “preciosas e grandíssimas promessas”, acabamos de “participar da natureza divina” (2 Ped. 1:4), e então, todas as nossas obras são feitas em Deus. “Os gentios, que não buscavam a justiça, alcançaram a justiça? Sim, mas a justiça que decorre da fé. Mas Israel, que buscava a lei da justiça, não a alcançou. Por quê? Porque não foi pela fé, e sim pelas obras da lei: tropeçaram na pedra de tropeço; como está escrito: ‘Eis que ponho em Sião uma pedra de tropeço e uma rocha de escândalo; e todo aquele que crer nela não será confundido“ (Rom. 9:30-33).
Em que consiste a
maldição? - Ninguém que leia detida e reflexivamente Gálatas 3:10 deixará de
entender que a maldição é a transgressão da lei. A desobediência da lei de Deus
é em si mesma a maldição, já que “o pecado entrou no mundo por um homem, e pelo
pecado a morte” (Rom. 5:12). O pecado encerra a morte. Sem pecado, a morte
seria impossível, pois “o aguilhão da morte é o pecado” (1 Cor. 15:56).
“Todos os que dependem das obras da Lei, estão debaixo da maldição”. Por que?
Será talvez a lei uma maldição? De modo nenhum, pois “a Lei é santa, e o
Mandamento santo, justo e bom” (Rom. 7:12). Por que, então, estão debaixo da
maldição todos os que se apoiam nas obras da lei? Porque está escrito: “Maldito
todo aquele que não permanece em todas as coisas que estão escritas no livro da
lei, para cumpri-las”.
Não há o que se confundir: Não é maldito porque obedece a lei, mas sim porque não a cumpre. Então, é fácil ver que apoiar-se nas obras da lei não significa que se esteja cumprindo a lei. Não! “Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeita à Lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser” (Rom. 8:7). Todos estão debaixo da maldição, e o que pensa livrar-se dela por suas próprias obras, continua nela. Considerando que a ”maldição” consiste em não permanecer em todas as coisas que estão escritas na lei, é fácil deduzir que a ”bênção” significa perfeita conformidade com a lei.
Benção e maldição - "Hoje ponho perante vós a bênção e a maldição. A bênção se obedeceres os Mandamentos do Eterno, vosso Deus, que os prescreve hoje. E a maldição se não obedecerdes os Mandamentos do Eterno, vosso Deus” (Deut. 11:26-28). Essa é a palavra viva de Deus, dirigida pessoalmente a cada um de nós. “A Lei produz ira” (Rom. 4:15), mas a ira de Deus vem somente para os desobedientes (Efe. 5:6). Se verdadeiramente cremos, não somos condenados, porque a fé nos põe em harmonia com a lei, a vida de Deus. “O que olha sinceramente para a Lei perfeita – a da liberdade – e persevera nela, e não é ouvinte surdo, mas fidedigno, este será feliz [bendito] no que faz” (Tiago 1:25).
Boas obras - A Bíblia
não rejeita as boas obras. Pelo contrário, as exalta. “Fiel é a palavra. E isto
quero que deveras afirmes, para que os que creem em Deus procurem aplicar-se às
boas obras; estas coisas são boas e proveitosas aos homens” (Tito 3:8). A
acusação que pesa contra os incrédulos é que eles negam a Deus com os atos: são
“reprovados para toda boa obra” (Tito 1:16). Paulo exortou Timóteo para que
mandasse aos ricos deste mundo “que hajam bem, que sejam ricos em boas obras”
(1 Tim. 6:17 e 18). E o apóstolo orou por todos nós “para que possais andar
dignamente diante do Senhor, agradando-lhe em tudo, frutificando em toda boa
obra” (Col. 1:10). Mais ainda, nos dá a segurança de ser “criados em Cristo
Jesus para boas obras ... de forma que andássemos nelas” (Efe. 2:10).
Ele mesmo preparou essas obras para nós; as produziu, e as concede a todo o que nEle crê (Sal. 31:19). “Esta é a obra de Deus, que creais naquele a quem enviou” (João 6:29). São requeridas boas obras, mas não podemos fazê-las. Somente Aquele que é Bom, que é Deus, pode fazê-las. Se é que em nós existe o mínimo de bem, se deve à obra de Deus. Nada que Deus faça é merecedor de desprezo. “O Deus de paz, que pelo sangue do concerto eterno, ressuscitou dos mortos a Nosso Senhor Jesus Cristo, o grande Pastor das ovelhas, lhes aperfeiçoe em toda boa obra, para fazerdes a sua vontade, operando em vós o que perante ele é agradável por meio de Jesus Cristo, ao qual seja a glória pelos séculos dos séculos. Amém” (Heb. 13:20 e 21).
6 E é evidente
que, pela lei, ninguém é justificado diante de Deus, porque o justo viverá pela
fé.
7 Ora, a lei não é da fé; mas o homem, que fizer estas coisas, por elas viverá.
Quem são os justos? - Quando lemos a declaração: “o justo viverá pela fé”, é indispensável que entendamos claramente o que significa o termo “justo”. Ser justificado pela fé é ser feito justo pela fé. “Toda injustiça é pecado” (1 João 5:17), e “o pecado é a transgressão da Lei” (1 João 3:4). Portanto, toda injustiça é transgressão da lei; e claro que, toda a justiça é obediência à lei. Vemos então que o justo – o reto –, é que obedece a lei, e ser justificado é ser feito guardador da lei.
Como chegar a ser justo
- O fim almejado é a prática do bem, e a norma é a lei de Deus. “A Lei produz
ira” “uma vez que todos pecaram”, e “por isso vem a ira de Deus sobre os
desobedientes”. Como chegaremos a ser praticantes da lei, e escaparmos assim da
ira, ou maldição? A resposta é: “o justo viverá pela fé”. Pela fé, não pelas
obras, seremos praticantes da lei! ”Com o coração se crê para justiça” (Rom.
10:10). E que nenhum homem será justificado perante Deus pela lei, é evidente.
Por que? Porque “o justo viverá pela fé”. Se a justiça vem pelas obras, então
não viria pela fé, “e se é por graça, já não é baseada nas obras. A graça já
não seria graça” (Rom. 11:6). “Para o que trabalha, não é contado o salário
como favor, mas como dívida. Por outro lado, para quem não trabalha mas crê
naquele justifica o ímpio, a fé lhe é o contada por justiça” (Rom. 4:4 e 5).
Não há nenhuma exceção. Não há caminhos intermediários. Não diz que alguns dos justos viveriam pela fé, nem que eles viveriam pela fé e pelas obras; mas simplesmente: “o justo viverá pela fé”. Isso prova que a justiça não vem pelas obras procedente de si mesmo. Todos os justos são feitos justos, e mantidos nessa situação, somente pela fé. Isso é assim devido à santidade sublime da lei. Além do alcance do homem. Só o poder divino pode cumpri-la. Deste modo, recebemos ao Senhor Jesus pela fé, e Ele vive a perfeita lei em nós.
A lei não vem da fé - É
a lei escrita – seja em um livro, ou em tábuas de pedra – a que se refere o
texto. A lei simplesmente diz: 'Faça isto'. 'Não faças aquilo'. “O que faz
essas coisas vive por elas”. A lei oferece vida somente sob essa condição.
Obras, somente obras, é o que a lei aceita. Pouco importa a origem das mesmas,
contanto que estejam presentes. Mas ninguém cumpriu as exigências da lei,
então, não pode haver cumpridores lei. Quer dizer, não pode haver ninguém cuja
vida presente é um registro de obediência perfeita.
"O que faz essas coisas vive por elas”. Mas a pessoa tem que estar viva para poder fazê-las! Um morto não pode fazer nada, e o que está morto em “crimes e pecados” (Efe. 2:1), está impossibilitado de obrar justiça. Cristo é o único em quem há vida, já que Ele é a vida, e Ele é o único que cumpriu e pode cumprir a justiça da lei. Quando não é negado e rejeitado, mas reconhecido e recebido, toda a plenitude de sua vida vive em nós, de forma que não somos mais nós, mas Cristo vivendo em nós. Então, sua obediência em nós nos faz justos. Nossa fé nos é contada por justiça, simplesmente porque aquela fé se apropria do Cristo vivo. Pela fé, sujeitamos nossos corpos como templos de Deus. Cristo, a Pedra viva, habita no coração que se transforma assim em trono de Deus. E deste modo, em Cristo, a lei viva vem a ser nossa vida, “porque dele [do coração] emana a vida” (Prov. 4:23).
8 Cristo
nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se maldição por nós; porque está escrito:
Maldito todo aquele que for pendurado no madeiro;
9 Para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios por Jesus Cristo, e para que pela fé recebamos a promessa do Espírito.
Abordando o tema
central - Nesta epístola não há nenhuma controvérsia sobre a lei, sobre se deve
ou não ser obedecida; se foi abolida, alterada ou perdeu sua força. A epístola
não contém a mais leve indicação sobre isto. O assunto por resolver não é se
a lei deveria ser obedecida, e sim como fazer para obedecê-la. Se dá por
determinado que a justificação – ser feito justo – é uma necessidade. A questão
é a seguinte: Vêm pela fé, ou pelas obras? Os “falsos irmãos” estavam
persuadindo aos gálatas que deveriam se tornar justos por seus próprios
esforços. Paulo, por meio do Espírito, mostrou a eles que todos os seus
próprios esforços eram em vão, e o único resultado que teriam era que a
maldição aderia ainda mais sobre o pecador.
A justiça pela fé em Cristo é estabelecida para todos em todo o tempo, como a única justiça verdadeira. Os falsos mestres se gloriavam na lei, mas devido à transgressão da mesma, trouxeram desgraça ao nome de Deus. Paulo se gloriava em Cristo, e por meio da justiça da lei que obteve deste modo, deu glória ao nome de Deus.
O aguilhão do pecado -
A última parte do verso 13 mostra claramente que a maldição consiste na morte:
“Maldito todo o que é pendurado em um madeiro”. Cristo foi feito maldição por
nós quando pendurando no madeiro, ao ser crucificado. Agora então, o pecado é o
causador da morte: “o pecado entrou no mundo por um homem, e pelo pecado a
morte, assim a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Rom.
5:12). “O aguilhão da morte é o pecado” (1 Cor. 15:56). Assim, virtualmente, o
versículo 10 nos diz que “todo o que não permanecer em tudo aquilo que está
escrito no livro da Lei” pode considerar-se morto. Em outras palavras,
que a desobediência é igual à morte.
"Quando seu mal desejo é concebido, produz o pecado. E o pecado, sendo consumado, gera morte” (Tg. 1:15). O pecado contém a morte, e o homem sem Cristo está morto em seus crimes e pecados (Efe. 2:1). Pouco importa que ande pretendendo estar cheio de vida, as palavras de Cristo permanecem: “A menos que comais a carne do Filho do homem, e bebais seu sangue, não terás vida” (João 6:53). “O que se rende aos prazeres, vivendo está morto” (1 Tim. 5:6). Se trata de uma morte em vida, o “corpo de morte” de Romanos 7:24. O pecado é transgressão da lei. O salário do pecado é a morte. Então, a maldição consiste nessa morte que o mais atraente dos pecados esconde dentro de si. “Maldito todo aquele que não permanece em todas as coisas que estão escritas no livro da lei, para cumpri-las”.
Redimidos da maldição -
"Cristo nos redimiu da maldição da Lei”. Alguns leitores superficiais
desta passagem se apressam a exclamar: 'Não precisamos guardar a lei, desde que
Cristo nos redimiu de sua maldição', como se o texto dissesse que Cristo nos
redimiu da “maldição” da obediência. Tais pessoas leram a Escritura sem
proveito. A maldição, tal como temos visto, já é a desobediência: “Maldito todo
aquele que não permanece em todas as coisas que estão escritas no livro da lei,
para cumpri-las”. Portanto, Cristo nos redimiu da desobediência da lei. Deus
enviou seu Filho “em semelhança de carne de pecado... para que a justiça da lei
fosse cumprida em nós” (Rom. 8:3 e 4).
Alguém dirá sem
refletir: 'Isso me tranquiliza: relativo à lei, posso fazer o que quiser, pois
que todos nós fomos redimidos'. É certo que todos foram redimidos, mas nem
todos têm aceito a redenção. Muitos dizem de Cristo: “não queremos que este
reine sobre nós”, e se afastam das bênçãos de Deus. Mas a redenção é para
todos. Todos foram comprados com o precioso sangue – a vida – de Cristo, e
todos podem, se quiserem, ser libertados do pecado e da morte. Somos redimidos
“da vã conduta” que recebemos de nossos pais, por meio daquele sangue (1 Ped.
1:18).
Tome tempo para pensar no que isso significa. Permita que impressione sua alma e dê força, contida na expressão: “Cristo nos redimiu da maldição da Lei”, de nosso fracasso de permanecer nas exigências justas. Não precisamos pecar mais! Ele cortou as algemas do pecado que nos escravizaram, de forma que tudo quanto temos que fazer é aceitar a salvação para sermos libertos de todo o pecado que nos domina. Já não é mais necessário que gastemos nossas vidas em anelos ferventes e em vão lamentos por desejos não cumpridos. Cristo não provê falsas esperanças, mas sim que vem aos cativos do pecado, e lhes declara: 'Liberdade! As portas de vossa prisão estão abertas. Saia dela!' Que mais é necessário dizer? Cristo ganhou a mais completa das vitórias sobre este presente século mau, sobre “a concupiscência da carne, e a concupiscência dos olhos, e a arrogância da vida” (1 João 2:16), e nossa fé nEle, torna nossa Sua vitória. Tudo quanto temos que fazer é aceita-la.
Cristo, feito maldição
por nós - Para todo aquele que lê a Bíblia, torna-se evidente que “Cristo
morreu pelos infiéis” (Rom. 5:6). Ele foi “entregue por nossos pecados” (Rom.
4:25). O Inocente morreu pelo culpado, o Justo pelo injusto. “Foi ferido pelas
nossas transgressões, e moído pelas nossas iniquidades: o castigo que nos traz
a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Todos nós
andávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo seu caminho: mas o
Senhor fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos” (Isa. 53:5 e 6). Agora
então, a morte entrou pelo pecado. A morte é a maldição que passou a todos os
homens, pela simples razão que “todos pecaram”. Desde que Cristo foi feito “maldição
por nós”, está claro que se tornou pecado por nós” (2 Cor. 5:21). “Levou nossos
pecados em seu corpo sobre o madeiro” (1 Ped. 2:24). Note que nossos pecados
estavam “em seu corpo”. Sua obra não consistiu em algo superficial. Nossos
pecados não foram postos nEle em uma sensação meramente figurativa, mas que
estavam “em seu corpo”. Foi feito maldição por nós, e por conseguinte, sofreu a
morte por nós.
Alguns acham isso uma verdade detestável. Para os pagãos é loucura, e para os
judeus pedra de tropeço, mas para os que são salvos, poder e sabedoria de Deus
(1 Cor. 1:23 e 24). Lembre-se que Ele levou nossos pecados no próprio corpo.
Não seus pecados, já que nunca pecou. A mesma Escritura que informa que Deus o
fez pecado por nós, destaca que “não tinha pecado”. A mesma passagem que nos
assegura que “levou nossos pecados em seu corpo no madeiro”, especifica que
“não cometeu pecado”. Que pudesse levar nosso pecado nEle mesmo, e que pudesse
ser feito pecado por nós, e não obstante não cometeu nenhum pecado, contribui a
sua glória imortal e nossa eterna salvação do pecado. Os pecados de todos os
homens estavam nEle, porém, ninguém poderia descobrir nEle a mais clara sombra
de pecado. Embora levando o pecado inteiro em si mesmo, em vida nunca
manifestou pecado algum. Ele o tomou, sorvendo-o pelo poder de sua vida
indissolúvel que vence a morte. É poderoso para levar o pecado, sem que este o
manche. E nos redime por sua vida maravilhosa. Nos provê sua vida de forma que
possamos ser libertados de toda a sombra de pecado que há em nossa carne.
"Nos dias de sua
vida terrestre, Cristo ofereceu pedidos e súplicas com grande brado e lágrimas
ao que o podia livrar da morte. E foi ouvido pela sua submissão” (Heb. 5:7).
Mas morreu! Ninguém lhe removeu a vida. Ele mesmo a deu, para tornar a tomá-la
(João 10:17 e 18). As dores da morte foram desatadas, “desde que era impossível
que fosse retido por ela” (Atos 2:24). Por que era impossível que a morte o
retivesse, depois que fosse posto voluntariamente debaixo do poder desta?
Porque “não tivera pecado”. Tomou o pecado sobre si, mas estava a salvo de seu
poder. Foi “em tudo semelhante a seus irmãos”, tentado em tudo de acordo com
nossa semelhança” (Heb. 2:17; 4:15). E posto que de si mesmo nada poderia fazer
(João 5:30), orou ao Pai para que o livrasse de cair derrotado, e cair assim
debaixo do poder da morte. E foi ouvido. Cumpriu-se as palavras: “Porque o
Senhor Deus me ajuda, e não me confundo; por isso pus o meu rosto como um
seixo, e sei que não serei confundido. Perto está o que me justifica; quem
contenderá comigo? Compareçamos juntamente; quem é meu adversário? Chegue-se a
mim” (Isa. 50:7 e 8).
Qual foi aquele pecado que tanto o oprimiu, e do qual foi libertado? Não o seu, pois não teve nenhum. Foi o teu e o meu. Nossos pecados já foram vencidos, derrotados. Nossa luta é só com um inimigo vencido. Quando procuras a Deus em nome de Jesus, havendo se submetido a sua morte e vida, de forma que não tomes seu nome em vão – posto que Cristo habite em ti –, tudo quanto que tens que fazer é se lembrar que Ele levou todo o pecado, e ainda o leva, e que ele é o Vencedor. Exclamarás: “Graças a Deus, que nos dá a vitória por meio de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Cor. 15:57). “Graças a Deus, que sempre nos leva à vitória em Cristo Jesus, e por nosso meio manifesta em todo o lugar, a fragrância de seu conhecimento” (2 Cor. 2:14).
A revelação da cruz - O
“madeiro” de Gálatas 3:13 nos leva novamente ao tópico central dos versos 2:20
e 3:1: a cruz inesgotável.
Deixe-nos considerar
sete pontos com relação a ela:
(1) A
redenção do pecado e da morte é feita por meio da cruz (Gál. 3:13).
(2) O
evangelho inteiro está contido na cruz, porque o evangelho “é poder de Deus
para salvação de todo o que crê” (Rom. 1:16). E “para os que estão sendo
salvos”, a cruz de Cristo “é poder de Deus” (1 Cor. 1:18).
(3)
Cristo se revela ao homem caído somente como o Crucificado e Ressuscitado. “Não
há outro Nome abaixo do céu, dado aos homens em que possam ser salvos” (Atos
4:12). Portanto, isso é tudo quanto Deus expõe perante os homens, a fim de que
não haja confusão possível. Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado, é tudo o
que Paulo queria saber. É tudo quanto necessita saber o ser humano. O que o
homem necessita é a salvação. Se a obtém, possui todas as coisas. Mas só na
cruz de Cristo é possível obter a salvação. Então, Deus não põe ante os olhos
do homem nenhuma outra coisa; lhe dá justamente aquilo que necessita.
Deus apresenta Jesus a todo homem, como crucificado, de forma que ninguém tenha
desculpa para se perder, ou continuar no pecado.
(4)
Cristo é apresentado a todo homem como o Redentor crucificado. E desde que o
homem necessita ser salvo da maldição, apresenta-o carregando a maldição. Lá
onde se esconde a maldição, Cristo a leva. Já vimos como Cristo a carregou, e
ainda carrega com a maldição da terra, desde que levou a coroa de espinhos, e a
maldição pronunciada sobre a terra foi: “Espinhos e cardos produzirás” (Gên.
3:18). Assim, mediante a cruz de Cristo, foi redimida a totalidade da criação
que agora geme debaixo da maldição (Rom. 8:19-23).
(5)
Cristo levou a maldição na cruz. O que pendurou naquela madeira indica que foi
feito maldição por nós. A cruz simboliza, não só a maldição, mas também a
libertação da mesma, porque é a cruz de Cristo, o Vencedor e Conquistador.
(6)
Alguém poderá perguntar: 'onde está a maldição? Respondemos: onde não está?!
Até o mais cego a pode ver, se tão somente atender à evidência de seus próprios
sentidos. A imperfeição é uma maldição. Sim, constitui a maldição. E
encontramos imperfeição em tudo o que tem relação com esta terra. O homem é
imperfeito, e até os planos mais elaborado dos que são projetados na terra,
contém imperfeições em algum detalhe. Todas as coisas que podemos ver se
revelam suscetíveis de melhoria, até mesmo quando nossos imperfeitos olhos não
notam a necessidade de tal melhoria. Quando Deus criou o mundo, tudo era “muito
bom”. Nem mesmo Deus viu possibilidade alguma de melhorá-lo. Mas agora é muito
diferente. O jardineiro luta com empenho para melhorar as frutas e as flores
que foram recomendadas. E se é certo que até no melhor da terra se revela a
maldição, que diremos das frutas defeituosas, folhas e talos doentes, plantas
venenosas, etc.? “A maldição consumiu a terra” em todos lugares (Isa. 24:6).
(7) Deveríamos desanimar por isso? Não, “porque Deus não nos destinou para a ira, mas para a aquisição da salvação, por nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Tes. 5:9). Embora possamos ver a maldição em todo lugar, a natureza vive, e o homem vive. Porém, a maldição é a morte, e nenhum homem ou coisa criada pode levar a morte, e ainda contudo, viver, porque a morte mata! Mas Cristo vive. Morreu, mas vive para sempre (Apoc. 1:18). Somente ele pode levar a maldição – a morte – e em virtude de seus próprios méritos voltar à vida. Há vida na terra, e há no homem, apesar da maldição, graças a Cristo que morreu na cruz. Em cada pedaço de grama, em toda a folha na floresta, em cada arbusto e em cada árvore, em cada fruta e cada flor, e até no pão que comemos, está estampada a cruz de Cristo. Está em nossos próprios corpos. Onde quer que olhemos, há evidências de Cristo crucificado. A pregação da cruz – o evangelho – é o poder de Deus revelado em todas as coisas que Ele criou. Tal é “o poder que opera em nós” (Efe. 3:20). A consideração de Romanos 1:16-20, junto com 1 Coríntios 1:17 e 18, mostra claramente que a cruz de Cristo é revelada em todas as coisas que Deus fez, até mesmo em nosso próprio corpo.
Consolo a partir do desânimo - "Porque males sem número me têm rodeado: as minhas iniquidades me prenderam de modo que não posso olhar para cima; são mais numerosos que os cabelos de minha cabeça; pelo que desfalece meu coração” (Sal. 40:12). Mas não é somente porque podemos clamar a Deus com confiança – “do profundo” –, mas sim, que em sua infinita misericórdia, espera que nessas mesmas profundidades encontremos a fonte de nossa confiança. O fato de estarmos vivos apesar de estar nas profundidades do pecado, prova que Deus, na pessoa de Cristo na cruz, nos assiste para livrar-nos. Deste modo, por meio do Espírito Santo, até aquele que está debaixo da maldição (e tudo está debaixo dela), prega o evangelho. Nossa própria fragilidade, longe de ser a causa de desânimo, é, se cremos no Senhor, uma garantia da redenção. Tiramos “força da fraqueza”. “Em todas estas coisas somos mais que vencedores por meio daquele que nos amou” (Rom. 8:37). Certamente Deus não deixou o homem sem testemunho. E “o que crê no Filho de Deus, tem o testemunho em si mesmo” (1 João 5:10).
Da maldição para a
benção - Cristo levou a maldição para que pudéssemos ter a bênção. Sua morte é
vida para nós. Se levamos voluntariamente em nossos corpos a morte do Senhor
Jesus, sua vida se manifestará também em nossa carne mortal (2 Cor. 4:10). Ele
foi feito pecado por nós, a fim de que sejamos feitos justiça de Deus nEle (2
Cor. 5:21). A bênção que recebemos por meio da maldição que Ele leva, consiste
na libertação do pecado. Para nós, a maldição é consequência da transgressão da
lei (Gál. 3:10). A bênção consiste em que nos convertamos de nossa maldade
(Atos 3:26). Cristo sofreu a maldição, o pecado e a morte, “para que em Cristo
Jesus, a benção de Abraão chegue aos pagãos”.
A bênção de Abraão
consiste, tal como Paulo afirma em outras de suas epístolas, na justiça pela
fé,: “Assim também Davi declara bem aventurado o homem a quem Deus imputa a
justiça sem as obras, dizendo: Bem-aventurados aqueles cujas maldades são
perdoadas, e cujos pecados são cobertos. Bem-aventurado o homem a quem o Senhor
não imputa como pecado” (Rom. 4:6-8).
Paulo continua expondo
que essa bênção é pronunciada para os pagãos que crêem, tanto como para os
judeus que creem, posto que Abraão também a recebeu sendo incircunciso. “Para
que fosse pai de todos os que creem” (vers. 11).
A bênção é a libertação
do pecado, e a maldição é a paga do pecado. Considerando que a maldição revela
a cruz, o Senhor faz que essa mesma maldição proclame a bênção. O fato de
estármos fisicamente vivos, embora sejamos pecadores, nos assegura que a
libertação do pecado é nossa. “Enquanto há vida, há esperança”, diz o
provérbio. A vida é nossa esperança.
Graças a Deus pela bendita esperança! A bênção veio a todos os homens. “Assim como também por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação, assim também por um só ato de justiça veio a graça sobre todos os homens para justificação de vida” (Rom. 5:18). Deus, que não faz distinção de pessoas, nos abençoou em Cristo com toda a bênção espiritual nos céus (Efe. 1:3). O dom é nosso, e se espera que o guardemos. Se alguém não tem a bênção, é porque não tenha reconhecido o dom, ou talvez porque o tenha recusado deliberadamente.
Uma obra consumada -
"Cristo nos redimiu da maldição da lei”, do pecado e da morte. Fez isso
“ao fazer-se maldição por nós”, e nos livra de todo desejo de pecar. O pecado
não pode ter domínio sobre nós se aceitamos Cristo verdadeiramente e sem
reservas. Essa verdade era tão atual no tempo de Abraão, Moisés, Davi e Isaías,
como em nossos dias. Mais de setecentos anos antes daquela cruz ser erguida no
Calvário, Isaías testificou das coisas que entendeu quando uma brasa acesa,
tomada do altar, purificou seu próprio pecado, disse: “Ele tomou sobre si as
nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si... Foi ferido pelas
nossas transgressões, e moído pelas nossas iniquidades: o castigo que nos traz
a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados... o Senhor fez
cair sobre ele a iniquidade de todos nós” (Isa. 53:5 e 6). “Desfaço as tuas
transgressões como a névoa, e os teus pecados como a nuvem: torna-te para mim,
por que eu te remi” (Isa 44:22). Muito tempo antes de Isaías, Davi escreveu:
“Não nos trata segundo os nossos pecados, nem nos retribui consoante as nossas
iniquidades”. “Quanto dista o Oriente do Ocidente, assim afasta de nós as
nossas transgressões” (Sal. 103:10, 12).
"Nós, os que temos Cristo, entramos no repouso” (Heb. 4:3). A bênção que recebemos é “a benção de Abraão”. Não temos outro fundamento se não o dos apóstolos e profetas: Cristo, a Pedra Angular (Efe. 2:20). A salvação que Deus proveu é plena e completa. Quando vimos para o mundo, já estava nos esperando. Não liberamos a Deus de nenhuma carga se rejeitamos, nem somamos peso algum à Ele, quando aceitamos.
" A promessa do
Espírito” - Cristo nos redimiu “para que pela fé recebamos a promessa do
Espírito”. Não cometamos o erro de ler: '... recebamos a promessa do dom do
Espírito'. Não é dito isso e não significa isso, como veremos em seguida.
Cristo nos redimiu, e esse fato prova o dom do Espírito, desde que é somente
“pelo Espírito eterno” que se ofereceu a si mesmo sem mancha a Deus (Heb.
9:14). Se não fosse pelo Espírito, nunca nos sentiríamos pecadores. Nem ao
menos conheceríamos a redenção. O Espírito convence do pecado e da justiça
(João 16:8). “O Espírito é o que testemunha, porque o Espírito é a verdade” (1
João 5:6). “Aquele que crê... tem o testemunho em si mesmo” (vers. 10). Cristo
está crucificado em favor de todo homem. Como já vimos, isso se demonstra pelo
fato de estarmos todos debaixo da maldição, e só Cristo pode levar a maldição.
Mas é por meio do Espírito que Deus mora na terra entre os homens. A fé permite
receber seu testemunho e desfrutamos naquele que nos assegura a possessão de
seu Espírito.
Note ainda: recebemos a benção de Abraão para que recebamos a promessa do Espírito. Mas é somente por meio do Espírito que vem a promessa. Portanto, a bênção não pode trazer a promessa de que receberemos o Espírito. Já temos o Espírito, junto com a promessa. Mas tendo a bênção do Espírito (que é a justiça), podemos estar seguros de receber aquilo que o Espírito promete ao justo: a herança eterna. Ao bendizer Abraão, Deus lhe prometeu uma herança. O Espírito é o penhor – a garantia – de toda a bênção.
O Espírito como garantia
da herança - Todos os dons de Deus levam consigo promessas de maiores bênçãos.
Sempre haverá mais e maiores. O propósito de Deus no evangelho é reunir todas
as coisas em Jesus Cristo, em quem “obtivemos também uma herança... e
tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa,
o qual é a garantia de nossa herança, até que cheguemos a possuí-la, para
louvor de sua glória” (Efe. 1:11-14).
Voltaremos, mais adiante, a falar desta herança. Por enquanto, basta dizer que se trata da herança prometida a Abraão, de quem viemos a ser filhos pela fé. A herança pertence a todos os que são filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo. E o Espírito que sela nossa filiação é a garantia, as primícias dessa herança prometida. Os que aceitam a gloriosa libertação – em Cristo – da maldição da lei, ou seja, a redenção, não da obediência a lei (uma vez que a obediência não é uma maldição), mas da desobediência a lei, têm no Espírito uma antecipação do poder e a bênção do mundo vindouro.
4 Irmãos,
como homem falo; se o testamento de um homem for confirmado, ninguém o anula
nem o acrescenta.
5 Ora, as
promessas foram feitas a Abraão e à sua posteridade. Não diz: E às
posteridades, como falando de muitos, mas como de uma só: E à tua posteridade,
que é Cristo.
6 Mas digo
isto: Que tendo sido o testamento anteriormente confirmado por Deus, a lei, que
veio quatrocentos e trinta anos depois, não o invalida, de forma a abolir a
promessa.
7 Porque, se a herança provém de lei, já não provém da promessa: mas Deus pela promessa a deu gratuitamente a Abraão.
Para Abraão foi pregado o evangelho da salvação para o mundo. Creu, e recebeu a bênção da justiça. Todos os que creem são abençoados como o crente Abraão. Todos “os que são da fé, são filhos de Abraão”. As promessas foram feitas a Abraão e à sua descendência”. “Se a herança dependesse da Lei, já não a concedeu a Abraão por meio da promessa”. A promessa que nos faz é a mesma que foi feita a ele: a promessa de uma herança na qual participamos como filhos seus.
" E a seu Descendente” - Não se trata de um simples jogo de palavras, mas de um assunto vital. O tópico controverso é o meio de salvação: A salvação é:
(1) Só por Cristo?
(2) Por alguma outra coisa? Ou
(3) Por Cristo e alguém mais, ou algo mais?
Muitos supõem que têm de salvar-se a si mesmos fazendo-se bons. Outros acreditam que Cristo é uma ajuda valiosa, um bom assistente para seus esforços. Outros ainda, lhe darão o primeiro lugar, mas não o único lugar. Veem a si mesmos como bons “segundo lugar”. Quem realiza a obra é Deus, e eles. Mas o texto estudado exclui todas essas pretensões vãs. Não diz: 'E à seus descendentes'“, e sim “A teu Descendente”. Não à muitos, mas para Um, “que é Cristo”.
Não há duas linhagens - Podemos contrastar a descendência espiritual de Abraão com sua descendência carnal. “Espiritual” é o oposto a “carnal”, e os filhos carnais, a menos que também sejam os filhos espirituais, não têm parte alguma na herança espiritual. Para os homens que vivem no corpo, neste mundo, não é nenhuma impossibilidade o ser completamente espirituais. Temos que ser, ou caso contrário não seremos filhos de Abraão. “Os que vivem segundo a carne não podem agradar a Deus” (Rom. 8:8). “A carne e o sangue não podem herdar o Reino de Deus” (1 Cor. 15:50). Há uma só linha de descendente espirituais de Abraão; só uma classe de verdadeiros descendentes espirituais: “os que são da fé”, os que, ao receber a Cristo pela fé, recebem o poder de serem feitos filhos de Deus (João 1:12).
Muitas promessas em Um - Embora o Descendente seja singular, as promessas são plurais. Não há nada que Deus queira dar a homem algum, que não tenha prometido a Abraão. Todas as promessas de Deus são transferidas a Cristo, em quem creu Abraão. “Todas as promessas de Deus estão nele. Por isso, nele dizemos 'amém', para glória de Deus” (2 Cor. 1:20).
A herança prometida - Em Gálatas 3:15 à 18 se vê claramente que prometeu, e a soma de todas as promessas, é uma herança. diz o versículo 16 que a lei que veio quatrocentos e trinta anos depois da promessa dada e confirmada, não pode anular esta última. “Se a herança dependesse da Lei, já não a concedeu a Abraão por meio da promessa”. Pode saber-se qual é a promessa, quando relacionamos o versículo precedente com este outro: “Não foi pela Lei, como Abraão e seus descendentes receberam a promessa de que seriam herdeiros do mundo, mas pela justiça que vem pela fé” (Rom. 4:13). Embora “os céus e a terra estão... guardados para o fogo do dia do juízo, e da destruição dos homens ímpios”, e nesse dia “os céus serão incendiados e desfeitos, e os elementos se fundirão queimados pelo fogo”; não obstante, nós, “segundo sua promessa, esperamos um novo céu e uma nova terra, onde habita a justiça” (2 Ped. 3:7, 12 e 13). É a pátria celestial que também esperaram Abraão, Isaac e Jacó.
Uma herança livre de maldição - "Cristo nos redimiu da maldição... de forma que pela fé recebemos a promessa do Espírito”. Temos visto que aquela promessa do Espírito é a possessão da terra renovada, ou seja, redimida da maldição. Porque “a mesma criação será livrada da escravidão da corrupção, participando da liberdade gloriosa dos filhos de Deus” (Rom. 8:21). A terra, recém saída das mãos do Criador, nova, fresca e perfeita em todos os aspectos, foi dada ao homem em possessão (Gên. 1:27, 28 e 31). O homem pecou, trazendo deste modo a maldição. Cristo assumiu sobre si toda a maldição, tanto do homem como de toda a criação. Redime a terra da maldição, de forma que possa ser a eterna possessão que Deus planejara originalmente que fosse; e também redime o homem da maldição a fim de capacitá-lo a possuir tal herança. Esse é o resumo do evangelho. “O dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus nosso Senhor” (Rom. 6:23). Esse dom da vida eterna está incluído na promessa da herança, uma vez que Deus prometeu a Abraão e sua semente, a terra “em herança eterna” (Gên. 17:8). Se trata de uma herança de justiça, já que a promessa de que Abraão seria o herdeiro do mundo foi por meio da justiça que vem pela fé. A justiça, a vida eterna, e um lugar onde viver eternamente, estão, os três, incluídos na promessa, e constituem tudo o que nos cabe desejar ou receber. Redimir o homem, sem lhe dar um lugar onde viver, seria uma obra inconclusa. As duas ações são partes de um todo. O poder pelo qual somos redimidos é o poder da criação que renovará os céus e a terra. Quando tudo se cumprir, “já não haverá nenhuma maldição” (Apoc. 22:3).
Os pactos da promessa -
O pacto e a promessa de Deus são a mesma coisa. Isso se nota claramente em
Gálatas 3:17, onde Paulo afirma que anular o pacto tornaria sem efeito a
promessa. Em Gênesis 17 lemos que foi feito um pacto com Abraão, para dar-lhe a
terra de Canaã como possessão eterna (Vers. 8). Gálatas 3:18 diz que Deus a deu
por meio da promessa. Os pactos de Deus com o homem não podem ser outra coisa
que promessas ao homem: “Quem lhe deu primeiro a ele, para que lhe seja
recompensado? Porque dele, por ele, e para ele, são todas as coisas” (Rom.
11:35 e 36).
Depois do diluvio, Deus fez um pacto com todo ser vivo da terra: pássaros, animais, e toda a besta. Nenhum deles prometeu nada em troca (Gên. 9:9-16). Simplesmente receberam o favor das mãos de Deus. Isso é tudo quanto podemos fazer: receber. Deus nos promete tudo aquilo de que precisamos, e mais de que podemos pedir ou imaginar, como um presente (dom). Nós nos damos a Ele; ou seja, não lhe damos nada. E Ele se entrega por nós; ou seja, nos dá tudo. O que complica o assunto é que, mesmo aquele homem que esteja disposto a reconhecer o Senhor em tudo, se empenha em negociar com Ele. Mas todo aquele que pretenda “negociar” com Deus, terá de fazê-lo nos termos que Ele estabelecer, ou seja, que não temos nada e que não somos nada. E que Ele tem tudo, é tudo, e é quem dá tudo.
O pacto ratificado - O
pacto (a promessa divina de dar ao homem toda a terra renovada, depois de tê-la
resgatado da maldição), foi “previamente confirmado por Deus”. Cristo é a
garantia do pacto novo, do pacto eterno, “porque todas quantas promessas há de
Deus, são nele sim, e por ele o Amém, para glória de Deus” (2 Cor. 1:20). A
herança é nossa em Jesus Cristo (1 Ped. 1:3 e 4), desde que o Espírito Santo é
a primícia da herança, e a possessão do Espírito Santo é Cristo, morando no
coração pela fé. Deus abençoou a Abraão, dizendo,: “Por meio de ti serão
abençoadas todas as nações”, e isso se cumpre em Cristo, a quem Deus enviou
para que nos abençoasse, para que cada um se converta de sua maldade (Atos 3:25
e 26).
Foi o juramento de Deus que ratificou o pacto estabelecido com Abraão. Aquela promessa e aquele juramento feitos a Abraão são a fundamento de nossa esperança, nosso “fortíssimo consolo” (Heb. 6:18). São “uma segura e firme âncora” (vers. 19), porque o juramento estabelece a Cristo como a garantia, a segurança, e Cristo “está vivo” (Heb. 7:25). “Sustém todas as coisas com sua Palavra poderosa” (Heb. 1:3). “Todas as coisas subsistem nele” (Col. 1:17). “Por isso, quando Deus quis mostrar aos herdeiros da promessa, a imutabilidade de seu propósito, interpôs um juramento” (Heb. 6:17). Nele reside nosso consolo e esperança de escapar e guardar-nos de pecar. Cristo pôs como garantia sua própria existência, e com ela, a de todo universo, para nossa salvação. Pode-se imaginar um fundamento mais firme para nossa esperança que a de sua poderosa Palavra?
A lei não pode anular a
promessa - A medida que avançamos, é necessário que lembremos que o pacto e a
promessa são coincidentes, e que incluem a terra, a nova terra que será dada a
Abraão e a seus filhos. Também é necessário lembrar que, desde que somente a
justiça poderá morar no novo céu e nova terra, a promessa inclui tornar justos
a todos os que crêem. Isso se efetua em Cristo, em quem se confirma a promessa.
“Um pacto, mesmo que seja de um homem, uma vez ratificado, nada o pode anular”,
quanto mais tratando-se do pacto de Deus!
Portanto, uma vez que nos seja dada a segurança da justiça eterna mediante o “pacto” feito com Abraão, que foi confirmado em Cristo pelo juramento de Deus, é impossível que a lei proclamada quatrocentos e trinta anos mais tarde pudesse introduzir algum elemento novo. A Abraão foi dada a herança por meio da promessa. Mas se quatrocentos e trinta anos depois fosse possível conseguir a herança de algum outro modo, isso deixaria sem efeito a promessa, e o pacto seria anulado. E isso implicaria ainda um colapso no governo de Deus e o fim de sua existência, já que colocou sua existência como garantia de que daria a Abraão e sua semente a herança, e a justiça exigida para possuí-la. “Porque não foi pela Lei, que Abraão e seus descendentes receberam a promessa de que seriam os herdeiros do mundo, e sim pela justiça que vem pela fé” (Rom. 4:13). O evangelho foi tão pleno e completo nos dias de Abraão, como sempre o havia sido. Ao juramento de Deus para Abraão, não é possível somar ou mudar algumas de suas condições. Não é possível subtrair nada à forma que então existia, e nada pode ser requerido de homem algum, que não o fosse igualmente de Abraão.
8 Logo, para que serve a Lei? Foi ordenada por causa das transgressões, até que viesse o descendente a quem a promessa tinha sido feita, e foi posta pelos anjos na mão de um mediador.
"Para que serve a
Lei?”. O apóstolo Paulo faz esta pergunta a fim de poder mostrar de modo mais
enfático o papel da lei no evangelho. A pergunta é muito lógica. Posto que a
herança vem inteiramente pela promessa, e que um “pacto” uma vez confirmado não
pode ser alterado, qual foi o objetivo de enviar a Lei quatrocentos e trinta
anos depois? “Para que serve a lei?”, que faz aqui?, que papel desempenha?
"Foi dada por
causa das transgressões”. É necessário que se entenda com clareza que a
promulgação da lei no Sinai não foi o princípio de sua existência. Existiu nos
dias de Abraão, e este a obedeceu (Gên. 26:5). Existia antes de ser pronunciada
no Sinai (ver Êxo. 16:1-4, 27 e 28). Foi “dada”, no sentido de no Sinai Ter
sido foi proclamada de forma explicita, por extenso.
"Por causa das
transgressões”. “Veio a Lei para que avultasse o pecado” (Rom. 5:20). Em outras
palavras, “para que pelo Mandamento se visse a malignidade do pecado” (Rom.
7:13). Foi promulgada debaixo das circunstâncias da mais terrível majestade,
como uma advertência aos filhos de Israel que mediante sua incredulidade
estavam em perigo de perder a herança prometida. Ao contrário de Abraão, não
creram no Senhor, e “tudo o que não procede da fé, é pecado” (Rom. 14:23). Mas
a herança tinha sido prometida “pela justiça que vem da fé” (Rom. 4:13). Então,
os judeus incrédulos não podiam recebê-la.
Assim, a lei lhes foi dada para convencê-los de que eles careciam da justiça necessária para possuir a herança. Embora a justiça não venha pela lei, deve estar “respaldada (apoiada) pela Lei” (Rom. 3:21). Resumindo, lhes foi dada a lei para que vissem que não tinham fé, e que portanto, não eram verdadeiros filhos de Abraão, e estavam a caminho de perder a herança. Deus havia posto sua lei em seus corações da mesma maneira que tinha feito com Abraão, para que pudessem crer, como aquele o fez. Mas desde que tinham deixado de crer, e ainda mantinham a pretensão de ser herdeiros da promessa, era necessário mostrar-lhes que a forma mais contundente de incredulidade é pecado. A lei foi dada por causa das transgressões, ou (o que é a mesma coisa) por causa da incredulidade do povo.
A confiança própria é pecado - O povo de Israel estava cheio de confiança própria e de incredulidade para com Deus, como demonstraram em sua murmuração contra a direção divina, e pela sua autoconfiança de ser capaz de realizar tudo o que Deus requeria, de ser capaz de cumprir suas promessas. Manifestaram o mesmo espírito que seus descendentes, que perguntaram: “O que faremos para realizar as obras de Deus”? (João 6:28). Ignoravam de um tal modo a justiça de Deus que pensavam que poderiam estabelecer a sua própria justiça, de modo equivalente (Rom. 10:3). A menos que vissem seu pecado, de nada lhes valeria a promessa. Daí a necessidade de apresentar-lhes a lei.
O ministério dos anjos - “Não são todos eles espíritos ministradores, enviados para serviço a favor dos que hão de herdar a salvação?" (Heb. 1:14). Não nos é dado saber qual era exatamente o papel dos milhares de anjos que estiveram presentes no Sinai. Mas sabemos que os anjos têm um interesse profundo e íntimo em tudo o que diz respeito ao homem. Quando se puseram os fundamentos da terra, “todos os filhos de Deus se regozijaram” (Jó 38:7). Uma multidão, dentre a hoste celestial, entoava cânticos de louvor na anunciação do nascimento do Salvador dos homens. Esses seres “poderosos em força” assistem ao Rei dos reis, e se apressam a fazer Sua vontade, executando suas ordens e obedecendo sua palavra (Sal. 103:20 e 21). O fato de estarem presentes ao ser dada a lei, demonstra que se tratava de um evento da maior transcendência e do mais profundo significado.
Por meio de um mediador - Assim foi que se deu a lei no Sinai. Quem foi aquele Mediador? Não há mais que uma resposta: “Há um só Deus, e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem” (1 Tim. 2:5). Porém, “o mediador não representa a um só, embora Deus seja um”. Deus e Jesus Cristo são Um. Jesus Cristo é ao mesmo tempo Deus e homem. Quando mediando entre Deus e o homem, Jesus Cristo representa a Deus perante o homem, e ao homem perante Deus. “Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo” (2 Cor. 5:19). Não há, nem pode haver, outro mediador entre Deus e o ser humano. “Em nenhum outro há salvação, porque não há outro Nome debaixo do céu, dado aos homens, em que possamos ser salvos” (Atos 4:12).
A obra de Cristo como
mediador - O homem afastou-se de Deus, e se rebelou contra Ele. “Todos nós
andávamos desgarrados como ovelhas” (Isa. 53:6). Nossas iniquidades nos separam
de nosso Deus (Isa. 59:1 e 2). “Porquanto a inclinação da carne é inimizade
contra Deus, pois não é sujeita à Lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser”
(Rom. 8:7). Cristo veio a fim de destruir a inimizade e reconciliar-nos com
Deus; Ele é nossa paz (Efe. 2:14-16). “Cristo morreu, uma única vez, pelos
pecados, o justo pelos injustos, para conduzir-vos a Deus” (1 Ped. 3:18). Por
meio dEle temos acesso a Deus (Rom. 5:1 e 2; Efe. 2:18). NEle é removida a
mente carnal, a mente rebelde, e se dá em seu lugar a mente do Espírito, “para
que a justiça que requer a Lei se cumpra em nós, que não andamos conforme a
carne, mas de acordo com o Espírito” (Rom. 8:4). A obra de Cristo é salvar
aquele que se havia perdido, restaurar o quebrantado, reunir o que se havia
separado. Seu nome é “Deus conosco”. Quando Ele vive em nós, somos feitos
participantes “da natureza divina” (2 Ped. 1:4).
A obra mediadora de Cristo não está limitada pelo tempo nem pelo alcance. Ser mediador significa mais que ser intercessor. Cristo era mediador antes do pecado entrar no mundo, e será mediador quando o pecado não mais existir no universo, e não haja necessidade alguma de perdão. “Todas as coisas subsistem nele”. É a mesma “imagem do Deus invisível”. Ele é a vida. Só nEle e por meio dEle flui a vida de Deus a toda criação. Portanto, Ele é o meio, o mediador, o modo pelo qual a luz da vida ilumina o universo. Não se tornou mediador quando o homem caiu, mas era desde a eternidade. Nada, não somente algum homem, mas nenhum outro ser criado, vem ao Pai se não por Cristo. Nenhum anjo pode estar na presença divina, senão em Cristo. A entrada do pecado no mundo não necessitou o desenvolvimento de qualquer novo poder, ou que se fosse colocado em marcha nenhuma nova maquinaria. O poder que havia criado todas as coisas não fez mais que continuar, pela clemência infinita de Deus, a restauração do que tinha se perdido. Todas as coisas foram criadas em Cristo; portanto, temos redenção em seu sangue (Col. 1:14-17). O poder que anima e sustém ao universo é o mesmo poder que nos salva. “Ora, àquele que é poderoso para fazer infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós, a ele seja a glória, na igreja e em Cristo Jesus, por todas as gerações, para todo o sempre. Amém! (Efe. 3:20 e 21). (Ver Apoc. 4:11, com relação a 5:9, N.T.).
21
Logo, a lei é contra as promessas de Deus? De maneira nenhuma; porque, se dada
fosse uma lei que pudesse vivificar, a justiça, na verdade, teria sido pela
lei.
22 Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado, para que a promessa pela fé em Jesus Cristo fosse dada aos crentes
“É a Lei contrária as promessas de Deus? De maneira nenhuma!” Se fosse, a lei não teria sido dada “por meio de um mediador”, Jesus Cristo, já que todas as promessas de Deus são “Sim” nEle (2 Cor. 1:20). Em Cristo encontramos combinadas a lei e a promessa. Podemos saber que a lei não foi, e não vai contra a promessa, pelo fato de que foi Deus quem deu tanto uma como outra. Sabemos igualmente que a proclamação da lei não introduziu nenhum elemento novo no ”pacto”. Posto que o pacto tinha sido confirmado, nada poderia ser acrescentado, nem removido. Mas a lei não é algo inútil, pois nesse caso Deus não a teria dado. Que guardemos ou não a lei, não é uma questão opcional, porque Deus mesmo a ordenou. Mas ao mesmo tempo, não vai contra a promessa, nem introduz nenhum elemento nela. Por que? Simplesmente, porque a lei está incluída na promessa. A promessa do Espírito diz: “Eu porei minhas leis na mente deles, as escreverei no seu coração” (Heb. 8:10). É exatamente isso o que Deus fez com Abraão ao dar-lhe o pacto da circuncisão. (Rom. 4:11; 2:25-29; Fil. 3:3).
A lei magnifica a promessa - A lei é justiça, como Deus declara: “Ouvi-me, vós que conheceis a justiça; vós, povo em cujo coração está minha Lei” (Isa. 51:7). A justiça que a lei requer é a única justiça que pode herdar a terra prometida. Ela é obtida, não pelas obras da lei, mas pela fé. A justiça da lei não se obtém por meio de esforços para guardar a lei, mas pela fé (Rom. 9:30-32). Portanto, quanto maior seja a justiça que a lei requeira, mais engrandecida será a promessa de Deus, pois Ele prometeu dar essa justiça a todos os que creem. Sim, tem jurado! Assim, quando foi dada a lei no Sinai, “entre o fogo, a nuvem e a escuridão, com voz potente” (Deut. 5:22), com o som da trombeta de Deus, com tremor de terra ante a presença do Senhor e seus santos anjos, se mostrou inefável grandeza e majestade da lei de Deus. Para todo aquele que recordasse o juramento de Deus a Abraão, foi uma revelação da surpreendente grandeza da promessa de Deus, desde que jurou que daria toda a justiça que a lei exige a qualquer um que confiasse nEle. A voz ensurdecedora com que a lei foi dada, é a mesma que do topo dos montes proclamou as boas novas da graça salvadora de Deus (Isa. 40:9). Os preceitos de Deus são promessas. Não pode ser de outra maneira, pois Ele sabe que não temos poder algum. Tudo o que o Senhor requer, Ele mesmo o dá ! Quando diz “não farás...” podemos tomar com a segurança que Ele nos dá, que se simplesmente crermos, nos preservará do pecado contra o qual nos adverte nesse preceito.
Justiça e vida -
"Se a Lei pudesse vivificar, a justiça realmente viria pela Lei”. Isso
demonstra que a justiça é vida. Não é uma mera fórmula, de uma teoria morta, ou
de um dogma, mas de ação vital. Cristo é a vida, e Ele é, por conseguinte,
nossa justiça. A lei escrita em duas tábuas de pedra não poderia dar vida; não
mais do que a pedra, sobre a qual estava escrita, pode dar. Todos os seus
preceitos são perfeitos, mas sua expressão escrita em caracteres esculpidos na
pedra, não pode transformar-se por si mesma em ação. Aquele que recebe a lei
somente na letra, possui o “ministério de condenação” e morte (2 Cor. 3:9). Mas
“o Verbo [a Palavra] se fez carne”. Em Cristo, a Pedra viva, a lei é vida e
paz. Recebendo a Ele pelo “ministério do Espírito” (2 Cor. 3:8), possuímos a
vida de justiça que a lei aprova.
O verso vinte e um mostra que a lei foi dada para enfatizar a grandeza da promessa. Todas as circunstâncias que acompanharam a promulgação da lei – a trombeta, as vozes, o terremoto, o fogo, a tempestade, os raios e trovões, a barreira de morte ao redor do monte –, indicaram que a lei “opera ira” nos “filhos da desobediência” (Rom. 4:15; Efe. 5:6). Mas o fato de que a lei obre ira somente nos filhos da desobediência, mostra que a lei é boa, e que “aquele que faz estas coisas, viverá por elas” (Rom. 10:5). Era o propósito de Deus desencorajar seu povo? De nenhuma maneira. É necessário obedecer a lei, e os terrores do Sinai tiveram por objetivo levá-los novamente ao juramento que Deus fizera quatrocentos e trinta anos antes; juramento que há de permanecer para todo o homem em todo o tempo, como segurança da justiça que vem mediante o Salvador crucificado que vive para sempre.
Aprendendo a sentir
nossa necessidade - Referindo-se ao Consolador, Jesus disse: “Quando ele vier
convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo” (João 16:8). De si mesmo,
disse: “Eu não vim chamar os justos, mas sim os pecadores”. “Os sãos não
precisam de médico, mas os enfermos” (Mar. 2:17). A pessoa tem que reconhecer
sua necessidade, antes de poder aceitar ajuda; têm que saber que está doente,
para receber o remédio.
Da mesma forma, a
promessa da justiça passará totalmente inadvertida para aquele que não se
reconhece pecador. Então, a primeira parte da obra consoladora do Espírito
Santo consiste em convencer os homens do pecado. “Mas a Escritura encerrou tudo
sob o pecado, para que, mediante a fé em Jesus Cristo, fosse a promessa
concedida aos que creem” (Gál. 3:22). “Pela Lei se alcança o conhecimento do
pecado” (Rom. 3:20). O que se reconhece pecador, está no caminho do
conhecimento, e “se confessamos nossos pecados, Deus é fiel e justo para
perdoar nossos pecados, e limpar-nos de todo o mal” (1 João 1:9).
Assim, a lei é, nas mãos do Espírito, um agente ativo que induz os homens que aceitem a plenitude da promessa. Ninguém odiará aquele que lhe salvou a vida mostrando-lhe um perigo que lhe era desconhecido. Pelo contrário, receberá a consideração de amigo, e será lembrado sempre com gratidão. Assim é como verá a lei aquele que foi avisado pela voz de advertência, de forma que escape da ira vindoura. Dirá com o salmista: “Os pensamentos vãos aborreço; mas eu amo a tua lei” (Sal. 119:113).
23 Mas, antes que a fé viesse, estávamos guardados debaixo da lei, e encerrados para aquele fé que se havia de manifestar.
Observe a semelhança
entre os versículos 8 e 22: “Mas a Escritura encerrou tudo sob o pecado, para
que, mediante a fé em Jesus Cristo, fosse a promessa concedida aos que creem”
(vers. 22). “A Escritura, prevendo que Deus justificaria aos pagãos pela fé, de
antemão anunciou o evangelho a Abraão, quando lhe falou: 'Por meio de ti serão
benditas todas as nações' ” (vers. 8). Vemos que a Escritura que prega o
evangelho é o mesma que “encerrou” a todos os homens debaixo do pecado. Claro
que, o que está encerrado debaixo da lei é um prisioneiro. Nos governos
terrestres, um criminoso é preso tão logo a lei consiga condená-lo. A lei de
Deus é onipresente, e sempre ativa. Portanto, no momento em que o homem peca, é
encerrado ou aprisionado. Tal é a condição do mundo inteiro, “porquanto todos
pecaram”, e “não há justo, nem ao menos um”.
Aqueles desobedientes a
quem Cristo pregou nos dias de Noé, estavam na prisão (1 Ped. 3:19 e 20). Mas
como os demais pecadores, eram os “presos de esperança” (Zac. 9:12). “O Senhor,
do alto do seu santuário, desde os céus, baixou vistas à terra, para ouvir o
gemido dos cativos e libertar os condenados à morte” (Sal. 102:19 e 20). Cristo
é dado como “mediador da aliança com o povo e luz para os gentios; para abrires
os olhos aos cegos, para tirares da prisão o cativo e do cárcere, os que jazem
em trevas.” (Isa. 42:6 e 7).
Se é que ainda não conheceis a alegria e a liberdade do Senhor, permita que lhe fale de minha experiência pessoal. Algum dia não muito distante, quem dera fosse hoje mesmo, o Espírito de Deus te fará sentir profunda convicção do pecado. Você pode estar cheio de dúvidas e vacilações, podes ter procurado todo tipo de desculpas e evasivas, mas quando chegar esse momento, não terás nada que responder. Não terás então dúvida alguma com respeito à realidade de Deus e o Espírito Santo, e não precisarás de argumento algum que te assegure dela. Reconhecerás a voz de Deus falando a sua alma, e seu brado será como o do antigo Israel: “Não fale Deus connosco, para que não morramos” (Êxo. 20:19). Saberás então o que significa estar “encerrado” numa prisão cujas paredes sentirás tão próximas de ti, que além de impossibilitarem tua fuga, pareçam sufocar-te. Relatos de pessoas que foram condenadas a serem enterradas vivas debaixo de uma pesada laje, se tornarão vívidos e reais, sentirás como se as tábuas da lei esmagassem sua vida, e seu coração como que esmagado por uma implacável mão de pedra. Nesse momento, te proporcionará grande alegria recordar que estás “encerrado” somente com o propósito de que 'pela fé recebas a promessa do Espírito' “em Cristo Jesus” (Gál. 3:14). Tão logo te agarres a esta promessa, descobrirás que é a chave para abrir todas as portas de seu “Castelo da dúvida” (O Progresso do Peregrino). As portas da prisão abrirão então de par em par, e dirás: “Escapamos qual pássaro do laço dos passarinheiros; quebrou-se o laço, e nos vimos livres” (Sal. 124:7).
Debaixo da lei, debaixo do pecado - Antes que viesse a fé, estávamos encerrados debaixo da lei, éramos prisioneiros da fé que haveria de manifestar-se depois. Sabemos que tudo o que não é de fé, é pecado (Rom. 14:23). Logo, estar “debaixo da lei” é o mesmo que estar debaixo do pecado. A graça de Deus traz salvação do pecado, de tal modo que quando cremos na graça de Deus, deixamos de estar debaixo da lei, porque somos libertados do pecado. Por conseguinte, os que estão debaixo da lei são os transgressores da lei. Os justos não estão debaixo da lei, mas estão caminhando nela.
24 De maneira que a lei nos serviu de aio (tutor), para nos conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados.
"Tutor” (aio) foi traduzido da expressão grega paidagogos, ou pedagogo. O pedagogo era um escravo do pai de família, que tinha por missão acompanhar o menino à escola, e assegurar-se de que este não trocasse o estudo por outras distrações e jogos. Se a criança tentasse escapar, o pedagogo teria de trazê-lo de volta ao caminho, e tinha autoridade inclusive para aplicar métodos físicos de correção. “Tutor” ou” instrutor”, não são boas traduções do termo grego. A melhor ideia seria a de guardião ou vigilante. O menino sujeito à sua custódia, mesmo tendo uma posição superior, está de fato privado de liberdade, como se estivesse na prisão. Todo aquele que não crê, está debaixo do pecado, encerrado debaixo da lei, e portanto, a lei age como seu guardião ou vigilante. A lei o manterá escravo. O culpado não pode escapar em sua culpa. Embora Deus seja misericordioso e clemente, “de nenhum modo terá por inocente ao culpado” (Êxo. 34:6 e 7). Quer dizer, jamais mentirá dizendo que o mau é bom. O que faz é prover um remédio no qual o culpado possa estar livre de sua culpa. Então a lei deixará de cortar sua liberdade, e poderá caminhar livre em Cristo.
Liberdade em Cristo
Cristo disse: “Eu sou a
porta” (João 10:9). É igualmente o redil, e também o Pastor. O homem supõe que
é livre saindo fora do redil, e pensa que vir ao redil significa por obstáculos
a sua liberdade; porém, é precisamente o contrário. O redil de Cristo é um
lugar amplo, enquanto que a incredulidade é uma prisão estreita. A largura do
pensamento do pecador nunca poderá superar o âmbito do estreito. O verdadeiro
pensador-livre é aquele que compreende “com todos os santos, a largura e a
longitude, a profundidade e a altura do amor de Cristo, e [conhece] esse amor
que supera a todo o conhecimento” (Efe. 3:18 e 19). Fora de Cristo não há mais
que escravidão. Só nEle há liberdade. Fora de Cristo, o homem está em prisão,
“seu próprio pecado o prende como um laço” (Prov. 5:22).
“Ora, o aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei”. (1 Cor. 15:56). É a lei que declara pecador o homem, e lhe faz consciente de sua condição. “Pela lei vem o conhecimento do pecado”, e “o pecado não é imputado não havendo lei” (Rom. 3:20; 5:13). A lei revela as paredes da prisão do pecador. O prende a ela, e faz que se sinta incômodo, oprimido pela sensação do pecado, como se o privasse da vida. O pecador se debate em vãos e frenéticos esforços para escapar, mas os Mandamentos se erguem ao seu redor como muros inexpugnáveis. Aonde quer que vá, sempre encontra um mandamento que diz: 'Você nunca poderá encontrar a liberdade por mim, pois tens pecado'. Tenta colocar-se de bem com a lei e promete obedecer-lhe, mas a situação não melhora em nada, já que seu pecado permanece de qualquer maneira. A lei o perturba (aguilhoneia), e o leva à única via de escape: “a promessa... por meio da fé em Jesus Cristo”. Em Cristo torna-se verdadeiramente livre, já que é feito justiça de Deus. Em Cristo está a perfeita lei da liberdade.
A lei prega o Evangelho
Toda a criação fala de
Cristo, proclamando o poder de sua salvação. Cada fibra do ser humano clama por
Cristo. Embora o homem não saiba, Cristo é o “Desejado de todas as nações”
(Ageu 2:7). Somente Ele pode “abençoar a todo vivente” (Sal. 145:16). Somente
nEle se encontra o remédio para a inquietude e anseio do mundo.
Cristo, em quem há paz – já que “Ele é a nossa paz” –, está procurando os que estão cansados e sobrecarregados, e os chama para virem a Ele, e tendo em conta que todo homem tem anseios que nenhuma outra coisa no mundo pode saciar, fica claro que se a lei desperta no homem uma percepção clara de sua condição, e a lei continua perturbando-o, sem lhe dar descanso, impedindo-lhe qualquer caminho de fuga, o homem terminará por encontrar a porta de salvação, pois ela está aberta de par em par. Cristo é a cidade de refúgio para onde pode escapar todo aquele que está sitiado pelo vingador do sangue, com a segurança de que será bem-vindo. Só em Cristo achará o pecador descanso do chicote da lei, porque em Cristo se completa em nós a justiça da lei (Rom. 8:4). A lei não permitirá que ninguém seja salvo, a menos que possua a justiça que vem de Deus pela fé” (Fil. 3:9), fé de Jesus.
25
Mas, depois que veio a fé, já não estamos debaixo de aio.
26 Porque todos vós sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus.
"A fé vem pelo ouvir, e pelo ouvir pela palavra de Deus (Cristo)” (Rom. 10:17). Quando o homem recebe a Palavra de Deus, a palavra da promessa que traz com ela a plenitude da lei, em vez de lutar contra, rende-se a ela, lhe “veio a fé”. O capítulo décimo primeiro de Hebreus demonstra que a fé veio desde o princípio. Desde os dias de Abel, o homem tem encontrado a liberdade por meio da fé. A fé pode vir hoje, agora. “Agora é o tempo aceitável, agora é o dia da salvação” (2 Cor. 6:2). “Se hoje ouvis a sua voz, não endureçais o vosso coração” (Heb. 3:7).
27 Porque todos quantos fostes batizados em Cristo já vos revestistes de Cristo.
“Não sabeis que todos os que foram batizados em Cristo Jesus, foram batizados em sua morte” ? (Rom. 6:3). É por sua morte que Cristo nos redime da maldição da lei, mas temos que morrer com Ele. O batismo é “uma morte semelhante a sua” (Rom. 6:5). Ressuscitamos para andar “em novidade de vida”, a vida de Cristo (ver Gál. 2:20). Havendo sido revestidos de Cristo, somos um nEle. Somos totalmente identificados com Ele. Nossa identidade se perde na sua. Frequentemente ouvimos dizer de quem se converteu: 'Mudou tanto que é difícil reconhecê-lo. Não é mais o mesmo'. Não, não é mais. Deus fez dele outro homem. Então, sendo um com Cristo, pertence-lhe tudo o que é de Cristo, inclusive um lugar nos lugares celestiais onde Cristo habita. Da prisão do pecado até a habitação de Deus, é exaltado. Isso pressupõe, então, que o batismo é para ele uma realidade, não uma simples formalidade externa. Não é só na água visível que se batiza, mas “em Cristo”, na vida de Ele.
Como nos salva o
batismo?
O vocábulo grego que
traduzimos por “batizar”, significa “submergir”. O ferreiro grego batizava em
água o material que forjava, com o objetivo de o esfriar. A dona de casa,
batiza a roupa para lavá-la. E com o mesmo propósito todos ‘batizam” suas mãos
em água. Sim, e todos utilizavam com frequência o baptisterion – ou
tanque - com o propósito semelhante. Disto retiramos a palavra batistério. Que
era e é um lugar onde a pessoa poderia submergir completamente debaixo da água.
A expressão “batizados
em Cristo”, indica como deve ser nossa relação com Ele. Deveríamos parecer
sórdidos e perdidos se comparados a sua vida. Então se verá somente a Cristo,
de forma que já não vivo eu, já que “fomos sepultados junto com ele para morte
por meio do batismo” (Rom. 6:4). O batismo nos salva “pela ressurreição de
Jesus Cristo” (1 Ped. 3:21), pois somos batizados em sua morte, “se Cristo
ressuscitou dos mortos para a glória do Pai, igualmente nós andemos em novidade
de vida”. Se fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho; muito mais
agora, seremos salvos por sua vida” (Rom. 5:10). Portanto, o batismo em
Cristo – não a mera forma, mas o fato –, nos salva.
Batismo significa “uma
boa consciência” perante Deus (1 Ped. 3:21). Em ausência disto, não há batismo
cristão. Então, o candidato para o batismo deve ter idade bastante para poder
ter consciência do fato. Deve ter consciência do pecado, e também do perdão por
meio de Cristo. Há de conhecer a vida que então se manifesta, irá depor
voluntariamente a velha vida de pecado, rendendo-se a uma nova vida de justiça.
Batismo não consiste em remover “as impurezas do corpo” (1 Ped. 3:21), nem na limpeza externa desse corpo, mas em “uma consciência boa como resposta para Deus” (N. T. Interl.), uma purificação da alma e da consciência. Há uma fonte aberta, para lavar o pecado e a imundícia (Zac. 13:1), e por essa fonte flui o sangue de Jesus. A vida de Cristo flui desde o trono de Deus, “no meio” do qual está de pé “um Cordeiro como se houvesse sido imolado” (Apoc. 5:6), da mesma maneira que fluiu do lado ferido de Cristo, na cruz. Quando “pelo Espírito Eterno se ofereceu sem mancha a Deus” (Heb. 9:14), de seu lado ferido brotou água e sangue (João 19:34). “Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela, para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra [literalmente: banho de água na palavra]” (Efe. 5:25 e 26). Ao ser sepultado nas águas em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, o crente demonstra sua aceitação voluntária da água da vida, o sangue de Cristo, que purifica de todo o pecado, e se prepara para viver de toda a palavra que vem da boca de Deus. Deste momento em diante perde a si mesmo de vista, e só a vida de Cristo se manifesta em sua carne mortal.
28 Nisto não
há judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos
vós sois um em Cristo Jesus.
29 E, se sois de Cristo, também sois descendência de Abraão, e herdeiros conforme a promessa.
“Não há diferença”
(Rom. 3:22; 10:12). É a nota tônica do evangelho. Todos são igualmente
pecadores, e todos são da mesma maneira salvos. Quem buscasse fazer diferença
em razão da nacionalidade – judia ou gentil –, poderia igualmente fazer com
base no sexo – macho ou fêmea –, ou da condição social – amo ou escravo –, etc.
Mas não há diferença. Todos os seres humanos são iguais perante Deus, sem
importar a raça ou condição. “Sois um em Cristo Jesus”, e Um é Cristo. “Não
diz: aos descendentes, como falando de muitos, mas como de um só: E a tua
descendência, que é Cristo” (Gál. 3:16). Não há mais que uma descendência, mas
abrange a todos os que pertencem a Cristo.
Ser revestido de Cristo
significa ser vestido “do novo homem, criado para ser semelhante a Deus em
justiça e santidade” (Efe. 4:24). Aboliu na carne a inimizade, a mente carnal,
“criando em si mesmo dos dois um novo homem, que faz a paz” (Efe. 2:15). Ele é
o autêntico Homem, “Jesus Cristo homem”. Fora dEle não existe verdadeira
humanidade. Chegamos “a um varão perfeito, à medida da estatura da plenitude de
Cristo” (Efe. 4:13). Na plenitude do tempo, Deus juntará todas as coisas em
Cristo. Não haverá mais que um único Homem, e apenas sua justiça, na medida em
que o “Descendente” seja um. “E já que sois de Cristo, de certo sois
descendentes de Abraão, e de acordo com a promessa, herdeiros”.
O “Descendente” é Cristo.
Assim declara o texto. Mas Cristo não viveu para si mesmo. Ganhou uma herança,
não para si, mas para seus irmãos. O propósito de Deus é reunir em Cristo, “sob
uma só cabeça, tudo o que está no céu e o que está na terra” (Efe. 1:10). Um
dia porá um fim a todas as divisões, seja da classe que forem, e já o faz
naqueles que o aceitam. Em Cristo não há distinções de nacionalidade, classe ou
cor. O Cristão pensa em qualquer um, - inglês, alemão, francês, russo, Turco,
chinês ou africano - simplesmente como uma pessoa, e portanto, como um possível
herdeiro de Deus por meio de Cristo. Se aquela outra pessoa, da raça ou
condição que seja, se torna cristão, os laços vêm a ser mútuos, e até ainda
mais fortes. Não há judeu nem grego, nem servo ou livre, nem homem nem mulher,
porque todos vós sois um em Cristo Jesus”.
Essa é a razão que
torna impossível que um Cristão vá a guerra. O Cristão não conhece distinção de
nacionalidade, vê um irmão em todo homem. A vida de Cristo é sua vida, pois é
um com Cristo. Será tão impossível entregar-se a luta, como o teria sido para
Cristo o brandir a espada e lutar em sua própria defesa, ante o ataque dos
soldados romanos, assim, dois cristãos não podem lutar entre si mais do que
Cristo pode lutar contra si mesmo.
Não obstante, a guerra não é agora o objeto de nosso estudo, e sim, mostrar a absoluta unidade dos crentes em Cristo. Realmente, eles são um. Apesar dos muitos milhões de crentes que existam, são um em Cristo. Cada um possui sua própria individualidade, mas sempre é a manifestação de algum aspecto da individualidade de Cristo. O corpo humano tem muitos membros, e todos eles diferem em suas peculiaridades. Porém, observamos perfeita unidade e harmonia no corpo humano, em seu estado de saúde, e também nos que foram revestidos do “novo homem”, o qual, “se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou; no qual não pode haver grego nem judeu, circuncisão nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre; porém Cristo é tudo em todos” (Col. 3:10 e 11).
A colheita
Na explicação que
Cristo deu da parábola do trigo e do joio, mostrou que a “boa semente [ou
descendente] são os filhos do Reino” (Mat. 13:38). O fazendeiro não permitiu
que se arrancasse o joio, pois no estado inicial era difícil distinguir este do
trigo, e parte do trigo poderia ser destruída; então, disse: “Permita crescer
um e outro até a colheita. E no tempo da sega se dirá aos segadores: Arranque
primeiro o joio, e amarre em pacotes para queimar, mas juntai o trigo em meu
celeiro” (vers. 30). Como é conhecido, está é a colheita quando se recolhe o
grão/ semente.
A parábola tem por
ensino específico mostrar que é na colheita que a semente é manifestada em
sua plenitude. Tudo aquilo que se colhe espera a plena manifestação e
maturidade da semente.
Agora então, “a sega é
o fim do mundo”. Então, o tempo mostrado ou em Gálatas 3:19, “até que viesse a
semente [ou descendente] a quem tem sido prometida” (N. T. Interl.), não é
outro que o fim do mundo, momento no qual se cumprirá a promessa com respeito à
nova terra. A “semente” – ou descendente – não pode manifestar-se antes desse
tempo.
Leiamos Gálatas 3:19
novamente (R.V. 1977): Logo, para que é a lei? Foi ordenada por causa das
transgressões, até que viesse a posteridade a quem a promessa tinha sido
feita”. O que nos ensina o versículo? Simplesmente isto: que a lei, tal que foi
proclamada no Sinai, sem mudar um jota ou um til, é parte integrante do
evangelho, e deveria ser apresentada no evangelho, até a segunda vinda de
Cristo no fim do mundo. “Enquanto o céu e a terra existirem, nem uma letra, nem
um ponto da Lei perecerão, sem que tudo se cumpra” (Mat. 5:18). E o que diremos
do momento em que este céu e esta terra passarem, estabelecendo-se os novos?
Então não haverá mais necessidade de que a lei esteja escrita num livro para se
pregar aos pecadores, e que seus pecados sejam expostos. Naquele tempo estará
no coração de todo o homem (Heb. 8:10 e 11). Abolida? De maneira nenhuma, e
sim, gravada indelevelmente em cada pessoa, escrita, não com tinta, mas com o
Espírito do Deus vivo.
A “semente” se
refere também a todos quantos pertencem a Cristo, e nós sabemos que a “herança”
prometida não se manifestou em sua plenitude. Jesus, em seus dias na terra, não
a recebeu em maior medida que Abraão. Mesmo Cristo não pode possuir a “herança”
prometida antes que o faça a Abraão, pois “as promessas foram feitas a Abraão e
a seu Descendente [ou semente]". O Senhor falou por meio de Ezequiel que
essa “herança” seria no momento em que Davi deixasse de ter um representante de
seu trono na terra, e predisse a queda de Babilônia, Pérsia, Grécia e Roma
nestes termos: “assim diz o Senhor Deus: Tira o diadema e remove a coroa; o que
é já não será o mesmo; será exaltado o humilde e abatido o soberbo. Ruína!
Ruína! A ruínas a reduzirei, e ela já não será, até que venha aquele a quem ela
pertence de direito; a ele a darei” (Eze. 21:26 e 27).
Deste modo, Cristo está
sentado no trono de seu Pai, e “desde então aguarda que seus inimigos sejam
postos debaixo de seus pés” (Heb. 10:13). Logo voltará. Todos os que são
guiados pelo Espírito de Deus, estes são filhos de Deus, e herdeiros com
Cristo, de forma que Cristo não pode possuir a herança antes deles. A “semente”
é uma; não está dividida. Quando Cristo vier para executar o juízo, e destruir
os que disseram “não queremos que este homem reine sobre nós”; quando o
Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com Ele, “então se
sentará em seu trono de glória” (Mat. 25:31).
Então estará completa a
“semente”, e a promessa será cumprida. Até aquele momento, a lei continuará
cumprindo fielmente sua missão de despertar e condenar a consciência dos
pecadores, não dando-lhes descanso até que venham a identificar-se com Cristo,
ou o rejeitarem completamente. Aceitarás as condições, caro leitor? Porás fim a
tuas reclamações da lei que te salva de perder-se num sono fatal? Aceitarás a
justiça da lei, em Cristo? Se assim o fizeres, como verdadeira semente de
Abraão que és, e herdeiro segundo a promessa, podes alegrar-te em tua libertação
da escravidão do pecado, cantando:
(T.
M. Westrup, #330)
Capítulo
4
A ADOÇÃO
1 Digo,
pois, que todo o tempo em que o herdeiro é menino em nada difere do servo,
ainda que seja senhor de tudo;
2 Mas está debaixo de tutores e curadores até ao tempo determinado pelo pai.
A divisão por capítulos
que hoje conhecemos, é arbitrária, e custa imaginar que razão pode levar a
situá-la neste caso entre o terceiro e o quarto. O capítulo anterior termina
com uma afirmação a propósito de quem são os herdeiros. O capítulo
quatro continua com considerações relativas a como poderemos vir a ser
constituídos herdeiros.
Nos dias de Paulo, embora um menino pudesse ser herdeiro do maior dos reinos, até ter alcançado certa idade, em nada se diferenciava de um servo (ou escravo). Se não chegasse a certa idade, jamais possuiría a herança. Nesse caso, até que a herança chegasse, viveria como servo.
3 Assim
também nós, quando éramos meninos, estávamos reduzidos à servidão debaixo dos
primeiros rudimentos do mundo,
4 Mas,
vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido
sob a lei,
5 Para remir os que estavam debaixo da lei, a fim de recebermos a adoção de filhos.
A expressão “meninos”
do versículo três, se refere a condição em que estávamos antes de receber “a
adoção de filhos” (vers. 5). Representa nossa condição antes de ser redimidos
da maldição da lei, ou seja, antes de nossa conversão. Se trata dos “meninos
inconstantes, levados por qualquer vento de doutrina, pelo engano dos homens
que com astúcia enganam fraudulosamente (Efe. 4:14). Em resumo: refere-se a nós
em nosso estado antes da conversão, quando “vivíamos nos desejos da nossa
carne... e éramos por natureza filhos da ira, igual aos demais” (Efe. 2:3).
“Quando éramos meninos”, “éramos servos debaixo dos rudimentos do mundo”. “Porque tudo o que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não são do Pai, mas do mundo. E o mundo e seus desejos passam” (1 João 2:16 e 17). A amizade do mundo é inimizade contra Deus. “Não sabeis que a amizade do mundo é inimizade contra Deus?” (Tiago 4:4). É “do presente século mau” que Cristo veio nos salvar. “Cuidem para ninguém vos engane por meio de filosofias e vãs sutilezas, segundo a tradição de homens, conforme os elementos do mundo, e não segundo Cristo” (Col. 2:8). A passagem “debaixo dos rudimentos do mundo” consiste em andar “segundo a corrente deste mundo”, viver “ao impulso dos desejos de nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos”, sendo “por natureza filhos da ira” (Efe. 2:1-3). É a mesma escravidão descrita em Gálatas 3:22-24: “Antes que chegasse a fé”, quando estávamos “confinados debaixo da lei”, encerrados “debaixo do pecado”. É a condição dos homens que estão “sem Cristo, separados da comunidade de Israel, estranhos aos concertos da promessa, não tendo esperança, e sem Deus no mundo” (Efe. 2:12).
Todos podem ser
herdeiros
Deus não tem descartado a raça humana. Pois ao primeiro homem criado o chamou de “filho de Deus” (Luc. 3:38), todos os homens podem ser igualmente herdeiros. “Antes que chegasse a fé”, desde que todos nos apartamos de Deus, “estávamos guardados pela Lei”, guardados por um severo vigilante, tidos em sujeição, a fim de podermos ser levados a aceitar a promessa. Que benção, que Deus concede também aos ímpios, ou a quem estiver na escravidão do pecado, como a seus filhos; filhos errantes e pródigos, mas sempre filhos, do começo ao fim! Deus tornou todos os homens “aceitos no Amado” (Efe. 1:16). O presente tempo de prova nos é dado com o propósito de nos oferecer uma oportunidade para que o conheçamos como nosso Pai, e que venhamos a ser-lhe verdadeiros filhos. A menos que retornemos a Ele, morreremos como escravos do pecado. “Quando se cumpriu o tempo”, Cristo veio. Em Romanos 5:6 encontramos uma expressão paralela: “Quando éramos fracos, a seu tempo Cristo morreu pelos ímpios”. A morte de Cristo opera a salvação tanto dos que vivem hoje como para seus contemporâneos, que viveram na Judéia, antes que se manifestasse em carne. Não teve um maior efeito nos que viveram naquela geração. Morreu uma vez por todos, mas seu impacto é o mesmo em qualquer época. “Quando se cumpriu o tempo”, se refere ao tempo no qual a profecia havia predito que se revelaria o Messias, mas a redenção é para todos os homens, em todas as épocas. Foi “conhecido ainda antes da criação do mundo, mas manifestado nestes últimos tempos” (1 Ped. 1:20). Se o plano de Deus houvesse sido o de se revelar em nossos dias, não haveria diferença alguma, de acordo com o propósito geral do evangelho. “Está sempre vivo” (Heb. 7:25), e sempre estará. “É o mesmo ontem, hoje e por todos os séculos” (Heb. 13:8). É “pelo Espírito eterno” que se ofereceu a si mesmo por nós (Heb. 9:14); portanto, esse sacrifício é eterno, presente e igualmente eficaz em qualquer era.
“Nascido de mulher”
Deus enviou seu Filho
“nascido de mulher”: um homem autêntico. Viveu e sofreu todas as enfermidades e
dores que afligem o homem. “O Verbo se fez carne” (João 1:14). Cristo sempre se
referiu sempre a si mesmo como “o Filho do homem”, identificando-se assim para
sempre com todo o gênero humano. Uma união que nunca será quebrada.
Sendo “nascido de
mulher”, necessariamente teve que ser “nascido debaixo da Lei”, desde que essa
é a condição de toda a humanidade. “Pelo que convinha que em tudo fosse
semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote naquilo
que é de Deus, para expiar os pecados do povo” (Heb. 2:17). Tomou sobre si
todas as coisas. “Levou nossas enfermidades e sofreu nossas dores” (Isa. 53:4).
Tomou nossas enfermidades e levou nossas doenças” (Mat. 8:17). “Todos nós nos
perdemos como ovelha, cada um se afastou por seu caminho: mas Jeová carregou
nele o pecado de todos nós” (Isa. 53:6). Nos redime vindo literalmente em nosso
lugar, e levando a carga de nossos ombros. “Como não teve pecado, Deus o
fez pecado por nós, para sermos feito justiça de Deus Nele” (2 Cor.
5:21).
No mais pleno sentido
da palavra, e em um grau que raramente se pensa quando se usa a expressão, se
converteu em substituto do homem. Permeia todo nosso ser, identificando-se tão
completamente connosco, que tudo quanto nos toque ou afete, toca e afeta Ele.
Não é nosso substituto no sentido em um homem substitui outro. No exército, por
exemplo, é colocado um soldado na posição de outro que está em algum outro
campo. Mas a substituição de Cristo é algo completamente diferente. É tão
completamente nosso substituto que vem em nosso lugar e já não aparecemos mais.
Desaparecemos, de forma que “já não vivo eu, mas Cristo vive em mim”.
Coloquemos nossas necessidades nEle, não tirando-as de nós e colocando-a sobre
Ele mediante penoso esforço, mas humilhando-nos no nada que realmente somos, de
forma que nossa carga descanse somente nEle.
Podemos ver já a forma em que veio “redimir aos que estavam debaixo da Lei”. O faz no mais real e prático dos sentidos. Alguns supõem que essa expressão significa que Cristo livrou os judeus da necessidade de oferecer sacrifícios, ou de toda a obrigação de guardar os Mandamentos. Por si somente os judeus estavam “debaixo da lei”, então Cristo veio redimir só os judeus. Nós precisamos reconhecer que estamos – ou estivemos antes de ser crentes – “debaixo da lei”, pois Cristo veio redimir precisamente os que estavam “debaixo da lei”, e não a outros. Estar “debaixo da lei”, tal como temos visto, significa estar condenado pela lei como transgressores. Cristo não veio “chamar os justos, mas pecadores” (Mat. 9:13). Mas a lei condena exclusivamente os que estão sob sua jurisdição, e aqueles que estão sob a obrigação de obedecê-la. Considerando que Cristo nos livra da condenação da lei, é evidente que nos redime para uma vida de obediência à lei.
"A fim de que
recebêssemos a adoção de filhos”
"Amados, agora já somos filhos de Deus” (1 João 3:2). “A todos que o receberam, aos que creram em seu Nome, lhes deu o direito de serem filhos de Deus” (João 1:12). É um estado radicalmente diferente do descrito em Gálatas 4:3 (“quando éramos meninos”). Naquela situação, poderia ser dito de nós “que este povo é rebelde, filhos mentirosos que não querem obedecer a Lei do Eterno” (Isa. 30:9). Ao crer em Jesus e receber “a adoção de filhos”, somos descritos como “filhos obedientes”, não conforme os maus desejos que obedecíamos em nossa ignorância (1 Ped. 1:14). Cristo disse: “Meu Deus, me deleito em fazer a tua vontade, e tua Lei está no meu coração” (Sal. 40:8). Portanto, uma vez que se fez nosso substituto, tomando literalmente nosso lugar, não no lugar de nós, mas vindo a nós e vivendo sua vida em nós e para nós, fica claro que sua lei estará em nosso coração, quando recebermos a adoção de filhos.
6 E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai.
7 Assim, já não és mais servo, mas filho; e se és filho, és também herdeiro de Deus por Cristo.
“Quanta paz e
felicidade traz o Espírito, quando faz morada no coração! Não como o convidado
temporário, mas na qualidade de único proprietário. “Assim, tendo sido
justificados pela fé, estamos em paz com Deus, por meio de nosso Senhor Jesus
Cristo”, de forma que nos alegramos até nas tribulações, de acordo com a
esperança que “não confunde, porque o amor de Deus é derramado em nosso coração
pelo Espírito Santo, que nos foi outorgado” (Rom. 5:1,5). Então podemos amar do
modo que Deus ama, pois que participamos de sua natureza divina. “O mesmo
Espírito testifica a nosso espírito que somos filhos de Deus” (Rom. 8:16). “O
que crê no Filho de Deus, tem o testemunho em si mesmo” (1 João 5:10).
Da mesma maneira em que
há duas classes de “filhos” [ou “meninos”], também há duas classes de “servos”.
Na primeira parte do capítulo se utiliza a palavra “menino” em referência aos
que ainda não alcançaram “o tempo [idade] assinalado”, os que ainda não tem os
sentidos exercitados para discernir o bem e o mal (Heb. 5:14). A promessa é
para eles, e também “para todos os que estão distantes” (Atos 2:39), e ao
aceitarem, virão a ser feitos participantes da natureza divina (2 Ped. 1:4), e
portanto, verdadeiros filhos de Deus. No estado de “filhos da ira”, são
servos do pecado; não de Deus. O cristão é um “servo”: um servo de Deus. Mas
serve de uma forma completamente diferente daquela em que o servo do pecado
serve a Satanás. O caráter do servo depende do Senhor a quem serve. Neste
capítulo, se usa o termo “servo”, não referindo-se ao servo de Deus – que é em
realidade filho –, mas ao servo ou escravo do pecado. Entre o escravo do pecado
e o filho de Deus, há uma diferença abismal. O escravo não pode possuir nada, e
carece de domínio sobre si mesmo. Essa é sua característica distintiva. Ao
filho nascido livre, ao contrário, lhe é dado domínio sobre toda a criação como
no princípio, levando em conta a vitória que obteve em si mesmo. “Melhor é o
longânimo do que o herói da guerra, e o que domina o seu espírito, do que
aquele que toma uma cidade” (Prov. 16:32).
Quando o filho pródigo vagava longe da casa paterna, em nada diferia de um servo. Era em verdade um servo, encarregado das tarefas mais rotineiras e servis. Estava nessa condição quando decidiu retornar à casa do pai, sentindo-se indigno de melhor trato que o de um servo. Mas o pai avistou-o quando ainda estava distante, e correu a buscá-lo, recebendo-o como filho, e portanto, herdeiro, embora tivesse perdido todo o direito à herança. Do mesmo modo, perdemos todo o direito de sermos chamados filhos, desperdiçamos a herança. Porém, em Cristo, Deus nos recebe verdadeiramente como filhos, e nos dá os mesmos direitos e privilégios que tem Cristo. Embora Cristo esteja agora no céu, a direita de Deus, “sobre todo principado, autoridade, poder e domínio, e sobre tudo quanto tem nome, não só neste século, mas também no vindouro” (Efe. 1:20 e 21), não tem nada que não compartilha conosco, porque “...Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, pela graça sois salvos, e, juntamente com ele, nos ressuscitou, e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus” (Efe. 2:4-6). Cristo é um conosco em nosso sofrimento, afim de que possamos ser um com Ele em sua glória. “Exaltou os humildes” (Luc. 1:52). “Levanta o pobre do pó e, desde o monturo, exalta o necessitado, para o fazer assentar entre os príncipes, para o fazer herdar o trono de glória; porque do Senhor são as colunas da terra, e assentou sobre elas o mundo” (1 Sam. 2:8). Nenhum rei na terra possui riquezas nem poder comparável ao do mais pobre mortal que reconhece o Senhor como seu Pai.
8 Mas, quando não conhecíeis a Deus, servíeis aos que por natureza não são deuses.
Escrevendo aos
coríntios, o apóstolo Paulo disse: “Sabeis que, outrora, quando éreis gentios,
deixáveis conduzir-vos aos ídolos mudos, segundo éreis guiados” (1 Cor. 12:2).
O mesmo era válido aos gálatas: tinham sido pagãos, adoradores de ídolos, e
escravos das mais degradantes superstições. Lembre-se que essa escravidão é a
mesma que estudamos no capítulo precedente: a escravidão de estar encerrados
“debaixo da lei”. É nesta escravidão que se encontra todo inconverso. No
segundo e terceiro capítulo de Romanos lemos que “não há diferença, pois todos
pecaram”. Os judeus mesmo, que não conheceram o Senhor por experiência pessoal,
estavam nessa escravidão: a escravidão do pecado. “Todo o que comete pecado, é
escravo do pecado” (João 8:34). “O que pratica o pecado pertence ao diabo” (1
João 3:8). “O que os pagãos sacrificam, sacrificam aos demônios, e não a Deus”
(1 Cor. 10:20). O que não é cristão, é pagão, não há meio termo. Quando o
Cristão apostata, se converte em pagão.
Nós mesmos andávamos “seguindo a corrente deste mundo, de acordo com o príncipe da potestade do ar, o espírito que agora opera nos filhos da desobediência” (Efe. 2:2). “Pois nós também, outrora, éramos néscios, desobedientes, desgarrados, escravos de toda sorte de paixões e prazeres, vivendo em malícia e inveja, odiosos e odiando-nos uns aos outros” (Tito 3:3). Também nós, “em outro tempo, quando não [conhecíamos ] a Deus, [servíamos] aos que por natureza não são deuses”. Quanto mais cruel o amo, mais opressiva é a escravidão. Que linguagem pode descrever o horror de ser escravos da própria corrupção?[corrupção em pessoa, personalizada por Satanás].
9 Mas, agora, conhecendo a Deus, ou antes, sendo conhecidos de Deus, como tornais outra vez a esses rudimentos fracos e pobres, aos quais de novo quereis servir?
Não é surpreendente que os homens prefiram continuar encarcerados? Cristo veio “proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos” (Isa. 61:1), dizendo aos prisioneiros: “‘Saí', e aos que estão em escuridão: 'Aparecei’” (Isa. 49:9). Mas alguns dos que ouviram essas palavras, havendo sido libertados, tendo visto a luz do Sol de justiça e tendo gostado das delícias da liberdade, eles preferem regressar à prisão. Desejam sentir o aperto das cadeias novamente, e escolhem o trabalho extenuante na mina do pecado. Uma cena nada excitante, certamente. O homem é capaz de mostrar apego às coisas mais repulsivas, incluindo a própria morte. Que descrição mais vívida da experiência humana!
10 Guardais
dias, e meses, e tempos, e anos
11 Receio de vós, que não haja trabalhado em vão para convosco.
A esse respeito, não corremos um perigo menor que o dos pagãos. Qualquer um que confia em si mesmo, está rendendo culto a obra de suas mãos, em vez de a Deus. O faz tão certamente quanto a um que se prostra ante uma imagem ou escultura. Ao homem é muito fácil confiar em sua suposta sagacidade, em sua habilidade para administrar seus assuntos; ele acha fácil esquecer que até mesmo os pensamentos dos sábios são vãos, e que não há poder, exceto o de Deus. “Não se glorie o sábio na sua sabedoria, nem o forte, na sua força, nem o rico, nas suas riquezas; mas o que se gloriar, glorie-se nisto: em me conhecer e saber que eu sou o Senhor e faço misericórdia, juízo e justiça na terra; porque destas coisas me agrado, diz o Senhor” (Jer. 9:23 e 24).
12
Irmãos, rogo-vos que sejais como eu, porque também eu sou como vós: nenhum mal
me fizestes
13
E vós sabeis que primeiro vos anunciei o Evangelho estando em fraqueza da
carne;
14
E não rejeitastes, nem desprezastes isso que era uma tentação na minha carne,
antes me recebestes como um anjo de Deus, como Jesus Cristo mesmo.
15
Qual é, logo, a vossa bem-aventurança? Porque vos dou testemunho de que, se
possível fora, arrancaríeis os vossos olhos, e mos daríeis.
16
Fiz-me acaso vosso inimigo, dizendo a verdade?
17
Eles têm zelo por vós, mas não como convém; mas querem excluir-vos, para que
vós tenhais zelo por eles.
18
É bom ser zeloso, mas sempre do bem, e não somente quando estou presente
convosco.
19
Meus filhinhos, por quem de novo sinto as dores de parto, até que Cristo seja
formado em vós:
20 Eu bem quisera agora estar presente convosco, e mudar a minha voz: porque estou perplexo a vosso respeito.
O apóstolo foi enviado
por Deus e por Cristo, para trazer-lhes uma mensagem de Deus, não dos homens.
Tratava-se da obra de Deus. Paulo não era mais que o humilde instrumento, o
“vaso de barro” que Deus havia escolhido como o meio para levar seu glorioso
evangelho da graça. Então, Paulo não se sentiu ofendido quando seu evangelho
foi rejeitado. “Nenhuma ofensa me fizeste”, lhes disse. Não lamentou os
esforços que tinha dedicado aos gálatas no sentido de haver desperdiçado seu
tempo, se não que temia por eles. Temeu que suas obras houvessem sido em vão,
no que se referia ao próprio interesse desses irmãos.
Aquele que pode dizer
de coração: “Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao teu nome dá glória, por amor
da tua misericórdia e da tua fidelidade” (Sal. 115:1), nunca se sentirá
pessoalmente ofendido se a mensagem não é recebida. Quem se irrita quando sua
mensagem é depreciada, ignorada, ou rejeitada com escárnio seu ensino,
demonstra, ou se esquece de que eram as palavras de Deus que estavam
pronunciando, ou que misturou ou substituiu por palavras de sua própria
escolha.
No passado, esse orgulho pessoal levou a perseguições que corromperam a professa igreja cristã. Homens se levantaram falando coisas perversas para atrair os discípulos. Quando foram rejeitadas suas declarações e modos, se ofenderam e tomaram vingança contra os chamados “heréticos”. A pessoa devota deve fazer continuamente a pergunta: 'A quem estou servindo? 'Se for a Deus, se contentará em entregar a mensagem que Deus lhe recomendou, deixando a vingança para Deus, a quem pertence por direito.
O sofrimento físico de Paulo
A partir de declarações
incidentais contidas na epístola, podemos deduzir certos detalhes históricos.
Parando na Galácia por causa de um contratempo em sua saúde, Paulo pregou o
evangelho “com demonstração do Espírito e de poder” (1 Cor. 2:4), de forma que
os gálatas viram a Cristo entre eles, como crucificado; e aceitando-o, foram
cheios de poder e gozo do Espírito Santo. Sua alegria e bençãos no Senhor
foram objeto de testemunho público, e em consequência disto sofreram uma
notável perseguição. Mas não se jactaram disso. Apesar da “débil” aparência de
Paulo (ver 1 Cor. 2:1-5 e 2 Cor. 10:10), o receberam como a um mensageiro de
Deus, em razão das boas novas que lhes trouxe. Tão ansiosamente apreciaram as
riquezas da graça que Paulo desdobrou ante eles, que teriam oferecido os
próprios olhos, se com isso houvessem podido resolver seu sofrimento.
Paulo instou com os
gálatas a que vissem de onde tinham caído, e para que pudessem apreciar a
sinceridade do apóstolo. De dia tinha lhes comunicado a verdade, e haviam se
alegrado nela; não era possível que estivesse se convertendo em um inimigo ao
continuar expondo-lhes essa mesma verdade!
Mas essas referências
pessoais contêm algo mais. Não podemos supor que Paulo estava ávido de simpatia
pessoal, quando fez referência às suas aflições e às condições adversas debaixo
das quais trabalhou entre eles. Nem por um momento perdeu de vista o propósito
da epístola, que era mostrar-lhes que “a carne nada aproveita” (João 6:63), e
que tudo o que é bom procede Espírito de Deus. Os gálatas haviam “começado com
o Espírito”. Paulo deveria ser pequeno em estatura, e de aparência física
fraca. Também, quando se encontrou com eles pela primeira vez, estava sofrendo
de uma doença física concreta. Apesar de tudo, pregou o evangelho com tal
poder, que todos puderam perceber próximo a ele a Presença real, ainda que
invisível.
O evangelho não provém do homem, mas de Deus. Não lhes foi dado conhecê-lo pela carne; portanto, em nada estavam em dívida com ela, relativo às bênçãos recebidas. Que cegueira! Que insensatez, o que pretenderam obter por meio de seus próprios esforços aquilo que só o poder de Deus pode iniciar! Já temos aprendido nós essa lição?
Onde está vossa
alegria?
Todo aquele que tenha conhecido ao Senhor, sabe que há alegria em aceitá-lo. Espera-se uma face radiante, e um testemunho jovial (alegre), naquele que se converte. Assim havia acontecido com os gálatas. Mas agora, aquela expressão de agradecimento tinha dado lugar as discussões e disputas amargas. A alegria e o calor do primeiro amor se extinguiram gradualmente. Tal coisa nunca deveria ter acontecido. “O caminho do justo é como a luz do amanhecer que aumenta até chegar ao pleno dia” (Prov. 4:18). O justo vive pela fé. Quando se afasta da fé, ou a substitui por obras, a luz se apaga. Jesus disse: “Tenho-vos dito estas coisas para que o meu gozo esteja em vós, e o vosso gozo seja completo” (João 15:11). É impossível que a fonte da vida se esgote. O fluxo nunca diminui. Então, se nossa luz se debilita e nossa alegria caminha para uma rotina monótona e rígida, podemos ter a segurança que deixamos o caminho da vida.
21
Dizei-me, os que quereis estar debaixo da lei, não ouvis vós a lei?
22
Porque está escrito que Abraão teve dois filhos, um da serva, e outro da livre.
23
Todavia o que era da escrava nasceu segundo a carne, mas, o que era da livre,
por promessa.
24
O que se entende por alegoria: porque estes são os dois concertos: um, do monte
Sinai, gerando filhos para a servidão, que é Agar.
25
Ora esta Agar é Sinai, um monte da Arábia, que corresponde à Jerusalém que
agora existe, pois é escrava com seus filhos.
26
Mas a Jerusalém que é de cima é livre; a qual é mãe de todos nós.
27 Porque está escrito: Alegra-te e clama, tu que não estás de parto; porque os filhos da solitária são mais do que os da que tem marido.
Muitos amam caminhos
que todos – menos eles, podem ver que levam diretamente à morte. Tendo
contemplado com seus próprios olhos as consequências de seu curso de
ação, persistem, escolhendo deliberadamente “as delícias temporárias do pecado”
em lugar “da justiça dos séculos” e “largura de dias”. Estar “debaixo da lei”
de Deus é ser condenado por ela como pecador, encarcerado e condenado a morte.
Porém, milhões de pessoas – e também os gálatas –, tem desejado e desejam tal
condição. Se tão somente dessem ouvido ao que a lei diz! E não há nenhuma razão
para que não o façam, desde que a lei se expressa com voz ensurdecedora. “O que
tem ouvidos, ouça”.
Lemos: “Lança fora a
escrava e seu filho, porque o filho da escrava não será herdeiro com o filho da
livre” (vers. 30). A lei decreta a morte de todos os que acham prazer nos “elementos
fracos e pobres” do mundo. “Maldito todo aquele que não permanece em tudo o que
está escrito no livro da Lei” (Gál. 3:10). O pobre escravo há de ser lançado
“fora, nas trevas. Ali haverá choro e ranger de dentes” (Mat. 25:30). “Pois eis
que vem o dia e arde como fornalha; todos os soberbos e todos os que cometem
perversidade serão como o restolho; o dia que vem os abrasará, diz o SENHOR dos
Exércitos, de sorte que não lhes deixará nem raiz nem ramo”. Portanto,
“Lembrai-vos da Lei de Moisés, meu servo, a qual lhe prescrevi em Horebe para
todo o Israel, a saber, estatutos e juízos” (Mal. 4:1, 4). Todos que estão
“debaixo da lei”, seja judeu ou gentil, cristão ou pagão, estão em servidão a
Satanás – ou servidão à transgressão da lei –, e serão lançados “fora”. “Todo o
comete pecado, é escravo do pecado. E o escravo não permanece para sempre na
casa, o filho, sim, para sempre” (João 8:34 e 35). Agradeçamos pois a Deus por
haver nos adotado como filhos.
Os falsos mestres
tentaram persuadir os irmãos que se eles abandonassem a fé sincera em
Cristo e confiassem em obras que eles próprios poderiam fazer, viriam a ser
filhos de Abraão, e com isto herdeiros das promessas. “Não os filhos segundo a
carne são os filhos de Deus, mas os filhos da promessa são contados como
descendentes” (Rom. 9:8). Dos dois filhos que teve Abraão, um foi gerado
segundo a carne, e outro de acordo com a “promessa”: foi nascido do Espírito.
“Pela fé, a mesma Sara, fora da idade, recebeu vigor para ser mãe, porque creu
que era fiel o que havia prometido” (Heb. 11:11).
Agar era uma escrava
egípcia. Os filhos de uma mulher escrava eram sempre escravos, mesmo que seu
pai fosse livre. Então, tudo o que Agar poderia gerar era escravos.
Mas muito antes que nascesse o menino-servo Ismael, o Senhor tinha manifestado claramente a Abraão que seria seu próprio filho livre, nascido de Sara, sua esposa livre, que herdaria a promessa. Tais são as obras do Todo-Poderoso.
"Elas representam
os dois pactos”
As duas mulheres, Agar
e Sara, representam os dois pactos. Lemos que Agar é o monte Sinai, “que gerou
filhos para a escravidão”. De igual forma que Agar poderia gerar só filhos
escravos, a lei – a lei que Deus pronunciou no Sinai –, não pode gerar homens
livres. Não pode fazer outra coisa a não ser mantê-los em servidão, “porque a
Lei produz a ira”, “porque pela Lei se alcança o conhecimento do pecado” (Rom.
4:15; 3:20). No Sinai, o povo prometeu guardar a lei que lhes havia sido dada.
Mas em sua própria força, careciam de poder para obedecê-la. O monte Sinai
gerou “filhos para a escravidão”, posto que sua promessa de fazer-se justos por
suas próprios obras não funcionou, nem pode funcionar jamais.
Consideremos esta
situação: O povo estava na escravidão do pecado. Não tinham poder para quebrar
aquelas cadeias. E a proclamação da lei em nada alterou essa situação. Se
alguém está na prisão por ter feito um crime, não acha libertação para o fato
de que lhe sejam lidos os estatutos. A leitura da lei que o levou à prisão
poderá apenas fazer mais doloroso seu cativeiro.
Então, não foi Deus
quem os levou à escravidão? Não, certamente, desde que não os induziu de modo
algum a que fizessem aquele aquele pacto no Sinai. Quatrocentos e trinta anos
antes havia feito um pacto com Abraão, que era perfeitamente suficiente sob
todos os pontos de vista. Este pacto foi confirmado em Cristo, e portanto, era
um pacto que vinha “de cima” (João 8:23). Prometia a justiça como um dom
gratuito de Deus, pela fé, e incluiu a todas as nações. Todos os milagres que
Deus realizou ao libertar os filhos de Israel da escravidão egípcia não eram
mais que demonstrações de seu poder para os libertar (e livrá-los) da
escravidão do pecado. Sim, a libertação do Egito foi, não só uma demonstração
do poder de Deus, mas também de seu desejo de libertá-los da escravidão do
pecado.
Deste modo, quando o
povo foi ao Sinai, Deus se limitou a referir-lhes o que havia feito em seu
favor, e lhes disse: “Se deres ouvido a minha voz e guardares meu pacto, vós
sereis meu tesouro especial sobre todos os povos, porque minha é toda a terra”
(Êxo. 19:5). A que pacto estava se referindo? Evidentemente, ao pacto que já
existia previamente, a seu pacto com Abraão. Se somente guardassem o pacto de
Deus, se guardassem a fé, e acreditassem na promessa de Deus, seriam um povo
peculiar. Na qualidade de dono de toda a terra, era capaz de cumprir em
benefício deles tudo quanto havia prometido.
O fato de que eles, em
sua própria suficiência, se apressassem a carregar sobre si mesmos a
responsabilidade de fazer-se realidade, não significa que Deus os induzira a
fazer esse pacto.
Se os filhos de Israel que haviam deixado o Egito tivessem andado nos “passos da fé de nosso pai Abraão” (Rom. 4:12), jamais se teriam jactado de serem capazes de guardar a lei promulgada no Sinai, porque “não foi por intermédio da lei que a Abraão ou a sua descendência coube a promessa de ser herdeiro do mundo, e sim mediante a justiça da fé” (Rom. 4:13). A fé justifica. A fé torna justo. Se o povo de Israel tivesse tido a fé de Abraão, teriam manifestado a justiça dele. No Sinai, a lei que foi promulgada “por causa das transgressões”, poderia já estar em seus corações. Poderia ter demonstrado sua verdadeira condição sem necessidade dos trovões terríveis. Nunca foi o propósito de Deus, nem o é agora, que pessoa alguma obtenha a justiça por meio da lei que foi promulgada no Sinai, e todo aquele que cerca o Sinai assim o demonstra. Não obstante, a lei é verdadeira, e deve ser observada. Deus libertou o povo de Israel “para que guardassem seus estatutos, e cumprissem suas leis” (Sal. 105:45). Não obtemos a vida guardando os mandamentos, mas Deus nos dá a vida para que possamos guardá-los pela fé nEle.
O paralelismo entre os
dois pactos
O apóstolo disse se
referindo a Agar e Sara: “estas mulheres representam os dois pactos”. Hoje
existem os dois pactos. Não é questão de tempo, mas de condição. Que ninguém se
jacte de sua impossibilidade de estar debaixo do antigo pacto, confiando em que
o tempo deste já passou. Realmente, o tempo passou, mas só no sentido de que
“basta o tempo decorrido para terdes executado a vontade dos gentios, tendo
andado em dissoluções, concupiscências, orgias, bebedices e em detestáveis
idolatrias” (1 Ped. 4:3).
A diferença é a mesma
que encontramos entre uma mulher escrava e uma livre. A descendência de Agar,
por mais numerosa que fosse, sempre seria formada por escravos; enquanto que a
de Sara seria de filhos livres. Então, o pacto do Sinai traz escravidão
“debaixo da lei” a todos os que se atêm nele, enquanto que o pacto proveniente
do alto, traz libertação. Não traz libertação da obediência à lei, mas
libertação de desobedecê-la. Não é fora da lei onde se encontra a liberdade,
mas nela. Cristo redime da maldição, que consiste na transgressão da
lei, de forma que possamos receber a benção. E a bênção consiste na obediência
à lei. “Bem-aventurados os irrepreensíveis no seu caminho, que andam na lei do
Senhor” (Sal. 119:1). Essa bênção é a liberdade. “andarei em liberdade, pois
busquei os teus preceitos” (Sal. 119:45).
O contraste entre os dois
pactos pode ser expresso brevemente deste modo: No pacto feito no Sinai, temos
que nos ver com a lei em sí, enquanto que no pacto do alto, temos a lei em
Cristo. O primeiro caso significa para nós a morte, pois a lei é mais afiada
que uma espada de dois gumes, e não somos capazes de manejá-la sem
consequências fatais. Mas no segundo caso, temos a lei “por meio de um
mediador”. Na primeira situação é o que nós podemos fazer. Na segunda, o que
pode fazer o Espírito de Deus.
Lembre-se que em nenhum lugar da epístola se questiona se a lei deve ser ou não obedecida. A única pergunta é: Como se alcança a obediência à lei? É por nossa própria obra, de forma que a recompensa não será um assunto de graça, mas de dívida? Ou será Deus trabalhando em nós, tanto o querer como o fazer, por sua boa vontade?
O contraste entre Sinai
e Sião
Da mesma forma em que
há dois pactos, também há duas cidades a que estes pertencem. A Jerusalém
“atual” pertence ao pacto velho, do monte Sinai. Nunca será livre, mas será
substituída pela Cidade de Deus, a Nova Jerusalém que descerá do céu (Apoc.
3:12; 21:1-5). Foi a cidade que Abraão anelou, “porque aguardava a cidade com
fundações cujo arquiteto e construtor é Deus” (Heb. 11:10; Apoc. 21:14, 19 e
20).
Há muitos que colocam
grandes esperanças – todas as suas esperanças –, na Jerusalém atual. “E até
hoje, quando é lido Moisés, o véu está posto sobre o coração deles” (2 Cor.
3:14). De fato, ainda esperam a salvação a partir do monte Sinai, e do antigo
pacto. Mas não é ali que ela se encontra, “Ora, não tendes chegado ao fogo
palpável e ardente, e à escuridão, e às trevas, e à tempestade, e ao clangor da
trombeta, e ao som de palavras tais, que quantos o ouviram suplicaram que não
se lhes falasse mais, pois já não suportavam o que lhes era ordenado: Até um
animal, tocando o monte, seria apedrejado. Na verdade, de tal modo era horrível
o espetáculo, que Moisés disse: Sinto-me aterrado e trêmulo! Mas tendes chegado
ao monte Sião e à cidade do Deus vivo, a Jerusalém celestial, e a incontáveis
hostes de anjos, e à universal assembleia e igreja dos primogênitos arrolados
nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados,
e a Jesus, o Mediador da nova aliança, e ao sangue da aspersão que fala coisas
superiores ao que fala o próprio Abel” (Heb. 12:18-24). O que espera as bênçãos
a partir da Jerusalém atual, está dependendo do antigo pacto e do monte Sinai,
para escravidão. Mas quem adora dirigindo-se à Nova Jerusalém, esperando as
bênçãos somente dela, agarra-se ao pacto novo, ao monte de Sião e a liberdade,
pois “a Jerusalém de cima... é livre”. Do que é livre? Do pecado; e uma vez que
“é a mãe de todos nós”, nos gera novamente, de forma que somos libertados
também do pecado. Livres da lei? Sim, certamente, pois a lei não condena os que
estão em Cristo.
Mas não permitas que
ninguém te seduza com palavras vãs, assegurando-te de que podes agora pisar
aquela lei que Deus proclamou com tal majestade, no monte Sinai. Achegando-nos
ao monte Sião, a Jesus, o mediador do novo pacto, ao sangue da aspersão, somos
libertados do pecado, da transgressão da lei. Em” Sião”, a base do trono de
Deus é sua lei. De seu trono procedem os mesmos raios, trovões e vozes (Apoc.
4:5; 11:19) que procederam do Sinai, já que ali está a mesma lei. Mas se trata
do “trono da graça” (Heb. 4:16), então, apesar dos trovões, podemos nos achegar
a ele com a confiança de achar misericórdia e graça em Deus. Também acharemos
graça para o momento oportuno na hora da tentação, posto que do trono, do
Cordeiro “imolado” (Apoc. 5:6), flui o rio de águas da vida que nos traz,
procedente do coração de Cristo, “a lei do Espírito que dá vida” (Rom. 8:2).
Bebamos dele, mergulhemos nele, e seremos limpos de todo o pecado.
Por que o Senhor não
levou o povo diretamente ao monte Sião, onde poderiam encontrar a lei como
vida, em vez de os levar ao monte Sinai, onde a lei significou somente morte?
É uma pergunta muito
lógica, e lógica também é sua resposta: Foi por sua incredulidade. Quando Deus
tirou Israel do Egito, seu propósito era levá-los diretamente ao monte Sião.
Após terem cruzado o Mar Vermelho, entoaram um cântico inspirado, e um de seus
versos dizia: “Com a tua beneficência guiaste o povo que salvaste; com a tua
força o levaste à habitação da tua santidade.” “Tu o introduzirás e o plantarás
no monte da tua herança, no lugar que aparelhaste, ó Senhor, para a tua
habitação, no santuário, ó Senhor, que as tuas mãos estabeleceram” (Êxo. 15:13,
17).
Se houvessem continuado
cantando, teriam chegado bastante próximo do monte Sião, pois “os resgatados do
Senhor voltarão, e virão a Sião com júbilo: e alegria eterna haverá sobre as
suas cabeças: gozo e alegria alcançarão, e deles fugirá a tristeza e o gemido”
(Isa. 35:10). A travessia do Mar Vermelho o confirmava (Isa. 51:10 e 11). Mas
logo esqueceram o Senhor, e em sua incredulidade se entregaram a murmuração.
Por conseguinte, “foi dada [a lei] por causa das transgressões” (Gál. 3:19).
Foram eles – sua incredulidade pecaminosa – que criou a necessidade de ir ao
monte Sinai, em vez de ir ao de Sião.
Não obstante, Deus não os privou do testemunho de sua fidelidade. No Sinai, a lei estava nas mãos do mesmo Mediador – Jesus – a quem nos dirigimos quando vamos a Sião. Da pedra em Horeb (ou Sinai) brotou o manancial de águas vivas a partir do coração de Cristo, “e a Rocha era Cristo” (Êxo. 17:6; 1 Cor. 10:4). Perante eles esteve a realidade do monte Sião. Todo aquele cujo coração se voltasse ali ao Senhor, contemplaria sua glória sem véu, tal como Moisés, e sendo transformado por ela, encontraria o “ministério que traz justificação”, em lugar do “ministério de condenação” (2 Cor. 3:9). “Seu amor é para sempre”, e até mesmo das mesmas nuvens ameaçadoras de ira que procederam dos raios e trovões, brilha o glorioso rosto do Sol da Justiça, formando o arco-íris da promessa.
28
Mas nós irmãos, somos filhos da promessa como Isaque.
29
Mas, como então aquele que era gerado segundo a carne perseguia o que era
segundo o Espírito, assim é também agora.
30
Mas que diz a escritura? Lança fora a escrava e seu filho, porque de modo algum
o filho da escrava herdará com o filho da livre.
31 De maneira que, irmãos, somos filhos, não da escrava, mas da livre.
Palavras de ânimo para
toda a alma! Eras um pecador. Na melhor da hipóteses tentas ser cristão, e as
palavras “Lança fora ao escravo” te fazem tremer. Compreendes que és escravo,
que o pecado o mantém prisioneiro, e que te amarram os laços dos maus hábitos.
Tens que aprender a não temer, quando fala o Senhor, quando proclama a paz com voz
ensurdecedora! Quanto mais assustadora sua voz, mais paz podes estar seguro de
obter. Anima-te!
O filho da escrava é a carne e suas obras. “A carne e o sangue não podem herdar o Reino de Deus” (1 Cor. 15:50). Mas Deus diz: “Lança fora a escrava e seu filho”. Se desejas que sua vontade seja cumprida em você, tal como se cumpre no céu, Ele fará o necessário para remover a carne e seus obras. Tua vida “será libertada da escravidão da corrupção, para participar da gloriosa liberdade dos filhos de Deus” (Rom. 8:21). Essa afirmação, que tanto te atemorizou, não é mais que a voz que ordena ao mau espírito que saia de ti, para não voltar nunca mais. Te declara vitória sobre todo pecado. Recebe a Cristo pela fé, e obtenha o poder de ser feito filho de Deus, herdeiro do Reino imortal, que permanece para sempre com seus habitantes.
"Mantenha-os,
pois, firmes”
Onde temos que nos
guardar? Na liberdade de Cristo, cujo deleite estava na lei do Senhor, pois a
tinha em seu coração (Sal. 40:8). “Mediante Cristo Jesus, a lei do Espírito que
dá vida, me libertou da lei do pecado e da morte” (Rom. 8:2). Guardemos ela
somente pela fé.
Nessa liberdade não há
nenhum vestígio de escravidão. É uma liberdade perfeita. É liberdade da alma,
liberdade de pensamento, tanto quanto liberdade de ação. Não consiste
simplesmente em nos capacitar a obedecer a lei, mas nos proporciona também a
mente que acha deleite em cumprí-la. Não se trata de se observamos a lei,
porque não encontramos outro modo para escapar ao castigo: isso seria a mais amarga
das escravidões. É de fato a escravidão dela que nos livra do pacto de Deus.
A promessa de Deus,
aceita pela fé, gera em nós a mente do Espírito, de forma que achamos o maior
prazer na obediência a todos os preceitos da Palavra de Deus. A alma experimenta
essa liberdade que possuem os pássaros em seu vôo sobre o cume das montanhas. É
a gloriosa liberdade dos filhos de Deus, que têm a plenitude da largura,
profundidade e altura do vasto universo de Deus. É a liberdade dos que não
precisam ser vigiados, mas sim dos que são dignos de confiança em toda a
situação, pois cada passo que dão não é mais que a ação da santa lei de Deus.
Por que te conformas com a escravidão, quando é tua esta liberdade que não
conhece limites? As portas da prisão estão abertas de par em par. Caminha na
liberdade de Deus.
(T.
M. Westrup, #330)
Capítulo 5
O ESPÍRITO TORNA FÁCIL A
SALVAÇÃO
1 Estai pois firmes na liberdade com que Cristo nos libertou, e não torneis a meter-vos debaixo do jugo da servidão.
A relação entre o capítulo quarto e cinco é tão estreita, que custa imaginar a razão que levou a se dividir o texto nesse ponto.
A liberdade que Cristo
oferece
Quando Cristo
manifestou-se em carne, o trabalho dele consistiu em “proclamar liberdade aos
cativos, e a abertura de prisão aos presos” (Isa. 61:1). Os milagres que
realizou foram ilustrações práticas de sua obra, e bem podemos agora considerar
um dos mais interessantes.
"Ensinava Jesus no
sábado numa das sinagogas. E veio ali uma mulher possessa de um espírito de
enfermidade, havia já dezoito anos; andava ela encurvada, sem de modo algum
poder endireitar-se. Vendo-a Jesus, chamou-a e disse-lhe: Mulher, estás livre
da tua enfermidade; e, impondo-lhe as mãos, ela imediatamente se endireitou e
dava glória a Deus” (Luc. 13:10-13).
Quando o hipócrita
dirigente da sinagoga reclamou porque Jesus tinha feito esse milagre no sábado,
Ele lembrou-lhe como cada um deixava livre a seu boi ou asno no sábado, a fim
de que bebessem, e acrescentou dizendo: "Por que motivo não se devia
livrar do cativeiro, em dia de sábado, esta filha de Abraão, a quem Satanás
trazia presa há dezoito anos?” (vers. 16).
Há dois aspectos dignos de menção: Satanás tinha amarrado a mulher, e esta estava “possessa de um espírito de enfermidade” que a incapacitava.
Note que esta descrição
se ajusta bem à nossa condição, antes de encontrar a Cristo:
(1) Somos cativos
de Satanás, estamos “cativos à vontade dele” (2 Tim. 2:26). “Todo o que comete
pecado, é escravo do pecado” (João 8:34), e “o que pratica o pecado pertence ao
diabo” (1 João 3:8). “Quanto ao perverso, as suas iniquidades o prenderão, e
com as cordas do seu pecado será detido” (Prov. 5:22). O pecado é a cadeia com
que Satanás nos amarra.
(2) Estamos
possessos “de um espírito de enfermidade”, e de nenhuma maneira possuímos a
força para nos endireitar, nem para libertar-nos por nós mesmos das cadeias que
nos amarram. Foi “quando ainda éramos fracos” que Cristo morreu por nós (Rom.
5:6). O termo que é traduzido por fracos em Romanos 5:6 é o mesmo que é
traduzido por ”enfermidade” no relato de Lucas. A mulher estava enferma ou
debilitada, e essa é também a nossa condição.
Que fez Jesus por nós?
Toma nossa fraqueza, e nos dá em troca sua força. “Não temos um sumo sacerdote
que não possa compadecer-se das nossas fraquezas” (Heb. 4:15). “Ele mesmo tomou
as nossas enfermidades e levou nossas doenças” (Mat. 8:17). Ele se fez em tudo
semelhante ao que nós somos, a fim de que possamos ser feitos em tudo ao que
Ele é. Nasceu “debaixo da Lei para redimir os que estavam debaixo da Lei” (Gál.
4:4 e 5). Nos libertou da maldição, fazendo-se maldição por nós, para que nos
fosse possível receber a bênção. Embora não conhecesse pecado, se tornou pecado
por nós, “para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus” (2 Cor. 5:21).
Para que Jesus livrou
essa mulher de sua enfermidade? Para fazê-la caminhar em liberdade. Não foi
certamente para que continuasse fazendo, por sua própria e livre vontade, as
mesmas coisas que anteriormente tinha que fazer por obrigação, quando estava em
seu estado de penosa escravidão. Com que propósito nos livra do pecado? Para
que possamos viver livres do pecado. Devido a debilidade de nossa carne, somos
incapazes de obrar a justiça da lei. Portanto, Cristo, que veio em carne, e que
tem poder sobre a carne, nos fortalece. Nos provê seu poderoso Espírito para
que a justiça da lei possa cumprir-se em nós. Em Cristo não andamos na carne,
mas no Espírito. Não podemos saber de que maneira ele o faz. Só Ele o sabe, já
que é Ele quem possui o poder. Mas nós podemos conhecer sua realidade.
Quando a mulher estava
ainda presa e sem forças para endireitar-se, Jesus lhe disse: “Mulher, estás
livre da tua enfermidade”. É um tempo verbal presente. Ele também diz isso à
nós hoje. Proclama liberdade a todo cativo.
A mulher “andava
encurvada, sem de modo algum poder endireitar-se”, porém, ela endireitou-se
imediatamente ante a palavra de Cristo. Fez o que “não podia” fazer. “O que é
impossível para os homens, é possível para Deus” (Luc. 18:27). “O Eterno sustém
a todos os que caem, e levanta a todos os oprimidos” (Sal. 145:14). Não é a fé
que produz os atos, mas ela é que reconhece o que já é um fato. Não há sequer
uma só alma encurvada debaixo do peso do pecado que Satanás encadeou, que
Cristo não sustenha e endireite. A liberdade lhe pertence. Simplesmente, deve
fazer uso dela. Que a mensagem ressoe em todos os lugares. Que toda alma saiba
que Cristo dá liberdade ao cativo. A boa nova encherá de alegria a milhares.
Cristo veio resgatar o
que se havia perdido. Nos redime da maldição. Nos redimiu. Nos tem redimido.
Então, a liberdade com que nos faz livres é aquela que existia antes que viesse
a maldição. Ao homem foi dado o domínio sobre a terra. Não meramente ao
primeiro homem criado, mas a toda a humanidade. “No dia em que Deus criou o
homem, à semelhança de Deus o fez; homem e mulher os criou, e os abençoou, e
lhes chamou pelo nome de Adão, no dia em que foram criados (Gên. 5:1 e 2).
“Também disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme à nossa
semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus,
sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que
rastejam pela terra. Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o
criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou e lhes disse: Sede fecundos,
multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar,
sobre as aves dos céus e sobre todo animal que rasteja pela terra“ (Gên.
1:26-28). Vemos que o domínio foi dado a todo o ser humano, macho ou fêmea.
Quando Deus fez o
homem, “lhe sujeitou [sob seus pés] todas as coisas” (Heb. 2:8). É certo que
agora não vemos que todas as coisas são sujeitas ao homem, “vemos, todavia,
aquele que, por um pouco, tendo sido feito menor que os anjos, Jesus, por causa
do sofrimento da morte, foi coroado de glória e de honra, para que, pela graça
de Deus, provasse a morte por todo homem” (vers. 9). Jesus redime a todo homem
da maldição do domínio perdido. Uma coroa implica um Reino, e a coroa de Cristo
é a mesma que foi dada ao homem, quando Deus o recomendou dominar sobre a obra
de suas mãos. Como homem, estando na carne, depois de haver ressuscitado e
estar a ponto de ascender, Cristo declarou: “Toda a autoridade me foi dada no
céu e na terra. Portanto, ide” (Mat. 28:18 e 19). NEle nos é dado todo o poder
que se perdeu pelo pecado.
Cristo – como homem –
provou a morte para nós, e por meio da cruz nos redimiu da maldição. Se estamos
crucificados com Ele, estamos igualmente ressuscitados e assentados com Ele nos
lugares celestiais, com todas as coisas sob nossos pés. Se não sabemos isto, é
porque não permitimos ao Espírito que nos revele. Os olhos de nosso coração têm
que ser iluminados pelo Espírito, “para saberdes qual é a esperança do seu chamamento,
qual a riqueza da glória da sua herança nos santos” (Efe. 1:18).
A exortação para os que
morreram e ressuscitaram com Cristo, é: “Não reine o pecado em vosso corpo
mortal, para obedecer a seus maus desejos” (Rom. 6:12). Em Cristo, temos
autoridade sobre o pecado, de forma que não tenha qualquer domínio sobre nós.
Quando “nos libertou de
nossos pecados com seu sangue ”nos fez reis e sacerdotes para Deus e seu Pai”
(Apoc. 1:5 e 6). Glorioso domínio! Gloriosa liberdade! Libertação do poder da
maldição, inclusive sendo rodeados dela! Libertação do presente século mau, da
concupiscência da carne, da concupiscência dos olhos, e da arrogância da vida!
Nem “o príncipe da potestade do ar” (Efe. 2:2), nem os “dominadores deste mundo
tenebroso” (6:12) podem ter domínio algum sobre nós. É a liberdade e autoridade
que teve Cristo quando ordenou: “Vai-te, Satanás” (Mat. 4:10). E o diabo o
deixou imediatamente.
É uma tal liberdade que
nada no céu nem na terra nos pode obrigar a proceder contra nossa eleição. Deus
nunca nos obrigará, pois é quem nos dá a liberdade. E nenhum outro fora dEle
pode obrigar-nos. É um poder sobre os elementos, de forma que sejam postos a
nosso serviço, em vez de sermos controlados por eles. Aprenderemos a reconhecer
Cristo e a cruz em todo o lugar, de forma que a maldição careça, para
nós, de poder. Nossa saúde “apressadamente brotará” (Isa. 58:8), pois que a
vida de Cristo se manifestará em nossa carne mortal. Uma liberdade gloriosa
como nenhuma língua ou pena podem descrever.
"Permanecei, pois, firmes”
"Pela palavra de Jeová foram feitos os céus, e todo o exército deles pelo espírito de sua boca”, “Porque falou, e tudo se fez; mandou, e logo tudo apareceu” (Sal. 33:6, 9). A mesma palavra que criou o firmamento estrelado, nos fala assim: “Permanecei, pois, firmes”. Isto não é uma ordem que nos deixa no mesmo estado de impotência anterior, mas que leva em si mesma o cumprimento do fato. Os céus não se formaram por si mesmos, foram trazidos à existência pela palavra do Senhor. Permitamos-Lhe, pois, ser nosso instrutor. “Levantai vossos olhos para o alto, e vede quem criou estas coisas, quem criou seu exército de estrelas, quem a todas chama pelos seus nomes, por causa da grandeza de suas forças” (Isa. 40:26). “Ele dá energia ao cansado, e multiplica as forças ao que não tem nenhum vigor” (Isa. 40:29).
1 Eis que eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará.
É necessário
compreender que isso envolve muito mais que o simples rito da circuncisão. O Senhor
fez com que esta epístola, que tanto fala da circuncisão, fosse preservada para
nosso benefício, porque contém a mensagem do evangelho para todas as épocas,
até mesmo se a circuncisão como rito não é em nossos dias objeto de nenhuma
polêmica.
A questão é como obter
a justiça – a salvação do pecado – e a herança que isto envolve. E pode ser
obtida somente pela fé, recebendo a Cristo no coração e lhe permitindo viver
sua vida em nós. Abraão teve essa justiça de Deus pela fé de Jesus Cristo, e
Deus lhe deu a circuncisão como sinal disto. Teve para Abraão um significado
muito especial, lembrava-lhe constantemente sua derrota quando tentou cumprir a
promessa de Deus por meio da carne. O registro deste fato, tem para nós
idêntico propósito. Mostra que “a carne nada aproveita”, e que portanto, não é
necessário depender dela. Não é que estar circuncidado faria que Cristo ficasse
sem proveito, porque mesmo Paulo estava, e em certo momento considerou oportuno
que Timóteo fosse circuncidado (Atos 16:1-3). Mas Paulo não dava valor algum a
sua circuncisão, nem para qualquer outro sinal externo (Fil. 3:4-7), e quando
lhe propuseram a circuncisão de Tito como condição necessária para a salvação,
não consentiu (Gál. 2:3-5).
O que devia ter sido
apenas um sinal indicativo de uma realidade preexistente, foi considerado pelas
gerações subsequentes como o meio para estabelecer essa realidade. Portanto, a
circuncisão é erguida nesta epístola como símbolo de todo tipo de “obra” que o
homem possa fazer, esperando obter assim a justiça. São “as obras da carne”,
postas em contraste com o Espírito.
É estabelecida esta
verdade: se uma pessoa faz algo com a esperança de ser salvo por ela, quer
dizer, de obter a salvação por suas próprias obras, “de nada lhe aproveitará
Cristo”. Se não se aceita a Cristo como um Redentor pleno, não o aceitamos em
nada. Quer dizer, ou aceita a Cristo tal qual é, ou o rejeita. Não pode ser de
outro modo. Cristo não está dividido, e não compartilha com nenhuma outra
pessoa ou coisa a honra de ser Salvador. Então é fácil ver que se alguém fosse
circuncidado com a intenção de ser salvo deste modo, estaria manifestando falta
de fé em Cristo como o pleno e único Salvador do homem.
Deus deu a circuncisão como um sinal da fé em Cristo. Os judeus a perverteram transformando-a em um substituto da fé. Quando um judeu se gloriava em sua circuncisão, ele estava gloriando-se de sua própria justiça. Assim mostra o versículo quatro: “Separados estais de Cristo, vós os que vos justificais pela lei: da graça tendes caído”. Paulo não estava de modo algum depreciando a lei, mas a capacidade do homem para obedecê-la. Tão santa e gloriosa é a lei, e tão grande suas exigências que nenhum homem pode alcançar a sua perfeição. Somente em Cristo se faz a nossa justiça da lei. A verdadeira circuncisão é adorar a Deus em Espírito, alegrar-se em Jesus Cristo, e não pôr a confiança na carne (Fil. 3:3).
2 E de
novo protesto a todo o homem, que se deixa circuncidar, que está obrigado a
guardar toda a lei.
3 Separados estais de Cristo, vós os que vos justificais pela lei: da graça tendes caído.
‘Aí está!’, exclamará
alguém, ‘isso demonstra que a lei é algo a evitar, já que Paulo afirma que os
que são circuncidados estão obrigados a cumprir toda a lei, ao mesmo tempo que
admoesta que ninguém se circuncide'.
Não tão depressa,
amigo. Vejamos mais atentamente o texto. Observe o que Paulo diz, no original
grego (vers. 3): “devedor é toda a lei a cumprir”. Você pode notar que o
mal não é a lei, nem cumprir a lei, mas sim o estar em dívida com a lei. É
importante apreciar a diferença. Ter comida e roupa é bom. Endividar-se para
poder comer e vestir, é muito triste. E mais triste ainda é ter a dívida, e
além disso faltar o necessário para comer e vestir.
Um devedor é aquele que deve algo. O que está em dívida com a lei, deve à justiça que a lei demanda. Então, todo aquele que está em dívida com a lei, está debaixo da maldição, “porque está escrito: 'Maldito todo aquele que não permanece em tudo o que está escrito no livro da Lei'“ (Gál. 3:10). Portanto, tentar obter justiça de qualquer outro modo que não seja pela fé em Cristo significa estar sob a maldição da dívida eterna. Está endividado pela eternidade, uma vez que não tem nada com que pagar. Porém, o fato de que seja devedor à lei – “devedor é toda a lei a cumprir” –, demonstra que deveria cumpri-la em sua totalidade. Como?: “Esta é a obra de Deus, que creiais nAquele a quem ele enviou” (João 6:29). Deixará de confiar em si mesmo e receberá e confessará a Cristo em sua carne, e então a justiça da lei se cumprirá nele, porque não andará de acordo com a carne, mas com o Espírito.
4 Porque nós pelo espírito da fé aguardamos a esperança da justiça.
Leia vários vezes este
texto, mas leia-o detidamente. Não esqueça o que já estudamos a respeito da
promessa do Espírito. Caso contrário, você corre o risco de equivocar seu
significado.
Não suponhas que o
texto significa que, tendo o Espírito, temos que esperar para obter a
justiça. Não diz isso. O Espírito traz a justiça. “O espírito vive por causa da
justiça” (Rom. 8:10). “Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, da
justiça e do juízo” (João 16:8). Todo o que recebe o Espírito, tem a convicção
do pecado, e da justiça que o Espírito lhe fez ver que carece, e que somente o
Espírito pode trazer-lhe.
Qual é a justiça que
traz o Espírito? É a justiça da lei (Rom. 8:4). “Porque sabemos que a lei é
espiritual” (Rom. 7:14).
O que há, então, sobre “a esperança da justiça” que aguardamos pelo Espírito? Note que não diz que por meio do Espírito aguardamos a justiça. O que diz é que “aguardamos a esperança da justiça que vem pela fé”, quer dizer, aguardamos a esperança que é dada ao possuirmos essa justiça. Refresquemos brevemente a memória a esse respeito:
(1) O Espírito de
Deus é “o Espírito Santo da promessa”. A possessão do Espírito é o penhor ou
garantia da promessa de Deus.
(2) O que Deus nos
prometeu, como filhos de Abraão, foi uma herança. O Espírito Santo é a garantia
daquela herança até que a possessão adquirida esteja redimida e nos seja entregue
(Efe. 1:13 e 14).
(3) Essa herança
prometida consiste nos novos céus e nova terra, nos quais mora a justiça (2
Ped. 3:13).
(4) O Espírito
traz a justiça. É o representante de Cristo, a forma na qual Cristo, que é
nossa justiça, vem morar em nossos corações (João 14:16-18).
(5) Portanto, a
esperança que o Espírito traz é a esperança de uma herança no Reino de Deus, na
nova terra.
(6) A justiça que
o Espírito traz é a justiça da lei de Deus (Rom. 8:4; 7:14). O Espírito não a
escreve em tábuas de pedra, mas em nossos corações (2 Cor. 3:3).
(7) Resumindo, podemos dizer que se em vez de crermos o suficiente para poder obedecer a lei, permitirmos que o Espírito faça morada em nosso coração e nos encha assim da justiça da lei, teremos a esperança viva em nosso interior. A esperança do Espírito – a esperança da justiça pela fé –, não contém elemento algum de incerteza. É algo positivamente seguro. Em nenhuma outra coisa há esperança. Quem não possui “a justiça que vem de Deus pela fé” (Fil. 3:9; Rom. 3:23), está privado de toda esperança. Somente Cristo em nós é “a esperança da glória” (Col. 1:27).
1 Porque em Jesus Cristo nem a circuncisão nem a incircuncisão tem virtude alguma; mas sim a fé que opera por caridade.
A palavra traduzida
aqui como ”valor”, é a mesma traduzido por “poderão”, “podido” ou “puderam”, em
Lucas 13:24; Atos 15:10 e 6:10, respetivamente. Em Filipenses 4:13, é
traduzida a mesma palavra: “Posso todas as coisas naquele que me
fortalece". Então, é necessário entender o texto deste modo: 'A
circuncisão não pode operar nada, nem a incircuncisão. Somente a fé que –
obrando pelo amor –, pode fazê-lo'. E essa fé que obra pelo amor, se encontra
somente em Jesus.
Mas o que nem a circuncisão ou a incircuncisão não podem cumprir? Nem mais, nem menos que a lei de Deus. Não está ao alcance de qualquer homem, seja qual seja o seu estado ou condição. O incircunciso carece de poder para guardar a lei, e a circuncisão em nada lhe pode ajudar a fazê-lo. Uma pessoa pode vangloriar-se de sua circuncisão, e outro de sua incircuncisão, mas ambos em vão. Pelo princípio da fé, “é eliminada” (Rom. 3:27). Posto que somente a fé de Jesus pode cumprir a justiça da lei, não sobra nenhum resquício para que possamos nos jactar pelo que temos “feito”. Cristo é o tudo em todos.
2
Corríeis bem; quem vos impediu, para que não obedeçais à verdade?
3 Esta
persuasão não vem daquele que vos chamou.
4 Um
pouco de fermento leveda toda a massa.
5 Confio
de vós, no Senhor, que nenhuma outra coisa sentireis; mas aquele que vos
inquieta, seja ele quem for, sofrerá a condenação.
6 Eu,
porém, irmãos, se prego ainda a circuncisão, por que sou pois perseguido? Logo,
o escândalo da cruz está aniquilado.
7 Eu quereria que fossem cortados aqueles que vos andam inquietando.
A lei de Deus é a
verdade (Sal. 119:142), e os irmãos de Galácia tinham começado a obedecê-la. No
princípio com êxito, mas posteriormente haviam detido seu progresso. “Por que?
Porque não a seguiram pela fé, mas pelas obras. Por isso tropeçaram “na pedra de
tropeço” (Rom. 9:32). Cristo é o caminho, a verdade e a vida, e nEle não há
tropeço. NEle se encontra a perfeição da lei, posto que sua vida é a lei.
A cruz é, e sempre foi, um símbolo da desgraça. Ser crucificado era ser submetido à morte mais ignominiosa de todas as que se conheciam. O apóstolo afirmou que se houvesse sido pregado a circuncisão (quer dizer, a justiça pelas obras), se haveria eliminado “o escândalo da cruz” (Gál. 5:11). O escândalo da cruz consiste em que a cruz é uma confissão da fraqueza e pecado do homem, e de sua absoluta incapacidade para obrar o bem. Tomar a cruz de Cristo, depender somente dEle para todas as coisas, é o que leva ao abatimento de todo o orgulho humano. O homem gosta de sentir-se independente e autônomo. Mas pregando-se a cruz, fica manifesto que no homem não mora o bem e que tudo deve ser recebido como um dom, e imediatamente haverá alguém que se sinta ofendido.
8 Porque
vós, irmãos, fostes chamados à liberdade; não useis então da liberdade para dar
ocasião à carne; mas servi-vos uns aos outros pela caridade;
9 Porque toda a lei se cumpre numa só palavra: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo.
Os dois capítulos
precedentes se referem à escravidão, ao encarceramento. Antes de vir a fé
estávamos “encarcerados” debaixo do pecado, éramos devedores à lei. A fé de
Cristo nos fez livres, mas ao sermos postos em liberdade recebemos esta
advertência: “Vai-te, e não peques mais” (João 8:11). Fomos colocados em
liberdade do pecado, não em liberdade de pecar. Quantos se confundem
com isto!
Muitas pessoas sinceras
imaginam que em Cristo estamos em liberdade para ignorar e desafiar a lei,
esquecendo que a transgressão da lei é pecado (1 João 3:4). Satisfazer a carne
é cometer pecado, “Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus,
pois não é sujeita à Lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser” (Rom. 8:7). O
apóstolo nos adverte a não usarmos mal a liberdade que Cristo nos dá, caindo
novamente na escravidão pela transgressão da lei. Em vez disto, deveríamos
servir cada um ao nosso próximo, porque o amor é o cumprimento da lei.
Cristo nos dá a
liberdade do primeiro domínio. Mas lembre-se que Deus deu o domínio ao gênero
humano, e que em Cristo todos vem a ser reis. Isso significa que o único ser
humano no qual um Cristão pode ter domínio é sobre si mesmo. O que é grande no
Reino de Cristo é o que domina sobre seu próprio espírito.
Como reis, encontramos
nossos súditos nas ordens inferiores dos seres criados, nos elementos e em
nossa própria carne, mas jamais em nossos semelhantes. A, estes, temos que
servir. Em nós deve haver a mente que havia em Cristo, inclusive quando ainda
estava nas reais cortes celestiais, em forma de Deus”, e que o levou a tomar
forma de servo (Fil. 2:5-7). Demonstrou deste modo também isto quando lavando
os pés dos discípulos, em plena consciência de ser seu Senhor e Mestre, tendo
vindo de Deus, e indo para Deus (João 13:3-13), mais ainda, quando todos os
santos redimidos se manifestem em glória, Cristo mesmo se cingirá, os convidará
a se sentar à mesa, e os servirá (Luc. 12:37).
A maior das liberdades se encontra no serviço, no serviço prestado ao nosso próximo, no nome de Jesus. O maior é o que presta maior serviço (não o maior serviço de acordo com o mundo, mas sim o que este tem por mais baixo). Deste modo aprendemos de Jesus, que é o Rei dos reis e Senhor dos senhores, por fazer-se servo de todos, rendendo um serviço que ninguém poderia e nem queria fazer. Todos os servos de Deus são reis.
O amor é o cumprimento
da lei
O amor não é um substituto do cumprimento da lei, mas é a perfeição deste. “O amor não faz mal ao próximo; assim, o amor é o cumprimento da lei” (Rom. 13:10). Se alguém diz: 'Eu amo a Deus', e aborrece a seu irmão, é mentiroso. Porque aquele que não ama a seu irmão a quem vê, não pode amar a Deus a quem não vê” (1 João 4:20). Quando um homem ama seu próximo, tem que ser porque ama a Deus. “O amor vem de Deus”, “porque Deus é amor” (1 João 4:7 e 8). Portanto, o amor é a vida de Deus. Se essa vida está em nós e lhe damos livre curso, a lei necessariamente estará em nós, porque a vida de Deus é a lei para toda a criação. “Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a sua vida por nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos” (1 João 3:16).
Amor é ausência de
egoísmo
Sendo que amor significa
serviço – fazer algo para os outros –, é evidente que o amor não enfoca a
atenção em si mesmo. Tudo o que pensa aquele que ama, é em como pode ser uma
benção a outros. Lemos que: “O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em
ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não
procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal” (1 Cor.
13:4 e 5).
É precisamente neste
ponto vital que muitos se equivocam. Felizes os que reconhecem seu erro, e
voltam à compreensão e prática do verdadeiro amor. O amor “não procura os seus
interesses”. Logo, o amor a si mesmo não é amor, de maneira nenhuma. Não é mais
que uma falsificação vil. Porém, muito do que o mundo chama de amor, não é de
fato amor aos demais, mas amor a si próprio.
Até mesmo a que deveria ser a forma mais elevada de amor conhecida na terra, o tipo de amor que o Senhor usou para representar seu amor por seu povo, o amor entre marido e mulher, é frequentemente mais egoísmo do que amor verdadeiro. Deixando de lado os casamentos que são forjados com o objetivo claro de obter riqueza ou posição na sociedade, em muitos casos, os candidatos ao casamento pensam mais na própria felicidade que na felicidade do outro. O amor autêntico desprovido de egoísmo existe na mesma proporção que a felicidade autêntica. Esta é uma lição que o mundo tarda em aprender. A felicidade autêntica se encontra somente quando a pessoa deixa de andar em sua busca, e se dedica em procurá-la para os demais.
O amor nunca deixa de
ser
Uma vez mais nos
encontramos ante um indicador de que muito do que se conhece como amor, na
realidade não é. O amor nunca deixa de ser amor. É uma declaração categórica: nunca.
Não há nenhuma exceção, e as circunstâncias não podem mudar isso.
Frequentemente ouvimos falar de amores que se esfriam, mas isso é algo que
nunca pode acontecer ao verdadeiro amor. O verdadeiro amor é sempre cálido,
ativo; nada pode congelar suas fontes. É invariável e inalterável, pela simples
razão simples de que é a vida de Deus. Não há outro verdadeiro amor, fora do
divino. Portanto, a única possibilidade de que o verdadeiro amor se manifeste
entre os homens, é que seja derramado em seus corações pelo Espírito Santo
(Rom. 5:5).
Quando alguém manifesta
seu amor por outro, recebe normalmente a pergunta: 'Por que você me ama?' Como
se alguém pudesse oferecer razões para amar! O amor é sua própria razão. Se o
que ama é capaz de dar uma razão, demonstra com isso que não ama realmente.
Seja lá o que for apontado como razão, com o passar do tempo, este suposto amor
desaparecerá. Mas “o amor nunca deixa de ser”. Portanto, não pode depender das
circunstâncias. A única resposta que se pode dar para o motivo de amar, é: por
amor. O amor ama, simplesmente, porque é amor. Amor é a qualidade daquele que
ama; ama porque tem amor, independentemente do caráter objeto amado.
Apreciamos a verdade do
que foi dito, ao irmos a Deus, a Fonte do amor. Ele é amor. Sua vida é amor.
Mas não é possível dar explicação alguma sobre sua existência. A maior
concepção humana do amor consiste em amar porque somos amados, ou porque o
objeto amado nos inspira amor. Mas Deus ama aquilo que é detestável. Ele ama a
quem o odeia. “Pois nós também, outrora, éramos néscios, desobedientes,
desgarrados, escravos de toda sorte de paixões e prazeres, vivendo em malícia e
inveja, odiosos e odiando-nos uns aos outros. Quando, porém, se manifestou a
benignidade de Deus, nosso Salvador, e o seu amor para com todos, não por obras
de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos salvou
mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo” (Tito 3:3-5).
“Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os
publicanos também o mesmo?... Sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai
celeste” (Mat. 5:46, 48).
"O amor não faz o
mau contra o próximo” (Rom. 13:10). Próximo significa todo o que está perto,
logo, o amor estende-se a todo aquele com quem entramos em contato. Só ama
aquele que ama a todos.
Desde que o amor não faz mal ao próximo, o amor cristão (que, como temos visto, é o único amor que existe) não admite guerras e lutas. Quando os soldados perguntaram a João Batista que teriam de fazer para serem seguidores do Cordeiro de Deus, respondeu: “A ninguém maltrateis” (Luc. 3:14). Quantas guerras poderiam ser evitadas com isso. Se um exército estivesse composto de cristãos, de verdadeiros seguidores de Cristo, ao estabelecer contato com o inimigo, em vez do atirar, veriam em que poderiam ajudar-se. “Se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-lhe de beber; porque, fazendo isto, amontoarás brasas vivas sobre a sua cabeça. Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem” (Rom. 12:20 e 21).
10
E vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros, vede não vos consumais também
uns aos outros.
11
Digo, porém: andai em Espírito e não cumprireis a concupiscência da carne.
12
Porque a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e estes
opõem-se um ao outro: para que não façais o que quereis.
13 Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais debaixo da lei.
Seguindo um mau
conselho e tendo abandonado a simplicidade da fé, os gálatas estava se
colocando debaixo da maldição, e estavam em perigo de condenarem-se ao fogo
eterno. “A língua é fogo; é mundo de iniquidade; a língua está situada entre os
membros de nosso corpo, e contamina o corpo inteiro, e não só põe em chamas
toda a carreira da existência humana, como também é posta ela mesma em chamas
pelo inferno” (Tg. 3:6). Se tem feito mais estragos pela língua do que pela
espada, pois esta última não se desembainha sem que haja uma língua turbulenta
por detrás. “Nenhum homem pode domar a língua”, mas Deus sim. Havia feito isso
com os gálatas quando suas bocas pronunciavam bençãos e louvor, mas agora, que
surpreendente mudança! Como resultado do ensino que recentemente estavam
recebendo, eles tinham descido das bênçãos para as contendas. Em vez de
edificarem-se mutuamente, estavam a ponto de devorarem-se.
Quando há disputas na igreja, podemos estar seguros que o evangelho está ali tristemente pervertido. Que ninguém se jacte de sua ortodoxia ou de sua firmeza na fé enquanto abriga uma disposição para a disputa, ou quando se tem o desejo de provocá-la. As disputas e discordâncias são os indicadores de haver-se afastado da fé, se é que a teve em algum momento. Tendo estado justificado pela fé, estamos em paz com Deus, por meio de nosso Senhor Jesus Cristo” (Rom. 5:1). Não estaremos somente em paz com Deus, mas teremos a sua paz. Assim, essa nova “persuasão” que havia levado à contenda, em que devoravam-se uns aos outros com línguas ascendidas no fogo iníquo, não provinha de Deus que os havia chamado ao evangelho. Um único passo errado pode terminar em uma grande divergência. Duas linhas de trem podem parecer, no inicio, paralelas, mas logo começam a divergir insensivelmente até levar, finalmente, a direções opostas. “Um pouco de levedura fermenta toda a massa”. Um pequeno erro, por insignificante que possa parecer, contém o gérmen de toda a maldade. “O que guarda a Lei inteira, e tropeça num único ponto, é culpado de toda ela” (Tg. 2:10). Um único princípio falso acariciado, produzirá a ruína de toda a vida e caráter. As pequenas raposas estão perdendo-se na vinha.
19
Porque as obras da carne são manifestas, as quais são: prostituição, impureza,
lascívia,
20
Idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, pelejas, dissensões,
heresias,
21 Invejas, homicídios, bebedices, glutonarias, e coisas semelhantes a estas, acerca das quais eu vos declaro, como já antes vos disse, que os que cometem tais coisas não herdarão o reino de Deus.
Não é uma lista que dê
prazer ouvir, e mesmo assim, está longe de ser exaustiva, já que o apóstolo
acrescenta: “e coisas semelhantes”. Algo que vale a pena relacionar com a
declaração de que “os que praticam tais coisas não herdarão o Reino de Deus”.
Compare esta lista com a que o Senhor apresenta em Marcos 7:21 até 23, a
respeito das coisas que procedem do interior do homem, do coração. Pertencem ao
homem por natureza. Compare agora ambas as listas com a de Romanos 1:28 a 32,
referida aos atos dos pagãos que não quiseram reconhecer a Deus. De fato, são
as coisas que fazem os que não conhecem ao Senhor.
Examine agora essas listas de pecados comparando com a que Paulo apresenta em II Timóteo 3:1 a 5, enumerando desta vez as obras daqueles que, nos últimos dias, terão somente “aparência de piedade”. É conveniente observar que essas quatro listas são em essência a mesma. Quando os homens se desviam da verdade do evangelho, que é poder de Deus para salvação de todos aqueles que creem, caem inevitavelmente debaixo do poder desses pecados.
“Não há diferença”
Todos os homens
compartilham a mesma carne (1 Cor. 15:39), pois cada habitante da terra é
descendente do mesmo casal: Adão e Eva. “O pecado entrou no mundo por um homem”
(Rom. 5:12), portanto, seja qual for o pecado que exista no mundo, é comum a
toda carne. No plano da salvação “não há diferença entre judeu e grego; já que
um mesmo é Senhor de todos, e é generoso com todos os que o invocam” (Rom.
10:12; 3:21-24). Ninguém na terra pode jactar-se ante outro, nem tem o menor
direito de depreciá-lo por sua condição pecaminosa e degradada. A confirmação
ou o conhecimento do vício aberto em qualquer um, longe de nos fazer sentir-se
bem (por nossa moralidade superior), deveria encher-nos de pesar e vergonha.
Não é mais que uma lembrança da realidade de nossa natureza humana. Os obras
que se mostram naquele assassino, bêbado ou libertino, são simplesmente as
obras de nossa própria carne. A carne que o gênero humano compartilha não
contêm outra inclinação que não seja a das más obras antes descritas.
Algumas das obras da
carne recebem a consideração geral de muito más, ou pelo menos,
inapresentáveis; por outro lado, outras se consideram comumente por pecados
veniais, quando não declaradas virtudes. Lembre-se da expressão: “e coisas
semelhantes” que indicam que todas as coisas enumeradas são essencialmente
idênticas. A Escritura declara que o ódio é assassinato. “Todo o que odeia seu irmão
é homicida” (1 João 3:15). Até mesmo a raiva é igualmente assassinato, como
mostram as palavras do Salvador em Mateus 5:21 e 22. A inveja, que é tão comum,
contém igualmente o assassinato. Mas quem considera a inveja como algo
pecaminoso? Longe de considerá-la como extremamente pecaminosa, nossa sociedade
a fomenta. Mas a Palavra de Deus nos assegura que é algo da mesma classe que o
adultério, fornicação, assassinato e embriaguez, e que os que fazem tais coisas
não herdarão o Reino de Deus. Acaso não é algo terrível?
O amor a si próprio, o desejo de supremacia, são a fonte de todos os outros pecados que foram mencionados. Neles se tem originado incontáveis crimes. As obras abomináveis da carne estão onde menos se poderia suspeitar. Se encontram onde há carne humana, e se manifestam de uma ou outra maneira sempre que essa carne não esteja crucificada. “O pecado está à porta” (Gên. 4:7).
O conflito entre a
carne e o Espírito
A carne não tem nada em
comum com o Espírito de Deus. “Se opõem entre si”; quer dizer, agem com o
antagonismo próprio de dois inimigos. Cada um deles procura a oportunidade de
vencer ao outro. A carne é corrupção. Não pode herdar o Reino de Deus, desde
que a corrupção não herda o incorrupção (1 Cor. 15:50). É impossível que a
carne se converta. Deve ser crucificada. “a inclinação da carne é inimizade
contra Deus, pois não é sujeita à Lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser.
Assim, os que vivem segundo a carne não podem agradar a Deus” (Rom. 8:7 e 8).
Aqui está a explicação
do retrocesso dos gálatas e do problema que aflige a tantas vidas cristãs. Os
gálatas haviam começado no Espírito, mas agora procuravam alcançar a perfeição
pela carne (Gál. 3:3). Algo tão impossível quanto chegar às estrelas cavando
galerias no solo. Deste mesmo modo, muitos tentam fazer o bem; mas porque ainda
não se renderam decidida e plenamente ao Espírito, não podem operar como
gostariam. O Espírito combate com eles, e obtém um controle relativo. Até mesmo
em algumas ocasiões se rendem plenamente ao Espírito, o que lhes trás uma
rica experiência. Mas então enfrentam ao Espírito, é a carne tomando o
controle, e parecem ser outras pessoas. As vezes se rendem à mente do Espírito,
e às vezes à da carne (Rom. 8:6); e deste modo, sendo de ânimo fraco, são
inconstantes em todos os seus caminhos (Tg. 1:8). Esta é uma situação por
demais insatisfatória.
O Espírito e a lei
"Pois se sois
guiados pelo Espírito, não estais debaixo da lei” (Gál. 5:18). Sabemos que a
lei é espiritual, mas eu sou carnal, vendido ao poder do pecado” (Rom. 7:14). A
carne e o Espírito mantém antagonismo; mas contra os frutos do Espírito, “não
há lei” (Gál. 5:22 e 23). Então, a lei está contra as obras da carne. A mente
carnal “não se sujeita à Lei de Deus”, então, os que estão na carne não podem agradar
a Deus, pois estão debaixo da lei”. Isso demonstra claramente que estar
“debaixo da lei” é ser um transgressor dela. “A Lei é espiritual”; portanto, os
que são guiados pelo Espírito estão em plena harmonia com a lei, de forma que
não estão debaixo dela.
Vemos uma vez mais que
a controvérsia não consistiu em se era necessário guardar ou não a lei, mas em como
se devia guardá-la. Os gálatas estavam deixando se levar pelo ensino lisonjeiro
de que teriam o poder para alcançar por eles mesmos, enquanto o apóstolo
divinamente nomeado enfatizava energicamente que a podemos guardar somente por
meio do Espírito. Mostrou pelas Escrituras a história de Abraão, e também a
partir da própria experiência dos gálatas. Haviam começado no Espírito, e
enquanto continuavam nele, corriam bem. Mas quando substituíram o Espírito por
eles mesmos, imediatamente começaram a manifestar obras contrárias a lei.
O Espírito Santo é a
vida de Deus; Deus é amor; o amor é o cumprimento da lei; a lei é espiritual.
Então, todo aquele que é espiritual, há de submeter-se a justiça de Deus. Se
trata de justiça “testificada pela lei” (Rom. 3:21), mas só obtida pela fé de
Jesus Cristo fé. O que é guiado pelo Espírito guardará a lei, não como uma
condição para receber o Espírito, mas como um resultado de havê-lo recebido.
Conhecemos algumas pessoas que professam serem espirituais. Se sentem tão plenamente guiadas pelo Espírito, que acreditam não precisar guardar a lei. Admitem não guardá-la, mas acreditam que seja o Espírito que conduz a isto. Então – dizem –, não pode tratar-se de pecado, embora esteja em oposição com a lei. O tais cometem o erro fatal de substituir a mente do Espírito por sua própria mente carnal. Confundem a carne com o Espírito e se colocam no lugar de Deus. Falar contra a lei de Deus é falar contra o Espírito. Sua cegueira é enorme, e bem podem orar: “Abre meus olhos, para que possa ver as maravilhas de sua Lei” (Sal. 119:18).
22
Mas o fruto do Espírito é: caridade, gozo, paz, longanimidade, benignidade,
bondade, fé, mansidão, temperança.
23 Contra estas coisas não há lei.
A primeiro fruto do
Espírito é o amor, e o amor é o cumprimento da Lei” (Rom. 13:10). Seguem o gozo
e a paz, posto que “havendo sido justificados pela fé, estamos em paz com
Deus”. “E não apenas isto, mas também nos gloriamos em Deus por nosso Senhor
Jesus Cristo” (Rom. 5:1, 11). Cristo recebeu a unção do Espírito Santo (Atos
10:38), ou, como lemos em outro lugar, “com óleo de felicidade” (Heb. 1:9). O
serviço para Deus é um serviço alegre. O Reino de Deus é “justiça, paz e
alegria pelo Espírito Santo” (Rom. 14:17). Aquele que não se alegra na
adversidade, como fazia na prosperidade, é porque ainda não conhece ao Senhor
como deveria. As palavras de Cristo levam à alegria completa (João 15:11).
O amor, a alegria, a paz, tolerância, paciência, generosidade, fidelidade, cortesia, domínio próprio, brotarão espontaneamente do coração do verdadeiro seguidor de Cristo. Ninguém poderá obtê-los pela força. Mas não moram em nós de forma natural. Ante uma situação exasperante, o que nos é natural é a ira e a irritação, não a amabilidade e a resignação. Note o contraste entre os obras da carne e o fruto do Espírito: as primeiras vêm de forma natural, porém, para que se produza o bom fruto, devemos estar convertidos inteiramente em novas criaturas: “homem bom, do bom tesouro do coração tira o bem” (Luc. 6:45). A bondade não procede de homem algum, mas do Espírito de Cristo ao habitar permanentemente no homem.
24
E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e
concupiscências.
Nosso velho homem foi crucificado junto com ele, de forma que o corpo do pecado seja destruído, afim de que não sejamos mais escravos do pecado. Porque o que está morto, está livre do pecado (Rom. 6:6 e 7). “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim” (Gál. 2:20). Essa é a experiência de todo verdadeiro filho de Deus. “Se alguém está em Cristo, é nova criatura” (2 Cor. 5:17). Vive porém em carne de acordo com a aparência externa, mas não vive mais de acordo com a carne mas sim de acordo com o Espírito (Rom. 8:9). Vive em carne uma vida que não é carnal, e a carne não tem poder sobre ele. Com relação às obras da carne, está morto: “Se, porém, Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito é vida, por causa da justiça” (Rom. 8:10).
25 Se
vivemos em Espírito, andemos também em Espírito.
26 Não sejamos cobiçosos de vanglórias, irritando-nos uns aos outros, invejando-nos uns dos outros.
Há aqui alguma dúvida
de que Paulo acreditava que o cristão vive no Espírito? Não. Não há nenhuma
sombra de dúvida. Considerando que vivemos no Espírito, deveríamos submeter-nos
ao Espírito. É somente pelo poder do Espírito – o mesmo Espírito que no
principio se movia sobre a face do abismo e estabeleceu a ordem a partir dos
caos – que toda a pessoa pode viver. “O Espírito de Deus me fez, e o sopro do
Todo-Poderoso me dá vida.” (Jó 33:4). O mesmo Espírito fez os céus (Sal. 33:6).
O Espírito de Deus é a vida do universo. É a eterna presença de Deus, na qual
“vivemos, e nos movemos, e existimos” (Atos 17:28). Dependemos do Espírito para
a vida; portanto, deveríamos andar nEle, e ser guiados por Ele. Tal é nosso
“culto racional” (Rom. 12:1).
Que maravilhosa vida é
colocada ao nosso alcance! Viver em carne, como se a carne fosse espírito. “Se
há corpo natural, há também corpo espiritual”. “Mas não é primeiro o
espiritual, e sim o natural; depois, o espiritual” (1 Cor. 15:44, 46). O corpo
natural é o que temos agora. O espiritual receberão todos os verdadeiros
seguidores de Cristo na ressurreição (1 Cor. 15:42-44; 50-53). Não obstante,
nesta vida, no corpo natural, o homem deve ser espiritual: têm que viver igual
ao seu corpo espiritual futuro. “Vós não viveis de acordo com a carne, mas de
acordo com o Espírito, se é que o Espírito do Senhor habita em vós” (Rom. 8:9).
“O que nasce da carne,
é carne; e o que nasce do Espírito, é espírito” (João 3:6). Para o nascimento
natural herdamos todos os males enumerados neste quinto capítulo de Gálatas, “e
coisas semelhantes”. Somos carnais. Em nós governa a corrupção. Por meio do
novo nascimento herdamos a plenitude de Deus, vindo “a ser participantes da
natureza divina, depois de ter escapado da corrupção que há no mundo por causa
da concupiscência” (2 Ped. 1:4). O “homem velho, corrompido por seus enganosos
desejos” (Efe. 4:22), é crucificado “para que o corpo do pecado seja destruído,
de forma que não sejamos mais escravos do pecado” (Rom. 6:6).
Permanecendo no
Espírito, andando no Espírito, a carne com suas concupiscências não tem mais
poder sobre nós do que teria se realmente estivéssemos mortos e enterrados. É
só o Espírito de Deus quem dá vida ao corpo. O Espírito usa a carne como um
instrumento de justiça. A carne continua sendo corruptível, continua estando
cheia de maus desejos, sempre disposta a rebelar-se contra o Espírito; mas por
tanto tempo quanto submetamos a vontade a Dios, o Espírito mantem a carne em
sujeição. Se vacilamos, se em nosso coração voltamos ao Egito, ou se pusermos a
confiança em nós mesmos, solapando assim nossa dependência do Espírito, então
reedificamos aquilo que tínhamos destruído e nos fazemos transgressores (Gál.
2:18). Mas isso não precisa acontecer. Cristo tem “poder sobre toda a carne”
(João 17:2), e demonstrou seu poder para viver uma vida espiritual em carne
humana.
Trata-se do Verbo feito
carne, Deus manifesto em carne, a revelação “desse amor que supera todo o
entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de Deus” (Efe. 3:19).
Estando sob o controle desse Espírito de amor e mansidão, nunca ambicionaremos
a vanglória, provocando e invejando uns aos outros. Tudo virá de Deus, e assim
se reconhecerá, de forma que ninguém terá a mínima disposição de jactar-se
sobre outro.
O Espírito de vida em
Cristo – a vida de Cristo –, é dada gratuitamente a todos. “E quem tem sede,
venha; e quem quiser, tome de graça da água da vida” (Apoc. 22:17). “Porque a
vida que estava com o Pai, se manifestou, e nós a vimos, e vos anunciamos a
vida eterna” (1 João 1:2). “Graças a Deus pelo seu dom inefável!” (2 Cor.
9:15).
Capítulo 6
A GLÓRIA DA CRUZ
É provável que o leitor
apressado chegue à conclusão que existe uma divisão natural entre o quinto e
sexto capítulo, de tal um modo que a última parte se refere a aspectos práticos
da vida espiritual, enquanto o primeiro expõe doutrinas teóricas. É um grande
erro. Nada na Bíblia é mera teoria; tudo é ação. Não há na Bíblia
qualquer coisa que não seja profundamente espiritual e prático. Ao mesmo tempo,
tudo é doutrina. Doutrina significa ensino. O que conhecemos por “Sermão” do
Monte é de fato pura doutrina, já que abrindo sua boca lhes ensinava, dizendo...”
Alguns parecem sentir uma tipo de desprezo pela doutrina. Se referem a ela com
leviandade, como se pertencesse ao reino da teologia especulativa e fixasse um
contraste com o prático e diário. Os tais desonram sem conhecer a pregação de
Cristo, que era pura doutrina, posto que Jesus sempre ensinou às pessoas. Toda
a verdadeira doutrina é intensamente prática; é dado ao homem com o único
propósito de que a ponha em prática.
A confusão precedente
se deve a uma eleição questionável das condições. O que alguns chamam de
doutrina, e que tacham – com razão – de não prática, não é de fato nenhuma
doutrina, mas sim sermão vulgar. Não há no evangelho nenhum lugar para ele.
Nenhum verdadeiro pregador do evangelho dará jamais “um sermão”. Se faz isto é
porque decidiu fazer alguma coisa diferente do que pregar o evangelho durante
algum tempo. Cristo nunca pregou sermões. O que fazia era oferecer doutrina a
seus ouvintes, ensinar-lhes. E “todo aquele que prevarica, e não permanece na
doutrina de Cristo, não tem a Deus. E o que permanece na doutrina de Cristo,
tem o Pai e o Filho” (2 João 9). Assim, o evangelho é todo ele doutrina, é
instrução que vem da vida de Cristo.
A última seção da
epístola revela seu objetivo claramente. É não prover o material apropriado para
a controvérsia, mas pôr um fim, levando os leitores a submeter-se ao
Espírito. O propósito é restabelecer os que estão pecando contra Deus,
enquanto eles tentam serví-lo por seu próprio e defeituoso modo, e os levar a
servi-lo verdadeiramente, em novidade de Espírito. O argumento da seção
precedente da epístola gira ao redor da verificação de que só é possível
escapar das obras da carne (que é pecado), por meio da circuncisão da cruz de
Cristo: servindo a Deus no Espírito, e não pondo a confiança na carne.
1 Irmãos, se alguém algum homem chegar a ser surpreendido nalguma ofensa, vós, que sois espirituais, encaminhai o tal com espírito de mansidão; olhando por ti mesmo, para que não sejas também tentado.
Quando os homens
começam a fazer-se justos a si mesmos, o orgulho, a jactância e o espírito de
crítica os levam à disputa aberta. Aconteceu deste modo aos gálatas, e
acontecerá deste modo sempre. Não poderia ser de outra maneira. Cada indivíduo
tem sua própria concepção da lei, a fim de ser ele mesmo o juiz. Não
pode evitar examinar os irmãos tanto quanto a si e conferir se eles
alcançam a altura devida, de acordo com sua medida. Se seus olhos
críticos descobrem um que não caminha de acordo com a regra, cai imediatamente
sobre o ofensor. Os que estão cheios de justiça própria se levantam em guardar
a seus irmãos até o ponto de mantê-los distante de sua companhia, para não
contaminar-se entrando em contato com eles. Em contraste marcado com este
espírito, tão comum na igreja, achamos a exortação com que o capítulo começa.
Em vez de ir à caça de faltas para condenar, temos que ir em busca de pecadores
para salvar.
Deus disse a Caim: “Se
fizeres certo, não serás aceito? Mas se não trabalhares bem, o pecado está à
porta para dominar-te. Mas tu deves dominá-lo” (Gên. 4:7). O pecado é uma besta
selvagem que se esconde, esperando a menor oportunidade para atacar e vencer ao
descuidado. É mais forte que nós, mas fomos dotados de poder para o dominar.
“Não reine o pecado em vosso corpo mortal” (Rom. 6:12). Porém, é possível (não
necessário) que conquiste até o mais cuidadoso. “Meus filhos, isto lhes escrevo
para que não pequeis. Mas se alguém pecar, temos advogado perante o Pai,
Jesus Cristo o Justo. Ele é a vítima por nossos pecados. E não só pelos nossos,
mas também pelos do mundo inteiro” (1 João 2:1 e 2). Deste modo, embora a
pessoa possa tropeçar, é restabelecida; não é rejeitada.
O Senhor apresenta o
trabalho por meio do pastor que procura a ovelha que se perdeu. O
trabalho do evangelho tem uma natureza individual. Até mesmo pela pregação do
evangelho milhares podem aceitá-lo em um só dia, o sucesso depende de seu
efeito no coração de cada pessoa. Quando o pregador que fala a milhares chega
individualmente a cada um deles, está fazendo o trabalho de Cristo. Deste modo,
se alguém cai em uma falta, restabeleça-o com espírito de mansidão. Não há
tempo que possa ser tão precioso, embora se considere desperdiçado, que o
dedicado para salvar ainda que uma única pessoa. Algumas das verdades mais
importantes e gloriosas das Escrituras, foram comunicadas por Cristo a uma
única alma. O que se esforça procurando a ovelha solitária do rebanho, é um bom
pastor.
"Deus estava em
Cristo reconciliando consigo o mundo, e não atribuindo aos homens seus pecados.
E nos encarregou a palavra da reconciliação” (2 Cor. 5:19). “Ele mesmo levou
nossos pecados em seu corpo sobre o madeiro” (1 Ped. 2:24). Não nos imputou
nossos pecados, mas o levou todos eles em si mesmo. “A calma aplaca a ira”
(Prov. 15:1). Cristo vem a nós com palavras de carinho para ganhar nosso
coração. Nos chama para que nos acheguemos a Ele e achemos descanso, de forma
que trocamos nosso jugo amargo de escravidão para o jugo fácil de sua carga
leve.
Todos os cristãos são um em Cristo, o Representante do homem. Então, “como ele é, assim somos nós neste mundo” (1 João 4:17). Cristo estava neste mundo como um exemplo do que os homens deveriam ser, e do que os verdadeiros seguidores são quando se consagram a Ele. Diz aos seus discípulos: “Como me enviou o Pai, igualmente eu também vos envio” (João 20:21). É com este objetivo que os reveste de seu próprio poder por meio do Espírito. “Deus não enviou seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo fosse salvo por ele” (João 3:17). Então, não nos envia a condenar, mas a salvar. Daí a repreensão: “Se alguém tem caído em alguma falta... restaurai-o”. O âmbito da exortação não se reduz aos que nos associamos na igreja. Nos envia como embaixadores de Cristo de forma que roguemos a todo homem que se reconcilie com Deus (2 Cor. 5:20). Nenhuma outra ocupação no céu ou na terra comporta uma honra maior que a de ser embaixador de Cristo, e é de fato essa tarefa que é dada até ao mais insignificante e rejeitado pecador que se reconcilia com Deus.
" Vós que sois espirituais”
Só para estes é
recomendada a restauração dos que caíram. Nenhum outro pode fazer isto.
O Espírito Santo há de falar por meio dos que têm que repreender e corrigir. É
o mesmo trabalho de Cristo, e é somente pelo poder do Espírito que alguém pode
ser sua testemunha.
Mas isto, talvez, não
seja um ato da maior presunção, que alguém possa restabelecer um irmão? Não
equivale pretender que esse alguém é espiritual?
Verdadeiramente não é
uma questão banal o estar em lugar de Cristo, perante o homem caído. O plano de
Deus é que cada um se cuide: “Cuidando para que você também não seja tentado”.
A regra que aqui é exposta é calculada para produzir um reavivamento na igreja.
Assim que alguém caia em alguma falta, o dever de cada um não é ir espalhar a notícia,
nem mesmo ir diretamente para o que caiu, mas perguntar-se à si mesmo: 'Como
estou eu? Qual é minha situação? Acaso não sou culpado, se não da mesma falta,
talvez de alguma outra igualmente reprovável? Não poderia ser que alguma falta
em mim haja levado à sua falta? Estou andando no Espírito, de forma que possa
reestabelecê-lo, em vez de afastá-lo ainda mais?' Isso resultaria em uma
reforma completa na igreja, e bem poderia acontecer que quando os demais
houvessem chegado à condição na qual possam ir ao que caiu, este tenha já
escapado da armadilha do diabo.
Com relação à forma de
tentar ao que caiu em transgressão (Mat. 18:15-18), Jesus disse: “Eu asseguro
que tudo aquilo que ligares na terra, terá sido ligado no céu; e tudo aquilo
que desligares na terra, será desligado no céu” (vers. 18). Significa que Deus
se submete a qualquer decisão que uma reunião de crentes, que se considere sua
igreja, possa tomar? Certamente que não. Nada que seja feito na terra pode
mudar a vontade de Deus. A história da igreja nos dois mil anos passados, é um
monte de erros e absurdos, uma carreira de exaltação própria e de pôr o eu no
lugar de Deus.
Que quis dizer então Cristo com isso? Exatamente o que disse. Que a igreja tem que ser espiritual, cheia do espírito de mansidão; e que cada um, quando falando, tem que fazê-lo como porta-voz de Deus. Apenas palavra de Cristo deve estar no coração e na boca daquele que tenha de tratar com o transgressor. Quando assim acontece, dado que a palavra de Deus sempre é estabelecida nos céus, resulta que tudo aquilo que você ligar na terra “terá sido ligado no céu”. Mas isso não acontecerá a menos que seja seguindo a Escritura estritamente, na letra e no espírito.
2 Levai as cargas uns dos outros e, assim, cumprireis a lei de Cristo.
A “Lei de Cristo” se
cumpre quando cada um leva a carga do outro, como a lei da vida de Cristo é
levar cargas. “Levou ele mesmo nossas enfermidades, e carregou nossas doenças”.
Todo aquele que queira cumprir sua lei há de continuar a mesma obra em favor
dos cansados e abatidos.
"Pelo que convinha
que em tudo fosse semelhante aos irmãos... Porque naquilo que ele mesmo, sendo
tentado, padeceu, pode socorrer aos que são tentados” (Heb. 2:17 e 18). Ele
sabe o que é ser tentado penosamente, e sabe também como vencer. Ainda que “não
conheceu pecado”, foi feito pecado por nós de forma que nos pode fazer justiça
de Deus nEle (2 Cor. 5:21). Tomou cada um dos nossos pecados e os apresentou
perante Deus como se fossem seus.
E é assim que vem a
nós. Em vez de nos recriminar por nossos pecados, nos abre o coração e nos faz
saber quanto sofreu com a mesma angústia, dor, pena e vergonha. Ganha com isto
nossa confiança. Sabendo que Ele passou pela mesma experiência, que esteve
prostrado nas mesmas dificuldades, prepara-nos para o ouvir quando nos
apresenta a via de escape. Sabemos que fala por experiência.
Portanto, o mais
importante ao resgatar pecadores, é mostrar que somos um com eles. É mostrando
nossas próprias faltas que salvamos a outro. O que se sente sem pecado, não é
certamente o que poderá restabelecer o pecador. Se você diz a alguém que caiu
em transgressão: 'Como você pôde fazer uma coisa destas? Eu nunca fiz qualquer
coisa semelhança em toda minha vida! Eu não entendo como alguém com o mínimo de
respeito próprio pôde cair nisso!', se você fala deste modo a ele, você teria
feito melhor ficando em casa. Deus escolheu um fariseu, e só a um, para ser seu
apóstolo. E não foi enviado até não ter-se reconhecido como o principal entre
os pecadores.
É humilhante confessar o pecado, mas o caminho da salvação é o caminho da cruz. É só mediante a cruz que Cristo pode ser o Salvador dos pecadores. Então, se temos que compartilhar a alegria, temos que também sofrer a cruz com Ele “menosprezando a vergonha”. Lembre-se: É somente confessando nossos próprios pecados que podemos salvar a outros de seus próprios pecados. Só assim podemos lhes mostrar o caminho da salvação. O que confessa seus pecados é o único que obtém purificação deles, podendo assim dirigir outros à Fonte.
3
Porque, se alguém cuida ser alguma coisa, não sendo nada, engana-se a si mesmo.
4 Mas prove cada um a sua própria obra, e terá gloria apenas em si mesmo, e não noutro.
Note as palavras: “não
sendo nada”. Não diz que nós não deveríamos acreditar tanto em algo que não
tenhamos chegado a ser. Pelo contrário, é a verificação plena de um fato: que
nós não somos nada. Não só um único indivíduo; também todas as nações
reunidas, são nada perante o Senhor. Sempre que acreditamos que somos algo,
estaremos nos enganando a nós mesmos. E fazemos frequentemente isto, em
detrimento do trabalho do Senhor.
Você se lembra da “Lei de Cristo”? Embora Ele tudo fosse, “se despojou de si mesmo” de forma que pudesse ser feita a vontade de Deus. “O servo não é maior que o seu senhor” (João 13:16). Só Deus é grande. “Certamente é vaidade completa todo o homem que vive” (Sal. 39:5). Deus sempre é verdadeiro, embora “todo homem seja mentiroso” (Rom. 3:4). Quando reconhecemos o anterior, e vivemos conscientes dele, nos colocamos na situação na qual o Espírito Santo pode alcançar-nos, tornando possível que Deus trabalhe por nós. O “homem de pecado” é quem se exalta (2 Tes. 2:3 e 4). O filho de Deus é o que se humilha.
5 Porque cada qual levará a sua própria carga.
Se contradiz o
versículo dois? De modo nenhum. A Escritura nos fala que levemos cada um a
carga do outro, não que lancemos as nossas neles!” “Lança sobre o Eterno tua
carga" (Sal 55:22). Cada um tem que pôr a carga sobre o Senhor. Ele leva a
carga da humanidade inteira, não em massa, mas individualmente. Não colocamos
nossas cargas nEle, juntando em nossas mãos ou em nossa mente, e os lançando
para Alguém distante de nós. Deste modo é impossível. Muitos tem procurado
desta forma ser libertado de sua carga de pecado, dor, angústia e castigo, sem
conseguir. Voltavam a senti-la pairando cada vez mais pesada sobre eles, até
deixa-los às portas do desespero. Onde estava o problema? Olharam a Cristo como
alguém distante, e pensaram que correspondia a eles estender a ponte sobre o
abismo. Mas isso não é possível. O homem (quando ainda éramos fracos) não pode
tirar de si a carga, nem na distância pequena dos próprios braços. Por muito
tempo mantivemos o Senhor afastado, embora só na longitude de nossos braços,
privando-nos do descanso da pesada carga. É somente quando reconhecemos e
confessamos que nada somos, e desaparecendo em nossa insignificância – deixando
de nos enganarmos a nós mesmos –, é então quando Lhe permitimos levar nossa
carga. Cristo
sabe como manejá-la. E levando seu
jugo, aprendemos dEle como levar as cargas de outros.
O que há, então, no
propósito de levar nossa própria carga? É “o poder que opera em nós” que a
leva! ”Com Cristo estou crucificado, e já não vivo eu, mas Cristo vive em mim”
(Gál. 2:20). Trata-se de mim; mas não eu, se não Ele.
Aprendi o segredo! Não
cansarei a qualquer outro fazendo-lhe participante de minha carga pesada, mas
eu mesmo a levarei; mas não eu, e sim, Cristo em mim. Há muitos no mundo que
ainda não aprenderam esta lição de Cristo, todo o filho de Deus achará ocasião
de tomar as cargas de algum outro. A sua própria, confiará ao Senhor. Não é
maravilhoso que “aquele que é poderoso” leve sempre nossa carga?
Aprendemos essa lição
na vida de Cristo. Andava fazendo o bem porque Deus estava com Ele. Consolou
aos tristes, curou os de coração quebrantado, libertou os que foram oprimidos
pelo diabo. Nem um só dos que foram a Ele levando seus sofrimentos e
enfermidades saíram sem alívio. “Assim se cumpriu o que disse o profeta Isaías:
‘Ele mesmo tomou nossas enfermidades e levou nossas dores’ ” (Mat. 8:17).
E depois, quando à
noite as multidões se colocavam no leito, Jesus procurava as montanhas ou a
floresta, para que em comunhão com o Pai (para quem vivia) pudesse obter
provisão renovada de vida e força para sua própria alma. “Cada um examine seu
próprio trabalho”. “Examinai-vos a vós mesmos, se permaneceis na fé;
provai-vos a vós mesmos. Ou não sabeis quanto a vós mesmos, que Jesus Cristo
está em vós? Se não é que já estais reprovados” (2 Cor. 13:5). “Porque embora
crucificado em fraqueza, vive pelo poder de Deus. Também nós somos fracos, mas
pelo poder de Deus, viveremos com ele pelo poder de Deus em vós” (vers. 4).
Deste modo, se nossa fé prova que Cristo está em nós (e a fé demonstra a
realidade do fato), teremos do que nos alegrar perante nós, e não ante outro.
Nos alegramos em Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo, e nosso gozo não
depende de qualquer outra pessoa no mundo. Mesmo que todos desanimem e caiam,
resistiremos, uma vez que “o fundamento de Deus permanece firme” (2 Tim. 2:19).
Então, que ninguém que se tem por cristão conforme-se em apoiar-se em algum outro. Embora sejas o mais fraco entre o fracos, sempre sejas um carregador de cargas, um obreiro juntamente com Deus, levando em Cristo sua própria carga e a de seu próximo, sem reclamações nem impaciência. Pode inclusive descobrir algumas das cargas pelas que seu irmão não expresse lamento algum, e também levá-las. E a mesma coisa pode fazer o outro. O fraco então, se regozijará assim: “Minha força e minha canção é o Eterno, o Senhor, que tem sido minha salvação” (Isa. 12:2).
6 E o que é instruído na palavra reparta de todos os seus bens com aquele que o instrui.
Sem dúvida alguma isso
se refere principalmente aos recursos temporais. Se um homem se dedica
inteiramente ao ministério da Palavra, é evidente que as coisas necessárias
para sua manutenção devem vir daqueles a quem ensina. Agora então, o
significado da exortação não se esgota aí. Quem recebe instrução na Palavra, deve
compartilhar com o instrutor “em todas as coisas boas”. O tópico do capítulo
presente é a ajuda mútua. “Levando cada um as cargas do outro”. Também aquele
que instrui aos demais, e recebe deles o alimento material, tem que usar o
dinheiro para assistir outros. Cristo e os apóstolos, que não possuíam nada –
posto que Cristo era o mais pobre entre o pobres - e os discípulos, tinham
deixado tudo para o seguir –, assistiram aos pobres com seus recursos
minúsculos (João 13:29).
Quando os discípulos
propuseram a Jesus que despedisse as multidões de forma que elas mesmas
pudessem se prover, Ele respondeu: “Eles não precisam partir. Dai-lhes vós de
comer” (Mat. 14:16). Jesus não estava brincando. Quis dizer o que disse de
fato. Sabia que os discípulos não tinham nada que dar às pessoas, mas tinham
tanto quanto Ele tinha. Eles não entenderam o poder das palavras, então,
Ele mesmo tomou os pãezinhos e os deu aos discípulos, de forma que eles
deram de comer aos famintos. Mas as palavras que lhes dirigiu significam que
deveriam fazer exatamente como Ele. Quantas vezes nossa falta de fé na palavra
de Cristo nos privou de trabalhar o bem e compartilhar o que temos. E é uma
pena, porque “tais sacrifícios agradam a Deus” (Heb. 13:16).
Visto que quem ensina não somente compartilha a Palavra, mas também coopera com o apoio material; de um mesmo modo, os que recebem o ensino da palavra não deveriam limitar a liberalidade somente para as coisas temporárias. É um erro a suposição que os ministros do evangelho não estão nunca em necessidade de refrigério espiritual, ou que eles não podem receber isto até do mais fraco no rebanho. É impossível descrever até que ponto provêem encorajamento para a alma do instrutor os testemunhos de gozo e fé no Senhor dado pelos que recebem a Palavra. Não se trata de simples verificação que seu trabalho não foi em vão. Pode muito bem ser que o testemunho não contenha referências imediatas ao que foi dado, mas o alegre e humilde testemunho do que Deus tem feito pelo ouvinte, influenciará positivamente o instrutor, e frequentemente redundará no fortalecimento de centenas de almas.
7 Não
erreis: Deus não se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso
também ceifará.
8 Porque o que semeia na sua carne, da carne ceifará corrupção; mas o que semeia no Espírito, do Espírito ceifará a vida eterna.
Não é possível
expressar com mais clareza essa declaração de princípios. A colheita, que será
feita no fim do mundo, revelará se a semente era trigo ou joio (discórdia).
“Semeai para vós segundo a justiça, colhei conforme o amor, preparai para vós
um terreno novo: é tempo de procurar a Iahweh, até que ele venha e faça chover
a justiça sobre vós” (Oséias 10:12, Bíblia de Jerusalém). “O que confia
em seu próprio coração é louco” (Prov. 28:26). A mesma coisa é necessária
dizer de quem confia em outros homens, como se deduz do verso 13 de Oséias 10:
“Arastes impiedade, colhestes iniquidade. Tú comerás o fruto da mentira, porque
confiaste em tua própria força, na multidão de seus próprios guerreiros”. “Maldito
o que confia no homem, e que se apoia na carne”, seja a sua própria ou de algum
outro homem. “Bendito o que confia no Eterno, e põe sua esperança nEle” (Jer.
17:5, 7).
Todo o que perdura vem
do Espírito. A carne está corrompida, e é fonte de corrupção. Quem consulta
nada mais que sua própria conveniência, obedecendo aos desejos da carne e da
mente, apanhará uma colheita de corrupção e morte. “O espírito é vida por causa
da justiça” (Rom. 8:10, Bíblia de Jerusalém), e o que consulta só a
mente do Espírito, colherá eterna glória. “Se vives conforme a carne,
morrereis. Mas se pelo Espírito deres morte às obras da carne, vivereis” (Rom.
8:13). Maravilhoso! Se vivemos, morremos; e se morremos, vivemos. Este é
testemunho de Jesus: “O que quiser salvar sua vida, a perderá; e o que perde
sua vida por causa de mim, a achará” (Mat. 16:25).
Isso não equivale a
perda da alegria no presente. Não implica contínua depravação e penúria, a
carência de algo que desejamos, com o propósito de obter outra coisa. Não significa
que a existência presente deva ser uma morte em vida, uma agonia lenta. Longe
disto! Isso é uma concepção errônea e falsa da vida cristã: uma vida que mais
seria chamar morte. Não; todo o que vem a Cristo e bebe do Espírito, tem “nele
uma fonte de água, que brota para a vida eterna” (João 4:14). A alegria da
eternidade é agora dele. Seu gozo é completo dia após dia. É “plenamente
saciado da plenitude de sua casa” (Sal. 36:8), bebendo do manancial do próprio
deleite de Deus. Possui tudo, aquele que deseja, uma vez que o coração clama
somente por Deus, e em quem mora toda a plenitude. Uma vez acreditara estar
descobrindo a vida, mas agora sabe que de fato não estava fazendo mais que
olhar para a tumba, para o sepulcro da corrupção. Agora é quando realmente
começa a viver, e a alegria da nova vida é inefável e gloriosa”, de forma que
canta:
A terna voz do
Salvador
(P. Castro,
#124)
Um exército sagaz
sempre tenta bater as posições inimigas de maior valor estratégico. Deste modo
se esconde uma promessa significativa para os crentes, Satanás a distorce,
transformando-a em motivo de desânimo. Muitos podem querer pretender que a
palavra “O que semeia para sua carne, da carne colherá corrupção”, significa
que, até mesmo depois de ter nascido do Espírito, devem continuar sofrendo as
consequências de sua vida anterior de pecado. Alguns acabam supondo que até
mesmo na eternidade eles levarão as cicatrizes dos pecados antigos e
lamentando-se em palavras como estas: ‘Nunca poderei ser o que deveria ter sido
se nunca tivesse pecado’.
Que calúnia da graça de
Deus, e da redenção em Cristo Jesus! Não é essa a liberdade na qual Cristo nos
faz livres. A exortação diz: “Como também você oferecia seus membros a
impurezas e a iniquidade, apresente agora vossos membros para servir a justiça
que conduz à santidade” (Rom. 6:19). Se o que sofre de tal modo a justiça,
sempre deve estar limitado por causa dos hábitos ruins do passado, seria
demonstrado que o poder da justiça é inferior ao do pecado. Mas a graça de Deus
é tão poderosa quanto os céus.
Imagine alguém que foi
condenado a prisão perpétua por seus crimes. Depois de ter ficado alguns anos
na prisão, é perdoado e posto em liberdade. Algum tempo depois o encontramos, e
descobrimos uma bola de ferro de trinta quilos algemada a seu tornozelo por
meio de uma corrente espessa, de forma que só a duras penas pode rastejar de um
lugar para outro. ‘Como? O que significa isto?’, – lhe perguntamos surpresos.
‘Não te permitiram partir livre?’.
‘Oh sim!’, nos
responde, ‘Sou livre, mas tenho que levar esta bola como lembrança de meus
crimes passados”.
Toda pregação
inspirada pelo Espírito Santo é uma promessa de Deus. Uma delas, transbordando
de graça, é esta: “Não te lembres dos pecados da minha mocidade, nem das
minhas transgressões: mas, segundo a tua misericórdia, lembra-te de mim, por
tua bondade, Senhor” (Sal. 25:7).
Quando Deus
perdoa e esquece nossos pecados, nos proporciona um poder tal para escapar
deles, que venhamos a ser como se nunca houvéssemos pecado. Mediante as
“preciosas e grandíssimas promessas”, que nos tem dado, faz que “cheguemos a
participar da natureza divina, e nos livremos da corrupção que está no mundo
por causa dos maus desejos” (2 Ped. 1:4). O homem caiu quando comeu da árvore
do conhecimento do bem e do mal. O evangelho apresenta uma tal redenção da raça
caída, que todas as negras memórias do pecado são apagadas. Os redimidos
acabarão sabendo só o bem, com Cristo, que “não conheceu pecado”.
Os que semeiam para a carne, da carne colherão corrupção, como todos nós tivemos a ocasião de verificar pessoalmente. “Mas vós não viveis de acordo com a carne, mas de acordo com o Espírito, se é que o Espírito de Deus habita em vós” (Rom. 8:9). O Espírito tem poder para nos liberar do poder da carne, e de todas as suas consequências. “Cristo amou a igreja, e se entregou a si mesmo por ela, para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela Palavra, para apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mancha nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível” (Efe. 5:25-27). “Por suas feridas fomos sarados”. A memória do pecado, não dos pecados individuais, persistirá pela eternidade nas cicatrizes das mãos, nos pés e no lado de Cristo. Constituem o selo de nossa perfeita redenção.
9 E não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecidos.
Nos cansamos muito
facilmente de fazer o bem, quando não olhamos à Jesus. Perdemos o descanso,
porque imaginamos que a prática contínua do bem deveria ser extenuante. Mas
isso só é assim porque não temos compreendido plenamente a alegria do Senhor, a
força que nos impede desfalecer. “Os que esperam no Eterno terão forças novas,
erguerão o vôo como águias; correrão, e não se cansarão; caminharão, e não se
cansarão (Isa. 40:31).
Da mesma maneira que
mostra o contexto, o tópico principal simplesmente não é o resistir à tentação
em nossa própria carne, mas ajudar a outros. Precisamos neste ponto aprender a
lição de Cristo, que “não se cansará nem desmaiará, até que estabeleça a
justiça na terra” (Isa. 42:4). Embora muitos dos que curou nunca demonstraram o
mínimo agradecimento, isto não o fez mudar em qualquer coisa. Veio fazer o bem,
não para oferecer-se a avaliação dos outros. Então, “de manhã, semeies a tua
semente, e a tarde não permitas descansar sua mão; porque não sabes o que é
melhor, se isto ou aquilo, ou se as duas coisas são boas” (Ecl. 11:6).
Não é determinado saber
quanto recolheremos nós, nem qual será a semeadura a partir da qual
colheremos. Uma parte dela pode ter caído a beira do caminho e sendo arrebatada
antes de poder lançar raízes; outra pode cair em terra pedregosa e pode secar;
e até mesmo outra pode cair entre espinhos, sendo sufocada. Mas uma coisa é
certa: colheremos! Não sabemos se prosperará a semeadura de amanhã, ou o que
fez pela tarde, ou se ambos o farão. Mas não existe a possibilidade que ambas
fracassem. Ou prosperará uma, ou outra... Ou ambas!
Isso não é incentivo suficiente para não cansarmos de fazer o bem? A terra pode parecer pobre, e a estação pouco promissora. Os piores pronunciamentos podem ser dados para a colheita, e podemos ser tentados a pensar que todo nosso trabalho foi em vão. Mas NÃO é assim. “No momento certo colheremos”. “Deste modo, meus irmãos amados, estai firmes e constantes, abundando sempre no trabalho do Senhor, sabendo que vosso trabalho no Senhor não é em vão” (1 Cor. 15:58).
10 Então, enquanto temos tempo, façamos o bem a todos, mas principalmente aos domésticos da fé.
Isto nos permite
concluir que o apóstolo está se referindo à ajuda material, posto que não faria
sentido lembrar-nos que preguemos a Palavra aos que não são da fé: para eles
especialmente é que é necessário pregar. Mas há uma tendência natural –
entenda-se natural, em oposição com espiritual – que é a de limitar a
benevolência aos que são considerados que ‘o merecem’. Ouvimos muito sobre os
“pobres que não merecem outra coisa”. Mas todos somos indignos até da menor das
bênçãos de Deus; e mesmo assim, nos concede continuamente. “E, se fizerdes bem
aos que vos fazem bem, que recompensa tereis? Também os pecadores fazem o
mesmo. E, se emprestardes àqueles de quem esperais tornar a receber, que
recompensa tereis? Também os pecadores emprestam aos pecadores, para tornarem a
receber outro tanto. Amai pois a vossos inimigos, e fazei bem, e emprestai, sem
nada esperardes, e será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo;
porque Ele é benigno até para com os ingratos e maus” (Luc. 6:33-35).
Deveríamos considerar
fazer o bem a outros como um privilégio alegre, e não como um pesado dever a
evitar se possível. Nunca nos referimos às coisas desagradáveis em termos de
“oportunidades”. Ninguém diz que teve a oportunidade de ferir-se, nem de perder
algum dinheiro. Pelo contrário, dizemos que tivemos a oportunidade para ganhar
alguma soma, ou de ter escapado de perigo que nos ameaçava. Assim é como
devemos considerar a benevolência para com os necessitados.
Mas as oportunidades têm que ser buscadas. Os homens labutam procurando oportunidades para ganhar dinheiro. O apóstolo nos exorta para que busquemos de igual maneira oportunidades para ajudar alguém. Deste modo fez Cristo. “Andava fazendo o bem”. Percorreu o país a pé, buscando oportunidades de fazer algum bem a alguém, e as encontrou. Fez o bem, “porque Deus estava com ele” (Atos 10:38). Seu nome é Emanuel que quer dizer “Deus connosco”. Sendo que Ele está diariamente connosco, até o fim do mundo, Deus também estará connosco, fazendo-nos o bem, de forma que também possamos fazer a outros.
11 Vede com que grandes letras vos escrevi por minha mão.
É possível ver o zelo que inflamava o apóstolo Paulo ao escrever a epístola, pelo fato de que, contrariamente ao seu costume, tomou a pena e começou a escrever a carta, ou parte dela, do próprio punho e letra. Como se pode deduzir do capítulo quatro, Paulo sofria algum problema na visão. Isso o impedia de fazer seu trabalho, ou o teria impedido a não ser pelo poder de Deus que nele morava. Precisou sempre que houvesse alguma pessoa que o assistisse. Alguns tiraram proveito daquela circunstância para escrever cartas espúrias para as igrejas em nome de Paulo, transtornando assim aos irmãos (2 Tes. 2:2). Mas na segunda carta aos Tessalonicenses mostrou-lhes como poderiam saber se uma epístola vinha ou não dele: seja quem for o que escrevesse o corpo da carta, ele mesmo estamparia o saudação e a assinatura, da própria mão. Nesta ocasião, não obstante, a urgência era tal que muito provavelmente escreveu ele mesmo a epístola inteira.
12 Todos os que querem mostrar boa aparência na carne, esses vos obrigam a circuncidar-vos, somente para não serem perseguidos por causa da cruz de Cristo.
É impossível enganar a Deus, e de nada serve enganar a nós mesmos, ou aos outros. “O Eterno não olha o que o homem olha. O homem olha o que está ante seus olhos, mas o Senhor olha o coração” (1 Sam. 16:7). A circuncisão na qual os falsos irmãos quiseram persuadir os gálatas a confiar, significava a justiça própria, em vez da justiça pela fé. Eles só tiveram a lei como “a forma do conhecimento e da verdade” (Rom. 2:20). Com as obras poderiam fazer uma semeadura “conveniente” para a carne; uma semeadura vazia, já que nela não havia nenhuma realidade. Eles poderiam parecer justos sem sofrer perseguição pela cruz de Cristo.
13 Porque nem ainda esses mesmos que se circuncidam guardam a lei; mas querem que vos circuncideis, para se gloriarem na vossa carne.
Não guardaram a lei em absoluto. A carne é oposta à lei do Espírito, e “os que vivem de acordo com a carne não podem agradar a Deus” (Rom. 8:8). Mas tentaram obter conversos para o que eles denominaram “nossa fé”, como muitos chamam às teorias particulares que sustentam. Cristo disse: “Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! Porque percorreis a terra e o mar para fazer um prosélito; e uma vez ganhado, o fazeis duas vezes mais filho do inferno que vós” (Mat. 23:15). Tais mestres se gloriavam na carne de seus “conversos”. Se acontecia que certa quantidade de pessoas se incorporasse à “nossa denominação”, então “houve” um grande “benefício” em comparação ao ano passado, sentem-se felizes. O número e as aparências importam muito aos homens, mas nada a Deus.
14 Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo.
Por que se gloriar na cruz? Porque por meio dela o mundo não é crucificado, e nós somos o mundo. A epístola termina como começou, com a libertação deste “presente século mau”. Só a cruz cumpre essa libertação. A cruz é um símbolo de humilhação. Então, nos gloriamos nela.
Deus é revelado na cruz
“Não se gabe o sábio em
sua sabedoria, nem de sua coragem o valente, nem o rico de sua riqueza” (Jer.
9:23). Por que não deve gabar-se o sábio de sua sabedoria? Porque até onde sua
sabedoria seja a sua própria, é tolice. “A sabedoria deste mundo é
loucura para Deus” (1 Cor. 3:19). Nenhum homem tem sabedoria alguma na qual se
gloriar. A sabedoria que Deus dá, leva à humildade, não para a vaidade.
Que diremos nós do
poder? “Toda a carne é erva” (Isa. 40:6). “Certamente é vaidade completa todo o
homem que vive” (Sal. 39:5). “Os homens são apenas um sopro, tanto o pobre como
o rico. Se fossem pesados todos juntos na balança, pesariam menos que um
sopro”. Mas “de Deus é o poder” (Sal. 62:9, 11).
Como para a riqueza,
esperar nelas é “incerteza” (1 Tim. 6:17). “O homem labuta em vão; empilha
riqueza, sem saber para quem” (Sal. 39:6). “Hás de pôr teus olhos na riqueza,
que não são nada? Porque criaram asas de águias, e voarão ao céu” (Prov. 23:5).
Só em Cristo há riquezas inescrutáveis e eternas.
Então, o homem não tem
absolutamente nada de que orgulhar-se. O que é do homem que carece de toda a
riqueza, sabedoria e poder? Tudo aquilo que o homem é ou tem, vem do Senhor. É
por isto para que “o que se gloria, glorie-se no Senhor” (1 Cor. 1:31).
Relacione o versículo
anterior com Gálatas 6:14. O mesmo Espírito inspirou ambas as passagens, assim
não podem estar em contradição mútua. Em um lugar lemos que temos que nos
gloriar só no conhecimento do Senhor. No outro que não há nada que se gloriar,
exceto na cruz de Cristo. Então, a conclusão é que na cruz de Cristo achamos o
conhecimento de Deus. Conhecer a Deus é vida eterna (João 17:3), e não há
nenhuma vida para o homem fora da cruz de Cristo. Vemos, pois, uma vez mais,
que tudo aquilo que pode ser conhecido de Deus, está revelado na cruz. Fora da
cruz não há conhecimento de Deus.
Isso nos mostra que a cruz é manifestada na criação inteira. O eterno poder e divindade de Deus, tudo quanto podemos conhecer dEle, se podem ver nas coisas que criou, e a cruz é o poder de Deus (1 Cor. 1:18). Deus gera forças a partir da fraqueza. Salva o homem por meio da morte, de forma que até os que morrem podem descansar na esperança. Nenhum homem é tão pobre, fraco e pecador, tão degradado e depreciado para não poder se gloriar na cruz. A cruz o toca justamente nessa situação em que está, pois é símbolo de vergonha e degradação. Revela o poder de Deus nele, e há nele motivo para glória eterna.
A cruz crucifica
A cruz nos separa do
mundo. Nos une a Deus, a Ele seja a glória! A amizade do mundo é inimizade contra
Deus. “Quem queira ser amigo do mundo, se constitui em inimigo de Deus” (Tg
4:4). Na cruz, Cristo destruiu a inimizade (Efe. 2:15 e 16). “E o mundo e seus
desejos passam. Mas, o que faz a vontade de Deus, permanece para sempre” (1
João 2:17). Portanto, deixemos que o mundo passe.
(V. Mendoza,
#266)
Jesus disse: “E quando
eu for erguido da terra, atrairei todos a mim” (João 12:32). Digo-o para
insinuar que a morte haveria de morrer: “Se humilhou a si mesmo, e foi
obediente até a morte, e morte de cruz. Por isso Deus também o exaltou isto até
o sumo, e lhe deu um Nome que é sobre todo nome” (Fil. 2:8 e 9).
Foi através da morte que ascendeu à destra do trono da Majestade nos céus. Foi a cruz que elevou da terra ao céu. Então, é só a cruz que nos traz a glória, e a única coisa que podemos nos gloriar. A cruz, que significa insulto e envergonha para o mundo, nos eleva sobre este mundo e nos assenta com Cristo nos lugares celestiais. Faz “pelo poder que opera em nós”, que é o mesmo que sustém o universo inteiro.
15 Porque em Cristo Jesus nem a circuncisão nem a incircuncisão tem virtude alguma, mas sim o ser uma nova criatura.
A salvação não vem do
homem, seja qual for a condição deste, ou o que ele possa fazer. Em seu estado
de incircuncisão está perdido, e ser circuncidado em nada lhe traz à salvação.
Só a cruz tem poder para salvar. O único valor é a nova criatura ou, como
traduzem algumas versões, “a nova criação”. “Se alguém está em Cristo, é uma
nova criatura” (2 Cor. 5:17); e só por meio da morte que nos unimos a Ele. “Não
sabeis que todos os que foram batizados em Cristo Jesus, foram batizados em sua
morte” (Rom. 6:3).
(M. Mavillard, #95)
A cruz faz uma nova criação. Vemos aqui outra razão para se gloriar nela. Quando a criação deixou as mãos de Deus no princípio, “Todas as estrelas do amanhecer louvaram, e se alegraram todos os filhos de Deus” (Jó 38:7).
O sinal da cruz
Relacione os textos que
até agora consideramos: (1) a cruz de Cristo é a única coisa em que temos que
nos gloriar, (2) o que se gloria, deveria fazê-lo somente em conhecer a Deus,
(3) Deus escolheu ao mais fraco no mundo para envergonhar os sábios, de forma
que ninguém pode se gloriar, exceto nEle, e (4) Deus é revelado nas coisas que
criou. A criação, que manifesta o poder de Deus, também apresenta a cruz, pois
a cruz de Cristo é o poder de Deus, e Deus se faz conhecer por meio dela.
Que nos diz o anterior?
Que o poder que criou o mundo e todas as coisas que há nele, é o mesmo que
salva em quem nele confie. É o poder da cruz.
Assim, o poder da cruz,
o único pelo qual a salvação vem, é o poder que cria e que continua operando na
criação. Mas quando Deus cria algo, é “muito bom”. Então, em Cristo, em sua
cruz, há uma “nova criação”. “Porque somos feitura dele, criados em Cristo
Jesus para boas obras, que Deus de antemão preparou para que andássemos nelas”
(Efe. 2:10). É na cruz onde encontramos essa nova criação, porque seu poder é
que “no princípio criou Deus os céus e a terra”. É o poder que guarda a terra
de desintegrar-se debaixo da maldição; o poder que traz a sucessão das
estações; o tempo da semeadura e da colheita; o que afinal renovará a terra
inteira. “Florescerá profusamente, se alegrará e cantará com alegria. A glória
do Líbano lhe será dada, a beleza do Carmelo e de Sarón. Todos verão a glória
do Eterno, a beleza de nosso Deus” (Isa. 35:2).
"Grandes são as
obras de Jeová, meditadas pelos que nelas se comprazem. Esplendor e majestade
sua obra, sua justiça para sempre permanece. De suas maravilhas tem deixado um
memorial. Clemente e compassivo Jeová!” (Sal. 111:2-4, Bíblia de
Jerusalém).
Vemos aqui que os obras
maravilhosas de Deus revelam sua justiça, tanto quanto a graça e
compaixão. Isso é outra evidência de que suas obras revelam a cruz de Cristo,
onde se concentram a infinidade do amor e a clemência.
"De suas
maravilhas tem deixado um memorial”. Por que deseja que o homem se lembre e
declare suas obras prodigiosas? Para que não se esqueça, mas que confie na
salvação do Senhor. Sua vontade é que o homem medite continuamente em suas
obras, de forma que possa conhecer o poder da cruz. Deste modo, quando Deus
criou os céus e a terra em seis dias, “terminou Deus no sétimo dia o trabalho que
fez, e descansou no sétimo dia de tudo aquilo tinha feito na criação. E Deus
abençoou ao sétimo dia, e o santificou, porque nele descansou de toda a obra
que havia feito na criação” (Gên. 2:2 e 3).
A cruz nos provê o
conhecimento de Deus ao mostrar-nos seu poder como Criador. Por meio da cruz
somos crucificados para o mundo, e o mundo para nós. Pela cruz somos
santificados. A santificação é trabalho de Deus, não do homem. Só seu divino
poder pode completar esse grande trabalho. No princípio Deus santificou o
sábado como a coroa do trabalho criativo, a evidência que o trabalho estava
completo, o selo da perfeição. Então, disse: “Também lhes dei meus sábados,
para que fossem um sinal entre mim e eles, de forma que soubessem que eu sou o
Eterno que os santifico” (Eze. 20:12).
Vemos, pois, que o
sábado, o sétimo dia, é o verdadeiro sinal da cruz. É o memorial da criação, e
a redenção é criação: criação por meio da cruz. Na cruz achamos as perfeitas e
completas obras de Deus, e somos revestidos delas. Ser crucificado com Cristo
significa ter renunciado totalmente o eu, reconhecendo que não somos nada, e
confiando incondicionalmente em Cristo. Nele encontramos o repouso. Nele
encontramos o sábado. A cruz nos leva de volta ao começo, para “o que existia
desde o princípio” (1 João 1:1). O repouso do sétimo dia não é mais que o sinal
de que na perfeita obra de Deus na cruz – a mesma da criação –, achamos repouso
do pecado.
‘Mas é difícil guardar
o sábado; o que farei com meu negócio?’; ‘Se guardo o sábado não poderei ganhar
a vida’; ‘É tão impopular!’. Nunca alguém pode pretender que seja algo
agradável o estar crucificado. “Nem Cristo se agradou a si mesmo” (Rom. 15:3).
Leia o capítulo 53 de Isaías. Cristo nunca foi muito bem visto, e menos ainda
ao ser crucificado. A cruz significa morte, mas também significa a entrada na
vida. Há bálsamo nas feridas de Cristo, há bençãos na maldição que Ele levou,
vida na morte que sofreu. Quem poderia afirmar que confia em Cristo para a vida
eterna, enquanto se recusa confiar nEle durante alguns anos, meses ou dias de
vida neste mundo?
Digamos isto uma vez mais, e digamos de coração: “Longe esteja mim o gloriar-se, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, por quem o mundo está crucificado para mim, e eu para o mundo”. Se você pode dizer isto verdadeiramente, então acharás as tribulações e aflições tão levianas, que poderás gloriar-te nelas.
A glória da cruz
É pela cruz que tudo se
sustenta. “Todas as coisas subsistem nEle” (Col. 1:17), e Ele não existe em
outra forma que não seja a do Crucificado. Se não fosse pela cruz, aconteceria
uma morte universal. Nenhum homem poderia respirar, nem uma planta crescer, nem
um raio de luz poderia brilhar do céu, a não ser pela cruz.
Agora então, “Os céus
contam a glória de Deus, e o firmamento anuncia o trabalho de suas mãos” (Sal.
19:1). Essas são algumas das coisas que Deus fez. Nenhuma pena pode descrever,
nenhum pincel para pintar a glória surpreendente dos céus. Porém, aquela glória
não é mais que a glória da cruz de Cristo, como mostram os atos antes
referidos. É revelado o poder de Deus nas coisas criadas, e a cruz é o poder de
Deus.
A glória de Deus é seu
poder, como “a grandeza incomparável de seu poder para os que crêem” se mostrou
na ressurreição de Jesus Cristo (Efe. 1:19 e 20). “Cristo ressuscitou dos
mortos para a glória do Pai” (Rom. 6:4). Foi por haver sofrido morte, pelo que
Cristo foi coroado de glória e de honra (Heb. 2:9).
Deste modo, vemos que a glória inteira das estrelas incontáveis, com as cores diversas, e a glória do arco-íris, a glória das nuvens douradas na colocação do sol, a glória do mar e dos campos em flor ou dos prados verdes, a glória da primavera e da colheita na maturidade, a glória do que brota e que da a fruta perfeita, a glória inteira que Cristo tem no céu, e também tudo o que deve ser revelado aos santos dele no dia em que “os justos arderão como o sol no Reino de seu Pai”, é a glória da cruz. Como poderíamos pensar em gloriar-nos em qualquer outra coisa?
16 E a todos quantos andarem em conformidade com esta regra, paz e misericórdia sobre eles e sobre o Israel de Deus.
A regra da glória! Que
grande regra para o que quer ser governado! São mencionadas aí duas classes?
Impossível, desde que a epístola inteira vem mostrar que todos são um em Cristo
Jesus. “E vós estais completos nele, que é a cabeça de todo o principado e
potestade (império). Nele também fostes circuncidados com uma circuncisão feita
sem mão, ao nos desfazermos do corpo dos pecados, por meio da circuncisão feita
por Cristo. Sepultado com Ele no batismo, também fostes ressuscitado com ele,
por meio da fé no poder de Deus que o ergueu dos mortos. Para você que estava
morto em pecados, na incircuncisão de sua carne, lhe deram vida com Cristo, e
perdoaram todos seus pecados” (Col. 2:10-13).
"Somos a verdadeira circuncisão, nós, os que adoram segundo o Espírito de Deus, e estamos contentes em Cristo Jesus, e não colocamos nossa confiança na carne” (Fil. 3:3). Aquela circuncisão nos constitui a todos no verdadeiro Israel de Deus, porque significa vitória sobre o pecado, e ”Israel” quer dizer vencedor. Já não estamos mais “excluídos da cidadania de Israel, desavisado dos pactos da promessa”, já não somos “estranhos nem forasteiros, mas concidadãos com os santos, membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, sendo a pedra principal do ângulo, Jesus Cristo” (Efe. 2:12, 19 e 29). Deste modo, nos encontraremos com as multidões que virão “do leste e do ocidente, e eles se sentarão com Abraão, Isaac e Jacó no Reino dos céus” (Mat. 8:11).
17
Desde agora ninguém me perturbe; pois trago no corpo as marcas do Senhor Jesus.
18 A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja, irmãos, com o vosso espírito. Amém!
O que se tem traduzido
por “sinais” é a forma plural da voz grega stigma. Implica vergonha e
desgraça. No passado, os responsável por crimes, como também os escravos que
tinham sido surpreendidos tentando escapar, os estigmatizava por meio da
colocação de uma marca ou sinal em seu corpo, indicando a quem pertenciam.
Tais são os sinais da
cruz de Cristo. Paulo as levava. Tinha sido crucificado com Cristo, e levava as
impressões de seus cravos. Estavam marcados em seu corpo. O assinalavam como um
servo, como o escravo do Senhor Jesus. Então que ninguém interferisse com ele:
não era servo dos homens. Só devia lealdade a Cristo, que o tinha comprado. Que
ninguém esperasse vê-lo servir ao homem ou a carne, porque Jesus o tinha
marcado com o Seu sinal, e não podia servir a nenhum outro. Também, ninguém
deveria interferir em sua liberdade em Cristo, ou o maltratar, porque seu
Senhor protegeria com toda a segurança aquele que lhe pertencia.
Você leva essas marcas?
Então você pode se gloriar nelas. Se assim fazes, não te gloriarás em vão, nem
ficarás envaidecido.
Quanta gloria há na
cruz! A glória inteira do céu está nesse objeto depreciado. Não na figura da
cruz, mas na cruz mesma. O mundo não reconhece isto como glória. Mas tampouco
reconheceu o Filho de Deus; nem reconhece ao Espírito Santo, porque não podem
ver a Cristo.
Que Deus abra nossos
olhos para ver a glória, de forma que possamos reconhecer seu valor. Que
consintamos em ser crucificados com Cristo de forma que a cruz nos eleve para a
glória. Na cruz de Cristo há salvação. É o poder de Deus para não cairmos, porque
nos eleva da terra para o céu. Na cruz está a nova criação que o mesmo Deus
qualifica como boa “de grande modo”. Nela está toda a glória do Pai e a glória
inteira das idades eternas. Portanto, que Deus não permita que nos gloriemos em
outra coisa que não seja a cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo
nos é crucificado, e nós para o mundo.
(Elisa Pérez,
#90)
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