No primeiro versículo do terceiro capítulo de
Hebreus temos uma exortação que compreende todo o mandado dado ao
cristão. É este: “Pelo que, irmãos
santos, participantes da vocação celestial, considerai a Jesus Cristo, apóstolo
e sumo-sacerdote da nossa confissão”. Fazer isto como a Bíblia ordena,
considerar a Cristo contínua e inteligentemente, verdadeiramente como Ele é,
transformará cada um num cristão perfeito, porque “contemplando seremos
transformados”.
Os ministros do Evangelho
têm uma ordem inspirada para conservarem continuamente o assunto, Cristo,
perante o povo, e dirigir a atenção do povo somente para Ele. Paulo disse aos
coríntios, “porque, nada me propus saber
entre vós, senão a Jesus Cristo, e Este crucificado”. (1 Cor. 2:2); e não há
razão para supor que a sua pregação aos coríntios foi diferente em qualquer
aspecto da pregação que ele fez nos outros lugares. De facto, ele diz-nos que
quando Deus revelou nele o Seu Filho, isto era o que ele podia pregar entre os
pagãos (Gál. 1:15, 16): e a sua alegria era que pela Sua Graça tinha
sido eleito para “pregar entre os gentios
as insondáveis riquezas de Cristo.” (Ef.
3:8).
Mas o facto dos apóstolos fazerem de Cristo o
assunto de toda a sua pregação, não é o nosso único mandado para O exaltar. O
Seu nome é único nome dado debaixo dos céus pelo qual podemos ser salvos. (Actos
4:12). O próprio Cristo declarou que nenhum homem pode ir ai Pai, senão
através d’Ele. (Jo. 14:6). Ele disse a Nicodemos: “E, como Moisés levantou a
serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado; para
que todo aquele que n’Ele crê pereça, mas tenha a vida eterna”. (Jo.
3:14,15). Este “levantamento” de Jesus, enquanto tem uma principal
referência à Sua crucificação, abrange mais do que um mero facto histórico;
isto significa que Cristo tinha que ser “levantado” por todo aquele porque n’Ele cresse, como Redentor crucificado, aos
quais graça e glória são suficientes para suprir as grandes necessidades do
mundo; quer dizer que Ele seria “levantado” em todo o Seu profundo encanto e
poder como “Deus connosco”, que a Sua Divina atracção pode deste modo
encaminhar todos a Ele. (João 12:32).
A exortação para considerar Jesus, e também a
razão para esse fim, é dada em (Hb. 12: 1-3); “Portanto nós também,
pois que estamos rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhos, deixemos todo
o embaraço e o pecado, que tão de perto nos rodeia, e corramos com paciência a
carreira que nos está proposta, olhando para Jesus, Autor e Consumador da fé, o
Qual pelo gozo que lhe estava proposto suportou a cruz, desprezando a afronta,
e assentou-se à dextra do trono de Deus. Considerai pois Aquele que suportou
tais contradições dos pecadores contra Si mesmo, para que não enfraqueçais,
desfalecendo em vossos ânimos. “E apenas e pela constante e persistente oração
considerando Jesus tal como Ele é revelado na Bíblia, que podemos ser guardados
da crise vindoura em beneficência, e do enfraquecimento pelo caminho.
De novo deveríamos considerar Cristo, porque n’Ele
“Estão escondidos todos os tesouros da
sabedoria e da ciência”. (Col. 2:3). A quem falte a sabedoria
peça-a directamente a Deus, que a dá a todos os homens liberalmente e a ninguém
recusa, e a promessa é que ela será dada; mas a desejada sabedoria só pode ser
obtida em Cristo. A sabedoria que não precede de Cristo, e não tem como
consequência guiar para Ele, é loucura; porque Deus, como fonte de todas as
coisas, é o Autor da sabedoria; a ignorância sobre Deus é a pior espécie de
loucura (ver Rum. 1:21, 22); e todos os tesouros de sabedoria e
conhecimento estão escondidos em Cristo; de maneira Que todo aquele que tem
apenas a sabedoria deste mundo, na, na realidade, nada sabe. E visto que todo o
poder nos céus e na terra foi dada a Cristo, o apóstolo Paulo declara que
Cristo é “O poder de Deus, e sabedoria de
Deus”. (1 Cor. 1:24).
Contudo, há um texto que resumidamente soma tudo
o que Cristo é para o homem, e dá a razão mais compreensivo para O considerar.
É esta! “Mas vós sois d`Ele, em Jesus Cristo,
o Qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e Justiça e Santificação, e
Redenção”. (1 Cor. 1:30). Nós
somos ignorantes, fracos, perdidos; Cristo é para nós sabedoria, justiça, e
redenção. Que alcance! Da ignorância e pecado para a justiça e redenção. A mais
alta aspiração do homem ou necessidade não pode ser alcançada fora dos limites
do que Cristo é para nós, e do que somente Ele é para nós. Razão suficiente
esta pelo que todos os olhos deviam estar fixos n’Ele.
COMO DEVEMOS
CONSIDERAR CRISTO
Mas como devemos considerar Cristo? –
Exactamente como Ele se revelou a Si mesmo ao mundo, segundo o testemunho que
Ele deu de Si mesmo. Naquele maravilhoso discurso relatado no quinto capítulo
de João, Jesus disse: “Pois assim como o Pai ressuscita os mortos, e os
vivifica, assim também o Filho vivifica aqueles que quer. E também o Pai a
ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo; Para que todos os honrem o Filho,
como honram o Pai. Quem não honra o Filho, não honra o Pai que O enviou”, versículos
21-23.
Para Cristo estar encarregado da mais alta
prerrogativa, o julgamento. Ele tem que receber a mesma honra que é devida a
Deus, porque Ele é Deus. O discípulo amado relata este testemunho: “No
princípio era Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”.
(João 1:1). O versículo 14 mostra que este Verbo Divino não é outro
senão Jesus Cristo: “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a Sua
glória, como a glória do Unigénito do Pai, cheio de graça e de verdade.
“No princípio era o Verbo”. A mente do homem não
pode alcançar as épocas que estão compreendidas nesta frase. Não é dado aos
homens saber quando ou como o Filho foi gerado; mas nós sabemos que Ele era o
Verbo Divino, não apenas d`Ele vir a esta terra para morrer, mas mesmo antes do
mundo ser criado. Justamente antes da Sua crucificação Ele orou, “E agora
glorifica-Me Tu, ó Pai, junto de Ti mesmo, como aquela glória que tinha contigo
antes que o mundo existisse”. (João 17:5). Mais de setecentos anos
antes do Seu advento, a Sua vinda foi assim profetizada pela Palavra de
inspiração: “E tu, Belém Efratá, posto que pequena entre milhares de Judá, de
ti Me sairá o que será Senhor em Israel, e cujas saídas são desde os tempos
antigos, desde os dias da eternidade”. (Miq. 5:2). Nós sabemos que Cristo
“Saiu e veio de Deus” (Jo 8:42), mas isto aconteceram há
tanto tempo nos dias da eternidade que está muito além do alcance da mente do
homem.
É CRISTO DEUS?
Em muitas passagens da Bíblia Cristo é chamado
Deus. O Salmista diz: “O Deus poderoso, o Senhor, falou e chamou a terra desde
o nascimento do Sol até ao seu escasso. Desde Sião a perfeição da formosura,
resplandeceu Deus. Virá o nosso Deus e não se calará; adiante d`Ele um fogo irá
consumindo, e haverá grande tormento ao redor d`Ele. Chamará os céus, do alto,
e a terra, para julgar o Seu povo. Congregai os meus santos; aqueles que
fizeram comigo um concerto com sacrifícios. E os céus anunciarão a Sua justiça,
pois Deus mesmo é um Juiz”. (Salmos 50: 1-6).
Pode ser conhecido que esta passagem se está
referindo a Cristo (1) pelo facto já aprendido, que o filho julga todas as
coisas; e (2) pelo facto que é pela segunda vinda de Cristo que Ele envia os
Seus anjos para ajuntar os Seus eleitos desde os quatro ventos.
(Mat. 24:31). “O
nosso Deus virá, e não guardará silêncio”. Não; porque quando o próprio Senhor
descer dos céus será “Com alarido, com voz de arcanjo, e com a trombeta de
Deus”. (1 Ts. 4:16). Este alarido será a voz do Filho de Deus, que
será ouvida por todos os que estão nas suas sepulturas, e que os fará
ressuscitar. (Jo 5:28, 29). Com a justiça viva eles serão
elevados a encontrar-se com o Senhor no ar, e estarão com Ele para sempre; e
isto constituirá “a nossa reunião a Ele”. (Ts. 11: 2-1). Compare (Sl.
50:5; Mt. 24:31, e Ts. 4:16).
“Um fogo devorará perante Ele, e será muito
tempestuoso ao Seu redor”: porque quando o senhor Jesus for revelado dos Céus
com os Seus poderosos anjos, será “Um fogo devorador tomando vingança dos que
não conhecem a Deus, e não obedecem ao Evangelho do senhor Jesus Cristo”. (Ts
11: 1-8). Assim sabemos que (Sl. 50:1-6) é uma vívida descrição
da segunda vinda de Cristo para a salvação do seu povo. Quando Ele vier será
como Altíssimo Deus”. Compare (Hc. 3).
Este é um dos Seus títulos justos. Muito tempo
antes do primeiro advento de Cristo, o profeta Isaías disse estas palavras de
conforto a Israel: “Porque um Filho nos nasceu, um Filho nos foi dado; e o
governo estará sobre os Seus ombros; e o seu nome será chamado Maravilhoso,
conselheiro, o Altíssimo Deus, o eterno pai, o Príncipe da Paz”. (Is.
9-6).
Estas não são simplesmente as palavras de
Isaías: Elas são as palavras do espírito de deus. Deus tem uma ligação directa
com o Filho, chamando-o pelo mesmo nome. Em (Sal. 45:6) lemos estas
palavras “O Teu trono, ó Deus, é para todo o sempre; o centro do Teu reino é um
Centro de Justiça”. O leitor casual podia tomar isto como sendo simplesmente
uma atribuição do Salmista para louvar a Deus; mas quando voltamos para o Novo
Testamento encontramos que é muito mais. Verificamos que é o Pai que fala, e
que Ele envia o Filho, chamando-lhe Deus. Ver (Hb. 1;1-8).
Este nome não foi a Cristo em consequência de
algum grande feito, mas por direito de herança. Falando do poder e da grandeza
de Cristo, o escritor da Epístola aos Hebreus diz que Ele foi feito tanto
melhor que os anjos, porque “Ele obteve ‘por herança’ um nome mais excelente
que o deles”. (Hb. 1:4). Um filho toma sempre por direito o nome do pai; e
Cristo, como “O Unigénito Filho de Deus”, tem legitimamente o mesmo nome. Um
filho, também, é em maior ou menor grau, a reprodução do pai; ele tem, até
certo ponto, os traços fisionómicos e características pessoais do seu pai; não
perfeitamente, porque não há reprodução perfeita entre a raça humana. Mas não
há imperfeição em Deus, ou em qualquer das Suas obras; portanto Cristo é a
“expressa imagem” da pessoa do Pai. (Hb. 1:3). Como Filho do Deus que
existe por Si mesmo, Ele tem por natureza os atributos da Divindade.
É verdade que há muitos filhos de Deus; mas
Cristo é o “Unigénito Filho de Deus”, e portanto o filho de Deus num sentido no
qual nenhum outro ser alguma vez já foi, ou pode ser. Os anjos são filhos de
Deus, como foi Adão (Jó 38:7; Lc 3:38), por criação; os cristãos são filhos de Deus
por adopção (Rm. 8: 14,15); mas Cristo é o Filho de Deus por nascimento. O
escritor da Epístola aos Hebreus seguidamente mostra que a posição do Filho de
Deus, não é uma posição à qual Cristo tenha sido elevado, mas uma a que Ele tem
por direito. Ele diz que Moisés foi fiel em toda a Casa de Deus, como um servo,
“mas Cristo como um Filho sobre a Sua própria casa”. (Hb. 3:6). E ele também
declarou que Cristo é o Construtor da casa. (vers. 3). É Ele que
constrói o templo do Senhor, e levará a gloria. (Zc. 6:12, 13).
O próprio Cristo ensinou de maneira mais
categórica que Ele é Deus. Quando o mancebo veio e perguntou, “Bom Mestre, que
devo fazer para herdar a Vida eterna?” Jesus antes de responder à pergunta
directa, disse: “Porque me chamas bom? Ninguém há bom, senão Um, que é Deus”. (Mar.
10:17,18). Que queria Jesus dizer com estas palavras? Queria porventura
insinuar que Ele não era absolutamente bom? Foi uma depreciação de Si mesmo? –
De maneira nenhuma; pois Cristo era absolutamente bom. Aos judeus, que estavam
continuamente procurando encontrar n’Ele qualquer falha da qual O pudessem
acusar, pessoalmente disse, “Qual de vós Me convence de pecado?” (Jo
8:46). Em toda a nação judaica nenhum homem podia ser encontrado que
alguma vez O tivesse visto fazer qualquer coisa ou ouvisse Ele pronunciar uma
palavra que tivesse a mais pequena semelhança com o mal; e os que tinham
decidido condená-lo apenas podiam fazê-lo proferindo falsas acusações contra
Ele. Pedro diz que Ele “não pecou, nem engano foi achado em Sua boca”. (I Pe
2:22). Paulo diz que Ele “não conheceu pecado”. (Cr 11:5-21). O Salmista
diz, “Ele +e a minha rocha, e n’Ele não há injustiça”. (Sl. 92:15). E João diz,
“Irmãos sabeis que Ele Se manifestou para nos tirar do pecado; e n’Ele não há
pecado”. (1 Jo 3:5).
Cristo não podia negar-se a Si mesmo, portanto
Ele não podia dizer que não era bom. Ele é e era absolutamente bom, a perfeita
bondade. E como não há quem seja bom a não ser Deus, e Cristo é bom, logo
Cristo é Deus, e isto é o que Ele queria ensinar ao mancebo.
Foi isto que Ele ensinou aos discípulos. Quando
Filipe disse a Jesus, “Mostra-nos o Pai, e isso nos basta”, Jesus disse-lhe:
“Há tanto tempo que estou convosco, e ainda não Me tendes conhecido Filipe?
Quem Me vê a Mim vê o Pai; como dizeis vós então, Mostra-nos o pai?” (João
14: 8,9). Isto é tão categórico como quando Ele disse, “Eu e o Pai
somos Um”. (João 10:30). Tão verdadeiramente era Cristo Deus, mesmo quando
aqui entre os homens, que quando lhe foi pedido para mostrar o pai Ele pôde
dizer, a Mim vê. E isto traz à mente a declaração que quando o Pai introduziu
no mundo o primogénito, disse, “E todos os anjos de Deus O adorem”. (Hb.
1:6). Não foi apenas quando Cristo se encontrava na glória do Pai antes
do mundo ser criado que tinha direito a homenagem, mas quando veio como um bebé
em Belém, mesmo então foi ordenado a todos os anjos que O adorassem.
Os judeus não interpretaram mal os ensinamentos
de Cristo acerca de Si mesmo.
Quando Ele declarou que era um com o Pai, os
judeus pegaram em pedras para O apedrejar; e quando Ele lhes perguntou por qual
das Suas boas obras procuravam apedrejá-lo, respondera, “não Te apedrejamos por
alguma boa obra, mas pela blasfémia; porque sendo Tu homem Te fazes Deus a Ti
mesmo”. (João 10:33). Se ele fosse o que eles consideravam que Ele era,
um mero homem, na verdade as Suas palavras teriam sido blasfémia; porém Ele era
Deus.
O objectivo de Cristo ao vir à terra era revelar
Deus aos homens, de maneira que eles pudessem ir a Ele. Por conseguinte o
apóstolo Paulo diz que “Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo” (11
Cr. 5:19 9); em João lemos que o verbo que era Deus, foi “feito carne”.
(Jo
1:1,14). Na mesma ligação é declarado, “Deus nunca foi visto por
alguém; o Filho Unigénito, que está no seio do Pai, esse O fez conhecer”. (Ou o
revelou). (Jo 1:18).
Note-se a expressão, “O Filho Unigénito, que
está no seio do Pai”, Ele tem a sua habitação ali, e Ele é ali como uma parte
da Divindade, com tanta certeza quando estava na terra como no céu. O uso do
presente gramatical implica existência contínua. Isto apresenta o mesmo
pensamento contido na declaração de Jesus aos Judeus (João 8:58), antes
que Abraão existisse, eu sou”. E isto de novo mostra a Sus identidade com
Aquele que apareceu a Moisés na sarça-ardente, declarando ser o Seu nome “Eu
Sou Aquele Que Sou”.
E, finalmente, temos as palavras inspiradas do
apóstolo Paulo acerca de Jesus Cristo, que “foi do agrado do Pai que toda a
plenitude n’Ele habitasse.” (Cl. 1:19).
O que é esta plenitude, que mora em Cristo,
aprendemos no capítulo seguinte, onde se diz que “n’Ele corporalmente toda a
plenitude de Divindade.” (Cl. 2:9). Este é o testemunho mais
absoluto e inequívoco do facto que Cristo possui por natureza todos os
atributos da Divindade. O facto da Divindade de Cristo aparecer também à medida
que passamos a considerar.
COMO CRISTO CRIADOR
Imediatamente a seguir ao
frequentemente citado texto que diz que Cristo, o Verbo, é Deus, lemos que
“todas as coisas foram feitas por Ele; e sem Ele nada do que foi feito se fez”.
(Jo
1:3). O comentário não pode tornar esta declaração mais clara do que é,
portanto passamos às palavras de (Hb. 1:1-4) “Deus... falou-nos
nestes últimos dias pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de tudo, por quem
fez os mundos; O qual sendo o resplendor da Sua glória, e a expressa imagem da
Sua pessoa, e sustentando todas as coisas pela palavra do Seu poder, havendo
feito por Si mesmo a purificação dos nossos pecados, assentou-se à dextra da
Majestade nas alturas; feito tanto mais excelente do que os anjos, quando
herdou mais excelente nome do que eles”. Ainda mais enfáticas do que estas são
ainda as palavras do apóstolo Paulo aos Colossesses. Falando de Cristo como
Aquele em Quem todos temos a redenção, descreve-O como aquele “que é a imagem
do deus invisível, o Primogénito de toda a criação; porque n’Ele foram criadas
todas as coisas que há nos céus e na terra visíveis e invisíveis, sejam tronos,
sejam dominações, sejam principados, sejam potestades: tudo foi criado por Ele
e para Ele; e Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por
Ele”. (Col. 1:15-17).
Este maravilhoso texto devia ser cuidadosamente
estudado e muitas vezes meditado. Não há nada no universo que Cristo não tenha
criado. Ele fez tudo o que existe no céu e na terra; ele fez todas as coisas
que podem ser vistas; os tronos e dominações, e os principados e os poderes no
céu, tudo teve origem n’Ele. E como Ele é antes de todas as coisas, e o seu
criador, assim por Ele todas as coisas subsistem, ou se mantêm juntas. Isto é
equivalente ao que é dito em (Hb. 1:3), que Ele sustenta todas as
coisas pela palavra do Seu poder. Foi pela palavra que os céus foram feitos; e
que a mesma palavra as mantêm nos seus lugares, e preserva da destruição.
Possivelmente não podemos omitir nesta ligação, (Isa.
40:25,26): “A quem pois Me fareis semelhante, para que lhe seja
semelhante? Diz o Santo. Levantai ao alto os vossos olhos, e vede quem criou
estas coisas, quem produz por conta o seu exército, quem a todos chama pelos
seus nomes; por causa da grandeza das Suas forças, e pela fortaleza do Seu
poder, porque Ele é forte em poder nenhum faltará”. Ou, como a tradução judaica
mais energicamente faz, “d`Ele, que é grande em força, e forte em poder, nenhum
escapa”. Torna-se evidente de outras porções do mesmo capítulo que Cristo é a
Santo que assim chama as hostes dos céus pelos seus nomes e as sustenta nos eus
lugares. Ele é Aquele perante o qual foi dito, “Preparai o caminho do senhor,
endireitai no ermo vereda a nosso Deus”. Ele é O que vem com mão forte,
trazendo o galardão com Ele; O que como um pastor alimentará o Seu rebanho,
levando os cordeiros no seu seio.
Mais um testemunho acerca de Cristo como Criador
deve ser suficiente. É o testemunho do próprio Pai. No primeiro capítulo de Hebreus,
lemos que Deus falou-nos pelo Seu Filho; do Qual disse, “e todos os anjos O
adorem “; e que dos anjos disse, o Qual dos Seus anjos faz espíritos, e dos
seus ministros labaredas de fogo “, porém ao seu filho diz, “O Teu trono, Ó
Deus subsiste pelos séculos dos séculos; o ceptro da tua justiça é o centro do
teu reino”; E Deus diz seguidamente: “E tu, Senhor, no princípio fundaste a
terra; e os céus são obras das tuas mãos”. (1:8-10). Aqui vemos o pai falando
do filho como Deus, e dizendo-lhe, tu lançaste os fundamentos da terra; e os
céus são obras das tuas mãos. Quando o próprio Pai dá esta honra ao filho, o
que é o homem, para que o negue? Com isso podemos muito bem deixar o directo
testemunho acerca da Divindade de Cristo, e o facto que Ele é o Criador de
todas as coisas.
Uma palavra de precaução pode ser necessário
aqui. Imaginemos que exaltávamos Cristo à custa do Pai, o que ignoraríamos o
Pai. Isso não pode ser, porque os seus interesses são um. Nós honramos o Pai
honrado o Filho. Prestemos atenção às palavras de Paulo, que “pura nós há um só
Deus, o Pai, de Quem é tudo e para Quem nós vivemos; e um só senhor, Jesus
Cristo, pelo Qual são todas as coisas, e nós por ele”. (1Cr. 8:6); Exactamente
como já citámos, que foi por Ele que Deus Criou os mundos. Fundamentalmente
todas as coisas precedem de Deus, o Pai; até o próprio Cristo precedeu e veio
do Pai; mas foi do agrado do Pai que n ‘Ele morasse toda a plenitude, e que Ele
fosse o directo, Agente imediato em cada acto da criação. O nosso objectivo nesta
investigação é estabelecer a correcta posição de Cristo em igualdade com o pai,
para que o Seu poder de redimir possa ser melhor apreciado.
É CRISTO UM SER CRIADO?
Antes de passar a qualquer das lições práticas
que são aprendidas destas verdades, devemos deter-nos alguns momentos sobre a
ideia que é honestamente suportada por muitos que não desejariam tecer
considerações voluntariamente desonrando Cristo, mas que, através dessa
opinião, realmente negam a Sua Divindade. É a ideia que Cristo é um ser criado,
que, pelo bom agrado de deus, foi elevado à Sua presente posição majestosa.
Ninguém que suporte este ponto de vista pode possivelmente ter qualquer
concepção exacta da exaltada posição que Cristo realmente ocupa.
O ponto de vista em questão é construído sobre
um conceito errado de um único texto. (Ap. 3:14) “e ao Anjo da Igreja que
está em Laodicéia escreve: Isto diz o amem, a testemunha fiel, o princípio da
criação de deus.” Isto é interpretado erradamente para significar que Cristo é
o primeiro ser que Deus criou; que a obra da criação de Deus começou com Ele.
Mas este ponto de vista contraria a Escritura que declara que o próprio Cristo
criou todas as coisas. Dizer que Deus começa a Sua obra da criação pela criação
de Cristo é deixar Cristo inteiramente fora da obra da criação.
A palavra traduzida “ Princípio” é arc., significando, também,
“cabeça” ou “chefe”.
Isto dá-se nome do soberano grego, Archon,
em Arcebispo, e na palavra Arcanjo. Tomando esta última palavra.
Cristo é o Arcanjo. Ver (Jd 9), (I Ts. 4:16); (Jo
5:28, 29); (Dn. 10:21). Isto não quer dizer que Ele é o primeiro dos
anjos, porque Ele não é um anjo, mas está acima deles. (Hb. 1:4). Significa que
Ele é o Chefe ou Príncipe dos anjos, exactamente como um arcebispo é a cabeça
dos bispos. Cristo é o comandante dos anjos. Ver (Apoc. 19:11-14). Ele
criou os anjos. (Col. 1:16). E por isso a declaração que Ele é o princípio ou
cabeça da criação de Deus, quer dizer que n’Ele a criação teve o seu princípio;
de tal modo, que Ele mesmo diz, ser o Alfa e o Ómega, o princípio e o fim, o
primeiro e o último. (Ap. 21:6; 22:13). Ele é a fonte
onde todas as coisas têm a sua origem.
Também não devemos imaginar que Cristo é uma
criatura, porque Paulo chama-lhe (Cl. 1:15) “as Primícias de toda a
criatura”; porquanto os versículos seguintes mostram-no como Criador, e não uma
criatura. “Porque n’ Ele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na
terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam
principados, sejam potestades: Tudo foi criado por Ele e para Ele”. Ora se Ele
criou tudo o que alguma vez foi criado, e existia antes de tudo o que foi
criado, é evidente que Ele mesmo não está entre o que foi criado. Ele está
acima de toda a criação, e não uma parte dela.
A Escritura declara que Cristo é “O Unigénito
Filho de Deus”. Ele é gerado, não Criado. Quanto ao tempo em que Ele foi
gerado, não nos é dado a investigar, nem as nossas mentes podiam compreender se
nos fosse dito. O profeta Miquéias diz-nos tudo o que podemos saber acerca
disto nestas palavras: “E tu Belém Efratá, posto que pequena entre milhares de
Judá, de ti Me sairá o que será Senhor em Israel, e cujas saídas são desde os
tempos antigos, desde os dias da eternidade”. (Miq. 5:2). Houve um
tempo em que Cristo saiu e veio de Deus, do seio do Pai (João 8:42; 1:18), porém
esse tempo é tão remoto nos dias de eternidade que praticamente não tem começo
para a compreensão finita.
Mas a questão é, que Cristo é um Filho gerado, e
não um ser criado. Ele tem por herança um nome mais excelente que
o dos anjos; Ele é “um Filho sobre a Sua própria casa”. (Heb.1:4; 3:6). E uma vez
que Ele é o Unigénito Filho de Deus, é da mesma substância e natureza de Deus,
e possui por nascimento todos os atributos de Deus; porque foi do agrado do Pai
que seu Filho fosse a expressa imagem da Sua Pessoa, o brilho da Sua glória, e
cheio da plenitude da Divindade. Assim Ele tem “Vida em Si mesmo”; Ele possui
imortalidade por direito próprio, e pode conferir imortalidade a outros. Vida
existe n’ Ele inerentemente, de maneira que não pode ser tirada d’ Ele; mas,
tendo-a dado voluntariamente, pode tomá-la de novo. As suas palavras são estas:
“Por isto o Pai Me ama, porque dou a minha vida para tornar a tomá-la. Ninguém
ma tira de Mim, mas Eu de Mim mesmo a dou; tenho poder para a dar, e poder para
tornar a tomá-la”. (Jo 10:27,18).
Se alguém apresentasse o antigo sofisma, como
podia Cristo ser imortal e apesar disso morrer, temos apenas que dizer que não
sabemos. Não temos a pretensão de sondar o infinito. Não podemos compreender
como Cristo podia ser Deus no princípio, partilhando da mesma glória com o Pai,
antes do mundo existir, e contudo ser um bebé em Belém. O mistério da
crucificação e ressurreição é o mistério da encarnação. Não podemos compreender
como Cristo podia ser Deus e apesar disso tornar-se homem por nossa causa. Não
podemos compreender como podia Ele criar o mundo do nada, nem como podia dar
vida aos mortos, nem ainda como Ele trabalha pelo Seu Espírito nos nossos
corações; apesar disso cremos e reconhecemos estas coisas. Devia ser suficiente
para nós aceitar como verdade estas coisas que Deus revelou, sem tropeçar em
coisas que nem a mente de um anjo pode alcançar. Portanto deleitemo-nos no
poder infinito e glória que as Escrituras declaram pertencer a Cristo, sem
perturbar as nossas mentes finitas numa vã tentativa de explicar o infinito.
Finalmente, conhecemos a Divina unidade do Pai
com o Filho pelo facto de ambos terem o mesmo Espírito. Paulo, depois de dizer
que aqueles que estão na carne não podem agradar a Deus, continua: “Vós, porém,
não estais na carne, mas no Espírito, se é que o espírito de Deus habita em
vós. Mas, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é d’Ele”. (Rm.
8:9). Aqui verificamos que o Espírito Santo é tanto o Espírito de Deus
como o Espírito de Cristo. Cristo “está no seio do Pai”; sendo por natureza da
mesma substância que Deus, e tendo vida em Si mesmo, Ele é correctamente
chamado Jeová, O que existe por Si mesmo, e é deste modo tratado em (Jr.
33:15), onde é dito que o Renovo de Justiça, que executará
julgamento e justiça na terra, será conhecido pelo nome de Jeová Tsidekenu –
O SENHOR, É NOSSA JUSTIÇA.
Portanto, ninguém, que honre Cristo
absolutamente, Lhe dá menos honra que dá ao Pai, porque isto seria desonrar o
Pai; mas deixai inteiramente, com os anjos no céu, adorar o Filho, não tendo
receio que eles estejam adorando e servindo a criatura em vez do Criador.
E agora, enquanto o assunto da Divindade de
Cristo está claro nas nossas mentes, façamos uma pausa para considerar a
maravilhosa história da Sua humilhação.
DEUS MANIFESTO NA CARNE
"E o Verbo foi feito carne, e habitou entre
nós”. (João 1:14).
Nenhumas palavras poderiam mais claramente
mostrar que Cristo era tanto Deus como homem. No princípio apenas Divino, Ele
tomou sobre Si mesmo a natureza humana, e viveu entre os homens como qualquer
mortal, excepto naqueles momentos em que a Sua Divindade brilhava, como na
ocasião da purificação do templo, ou quando as Suas abrasadoras palavras de
simples verdade forçou os Seus inimigos a confessar que “nenhum homem falou
assim como este homem”. A humilhação que Cristo voluntariamente tomou sobre Si
mesmo é melhor relatada por Paulo aos Filipenses: “Havendo este mesmo
sentimento em vós que houve também em Cristo Jesus; que sendo originalmente na
forma de Deus, não contou isso como coisa a ser agarrada firmemente (isto é,
apegado a) mostrando igualdade com Deus, mas esvaziou-Se a Si mesmo, tomando a
forma de um servo, fazendo-Se semelhante aos homens; e, achado na forma de
homem, humilhando-se a Si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz”.
(Fl.
2:5-8).
A tradução acima faz este texto muito mais claro
do que está na edição habitual.
A ideia é que, apesar de Cristo ser na forma de
Deus, sendo “o brilho da Sua glória, e a expressa imagem da Sua Pessoa” (Hb.
1:3), tendo todos os atributos de Deus, sendo o Soberano do universo, e
Aquele em quem todo o céu se deleita em adorar, Ele não pensou que qualquer
destas coisas fosse desejável, enquanto os homens estivessem perdidos e sem
forças. Ele não podia gozar a Sua glória enquanto o homem fosse um desterrado,
sem esperança. Por isso esvaziou-se a Si mesmo, despojou-se a Si mesmo de Todas
as Suas riquezas e glória, e tomou sobre Si mesmo a natureza do homem, a fim de
poder redimi-lo. E deste modo podemos reconciliar a unidade de Cristo com o Pai
com a declaração, “Meu Pai é maior do que Eu”.
É impossível para nós compreender como podia
Cristo, como Deus, humilhar-se a Si mesmo até à morte de na cruz, e é pior do
que inútil para nós especular sobre isso. Tudo o que podemos fazer é aceitar os
factos tal como eles são apresentados na Bíblia. Se o leitor achar difícil
harmonizar algumas declarações da Bíblia acerca da natureza de Cristo, recordai
que seria impossível expressá-lo em termos que capacitassem as mentes finitas a
compreendê-lo completamente. Precisamos como o enxerto dos gentios e no povo de
Israel é contrário à natureza, assim muito da economia Divina é um paradoxo
para o entendimento humano.
Outras Escrituras que citaremos aproximarão de
nós o facto da humanidade de Cristo, e do que ela significa para nós. Já lemos
que “O Verbo se fez carne”, e agora leremos o que Paulo diz acerca da natureza
dessa carne: “Portanto o que era impossível à lei, visto como estava enferma
pela carne, Deus, enviando o Seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo
pecado condenou o pecado na carne; para que a justiça da lei se cumprisse em
nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito”. (Rm.
8:3-4).
Uma pequena reflexão será suficiente para
mostrar a qualquer um que se Cristo tomou sobre Si mesmo a semelhança do homem,
a fim de poder remir o homem, teve que ser a um homem pecador que Ele se tornou
semelhante, porque foi o homem pecador que Ele veio remir. A morte não podia
ter poder sobre um homem sem pecado, como Adão foi no Éden; e não podia ter
tido qualquer poder sobre Cristo, se o Senhor não tivesse colocado sobre Si a
iniquidade de todos nós. Além disso, o facto que Cristo tomou sobre Si mesmo a carne,
não de um ser sem pecado, mas a de um pecador, isto é, que a carne que Ele
tomou tinha todas as fraquezas e tendências pecaminosas a quem a natureza
humana caída está sujeita, é mostrado pela declaração de que Ele “foi feito a
semente de David segundo a carne”. David tinha todas as
paixões da natureza humana. Ele diz sobre Si mesmo, “Eis que em iniquidade fui
formado, e em pecado me concebeu minha mãe”. (Sal. 51:5).
O testemunho seguinte no livro dos Hebreus é
muito claro neste aspecto: - “Porque, na verdade, Ele não tomou em Si a
natureza dos anjos; mas tomou a semente de Abraão. (“Porque na verdade, Ele não
tomou os anjos, mas tomou a descendência de Abraão”. Versão Revista). Pelo que
convinha que em tudo fosse semelhante aos irmanes, para ser misericordioso e sumo-sacerdote
naquilo que é de Deus, para expiar os pecados do povo. Porque naquilo que Ele
mesmo, sendo tentado, padeceu, pode socorrer aos que são tentados”. (Hb.
2:16-18). (Versão King James).
Se Ele em todas as coisas foi feito semelhante aos
irmãos, então Ele teve que sofrer todas as enfermidades, e sido objecto de
todas as tentações, dos Seus irmãos. Mais dois textos que põem este assunto
muito enfaticamente será prova suficiente neste ponto.
Primeiramente citamos (II Cr. 5:21): “Porque Ele (Deus) fê-lo (Cristo) pecado por
nós, O qual não conheceu pecado; para que n’ Ele pudéssemos ser feitos
justiça”. (Versão K.J.)
Isto é mais forte do que a declaração de que Ele
foi feito “na semelhança da carne pecaminosa”. Ele foi feito pecado.
Aqui está o mesmo mistério de que o filho de Deus devia morrer. O imaculado,
Cordeiro de Deus, que não conheceu o pecado, foi feito pecado. Ainda que sem
pecado, não foi apenas contado como um pecador, mas tomando realmente sobre Si
a natureza pecaminosa. Ele foi feito pecado para que nós pudéssemos
ser feitos justos. Por isso Paulo diz aos Gálatas que “Deus enviou o Seu Filho,
nascido de mulher, nascido debaixo da lei, para remir os que estavam debaixo da
lei, a fim de recebermos a adopção de filhos”. (Gál. 4:4,5).
“Porque naquilo que Ele mesmo, sendo tentado,
padeceu, pode socorrer aos que são tentados”. “Porque não temos um sumo-sacerdote
que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em
tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemos pois com confiança ao trono da
graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno”. (Hb. 2:18; 4:15,16).
Mais um ponto, e podemos então aprender
completamente a lição que aprenderíamos do facto que, “O Verbo se fez carne, e
habitou entre nós”. Como foi que Cristo podia ser assim “rodeado de fraquezas” (Hb.
5:2), e continuar sem conhecer pecado? Alguém pode ter pensado enquanto
lê até aqui, que estávamos depreciando o carácter de Jesus, baixando-O ao nível
dum homem pecador. Pelo contrário, estamos simplesmente exaltando o “poder
Divino” do nosso bendito Salvador, o qual por Si mesmo voluntariamente desceu
ao nível do homem pecador, a fim de que Ele pudesse elevar o homem à Sua
imaculada pureza, que Ele conservou sob as mais adversas circunstâncias. A Sua
humanidade somente velava a Sua natureza Divina, pela qual estava
inseparavelmente ligado com o Deus invisível, e que foi mais do que capaz de
triunfar em resistir às fraquezas da carne. Houve em toda a Sua vida uma luta. A
carne, movida pelo inimigo de toda a justiça, tendia ao pecado, por outro lado
a Sua natureza Divina nunca por um momento abrigou um mau desejo, nem o Seu
poder Divino por um instante vacilou. Tendo sofrido na carne tudo aquilo que os
homens podem sofrer, voltou para o trono do pai tão imaculado como quando
deixou as cortes da glória. Quando estava no sepulcro, debaixo do poder da
morte, “era impossível que Ele lá se mantivesse”, porque Ele “não conheceu
pecado”.
Mas alguém dirá, “eu não vejo qualquer conforto
nisto para mim. Ter a certeza, que tenho um exemplo, porém não posso imitá-lo,
porque não tenho o poder que Cristo tinha. Ele era Deus mesmo enquanto esteve
aqui na terra; e eu sou apenas homem”. Sim, mas vós podeis ter o mesmo poder
que Ele tinha se o quiserdes. Ele “foi rodeado de fraquezas”, contudo “não
pecou”, porque o poder Divino morava constantemente n’ Ele. Agora ouvi as
palavras inspiradas do apóstolo Paulo, e aprendei o que é o nosso privilégio
ter: “Por causa disto me ponho de joelhos perante o
pai de nosso senhor Jesus Cristo. Do qual toda a família nos céus e na terra
toma o nome. Para que, segundo as riquezas da Sua glória, vos conceda que
sejais corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior; PARA QUE
Cristo habite pela fé nos vossos corações a fim de, estando arraigados e
fundados em amor, poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos, qual
seja a largura, e o cumprimento, e a altura, e a profundidade, e conhecer o
amor de Cristo que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de toda a
plenitude de Deus”. (Ef. 3: 14-19).
Quem podia pedir mais? Cristo, no qual
corporalmente morava toda a plenitude da Divindade, podia morar nos nossos
corações, de maneira que podemos ser cheios com a plenitude de Deus. Que
maravilhosa promessa! “Ele compadece-Se das nossas fraquezas”. Isto é, tendo
sofrido tudo o que a carne pecaminosa herda, Ele conhece tudo isso, e tão
intimamente que se identifica a Si mesmo com os Seus filhos, que seja o que for
que os oprima causa-lhe impressão semelhante, e Ele sabe a quantidade de poder
Divino que é necessária para resistir a isso; e se nós, a não ser sinceramente
desejarmos recusar “as impuras e mundanas concupiscência”, Ele é capaz e está
ansioso por nos dar força “muito mais abundantemente, além daquilo que pedimos
ou pensamos”. Todo o poder que por natureza mora em Cristo, podemos ter morando
em nós pela graça, porque Ele a todos dá livremente.
Então deixai a alma fatigada, débil, oprimida
pelo pecado ganhar coragem. Deixai-os “ir corporalmente ao trono da graça”,
onde têm a certeza de encontrar graça e ajuda em tempo de necessidade, porque
essa, é sentida pelo nosso Salvador no mesmo momento em que é sentida. Ele
“compadece-Se das nossas enfermidades”. Se fosse simplesmente o que Ele sofreu
há mil e oitocentos anos, podíamos recear que Ele tivesse esquecido alguma
enfermidade; mas não, a mesma tentação que vos oprime toca-O. Os seus
ferimentos estão sempre frescos, e Ele nunca deixa de interceder por vós.
Que maravilhosas possibilidades há para o
cristão! O qual pode alcançar alturas de santidade! Não importa quanto Satanás
possa lutar contra ele, assaltando-o onde a carne é mais fraca, ele pode
habitar à sombra do Altíssimo, e ser cheio com a plenitude da força de Deus.
Aquele que é mais forte do que Satanás pode morar continuamente no seu coração;
e assim, enfrentando os assaltos de Satanás como do alto de uma poderosa
fortaleza, pode dizer, “Eu posso fazer todas as coisas através de Cristo, que
me fortaleceu”.
LIÇÕES PRÁTICAS IMPORTANTES
Não é meramente como uma maravilhosa teoria, um
mero dogma, que devemos considerar Cristo como Deus e Criador. Cada doutrina da
Bíblia é para nosso benefício prático, e deve ser estudada com esse propósito.
Vejamos primeiramente que relação mantém esta doutrina com o mandamento central
da lei de Deus. Em (Gén.2:1-3) encontramos estas palavras finalizando o relato da
criação: “Assim os Céus, e a terra e todo o seu exército foram acabados. E
havendo Deus acabado no dia sétimo, a Sua obra que tinha feito, descansou no
sétimo dia de toda a Sua obra, que tinha feito. E abençoou o dia sétimo, e o
santificou; porque nele descansou de toda a Sua obra, que Deus criara e
fizera”. A tradução judaica traduz o texto mais literalmente do seguinte modo:
“Assim foram acabados os céus e a terra, e todos os seus exércitos. E Deus
acabou no sétimo dia a Sua obra que tinha feito, etc. Isto é o mesmo que
encontramos no quarto mandamento, (Ex. 20: 8 – 11).
Nisto verificamos, que o mais natural é, que o
mesmo Ser que criou, descansou. Ele que trabalhou seis dias na criação da
terra, descansou no sétimo, e o abençoou e santificou. Porém já aprendemos que
Deus Pai criou os mundos pelo Seu Filho Jesus Cristo, e que Cristo criou todas
as coisas que existem. Portanto é inevitável a conclusão que Cristo descansou
naquele primeiro sétimo dia, no final dos seis dias da criação, e que o
abençoou e santificou. Por conseguinte o sétimo dia o Sábado é o dia do
senhor mais enfaticamente. Quando Jesus disse para os fariseus acusadores,
“Porque o Filho do homem até do Sábado é Senhor”. (Mt. 12:8), ele declarou
a Sua soberania sobre um dia idêntico que eles tão escrupulosamente observavam
no aspecto exterior; e fê-lo em palavras que mostram que Ele o observava como
Seu distintivo de autoridade, como demonstração do facto de que Ele era tão
grande como o Templo. Deste modo, o dia de Sábado é o Divinamente indicado como
memorial da criação. É o dia mais honrado de todos, visto que a sua especial
missão é trazer à mente o poder criador de Deus, que é aquele que prova ao
homem, a Sua Divindade. Portanto, quando Cristo disse que o Filho do homem até
do Sábado é Senhor, Ele reivindicou uma alta distinção nada menos do que
ser o Criador, de cuja Divindade esse dia se mantém como um memorial.
O que diremos, então, à insinuação tantas vezes
feita, que Cristo mudou o dia de Sábado de um dia que comemora a finalização da
criação para um que não tem tal significação? Simplesmente isto, que para
Cristo mudar ou abolir o Sábado seria destruir aquilo que traz à mente a Sua
Divindade. Se Cristo tivesse abolido o Sábado, teria destruído a obra das Suas
próprias mãos, e assim teria trabalhado contra Si mesmo; e um reino dividido
contra si mesmo não pode subsistir. Mas Cristo “não pode negar-Se a Si mesmo”,
e portanto não mudou um jota daquilo que Ele mesmo determinou, e que, pela
proclamação da Sua Divindade, mostra-O digno de honra acima de todos os deuses
pagãos. Teria sido tão impossível a Cristo mudar o Sábado como seria mudar o
facto de que Ele criou todas as coisas em seis dias, e descansou no sétimo.
Outra vez, as tão repetidas declarações que o
senhor é Criador estão significadas como uma fonte de força. Notai como a
criação e redenção estão ligadas no primeiro capítulo de Colossenses. Para
alcançarmos plenamente o assunto perante nós, leremos os (versículos 9 – 19) : “Por esta razão, nós também, desde o dia em que
o ouvimos, não cessámos de orar por vós, e de pedir que sejais cheios do
conhecimento da Sua Vontade, em toda a sabedoria e inteligência espiritual;
Para que possais andar dignamente diante do Senhor, agradando-lhe em tudo,
frutificando em toda a boa obra, e crescendo no conhecimento de Deus;
corroborados em toda a fortaleza, segundo a força da Sua glória, em toda a
paciência, e longanimidade com gozo; dando graças ao pai que nos fez idóneos
para participar da herança dos santos na luz; o qual nos tirou da potestade das
trevas, e nos transportou para o reino do Filho do Seu amor; em quem temos a
redenção pelo Seu sangue, a saber, a remição dos pecados; O qual é a imagem do
Deus invisível, o Primogénito de toda a criação; Porque n’Ele foram criadas
todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam
tronos, sejam principados, sejam potestades; Tudo foi criado por Ele e para
Ele. E Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por Ele. E
Ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o Princípio e o Primogénito dentre os
mortos, para que em tudo tenha a preeminência. Porque foi do agrado do pai que
toda a plenitude n’Ele habitasse”.
Não é por acaso que a maravilhosa declaração
acerca de Cristo como Criador está ligada com a declaração de que n’Ele temos a
redenção. Não; quando o apóstolo torna conhecido o seu desejo que fossemos
“corroborados com toda a fortaleza, segundo a força da Sua glória”, ele dá-nos
a conhecer o que é esse glorioso poder. Quando nos fala sobre a libertação do
poder das trevas, dá-nos a conhecer alguma coisa do poder libertador.
É para nosso conforto que está escrito que a
cabeça da igreja é o Criador de todas as coisas. É-nos dito que todas as coisas
subsistem pela palavra do Seu poder (Hb.
1:3), a fim de que possamos descansar na certeza que:
“A mão que sustém toda a
natureza
também guardará os Seus
Filhos”.
Notai a ligação de (Is. 40:26). O capítulo
apresenta a maravilhosa sabedoria e poder de Cristo, ao chamar todos os
exércitos do céu pelos nomes, e em mantê-los a todos nos seus lugares, pela
grandeza da Sua força e pela fortaleza do Seu poder, e em seguida pergunta:
“Porque pois dizes, ó Jacó, e tua falas ó Israel: O meu caminho está encoberto
ao Senhor, e o meu juízo passa de largo pelo meu Deus? Não sabes, não ouviste
que o eterno Deus, o Senhor, o Criador dos fins da terra, nem se cansa nem se
fatiga? Não há esquadrinhação do seu entendimento”. Pelo contrário, “Dá esforço
ao cansado; e multiplica as forças ao que não tem nenhum vigor”. O Seu poder; é
de facto, a capacidade para criar todas as coisas do nada; portanto Ele pode
operar maravilhas através daqueles que não têm força. Ele pode fazer aparecer
força no fraco. Sem dúvida então, que qualquer coisa que serve para manter
perante a mente o poder criador de Cristo, tem que ter a tendência para renovar
a nossa força espiritual e coragem.
E este é precisamente o desígnio do Sábado.
Lemos (Salmo 92), que se intitula um Salmo para o Sábado.
Os primeiros quatro versículos são estes: “Bom é louvar ao Senhor, e cantar louvores ao
Teu nome, ó Altíssimo; para de manhã anunciar a Tua benignidade, e todas as
noites a Tua fidelidade, sobre um instrumento de dez cordas, e sobre o
saltério, sobre a harpa com som solene. Pois Tu, Senhor, me alegraste com os
Teus feitos; exultarei nas obras das Tuas mãos”.
O que tem isto a ver com o Sábado? Exactamente
isto: O Sábado é o memorial da criação. Diz o Senhor: “E também lhes dei os
Meus Sábados, para que servissem de sinal entre Mim e eles; para que soubessem
que Eu Sou o Senhor que os santifica”. (Ez. 20:12). O Salmista
guardou o Sábado como Deus ordenou que fosse guardado em meditação sobre a
criação e o maravilhoso poder e bondade de Deus contidos nela. E por conseguinte,
meditando nisso, ele compreendeu que o Deus que veste os lírios com uma glória
superior à de Salomão, cuida muito mais das Suas criaturas inteligentes; e da
maneira como ele contemplava os Céus, que mostram o poder e glória de Deus, e
compreendeu que lhes foi dada existência a partir do nada, viria a ele o
encorajador pensamento, que o mesmo poder operaria nele para o libertar da
enfermidade humana. Portanto, ele foi feliz, e triunfou na obra das mãos de Deus.
O conhecimento do poder de Deus, que veio a ele pela contemplação da criação,
encheu-o de coragem, quando compreendeu que o mesmo poder estava á Sua
disposição; e, alcançando esse poder pela fé, obteve vitórias através disso. E
este é o desígnio do Sábado; trazer o homem a um conhecimento salvador de Deus.
O argumento, resumidamente exposto é este:
1 - Fé em Deus é ser gerado por um conhecimento do
seu poder; não confiar n’Ele implica ignorância acerca da Sua capacidade para
cumprir as Suas promessas; a fé n’Ele tem que ser em proporção ao nosso real
conhecimento do Seu poder.
2 - Uma inteligente contemplação da criação de Deus
dá-nos uma verdadeira concepção do Seu poder; porque o Seu eterno poder e
Divindade são compreendidos pelas coisas que criou. (Rm. 1:20).
3 - É a fé que dá vitória (I Jo 5:4); portanto, uma
vez que a fé vem pelo conhecimento do poder de Deus, pela Sua palavra e pelas
coisas que Ele fez, nós obtemos a vitória, ou triunfamos pelas obras das Suas
mãos. Por isso, o Sábado, que é o memorial da criação, é, se devidamente observado,
uma fonte do maior reforço para o cristão em combate.
Á
luz desta grande verdade, não há lugar para o controvérsia acerca da redenção
ser maior do que a criação, porque redenção é criação. Ver (II Cr. 5:17); (Ef.
4:24).
O poder da redenção é o poder da criação; o poder de Deus para a salvação é o
poder que pode trocar a insignificância humana e fazer dela aquilo que será por
toda a eternidade para o louvor da glória da graça de Deus. “Portanto também os
que padecem segundo a vontade de Deus encomendem-lhe as suas almas, como ao
fiel Criador, fazendo o bem”. (Pedro 4:19).
Isto é o que (EZ. 20:12) quer dizer: “E
também lhes dei os Meus Sábados, para que servissem de sinal entre mim e eles,
para que soubessem que Eu Sou o Senhor que os santifica”. Isto é, sabendo que a
nossa santificação é a vontade de Deus, (1Tess. 4:3; 5:23, 24), aprendemos, por
meio do Sábado, correctamente observado, que é o poder de Deus que é exercido
na nossa santificação. O mesmo poder que foi utilizado na criação dos mundos é
utilizado na santificação dos que se submetem a si mesmos à vontade de Deus.
Certamente que este pensamento, quando completamente compreendido, deve trazer
alegria e conforto em Deus à alma sincera. À luz disto, podemos apreciar o
poder de (Is. 58:13, 14): “ Se desviares o teu pé do Sábado, e de
fazer a tua vontade no Meu Santo dia; e se chamares ao Sábado deleitoso, e
santo dia do Senhor digno de honra e o honrares não seguindo os teus caminhos,
nem pretendendo fazer a tua própria vontade, nem falar as tuas próprias palavras,
“então te deleitarás no senhor”, e te farei cavalgar sobre as alturas da terra,
e te sustentarei com a herança de teu pai Jacó; porque a boca do Senhor o
disse”.
Isto é, se o Sábado é guardado segundo o
plano de Deus, como um memorial do Seu poder que é usado para a salvação do Seu
povo, a alma, triunfando na obra das Suas mãos, deve deleitar-se no Senhor. E
por isso o Sábado é o grande fulcro para a alavanca da fé, que eleva a alma às
alturas do trono de Deus, para manter comunhão com Ele.
Para resumir o assunto em poucas
palavras, deve ser declarado o seguinte: O eterno poder e Divindade do senhor
estão revelados na criação. Mas o Evangelho é o poder de Deus para a Salvação. (Rm.1:16).
Por conseguinte o Evangelho apenas nos revela o poder que foi usado para dar
existência aos mundos, agora utilizado para a salvação dos homens. É o mesmo
poder em cada caso.
CRISTO O LEGISLADOR
“Porque
o Senhor é o nosso Juiz; o Senhor é o nosso Legislador; o Senhor é o nosso Rei;
Ele nos Salvará.” (Is. 33:22).
Agora
temos que considerar Cristo num outro aspecto, se bem que não seja mais um.
É o que resulta naturalmente da Sua posição como
Criador, porque Aquele que criou deve certamente ter autoridade para guiar e
controlar. Lemos em (João 5:22-23) as palavras de Cristo, que “o Pai a ninguém
julga, mas deu ao Filho todo o juízo; para que todos honrem o Filho, como
honram o Pai.” Tal como Cristo é a manifestação do pai na Criação, assim é Ele
a manifestação do Pai em dar e executar a lei. Alguns textos da Escritura serão
suficientes para provar isto.
Em
(Nm.
21: 4-6) temos um relato parcial de um incidente que teve lugar
enquanto os filhos de Israel estavam no deserto. Leiamo-lo: “Então partiram do
monte de Hor, pelo caminho do Mar Vermelho, a rodear a terra de Edom; porém a
alma do povo angustiou-se muito por causa do caminho. E o povo falou contra
Deus, e contra Moisés. Porque nos fizeste subir da terra do Egipto para que
morrêssemos neste deserto? Pois aqui nem pão nem água há; e a nossa alma tem
fastio deste pão tão vil. Então o Senhor mandou entre o povo serpentes
ardentes, que morderam o povo; e morreu muito povo de Israel.” (Trad.
K.J.) O povo falou contra Deus e contra Moisés, dizendo; porque nos
fizeste subir a este deserto? Eles não confiaram no seu Guia. Por causa disto é
que eles foram destruídos pelas serpentes. Seguidamente lemos as palavras do
apóstolo Paulo acerca do mesmo acontecimento:
“E
não tentemos a Cristo, como alguns deles também tentaram, e pereceram pelas serpentes.”
(1Cor.10:9).
O que é que isto prova? Que o Guia contra quem eles murmuraram era Cristo. Isto
é a seguir demonstrado pelo facto que quando Moisés lançou o seu destino com
Israel, recusando ser chamado filho da filha do Faraó, considerou a vergonha de
Cristo mais preciosa do que os tesouros do Egipto. (Hb. 11:26). Lede também (1Cr.10:4),
onde Paulo diz que os pais “beberam todos duma mesma bebida espiritual; porque
bebiam da pedra espiritual que os seguia; e a pedra era Cristo”. Portanto,
nesse tempo, Cristo era o Guia de Israel desde o Egipto.
O
terceiro capítulo de Hebreus explica este mesmo facto. Aqui está escrito para
considerar o Apóstolo e Sumo-sacerdote da nossa profissão, Cristo Jesus, que
foi fiel em toda a Sua casa, não como um servo, mas como um Filho sobre a Sua
própria casa. (Vers. 1-6). Em seguida diz-nos que somos a Sua casa se tão-somente
conservamos firme a confiança até ao fim. Portanto, somos exortados pelo
Espírito Santo a ouvir a Sua voz e a não endurecer os corações, como fizeram os
pais no deserto. “Porque nos tornamos participantes de Cristo, se retivermos
firmemente o princípio da nossa confiança até ao fim. Enquanto se diz: Hoje, se
ouvirdes a Sua (de Cristo) voz, não endureçais os vossos corações, como na
provação. Porque, havendo-a alguns ouvido, O provocaram; mas não todos os que
saíram do Egipto por meio de Moisés. Mas com quem se indignou Ele (Cristo)
durante 40 anos? Não por ventura com os que pecaram, cujos corpos caíram no
deserto?” (Vers. 14-17). Outra vez é Cristo colocado aqui como Guia e
Comandante de Israel durante os 40 anos de jornada no deserto.
A
mesma coisa é mostrada em (Js. 5:13-15), onde está escrito que
o homem que Josué viu perto de Jerico, tendo uma espada nas suas mãos, em
resposta à pergunta de Josué, “És tu dos nossos ou dos nossos inimigos?” Disse
“Não; mas venho agora como Capitão do exército do Senhor.” Na verdade, ninguém
se encontrará que ponha em dúvida que Cristo era o Guia de Israel, ainda que
invisível. Moisés o guia visível de Israel “ficou firme como vendo o
invisível.” Foi Cristo que comissionou Moisés para ir e libertar o Seu povo.
Seguidamente lemos (Ex. 20: 1-3):
“Então
falou Deus todas estas coisas, dizendo: Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei
na terra do Egipto, da casa da servidão. Não terás outros deuses diante de
Mim.”
Quem disse estas palavras? Aquele que os trouxe
do Egipto. E quem foi o Guia de Israel desde o Egipto? Foi Cristo. Então quem
proclamou a lei no monte Sinai? Foi Cristo, o brilho da glória do Pai, e a
expressa imagem da Sua pessoa. O qual é a manifestação de Deus para o homem.
Foi o Criador de todas as coisas, e Aquele a quem foi dado todo o julgamento.
Este
assunto pode ser provado de outra maneira. Quando o Senhor vier será com
alarido (1Tess. 4:16), que penetra as sepulturas e ressuscita os mortos
(João
5:28,29). “O Senhor desde o alto bramirá, e fará ouvir a Sua voz desde
a morada da Sua santidade; terrivelmente bramirá contra a Sua habitação; com um
grito de alegria, como aqueles que pisam as uvas, contra todos os habitantes da
terra. Chegará o estrondo até à extremidade da terra; porque o Senhor tem
contenda com as nações, entrará em juízo com toda a carne; os ímpios entregará
a espada, diz o Senhor.” (Jr. 25:30,31). Comparando isto com (Ap.
19:11-21), onde Cristo é o Comandante dos exércitos dos Céus, a Palavra
de Deus, Rei dos reis, e o Senhor dos senhores, o que pisará o lagar do vinho
do furor da ira do Deus Todo-Poderoso, destruindo todos os ímpios, verificamos
que é Cristo que brama da Sua habitação contra os habitantes da terra, quando
tem a Sua contenda com as nações. Joel junta outro ponto, em que ele diz, “O
Senhor bramará de Sião, e dará a Sua voz de Jerusalém, e os Céus e a terra
tremerão”, (Joel 3:16).
Deste
texto, aos quais outros se podiam juntar, aprendemos que em ligação com a vinda
do Senhor para libertar o Seu povo, Ele fala com uma voz que sacudirá a terra e
os céus, “De todo vacilará a terra como o ébrio, e será movida e removida como
a choça de noite” (Is. 24:20), e “no qual os céus passarão com grande estrondo” (Pe.11
3:10).
Em seguida lemos (Hb. 12:25, 26): “ Vede
que não rejeiteis ao que fala; se não escaparam aqueles que rejeitaram o que na
terra os advertia, muito menos nós, se nos desviarmos daquele que falou dos
céus; a voz do qual moveu então a terra, mas agora anunciou, dizendo: Ainda uma
vez comoverei, não só a terra, senão também o céu”. Versão K.J.
A
altura em que a voz falando na terra a fez tremer, foi quando a lei era
proferida no Sinai (EX. 19:18-20; Hb. 12:18-20), um acontecimento que de
assombroso nunca tinha tido paralelo, e nunca terá até que o Senhor venha com
todos os anjos do Céu, para salvar o Seu povo. Porém notai: A mesma voz que
nessa altura estremeceu a terra, no tempo vindouro, estremecerá não só a terra,
como também o céu; e vimos que é a voz de Cristo que soará com tal intensidade
que os céus e a terra tremerão quando Ele tiver a Sua contenda com as nações.
Portanto está demonstrado que foi a voz de Cristo que se ouviu no Sinai,
proclamando os dez mandamentos. Isto não é mais do que naturalmente teríamos
concluído daquilo que aprendemos acerca de Cristo como Criador, e Autor do
Sábado.
Na
realidade, o facto que Cristo é uma parte da Divindade, possuindo todos os
atributos da Divindade em todos os aspectos, como Criador e Legislador, é a
única força que há na expiação. É somente isto que torna possível a Redenção.
Cristo morreu “para que pudesse levar-nos a Deus”. (1Pe. 3:18); mas se lhe
faltasse um jota para ser igual a Deus, não podia levar-nos a Ele. Divindade significa
ter os atributos Divinos. Se Cristo não fosse Divino, então teríamos apenas um
sacrifício humano. Não importa, ainda que se admitisse que Cristo era a mais
elevada inteligência criada no Universo; nesse caso Ele seria um súbdito,
devendo obediência à lei, sem capacidades para fazer mais do que o Seu próprio
dever. Ele podia não ter justiça para conceder aos outros. Há uma distância
infinita entre o mais elevado anjo jamais criado por Deus, e Deus; portanto o
mais elevado anjo não podia levantar o homem perdido, e fazê-lo participante da
natureza Divina.
Os anjos podem ministrar; só Deus pode redimir.
Agradeçamos a Deus porque somos salvos “pela redenção que está em Cristo
Jesus,” em quem mora corporalmente toda a plenitude da Divindade, e que por esse
motivo, é capaz de salvar todos aqueles que vão a Deus através d’Ele.
Esta
verdade ajuda para uma mais perfeita compreensão da razão por que Cristo é
chamado a Palavra de Deus. Ele é Aquele por quem a vontade Divina e o poder
Divino se torna conhecido dos homens. Ele é, por assim dizer, o porta-voz da
Divindade, a manifestação do Divino. Ele declara ou faz conhecer Deus ao homem.
É do agrado do Pai que n’Ele habite toda a plenitude; e por isso o pai não O
colocou numa posição secundária, como alguns pensam, quando Cristo é exaltado
como Criador e Legislador; porque a glória do Pai brilha através do Filho.
Visto que Deus é conhecido apenas através de Cristo, é evidente que o Pai não
pode ser honrado como deve ser, por aqueles que não exaltam Cristo. Tal como o
próprio Cristo disse, “quem não honra o Filho, não honra o Pai que O enviou.” (João
5:23).
Pergunta-se
como podia Cristo ser Mediador entre Deus e o homem e também o Legislador? Não
temos que explicar como podia isso ser mas simplesmente aceitar o relato da
Escritura que diz ser assim. E o facto de que é assim é aquele que dá força à
doutrina da expiação. A certeza para o pecador do total e livre perdão assenta
no facto de que o próprio Legislador, Aquele contra quem ele se revelou e a
quem tem desafiado, é o que se deu a Si mesmo por nós. Como é possível para
qualquer um duvidar do honesto propósito de Deus, ou da Sua perfeita
boa-vontade para com a humanidade, quando se deu a Si mesmo para sua redenção?
Não imagineis que o Pai e o Filho estavam separados nesta realização. Eles eram
um nisto como em tudo o mais. Conselho de paz haverá entre Eles ambos.
(Zc. 6:12,13), e
mesmo aqui na terra o Unigénito Filho estava no seio do Pai.
Que
maravilhosa manifestação de amor! O Inocente sofreu pelo culpado; o Justo, pelo
injusto; o Criador, pela Criatura; o Autor da lei pelo transgressor; o Rei
pelos súbditos rebeldes. Visto que Deus não poupou o Seu próprio Filho, antes
livremente O entregou por todos nós; Desde então Cristo voluntariamente se deu
a Si mesmo por todos nós.
Quando mais não nos dará Ele todas as coisas? O
Infinito amor não podia dar uma maior manifestação de si mesmo. Bem pode o
Senhor dizer, “O que mais se podia fazer à minha vinha que Eu não lhe tivesse
feito.”
A JUSTIÇA DE DEUS
“Mas buscai primeiro o reino de Deus, e a Sua justiça e
todas estas coisas vos serão acrescentadas.” (Mateus 6:33).
Jesus
diz que a única coisa a ter em vista nesta vida é a justiça de Deus. Alimento e
vestidos são a menor necessidade em comparação com isso. Deus deseja provê-las
como uma coisa natural, de maneira que não precisa haver ansioso cuidado e
preocupação pela falta delas; mas a certeza do reino de Deus e Sua justiça
devem ser o único desejo da vida.
Em
(I
Cor. 1:30), está escrito que Cristo foi feito justiça e sabedoria por
nós; desde então Cristo é a sabedoria de Deus e n’Ele mora corporalmente a
plenitude da Divindade, é evidente que a justiça em que Ele foi feito para nós
é a justiça de Deus. Vejamos o que é esta justiça.
Em
(Salmos
119:172), o Salmista dirige-se destes termos ao senhor: “A minha língua
falará da Tua palavra, pois todos os Teus mandamentos são justiça.” Os
mandamentos são justiça, não apenas em abstracto, mas são a justiça de Deus.
Para provar lemos o seguinte:
“Levantai
os vossos olhos para os céus, e olhai para a terra de baixo, porque os céus
desaparecerão como o fumo, e a terra se envelhecerá como um vestido, e os seus
moradores morrerão semelhantemente; mas a minha salvação durará para sempre, e
a minha justiça, não será quebrantada. Ouvi-me vós que conheceis a justiça,
vós, povo, em cujo coração está a minha lei; não temais o opróbrio dos homens,
nem vos turveis pelas suas injúrias.” (Isaías 51: 6,7).
O
que aprendemos disto?
Os que conhecem a justiça de Deus são aqueles em
cujo coração está a Sua lei, e por conseguinte a lei de Deus é a justiça de
Deus.
Isto
pode ser provado de novo, como segue: “Toda a iniquidade é pecado.” (1Jo.
5:17).
“Qualquer que comete pecado, também transgride a
lei; porque o pecado é a transgressão da lei.” (1Jo. 3:4). (Versão
K.J.). Pecado é a transgressão da Lei, e também é injustiça; portanto
pecado e injustiça são exactamente o mesmo. Porém, se injustiça é transgressão
da lei, justiça tem que ser obediência à lei. Ou, para por a proposição na
forma matemática:
Injustiça = I João 5:17
Transgressão da lei = pecado I João 3:4 (Versão
K.J.)
Por
isso, de acordo com o axioma que duas coisas que são iguais a uma mesma coisa
são iguais entre si, temos:
Injustiça = transgressão da lei
A qual é uma equação negativa. A mesma coisa,
transformada em termos positivos, seria:
Justiça = obediência à lei
Ora
a que lei é a obediência para que seja justiça e desobediência para que seja
pecado? É a lei que diz, “não cobiçarás;” porque o apóstolo Paulo diz-nos que
esta lei convencia-o do pecado. (Rm. 7:7). Então, a lei dos dez
mandamentos, é o padrão da justiça de Deus. Visto que é a lei de Deus, e é
justiça, tem que ser a justiça de Deus. Na verdade, não há outra justiça.
Visto
que a lei é a justiça de Deus – uma transcrição do Seu carácter – é fácil ver
que temer a Deus e guardar os Seus mandamentos é todo o dever do homem.
(Ec. 12:13). Não permiti que alguém pense que o seu dever será limitado
se estiver limitado aos Dez mandamentos, porque eles são “infinitamente amplos.”
“A lei é espiritual,” e compreende muito mais do que aquilo que pode ser
discernido por um leitor habitual. “O homem natural não compreende as coisas do
Espírito de Deus; porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque
elas se discernem espiritualmente.” (I Cr. 2:14). A extraordinária
amplitude da lei apenas pode ser compreendida pelos que orando, têm meditado
nela.
Alguns textos da Escritura chegarão para
mostrar-nos um pouco da sua amplitude.
No
sermão da montanha Cristo disse: “Ouvistes o que foi dito aos antigos; Não
matarás; mas qualquer que matar será réu de juízo, eu, porém, vos digo que
qualquer que sem motivo se encolerizar contra seu irmão, será réu do sinédrio;
e qualquer que lhe disser: louco, será réu do fogo do inferno.” (Mt.
5: 21,22). E ainda “Ouvistes o que foi dito aos antigos: Não cometerás
adultério. Eu, porém, vos digo, que qualquer que atentar numa mulher para a
cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela.” (Verso. 27, 28).
Isto
não quer dizer que os mandamentos “Não matarás”, e, “Não cometerás adultério”,
são imperfeitos, ou que Deus requer agora um maior grau de moralidade dos
cristãos que Ele requeria do Seu povo que era chamado judeu. Ele requer o mesmo
de todos os homens em todas as eras. O Salvador simplesmente explicou estes
mandamentos, e mostrou a sua espiritualidade. À calada acusação dos fariseus de
que Ele estava ignorando e destruindo a lei moral, replicou dizendo que veio
com o propósito de cumprir a lei e que ela não podia ser abolida; e em seguida
expôs o verdadeiro significado da lei, numa forma que os convenceu da
ignorância e desobediência deles. Ele mostrou que mesmo um olhar ou um
pensamento podia ser uma violação à lei, e que ela é na realidade um
esquadrinhador dos pensamentos e intentos do coração.
Nisto
Cristo não revelou uma nova verdade, mas apenas trouxe luz e revelou uma
antiga. A lei quer dizer exactamente o mesmo como quando Ele a proclamou no
Sinai e quando a expôs na montanha da Judeia. Quando, em tons que fizeram
estremecer a terra, Ele disse, “Não matarás”, queria dizer, “não acariciarás a
ira no teu coração; não te entregarás à inveja, nem contenda, nem qualquer
coisa que seja no mais remoto grau que esteja ligado a assassínio.” Tudo isto e
muito mais está contido nas palavras, “Não matarás.” E isto era ensinado pelas
palavras inspiradas no Velho Testamento; pois Salomão mostrou que a lei trata
de coisas que não se vêem, quando escreveu:
“De
tudo o que se tem ouvido, o fim é: Teme a Deus, e guarda os Seus mandamentos;
porque este é o dever de todo o homem. Porque Deus há-de trazer a juízo toda a
obra, e até tudo o que está encoberto, quer seja bom quer seja mau.” (Ec.
12:13,14).
O
argumento é este: O julgamento é feito sobre cada coisa secreta; a lei de Deus
é o padrão no julgamento, ela determina a natureza de cada acto, seja bom ou
mau; portanto a lei de Deus proíbe o mal tanto no pensamento como na prática.
Por conseguinte o fim de tudo o que se tem ouvido é que os mandamentos de Deus
contêm todo o dever do homem.
Tomemos
o primeiro mandamento, “Não terás outros deuses diante de Mim.” O apóstolo
fala-nos de alguns “para quem o seu Deus era o apetite.” (Fp. 3:19). Mas
glutonaria e intemperança são um suicídio; e assim verificamos que o primeiro
mandamento trespassa os restantes. Isto não é tudo, porque ele também nos diz
que cobiça é idolatria. (Col. 3:5). O décimo mandamento não
pode ser violado sem violar o primeiro e o segundo. Por outras palavras, o
décimo mandamento coincide com o primeiro; e verificamos que o decálogo é um círculo
tendo uma circunferência tão grande como o universo, e contendo no seu interior
o dever moral de cada criatura. Em resumo, ela é a norma da justiça de Deus,
que persiste eternamente.
Sendo
este o caso, a exactidão da declaração que “os que praticam a lei serão
justificados,” é óbvio. Justificar significa fazer justo, ou
mostrar que alguém é justo. Ora é evidente que perfeita obediência a uma lei
perfeitamente justa constituirá qualquer uma pessoa justa. Foi o propósito de
Deus que todas as criaturas rendessem tal obediência à lei; e deste modo foi a
lei ordenada para vida. (Rm. 7:10).
Mas
para qualquer pessoa ser julgada “um cumpridor da lei” seria necessário que
tivesse guardado a lei na sua mais completa extensão e em cada momento da sua
vida. Se ele tropeçasse num só ponto destes, não podia dizer-se cumpridor da
lei. Ele não podia ser um cumpridor da lei se a tivesse cumprido apenas em
parte. É um triste facto, portanto, que não haja em toda a raça humana
cumpridores da lei, porque tanto judeus como gentios estão “todos debaixo da
lei do pecado; tal como está escrito, não há um justo, nem um sequer; não há
ninguém que entenda; não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e
juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só.” (Rm.
3:9-12). A lei fala a todos os que estão dentro do seu alcance; e em
todo o mundo não há um que possa abrir a sua boca para se limpar a si mesmo da
acusação de pecado que ela trás contra ele. Para que toda a boca esteja fechada
e todo o mundo seja condenável diante de Deus. (Vers. 19). “Porque todos
pecaram e destituídos estão da glória de Deus”. (Vers. 23).
Portanto,
embora “nenhuma carne seja justificada pelas obras da lei”, é evidente que
“nenhuma carne será justificada diante d’Ele pelas obras da lei, porque pela
lei vem o conhecimento do pecado. (Vers. 20) A lei, sendo “santa, e
justa, e boa”, não pode justificar o pecador. Por outras palavras, uma lei
justa não pode declarar uma pessoa que a transgride, inocente. Uma lei que
justificasse um homem ímpio seria uma lei ímpia.
A lei devia ser vilipendiada por não poder
justificar os pecadores. Pelo contrário, ela deve ser exaltada por causa disso.
O facto que a lei não declarará os pecadores, como justos – o que não é dizer
que esses homens a tenham guardado, quando a transgrediram, – é em si mesmo
suficiente evidência de que ela é boa, Os homens aplaudem um incorruptível juiz
terreno, o qual não pode ser subornado e que não declarará um homem culpado
como inocente. Seguramente, eles deviam enaltecer a lei de Deus, que não dará
um falso testemunho. Ela é a perfeição da justiça, e portanto ela é forçada a
declarar o triste facto que não há sequer um da raça de Adão que tenha cumprido
as suas exigências.
Além disso, o facto que cumprir a lei é simplesmente
o dever do homem, mostra que quando ele não o faz num simples pormenor nunca o
pode fazer totalmente. Os requisitos de cada preceito da lei são tão amplos, –
toda a lei é tão espiritual, – que um anjo não podia render-lhe mais do que
simples obediência. Sim, muito mais, a lei é justiça de Deus, uma transcrição
do Seu carácter, – e uma vez que o Seu carácter não pode ser diferente do que
ela é, conclui-se que mesmo o próprio Deus não pode ser melhor do que a medida
da bondade requerida pela Sua lei. Ele não pode ser melhor do que é, e a lei
declara o que Ele é. Que esperança, então, tem aquele que falhou, num único
preceito, de poder juntar bondade suplementar para fazer a medida completa? Ele
que se esforça por fazer aquilo que coloca perante si mesmo a impossível tarefa
de ser melhor do que Deus requer, sim, mesmo melhor do que o próprio Deus.
Porém, não é simplesmente num único pormenor que
os homens falham. Eles falham em cada pormenor. “Todos se extraviaram, e
juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só.” Não
apenas assim, mas é impossível ao homem caído, com o seu débil poder, para
praticar até um simples acto que esteja ao nível do perfeito padrão. Esta
proposição não precisa ser mais provada do que uma reafirmação do facto que a
lei é o padrão da justiça de Deus. Certamente que não há alguém tão presunçoso
para pretender que qualquer acto de suas vidas tenha sido ou possa ser tão bom
como se fosse feito pelo próprio Senhor. Todos devem dizer com o salmista, “Não
tenho outro bem além de ti.” Sl. 16:2
Este facto está incluído em declarações directas
da Escritura. Cristo, “Não necessitava que alguém testificasse do homem, porque
Ele bem sabia o que havia no homem” (Jo. 2:25), disse: “Porque do
interior do coração dos homens saem os maus pensamentos, os adultérios, as
prostituições, os homicídios, os furtos, a avareza, as maldades, o engano, a
dissolução, a inveja, a blasfémia, a soberba, a loucura. Todos estes males
procedem de dentro e contaminam o homem.” Mc. 7: 21-23. Por outras palavras, é
mais fácil cometer o erro do que fazer o que é correcto e as coisas que uma
pessoa naturalmente faz é mau. O mal mora no interior e faz parte da pessoa. Por
isso o apóstolo diz “A inclinação (carnal, natural) da carne é inimizade contra
Deus; pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser. Portanto
os que estão na carne não podem agradar a Deus.” Rm. 8:7-8. E
ainda. “Porque a carne cobiça contra o Espírito, e o Espírito contra a carne; e
estes opõem-se um ao outro, para que não façais o que quereis. “ Jl.
5:17. Em virtude do mal ser uma parte da própria natureza do homem,
sendo uma herança de cada indivíduo através duma longa linha de antepassados
pecadores, é muito evidente que por mais justiça que venha dele tem que ser
apenas como “trapos da imundície” (Isaías 64:6), comparados com a
imaculada vestido da justiça de Deus.
A impossibilidade de haver boas obras
procedentes de um coração pecaminoso é assim expressivamente ilustrada pelo
nosso Salvador: “Porque cada árvore se conhece pelo seu próprio fruto; pois não
se colhem figos dos espinheiros, nem se vindimam uvas dos abrolhos. O homem bom
do bom tesouro do ser coração tira o bem, e o homem mau do mau tesouro do seu
coração tira o mal, porque da abundância do seu coração fala a boca.” Lucas
6:44,45. Isto é dizer, que um homem não pode fazer bem sem que
primeiramente se torne bom. Por conseguinte, obras feitas por uma pessoa
pecaminosa não tem qualquer efeito para a fazer justa, mas, pelo contrário,
vindo de um coração mau, elas são más, e assim adicionadas à soma da sua
pecaminosidade. Somente mal pode vir de um mau coração, e o mal multiplicado
não pode fazer obras boas; portanto é inútil uma pessoa má pensar em tornar-se
justo antes pelos seus próprios esforços. Primeiramente ele tem que ser feito
justo antes de puder fazer o bem que lhe é exigido, e que ele quer fazer.
Então, o caso fica assim:
1. A Lei
de Deus é a perfeita justiça; e perfeita conformidade
com ela, é exigida de cada um
que deve entrar no reino dos
céus.
2. Mas a
lei não tem uma partícula de justiça para dar a
qualquer homem, porque todos
são pecadores, e não podem
obedecer aos seus requisitos.
Não importa quão diligentemente nem quão zelosamente
um homem trabalhe, nada do que ele possa fazer encontrará a medida completa
medida das exigências da lei. É demasiado elevado para ele alcançar; ele não
pode alcançar a justiça pela lei. “Por isso nenhuma carne será justificada
(feita justa) diante d’Ele pelas obras da lei.” Que deplorável condição! Nós
temos que ter a justiça da lei ou não poderemos entrar no céu, e mesmo assim a
lei não tem justiça para qualquer de nós. Ela não concederá aos nossos mais
persistentes e enérgicos esforços a mais pequena porção daquela santidade sem a
qual nenhum pode ver o senhor.
Quem,
então, pode ser salvo? Pode, então, haver tal coisa como uma pessoa justa? Sim,
porque a Bíblia frequentemente fala deles. Ela fala de Ló como “esse justo
homem;” ela diz, “Dizei aos justos, que bem lhes irá, porque comerão do fruto
das suas obras” (Is. 3:10), indicando assim que haverá pessoas justas para
receber a recompensa; e claramente declara que no final haverá uma nação justa,
dizendo: “Naquela dia se entoará este cântico na terra de Judá: Uma forte
cidade temos, a que Deus pôs a salvação por muros e ante muros. Abri as portas,
para que entre nela a nação justa, que observa a verdade.” Is. 26: 1-2. David diz, “a Tua lei é a
verdade.” Sl. 119: 142. Ela
não é somente a verdade, mas a suma de toda a verdade; consequentemente a nação
que guarda toda a verdade será a nação que guarda os mandamentos de Deus. Esses
serão os que farão a Sua vontade, e entrarão no reino do céu. Mateus
7: 21.
O SENHOR JUSTIÇA NOSSA
Então, a questão é, como pode a justiça que é
necessária para que alguém possa entrar naquela cidade, ser obtida? A resposta
a esta pergunta é a grande obra do Evangelho. Tenhamos primeiramente uma
parábola acerca da justificação, ou justiça imputada. O facto pode ajudar-nos a
uma melhor compreensão da teoria. O exemplo é dado em Lc. 18: 9-14, nestas
palavras: “E
disse também esta parábola a uns que confiavam em si mesmos, crendo que eram
justos, e desprezavam os outros: Dois homens subiram ao templo, a orar; um
fariseu, e outro publicano. O fariseu, estando em pé, orava consigo desta
maneira: Ó Deus, graças Te dá, porque não sou como os demais homens,
roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano. Jejuo duas
vezes por semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo. O publicano, porém,
estando em pé, de longe nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas batia no
peito, dizendo: Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador! Digo-vos que este
desceu justificado para casa. E não aquele; porque qualquer que a si se exalta
será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado.”
Isto foi dado para mostrar como não podemos, e
como podemos, obter justiça. Os fariseus não estão extintos; há muitos nestes
dias que esperam alcançar justiça pelas suas próprias boas obras. Eles confiem
em si mesmos que são justos. Eles nem sempre se vangloriam tão abertamente dos
seus méritos, porém mostram de outras maneiras que estão confiando na sua
própria justiça. Talvez o espírito do fariseu, o espírito que relata a Deus as
próprias boas obras de alguém como razão para favorecer, é encontrado tão
frequentemente como noutro lado entre aqueles professos cristãos que sentem a
maior submissão por causa dos seus pecados. Eles sabem que pecaram, e sentem-se
condenados. Eles lamentam o seu estado pecaminoso e deploram a sua fraqueza. O
seu testemunho nunca se eleva acima deste nível. Frequentemente eles
reprimem-se por muito se envergonharem de falar em reuniões sociais, e muitas
vezes eles não ousam aproximar-se de Deus em oração. Depois de terem pecado num
grau mais elevado do que o habitual, privam-se de orar por algum tempo, até que
o vívido sentido da sua queda tenha passado, ou até imaginarem que compensaram
isso com algum especial bom procedimento. O que revela isto? Aquele espírito
farisaico que exibiria a sua própria justiça perante a face de Deus; que não
viria perante Ele a menos que isso pudesse apoiar-se no falso da sua suposta
bondade própria. Eles queriam poder dizer ao Senhor, “Vê quão bom eu tenho sido
neste poucos dias, certamente que Tu me aceitarás agora.”
Mas qual é o resultado? O homem que confiou em
sua própria justiça nada obteve, enquanto que o homem que orou, com um coração
contrito, “Deus sê misericordioso comigo, um pecador,” foi para sua casa
justificado. Isto diz que ele desceu justificado, isto é, feito justo.
Notai que o publicano fez algo mais do que
lamentar o seu estado pecaminoso; ele pediu misericórdia. O que é misericórdia?
É auxílio imerecido. É a disposição para tratar de um homem melhor do que ele
merece. Ora a Palavra Inspirada diz de Deus: “Pois quando o céu está elevado
acima da terra, assim é grande a Sua misericórdia para com os que O temem.” Sl.
103:11. Isto é, a medida pela qual Deus nos trata melhor do que
merecemos quando nós em humildade vamos a Ele, é a distância entre a terra e a
altura dos céus. Em que respeito nos trata Ele melhor do que merecemos? Tirando
de nós os nossos pecados; porque o versículo seguinte diz: “quando está longe o
oriente do ocidente, assim afasta de nós as nossas transgressões.” Com isto
concordam as palavras do discípulo amado: “Se confessar-mos os nossos pecados,
Ele é fiel e justo, para nos perdoar dos pecados e nos purificar de toda
injustiça.” I Jo. 1:9.
Para mais uma declaração da benignidade de Deus,
e de como é manifestada, lede Mq. 7: 18-19: “Quem, ó Deus, é
semelhante a Ti; que perdoas a iniquidade, e que Te esqueces da rebelião do
restante da Sua herança? O Senhor não retém a Sua ira para sempre, porque tem
prazer na benignidade. Tornará a apiedar-se de nós; subjugará as nossas
iniquidades, e lançará todos os nossos pecados nas profundezas do mar.” Leiamos
agora a declaração directa da Escritura de como a justiça é concedida.
O Apóstolo Paulo, tendo provado que todos
pecaram ficaram destituídos da glória de Deus, de maneira que pelas obras da
lei nenhuma carne será justificada diante d’Ele, prossegue dizendo que somos
“justificados (feitos justos) gratuitamente pela Sua graça pela redenção que há
em Cristo Jesus. Ao qual Deus propôs para propiciação pela fé no Seu sangue,
para demonstrar a Sua justiça pela remição dos pecados dantes cometidos, sob a
paciência de Deus; para demonstração da Sua justiça neste tempo presente, para
que Ele seja justo, e justificador daquele que tem fé em Jesus.” Rm.
3:24-26.
“Ser feito justo gratuitamente.” Que mais podia
ser? Visto que os melhores esforços dum homem pecador não tem o mínimo efeito
para produzir justiça é evidente que a única maneira para isso acontecer nele é
na forma de uma dádiva. Que justiça é uma dádiva, está plenamente declarado por
Paulo em Romanos 5:17: “Porque, se pela ofensa de um só, a morte reinou
por esse, muito mais os que recebem a abundância da graça, e do dom da justiça,
reinarão em vida por um só, Jesus Cristo.” É por causa da justiça ser um dom
para a vida eterna, que é a recompensa de justiça, a dádiva de Deus, por Jesus
Cristo nosso Senhor.
Cristo foi colocado por Deus como aquele através
do qual o perdão dos pecados tem de ser obtido: e este perdão consiste
simplesmente na declaração da Sua justiça (que é a justiça de Deus) para a
remissão dos pecados. Deus, “que é rico em misericórdia” (Ef.2:4), e que se
deleita nisso, põe a Sua própria justiça no pecador que crê em Jesus, como um
substituto dos seus pecados. Certamente que isto é uma troca vantajosa para o
pecador, e não é um prejuízo para Deus, porque Ele é infinito em santidade e a
provisão nunca pode ser diminuída.
A Escritura que acabámos de considerar (Rm.
3:24-26) não é senão outra declaração dos vers. 21,22, seguido da
declaração que pelas obras da lei nenhuma carne será justificada. O apóstolo
acrescenta: “Mas agora se manifestou sem a lei a justiça de Deus, tendo o
testemunho da lei e dos profetas; isto é, a justiça de Deus pela fé em Jesus
Cristo para todos e sobre todos os que crêem.” Deus coloca a Sua justiça sobre
o crente. Ele cobre-o com ela, de modo que o seu pecado nunca mais aparece.
Então o perdoado pode exclamar com o profeta:
“Regozijar-me-ei muito no Senhor, a minha alma
se alegra no meu Deus; porque me vestiu de vestidos de salvação, me cobriu com
o manto de justiça, como um noivo se adorna com atavios, e como noiva que se
enfeita com as suas jóias.” Is. 61:10.
Então que diremos sobre “a justiça de Deus sem a
lei”? Como pode isso estar de acordo com a declaração que a lei é a justiça de
Deus, e que fora dos seus requisitos não há justiça? Não há contradição aqui. A
lei não é ignorada por este processo. Note-se cuidadosamente: Quem deu a lei?
Cristo. Como a proclamou Ele? “Como quem tem autoridade,” Tal como Deus. A lei
irradiava-se d’Ele da mesma maneira como do Pai, e é simplesmente uma
proclamação da justiça do Seu carácter. Portanto a justiça que vem pela fé de
Jesus Cristo é a mesma que está resumida na lei; e é mais adiante provado pelo
facto que isto é o “testemunho da lei”.
Deixai que o leitor tente imaginar a cena. Aqui
está a lei como testemunha viva contra o pecado. Ela não pode mudar, e não
chamará ao pecador um homem justo. O pecador convicto tenta uma e outra vez
obter justiça da lei, porém ela resiste a todas as suas aproximações. Ela não
pode ser subornada por qualquer quantidade de penitência ou pretensas boas
obras. Mas aqui ergue-se Cristo,“cheio de graça” e de verdade, atraindo a Si o
pecador. Por fim o pecador, cansado da luta inútil para alcançar a justiça da
lei, houve a voz de Cristo, e corre para os Seus braços abertos. Escondido em
Cristo é coberto com a Sua justiça; e agora observai! Ele obteve, pela fé em
Cristo, aquilo pelo que tem lutado inutilmente. Ele tem a justiça que a lei
exige, e é a verdadeira justiça, porque a obteve da Fonte da Justiça;
exactamente do mesmo lugar de onde a lei veio. E a lei testifica a
autenticidade desta justiça. Ela diz que enquanto o homem a retiver, irá
perante o tribunal defendê-lo contra todos os acusadores. Ela testemunhará o
facto de que ele é um homem justo. Com a justiça que é “pela fé em Cristo, a
justiça que vem de Deus pela fé” (Fl. 3:9), Paulo estava seguro de
que subsistiria no dia de Cristo.
Não há na transacção espaço para encontrar
falta. Deus é justo, e ao mesmo tempo o Justificador daquele que crê em Jesus.
Em Jesus mora toda a plenitude da divindade; Ele é igual ao Pai em cada
atributo. Consequentemente a redenção que está n’Ele o poder para trazer de
volta o homem perdido é infinito. A rebelião do homem é tanto contra o Filho
como contra o pai, visto que ambos são um. Portanto, quando Cristo “se deu a Si
mesmo pelos nossos pecados,” era o Rei sofrendo pelos súbditos rebeldes. A
pessoa ofendida passando, desculpando, pela ofensa do ofensor. Nenhum céptico
negará que qualquer homem tem o direito e privilégio de perdoar qualquer ofensa
cometida contra Si mesmo; tal esse direito; e mais porque Ele reivindica a
integridade da Sua lei, submetendo a sua própria Pessoa há punição que era
devida ao pecador. “Mas o inocente sofreu pelo culpado.” Certo; mas o inocente
Sofredor “deu-Se a Si mesmo” voluntariamente, a fim de que Ele pudesse em
justiça com o Seu governo fazer aquilo que o Seu abnegado amor, a saber, passar
pela injúria feita a Si mesmo como Soberano no universo.
Agora leiamos a própria declaração de Deus sobre
o Seu próprio Nome – uma declaração dada em face de um dos piores casos de
desobediência apresentado a Ele: “E o Senhor desceu numa nuvem, e se pôs ali
junto a ele; e ele apregoou o nome do Senhor. Passando pois o Senhor perante a
sua face, clamou: O Senhor Deus, misericordioso e piedoso, tardio em iras e
grande em beneficência e verdade: que guarda a beneficência em milhares; que
perdoa a iniquidade, e a transgressão, e o pecado; que ao culpado não tem por
inocente; que visita a iniquidade dos pais sobre os filhos e sobre os filhos
dos filhos até à terceira e quarta geração.” Êxodo 34: 5-7. (Versão
K.J.).
Este é o Nome de Deus; é o carácter no qual Ele
se revela a Si mesmo ao homem; a luz na qual Ele deseja que os homens O olhem.
Então que diremos da declaração que Ele “ao culpado não tem por inocente”? Que
está perfeitamente de acordo com a Sua grande paciência, abundante
beneficência, e o Seu perdão das transgressões do Seu povo. É verdade que Deus não
terá o culpado por inocente; Ele não podia fazer isso e continuar a ser um Deus
justo. Porém Ele faz algo muito melhor: Ele
remove a culpa, de maneira que uma pessoa primeiramente culpada não
precisa estar limpo, ele é justificado, e contado como se nunca tivesse pecado.
Não deixeis que alguém argumente com sofismas
acerca da expressão, “cobrir de justiça” como se tal coisa fosse uma
hipocrisia. Alguns, com uma singular falta de apreciação do valor do dom da
justiça, têm dito que não quiseram a justiça que foi “vestida”, mas que queriam
somente aquela justiça que vem da vida, depreciando assim a justiça de Deus,
que é pela fé de Jesus Cristo para todo e sobre todo aquele que crê.
Concordamos com as suas ideias até ao ponto em que isto é um protesto contra a
hipocrisia, uma forma de divindade sem poder; mas teríamos o leitor a criar na
mente este pensamento: isto faz uma diferença muito grande de quem é que cobre de justiça. Se tentarmos
vesti-la nós mesmos, então realmente não obtemos mais do que uma vestimenta
imunda, não importa quão formosa ela nos pareça; mas quando é Cristo que nos
veste, não deve ser desprezada ou rejeitada. Notai a expressão em Isaías: “Ele
me cobriu com o manto de justiça.” A Justiça com a qual Cristo nos cobre é
justiça que encontra a aprovação de Deus é satisfeito com ela, certamente que
os homens não devem tentar encontrar alguma coisa melhor.
Mas nós continuamos esta ilustração somente mais
um passo, e isso libertará o assunto de toda a dificuldade. (Zc.
3: 1-5) dá-nos a solução: lê-se assim: “E me mostrou o sumo-sacerdote Josué, o qual
estava diante do Anjo do Senhor, e Satanás estava à Sua mão direita, para se
lhe opor. Mas o Senhor disse a Satanás: O senhor te repreende, ó Satanás; sim,
o Senhor, que escolheu Jerusalém, te repreende; não é este um tição tirado do
fogo? Ora Josué, vestido de vestidos sujos, e estava diante do Anjo. Então
falando, ordenou aos que estavam diante d’Ele, dizendo: Tirai-lhe estes
vestidos sujos. E a ele lhe disse: Eis que tenho feito com que passasse de ti a
tua iniquidade, e te vestirei de vestidos novos. E disse eu: Ponham-lhe uma
mitra limpa sobre a sua cabeça. E puseram uma mitra limpa sobre a sua cabeça e
o vestiram de vestidos: E o Anjo do senhor estava ali.”
Note-se no relato acima descrito que o tirar dos
vestidos sujos é o mesmo que tirar a iniquidade da pessoa. E por isso nós
verificamos que quando Cristo nos cobre com o manto da Sua própria justiça, ele
não dá uma capa para o pecado mas tira o pecado. E isto mostra-nos que o perdão
dos pecados é algo mais do que uma mera forma, algo mais do que uma mera
entrada nos livros de registo no céu, a fim de que o pecado seja cancelado. O
perdão dos pecados é uma realidade; é qualquer coisa evidente, algo que
fundamentalmente afecta a pessoa. Na realidade purifica-o do pecado; e se ele é
purificado do pecado, é justificado, feito justo, tem certamente que sofrer uma
mudança radical. Ele é, na verdade, outra pessoa. Visto que obteve esta justiça
pela remissão dos pecados, em Cristo. Foi obtida apenas revestindo-se de
Cristo. Mas "se alguém está em Cristo, nova criatura é. “II
Cor. 5:17. E assim o completo e livre perdão dos pecados traz consigo
aquela maravilhosa e miraculosa mudança conhecida como o novo nascimento.
Porque um homem não se pode tornar uma nova criatura a não ser por novo
nascimento. Isto é o mesmo que ter um coração novo, ou limpo.
O coração novo é um coração que ama a justiça e
odeia o pecado. É um coração pronto a ser guiado nas veredas da justiça. É um
coração assim que o Senhor desejava que Israel tivesse quando disse, “Quem dera
que eles tivessem tal coração que Me temessem, e guardassem todos os Meus
mandamentos todos os dias, para que bem lhes fosse a seus filhos para sempre!” Dt.
5:29. Em resumo, é um coração liberto do amor do pecado como também da
culpa do mesmo. Mas o que faz um homem desejar sinceramente perdão dos seus
pecados?
É simplesmente o seu ódio por eles, e o seu
desejo de justiça, que os aborrece e deseja ser inflamado pelo Espírito Santo.
O Espírito contende com todos os homens. Ele vem
como um reprovador; quando a sua voz de reprovação é ouvida, então
imediatamente assume a função de confortador. A mesma submissão, disposição de
ceder que conduz a pessoa a aceitar a reprovação do Espírito, também o guiará a
seguir os ensinamentos do espírito, e Paulo diz que “todos os que são guiados
pelo Espírito de Deus esse são filhos de Deus.” Rm. 8:14.
Uma vez mais, o que traz justificação, ou o
perdão dos pecados? É a fé, porque Paulo diz: “Sendo pois justificados pela fé,
temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo.” Rm. 5:1. A justiça
de Deus é dada a todos e sobre todos os que crêem. Rm. 3:22. Mas este mesmo
exercício da fé faz a pessoa um filho de Deus, visão que o apóstolo Paulo diz
outra vez, “porque todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus.” Gál.
3:26.
O facto que cada um cujos pecados são perdoados
é imediatamente um Filho de Deus, é mostrado na carta de Paulo a Tito.
Primeiramente ele lembra a condição ímpia em que outorga estivemos, e em
seguida diz (Tito 3:4-7): “Mas quando apareceu a benignidade e caridade de
Deus, nosso Salvador para com os homens não pelas obras da justiça que
houvéssemos feito, mas segundo a Sua misericórdia, nos salvou pela lavagem de
regeneração e da renovação do espírito Santo. Que abundantemente Ele derramou
sobre nós por Jesus Cristo nosso Salvador; para que, sendo justificados pela
Sua graça, sejamos feitos herdeiros segundo a esperança da vida eterna.”
Note-se que é através da justificação pela Sua
graça que nos tornamos herdeiros. Já aprendemos em Rm. 3:24,25 Que esta
justificação pela Sua graça é pela nossa fé em Cristo; Porém Gl.
3:26 Diz-nos que fé em Cristo Jesus faz-nos filhos de Deus; portanto
sabemos que seja quem for que tenha sido justificado pela graça de Deus, – foi perdoado,
– é um filho e um herdeiro de Deus.
Isto mostra que não há lugar para a ideia que
uma pessoa tem que atravessar uma espécie de provação, e alcançar um certo grau
de santidade, antes de Deus o aceitar como Seu Filho. Ele recebe-nos
exactamente como somos. Ele ama-nos não por causa da nossa bondade, mas pela
nossa necessidade. Ele recebe-nos, não em atenção a alguma coisa que tenha
visto em nós, mas em atenção a Si mesmo, e pelo que Ele sabe que o seu Divino
poder pode fazer em nós. É somente quando compreendemos a maravilhosa exaltação
e santidade de Deus, e o facto que Ele vem a nós, na nossa pecaminosa e
degradada condição, a fim de adoptar-nos para a Sua família, que podemos
apreciar a força da exclamação do apóstolo, “Vede quão grande caridade nos tem
concedido o Pai: que fôssemos chamados filhos de Deus. Por isso o mundo nos não
conhece; porque o não conhece a Ele.” I Jo. 3:1. Cada um sobre quem esta
honra é concedida, será ele mesmo purificado, tanto quanto Ele é puro.
Deus não nos adopta como Seus filhos por sermos
bons, mas devido ao facto de que Ele pode fazer-nos bons. Paulo diz: “Mas Deus,
que é riquíssimo em misericórdia, pelo Seu muito amor com que nos amou, estando
nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela
graça sois salvos), e nos ressuscitou juntamente com Ele e nos fez
assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus; Para mostrar nos séculos
vindouros as abundantes riquezas da Sua graça, pela Sua benignidade para connosco
em Cristo Jesus.” Ef. 2:4-7. Em seguida acrescenta: “Porque pela graça sois
salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus. Não vem das obras,
para que ninguém se glorie. Porque somos feitura Sua, criados em Cristo Jesus
para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas.” Versículos
8-10. Esta passagem mostra que Deus nos amou enquanto ainda estávamos
mortos em pecados; Ele deu-nos o Seu Espírito para nos vivificar em Cristo, o
mesmo Espírito que marca a nossa adopção na família Divina. E Ele assim nos
adopta pelo que, como novas criaturas em Cristo, podemos fazer as boas obras
que deus ordenou.
ACEITAÇÃO DE DEUS
Muitas
pessoas hesitam em começar a servir o Senhor, porque temem que Deus não os
aceitasse; e milhares que durante anos têm professado ser seguidores de Cristo
continuam duvidando se estão aceites por Deus. Para benefício destes escrevo, e
não confundiria as suas mentes com especulações, antes porém esforçar-me-ei por
dar-lhes as simples certezas da Palavra de Deus.
“Receber-me-á o Senhor?” Eu respondo com outra
pergunta: Receberá um homem o que comprou? Se fordes a uma loja e fizerdes uma
compra, recebereis as mercadorias quando elas estiverem prontas a entregar? É
claro que recebereis, não somente de que as desejais, mas que estais ansiosos
por recebê-las. Se não as quisésseis, não as teríeis comprado.
Além disso, quanto mais tiverdes pago por elas
mais ansiosos estais por recebê-las. Se o preço que pagastes foi elevado, e se
quase tivésseis dado a vossa vida para ganhá-las, então não podia haver dúvida
que aceitaríeis a compra quando fosse entregue. A vossa grande ansiedade é que
pudesse haver alguma falha na sua entrega.
Agora apliquemos esta simples e natural
ilustração no caso do pecador que vem a Cristo. Em primeiro lugar, Ele comprou-nos.
“Ou não sabeis que o vosso corpo é o
templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não
sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço, glorificai pois a
Deus no vosso corpo, e o vosso espírito, os quais pertencem a Deus.” I Cr.
6:19, 20.
O preço que Ele pagou por nós foi o Seu próprio
sangue – a Sua vida. Paulo disse aos anciãos de Éfeso: “Olhai pois por vós, e por todo o rebanho sobre que o Espírito vos
constitui bispos, para apresentardes a igreja de Deus, que Ele resgatou com o
Seu próprio sangue.” At. 20: 28 “Sabendo que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que
fostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos
vossos pais. Mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado
e incontaminado.” I Pe. 1: 18,19. “Ele deu-Se a Si mesmo por nós. “ Tito 2:4. Ele “deu-Se a Si mesmo pelos nossos pecados,
para nos livrar do presente século mau, segundo a vontade de Deus nosso Pai. “
Gál:
1-4.
Ele não comprou uma certa classe, mas todo o
mundo de pecadores. “Porque Deus amou
o mundo de tal maneira, que deu o Seu Filho Unigénito. “ João 3:16. Jesus disse, “O
Pão que Eu der é a minha carne, que Eu darei pela vida do mundo.” João 6:51. “Porque Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos
ímpios.” “Deus prova o Seu amor para connosco, em que Cristo morreu por nós,
sendo nós ainda pecadores.” Rm. 5: 6,8.
O preço pago foi infinito, por conseguinte
sabemos que Ele desejou muito aquilo que comprou. Ele determinou em Seu coração
obtê-lo. Ele não podia estar satisfeito sem isso. Ver Fl. 2: 6-8, Hb. 12: 2, Is. 53:11.
“Mas eu não sou digno.” O que quer dizer que não
sois merecedores do preço pago, e por isso temeis vir para que Cristo
imaginando que rejeite a compra. Ora podíeis ter algum receio a esse respeito
se a compra não estivesse selada, e o preço não estivesse já pago. Se Ele
recusasse aceitar-vos, baseando-se em que não mereceis o preço, Ele não só vos
perderia, como também perderia o preço pago. Ainda que a mercadoria pela qual
pagaste não merecesse o valor pago, vós mesmos não seríeis tão loucos que as
mandásseis fora. Preferiríeis obter alguma coisa pelo dinheiro que destes do
que ficares sem nada.
Mas, além disso, não tendes nada a ver com a
questão do merecimento. Quando Cristo esteve na terra para fazer a compra, Ele “não necessitava que alguém testificasse do
homem, porque Ele bem sabia o que havia no homem.” João 2:25. Ele conhecia o
que comprou e sabia o valor exacto do que comprou. Em nada fica desapontado
quando ides a Ele e verifica que não tendes valor algum. Não tendes que vos
preocupar acerca da questão do merecimento, se Ele, com o Seu perfeito
conhecimento do caso ficou satisfeito com o que adquiriu, vós devíeis ser os
últimos a queixar-se.
Porque, a mais maravilhosa verdade de todas, é
que Ele comprou-vos por causa de não serdes merecedores. Os Seus olhos
experimentados viram em vós grandes possibilidades, e comprou-vos, não pelo que
éreis nessa altura ou valeis agora, mas por aquilo que Ele podia fazer de vós.
Ele diz: “Eu, Eu mesmo, sou o que te
apago as tuas transgressões por amor de Mim.” Is. 43:25. Nós não temos justiça,
portanto Ele comprou-nos, “porque n’Ele habita
corporalmente toda a plenitude de divindade. E estais perfeitos n’Ele que é a cabeça
de todo o principio e potestade.” Cl. 2:9,10 aqui está todo o processo: “Todos
nós... éramos por natureza filhos da ira, como os outros também. Mas Deus, que
é riquíssimo, em misericórdia, pelo seu amor com que nos amou, estando nós
mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois
salvos), e nos ressuscitou juntamente com Ele e nos fez sentar nos lugares
celestiais, em Cristo Jesus, para mostrar nos séculos vindouros as abundantes
riquezas da sua Graça, pela Sua benignidade para connosco em Cristo Jesus.
Porque pela graça sois salvos, por meio da fé, e isto não vem de vós, é dom de
Deus, não vem das obras, para que ninguém se glorie. Porque somos feitura Sua,
criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que
andássemos nelas.” Ef. 2:3-10.
Nós temos que ser “para louvor da Glória da Sua Graça.” Não podíamos sê-lo se
originalmente valêssemos todo o preço que Ele pagou por nós. Nesse caso não
podia haver glória para Ele nesta transacção. Ele não podia, nos dias futuros,
mostrar em nós as riquezas da Sua Graça. Mas, quando Ele nos toma, nada
valemos, e no fim apresenta-nos sem faltas perante o trono, isto será para Sua
glória eterna. E então não haverá qualquer atribuição merecida para eles mesmos.
Por toda a eternidade, os exércitos santificados estarão unidos em dizer a
Cristo, “Digno és... porque foste morto,
e com Teu sangue comprar-te homens para Deus de Toda a tribo, e língua, e povo,
e nação, e para o nosso Deus fizestes reis e sacerdotes. “Digno é o Cordeiro,
que foi morto, de receber o poder, e riquezas, e sabedoria, e força, e honra, e
gloria, e acções de graças.” Ap. 5:9, 10, 12.
Seguramente que todas as dúvidas tal como acerca
da aceitação de Deus, deviam estar finalmente esclarecidas. Mas não estão. O
coração mau do descrente ainda sugere dúvidas. “E creio em tudo isto, mas” e pára exactamente ali, se crêsseis não
diríeis “mas”. Quando as pessoas
acrescentam “mas” à declaração de
que acreditam, eles realmente querem dizer. “Eu creio, mas eu não acredito.” Porém vós continuais: “Talvez
tenhas razão, mas ouve-me com atenção. O que eu ia a dizer é, eu creio nas
declarações da Escritura que citaste, mas a Bíblia diz que se nós somos filhos
de Deus devemos ter o testemunho do Espírito, e tê-lo-emos em nós mesmos, e eu
não sinto qualquer testemunho desses, de modo que não posso acreditar que estou em Cristo. Eu creio na Sua Palavra,
mas não tenho o testemunho”. Eu compreendo a vossa dificuldade, vejamos se ela
não pode ser removida.
Para que estejais em Cristo, vós mesmos podeis decidi-lo.
Tendes visto que Ele se deu por vós. Ora a questão é, tende-vos vós mesmos dado
a Ele? Se o tendes feito, podeis estar certos que Ele vos aceitou. Se não sois
d’Ele, é unicamente porque recusais entregar-lhe aquilo que Ele comprou. Estais
defraudando-O. Ele diz, “todo o dia
estendi as Minhas mãos a um povo rebelde e contradizente.” Rm. 10:21. Ele pede-vos que Lhe entregueis o que comprou e
pagou, contudo recusais e O acusais de não querer receber-vos. Porém, se de
coração vos renderdes a ele para serdes Seus filhos, podeis estar certos que
Ele vos recebeu.
Ora se apesar da vossa crença nas Suas Palavras,
ainda duvidais se Ele vos aceita, porque não sentis o testemunho no vosso
coração, eu volto a insistir que não acreditais. Se o fizésseis, teríeis o
testemunho. Ouvi as Suas Palavras: “Quem
crê no Filho de Deus, em si mesmo tem o testemunho, quem a Deus não crê mentiroso
O fez, porquanto não creu no testemunho que Deus de Seu Filho deu.” I João
5:10. Crer no Filho é simplesmente crer na Sua Palavra e no testemunho acerca
d’Ele.
E “quem
crê no Filho de Deus, em si mesmo tem o testemunho.” Não podeis ter o
testemunho até que acrediteis, e logo que crerdes, tereis o testemunho. Como é
isto? Porque o vosso crer na Palavra
de Deus é ter o testemunho.
Deus diz assim: “Ora a fé é firme fundamento das coisas
que se esperam, e a prova das
coisas que se não vêem.” Hb. 11:1.
Se ouvísseis Deus dizer com uma voz audível que
éreis Seus filhos, consideraríeis isso um testemunho suficiente. Por isso,
quando Deus fala na Sua Palavra, é a mesma coisa que falar com uma voz audível,
e a vossa fé é a prova que ouvis e creies.
Isto é um assunto tão importante que merece uma
cuidadosa consideração. Leiamos um pouco mais do relato. Primeiramente, lemos
que “todos somos filhos de Deus pela fé
em Cristo Jesus.” Gl. 3:26. Isto
é uma positiva confirmação do que eu disse acerca da nossa descrença no
testemunho. A nossa fé faz-nos filhos de Deus. Mas como alcançamos esta fé? – “Fé
é pelo ouvir, e ouvir pela Palavra de Deus.” Rm. 10:17. Mas como
podemos obter fé na Palavra de Deus? - Justamente acreditando que Deus não pode
mentir. Dificilmente chamaríeis a Deus mentiroso na Sua face, porém, é
exactamente o que fazeis se não acreditais na Sua Palavra. Tudo o que tendes a
fazer para crer é crer. “A palavra está junto de ti, na tua boca e no teu
coração, esta é a Palavra da fé, que prezamos, a saber: Se com a tua boca
confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus O ressuscitou dos
mortos, serás salvo. Visto que com o coração se crê para a justiça, e com a
boca se faz confissão para a salvação. Porque a Escritura diz: Todo aquele que
n’Ele crer não será confundido.” Rm. 10:8-11.
Tudo isto está em harmonia com o relato dado por
Paulo: “O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de
Deus. E, se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de Deus e co-herdeiros
de Cristo.” Rm. 8:16,17. Este Espírito que testifica com o nosso espírito é
o Consolador que Jesus prometeu. Jo. 14:16. E sabemos que o Seu
testemunho é verdadeiro, porque Ele é o “Espírito de verdade.” Ora como
testifica Ele? Trazendo à nossa memória a Palavra que foi escrita. Ele inspirou
essas palavras (I Cr. 2:13, II Pe. 1:21), e, portanto, quando Ele as traz à
nossa lembrança, é o mesmo com se elas nos fossem ditas directamente. Ele
apresenta à nossa mente o registo, parte do qual citámos, sabemos que ele é
verdadeiro, porque Deus não pode mentir, nós convidamos Satanás a continuar com
o seu falso testemunho contra Deus, e cremos nessa declaração, mas se
acreditarmos na declaração, sabemos que somos filhos de Deus, e claramente “Abba
Pai.” Então a gloriosa verdade irrompe mais completamente sobre a alma.
A repetição das palavras torna-o realidade em nós. Ele é o nosso Pai,
nós somos Seus filhos. Que alegria dá este pensamento! Assim vemos que o
testemunho que temos em nós mesmos não é uma simples impressão, ou uma emoção.
Deus não nos pede que confiemos tanto num testemunho tão inseguro como é o nosso
sentimento. Aquele que confia no seu próprio coração é um louco, a Escritura o
diz. Porém o testemunho no qual temos que confiar é a imutável Palavra de Deus,
e nós podemos ter este testemunho através do Espírito, nos nossos próprios
corações. “Graças a Deus pelo Seu inefável dom.”
Esta certeza não nos garante o abrandamento da
nossa diligência e passar a viver com satisfação, como se tivéssemos ganho a
perfeição. Nós devemos recordar que Cristo não nos aceitou por nossa causa, mas
pelo Seu próprio amor, não porque fossemos perfeitos, mas porque n’Ele podemos
chegar à perfeição. Ele abençoa-nos, não por termos sido tão bons que
merecíamos uma bênção, mas para que na força da bênção pudéssemos deixar as
nossas iniquidades. At. 3:26. A todos os que crêem em Cristo, é dado o poder por
direito ou privilégio de se tornarem filhos de Deus. Jo. 1:12, margem (Versão
K.J.). É pelas “grandíssimas e preciosas promessas” de Deus através de
Cristo que somos “participantes da natureza Divina.” II Pedro 1:4.
Consideremos resumidamente a aplicação prática
de algumas destas escrituras.
A VITÓRIA DA FÉ
A Bíblia diz que o “justo viverá da fé.” A
justiça de Deus é “revelada de fé em fé.” Rm. 1:17. Nada pode ilustrar melhor
a obra da fé do que alguns exemplos que estão escritos para nossa lição, “para
que pela paciência e consolação das Escrituras tenhamos esperança.” Rm.
15:4. Tomamos primeiro, um notável acontecimento relatado no capítulo
vinte do segundo livro de Crónicas. Deixai que o leitor siga a corrente do
comentário com a Bíblia.
“E sucedeu que, depois disto, os filhos de
Moabe, e os filhos de Amom, e com eles outros dos Amonitas, vieram à peleja
contra Jeosafá. Então vieram alguns que deram aviso a Jeosafá, dizendo: vem
contra ti uma grande multidão d’além do mar e da Síria, e eis que já estão em
Hazazom-Tamar, que é En-Gedí.” Vers. 1 e 2.
Este grande exército fez com que o rei e o povo
temessem, mas eles tomaram o caminho prudente de se reunirem juntamente “para
pedirem socorro ao Senhor, também de todas as cidades de Judá vieram para
buscar ao Senhor.” Versículos 3 e 4. Então ergue-se a oração de Jeosafá, como
guia da congregação, e é digna de estudo especial, visto que foi uma oração da
fé, e contém em si mesmo o começo da vitória: “E pôs-se Jeosafá em pé na congregação de Judá e
Jerusalém, na Casa do Senhor, diante do pátio novo, e disse: Ah! Senhor, Deus
de nossos pais, porventura não és Tu Deus nos Céus? Não governas Tu acima de
todos os reinos das gentes? E não há na Tua mão força e poder, que ninguém há
que Te possa resistir?” Versículos 5 e 6 (versão K.J.).
Esse foi um excelente início para uma oração.
Ela começa com o reconhecimento de Deus no céu. Assim começa o modelo da
oração, “Pai-nosso que estás nos céus.” O que significa isto? Que Deus, como
Deus nos céus, é Criador. Ela contém o reconhecimento do Seu poder sobre todos
os reinos do mundo e dos poderes das trevas, o facto de Ele ser nos céus, o
Criador, mostra que na Sua mão há poder e força, ao qual ninguém pode resistir.
Por que motivo, o homem que pode começar a sua oração na hora da necessidade
com um tal reconhecimento do poder de Deus, tem a vitória já do seu lado.
Contudo, notai, que Jeosafá não apenas declarou a sua fé no maravilhoso poder
de Deus, mas pediu o poder de Deus como propriamente seu, dizendo, “não és Tu o
nosso Deus?” Ele cumpriu a exigência da Escritura: “É necessário que aquele que
se aproxima de Deus creia que Ele existe, e que é galardoador dos que O
buscam.”
Jeosafá prosseguiu cintando como o Senhor os
colocou naquela terra, e como, apesar de não lhes permitido que passassem por
Moabe e Amom, aquelas nações que vinham para os expulsar da herança dada por
Deus. Vers. 7-11. E então concluiu: Ah! Deus nosso, porventura não os
julgarás? Porque em nós não há força perante esta grande multidão que vem
contra nós; e não sabemos nós o que faremos; porém os nossos olhos estão postos
em Ti.” Vers. 12. Senhor, nada para Ti é ajudar, quer o poderoso quer o
de nenhuma força. (II Cr. 14:11); e porque, quanto ao
Senhor, Seus olhos passam por toda a terra, para mostrar-se forte para com
aqueles cujo coração é perfeito para com Ele. (II Cr. 13:9), isto
convém àqueles que estão necessitados, para que confiem apenas n’Ele. Esta
posição de Jeosafá e seu povo estava em harmonia com a ordem apostólica,
“Olhando para Jesus, Autor e consumador da nossa fé,” Hb. 12:2. Ele é o
princípio e o fim, e todo o poder no céu e na terra está nas Suas mãos.
Então, qual foi o resultado? O profeta do senhor
veio no poder do Espírito Santo, “e disse: Dai ouvidos todo o Judá, e vós
moradores de Jerusalém, e tu, ó rei Jeosafá, assim o Senhor vos diz: Não
temais, nem vos assusteis por causa desta grande multidão, pois a peleja não é
vossa, senão de Deus.” Vers. 15. E veio a ordem para sair
de manhã cedo ao encontro do inimigo, e eles veriam a salvação do Senhor,
porque Ele estava com eles.
Agora vem a parte mais importante: "E pela manhã se levantaram e saíram ao deserto
de Tecoa, e, saindo eles, pôs-se em pé Jeosafá, e disse: Ouve-me, ó Judá, e
vós, moradores de Jerusalém: Crede no Senhor vosso Deus, e estareis seguros,
crede nos Seus profetas, e sereis prosperados. E aconselhou-se com o povo, e
ordenou cantores para o senhor, que louvassem a Majestade Santa, saindo diante
dos armados, e dizendo: Louvai ao Senhor, porque a Sua benignidade dura para
sempre.” Versículos 20,21.
Na verdade, esta foi uma forma estranha de ir ao
encontro do inimigo. Jamais um pequeno exército foi combater com uma tal
vanguarda. Mas qual foi o resultado?
“E, ao tempo que começaram com júbilo e louvor,
O Senhor pôs emboscadas contra os filhos de Amom e de Moabe e os da montanha de
Seir, que contra Judá, e foram desbaratados. Porque os filhos de Amom e Moabe
se levantaram contra os moradores da montanhas de Seir, para os destruir e exterminar,
e, acabando eles com os moradores de Seir, ajudaram uns aos outros a
destruir-se. Entretanto chegou Judá à atalaia do deserto, e olharam para a
multidão, e eis que eram corpos mortos, que jaziam em terra, e nenhum escapou.”
Vers. 22-24.
Embora tivesse havido alguns exércitos que foram
combater com vanguarda semelhante como fez o exército de Jeosafá, também é
verdade que poucos exércitos têm sido galardoados com um idêntico sinal de
vitória. E não podia ser errado estudar um pouco a filosofia da vitória da fé,
como se explicou nesta exemplo. Quando o inimigo, que tinha confiado no seu
número superior, ouviu os israelitas virem naquela manhã, contando e aclamando,
o que teriam eles concluído? Nada mais que terem os israelitas recebido
reforços, e estavam de tal maneira fortalecidos que seriam inútil tentar
defrontá-los. Assim o pânico apoderou-se deles, e cada um olhou para o seu
vizinho como um inimigo.
E não tinham eles razão na sua conclusão que
Israel recebido reforço? Na verdade tinham, porque o relato diz: “E, ao tempo
que começaram com júbilo e louvor, o Senhor pôs emboscadas
contra os filhos de Amom, Moabe, e os da montanha de Seir.” O exército do
senhor, no qual Jeosafá e o seu povo confiarem, lutou por eles. Tinham sido
reforçados, e sem dúvida se os seus olhos pudessem ser abertos para os ver,
eles os teriam visto, tal como aconteceu com o servo de Eliseu numa ocasião, em
que os que estavam com eles eram em maior número do que o infinito.
Mas o ponto que deve ser especialmente
considerado é que, quando Israel começou a cantar e a louvar, o Senhor pôs
emboscadas contra o inimigo. O que quer isto dizer? Significa que a fé deles
era verdadeira. A promessa de Deus era considerada como se realmente estivesse
realizada. Por isso eles crerem no senhor, ou, mais literalmente, eles
edificaram sobre o senhor, e assim foram estabelecidos ou edificados. Assim
provaram a verdade das palavras, “Esta é a vitória que vence o mundo, a nossa
fé.” I João 5:4.
Apliquemos esta ilustração num caso de conflito
contra o pecado. Aqui vem uma forte tentação para fazer o que sabemos ser
errado. Para nossa tristeza frequentemente temos provado a força da tentação,
porque ela nos tem vencido, desta modo sabemos que não temos poder contra ela.
Mas agora os nossos olhos estão postos Senhor, que nos tem dito para irmos com
confiança ao trono da graça, para que possamos obter misericórdia e encontrar
graça e ajuda em tempo de necessidade. Desta maneira começamos, não com uma
declaração triste por causa da nossa fraqueza, mas com alegria pelo
conhecimento do grandioso poder de Deus. Estando tranquilos porque, podemos
arriscar-nos a declarar a nossa dificuldade ou a nossa fraqueza. Se declararmos
primeiramente a nossa fraqueza, e a nossa situação desencorajante, colocamo-nos
a nós mesmos perante Deus. Nesse caso Satanás aumentará a dificuldade e porá as
suas trevas à volta de nós de maneira que nada mais podemos ver senão a nossa
fraqueza, e por isso, se bem que o nosso clamor e súplica possam ser fervorosos
e agonizantes, serão em vão, porque lhes faltará o elemento essencial crendo o
que Deus é, e que Ele é tudo o que de Si mesmo tem revelado ser. Mas quando
começamos com o reconhecimento poder de deus, então podemos seguramente
declarar a nossa fraqueza, porque nessa altura estamos simplesmente pondo a
nossa fraqueza ao lado do Seu poder, e o contraste tem tendência a criar
coragem.
Depois, enquanto oramos, a promessa de Deus vem
à nossa mente, trazida pelo Espírito Santo. Pode ser que não pensemos numa
promessa especial que exactamente se adapte ao caso, mas podemos lembrar-nos
que “esta é uma palavra fiel, e digna de toda a aceitação, que Cristo Jesus
veio ao mundo, para salvar os pecadores” (I Tm. 1:15), e que Ele “Se deu a Si
mesmo por nossos pecados, para nos livrar do presente século mau, segundo a
vontade de Deus nosso Pai” (Gál. 1-4), e nós podemos que isto
saber que isto vem com cada promessa, porque “Aquele que nem o Seu próprio
Filho poupou, antes O entregou por todos nós, como nos não dará também com Ele
todas as coisas?” Romanos 8:32.
Então recordamo-nos que Deus pode falar daquelas
coisas que não existem como se existissem. Isto é, se Deus deu a promessa, é
como se já tivesse sido cumprido. E por isso, sabendo que a nossa libertação do
pecado é segundo a vontade de Deus (Gál. 1:4), contamos a vitória
como sendo já nossa, e começamos por agradecer a Deus pelas Suas “grandíssimas
e preciosas promessas.” Como a nossa fé se apodera firmemente destas promessas
e falas reais, nós não podemos evitar de louvar a Deus pelo Seu maravilhoso
amor, e enquanto estamos fazendo isto, as nossas mentes estão completamente
guardadas do mal, e a vitória é nossa. O Senhor pôs emboscadas contra o
inimigo. A nossa atribuição de louvor mostra a Satanás que recebemos reforços,
e como ele tem experimentado o poder da ajuda que nos é concedida, sabe que
nada pode fazer naquela ocasião, e por isso nos deixa. Isto ilustra a força da
injunção do apóstolo Paulo:
“Não estejais inquietos por
coisa alguma (isto é, não vos preocupeis por coisa alguma), antes as vossas
petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplicas, com
acção de graças.” Fl. 4:46.
ESCRAVOS E HOMENS LIVRES
O poder da fé para
trazer a vitória pode ser mostrado noutro aspecto dos textos da Escritura, que
são muito práticos. Em primeiro lugar compreendamos que o pecador é um escravo.
Cristo disse: “Que todo aquele que comete pecado é servo do pecado. “ Jo 8:34. Paulo também diz, colocando-se a si mesmo no lugar
do homem não renovado: “Porque sabemos que a lei é espiritual, mas eu sou
carnal vendido sob o pecado.” Rm.
7:14. Um homem que está vendido é um
escravo. Pedro traz à luz o mesmo facto, quando, falando dos corruptos falsos
ensinadores, diz: “Prometendo-lhes liberdade, sendo eles mesmos servos da
corrupção, porque de quem alguém é vencido, do tal faz-se também servo.” II Pe. 2:19.
A características
preeminentes do escravo é que ele não pode fazer o que lhe agrada, mas é
obrigado a fazer a vontade de outro, não interessa quão penoso isso seja. Paulo
prova assim a sua expressão que, como homem carnal, era escravo do pecado:
“Porque o que faço não o aprovo, pois o que quero isso não faço, mas o que
aborreço isso faço.” “De maneira que agora já não sou eu que faço isto, mas o
pecado que habita em mim. Porque eu sei que em mim, (isto é, na minha carne,)
não habita bem algum, e com efeito o querer está em mim, mas não consigo
realizar o bem. Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse
faço.” Romanos 7: 15, 17-10.
O facto de o pecado
controlar, prova que um homem é um escravo, e todo o que comete pecado é servo
do pecado, a escravidão torna-se intolerável quando o pecador teve algum
vislumbre de libertação, e anseia por ela, ainda assim ele não pode quebrar as
cadeiras que o prendem ao pecado. A impossibilidade do homem não renovado fazer
mesmo o bem que desejaria fazer, já foi demonstrado pelo texto de Rm. 8:7,8
e Gl. 5.17.
Quantas pessoas têm
nas suas próprias experiência provado a verdade destas Escrituras. Quantos têm
decidido, uma e outra vez, e mesmo assim as suas sinceras decisões têm-se
provado fracas como água em face da tentação. Eles não tinham poder, e não
sabiam o que fazer, e, infelizmente, os seus olhos não estavam tão postos em
Deus como em si mesmos e no inimigo. As suas experiências foram uma luta
constante contra o pecado, isto é verdade, mas também de constante derrota.
Chamais a isto uma
verdadeira experiência cristã? Há alguns que pensam que é. Porque motivo, o
apóstolo em seguida, na angústia da sua alma, clama, “Miserável homem que eu
sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” Rm. 7:24. É a verdadeira
experiência cristã um corpo de morte tão terrível que a alma é constrangida a
clamar por libertação?
Verdadeiramente que
não.
Outra vez, quem é que,
na resposta ao seu sincero apelo, se lhe revela como um Libertador? Diz o
apóstolo, “Dou graças a Deus por Jesus Cristo nosso Senhor.” Noutro trecho ele
diz de Cristo: “E, visto como os
filhos participam da carne e do sangue, também Ele participou das mesmas
coisas, para que pela morte aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é,
o diabo, e livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida
sujeitos à servidão.” Hb. 2: 14,15.
Novamente, Cristo
proclamam assim a Sua própria missão: “O Espírito do Senhor
está sobre mim, porque o Senhor Me ungiu para pregar as boas novas aos cativos,
e a abertura de prisão aos presos, Is. 61:1.
O que esta servidão e
cativeiro são, já foi mostrado. É a servidão do pecado o cativeiro de ser
compelido a pecar, mesmo contra a vontade, pelo poder das más tendências e
hábitos herdados a adquiridos. Liberta Cristo duma verdadeira experiência
cristã? Efectivamente, não. Então o jugo do pecado, do qual o apóstolo se
queixa em Romanos sete, não é a experiência de um filho de Deus, mas a de um
servo do pecado. É para livrar o homem deste cativeiro que Cristo veio, não
para nos livrar de guerras e lutas durante esta vida, mas da derrota, para
habilitar-nos a ser fortes no Senhor e no poder da Sua força, de modo a
podermos dar graças ao Pai “que nos livrou do poder das travas, e nos
transformou para o reino do Seu amado Filho,” pelo sangue de Quem temos a
redenção.
Como se efectua esta
libertação? Pelo Filho de Deus. Diz Cristo: “Se vós permanecerdes na minha
palavra, verdadeiramente sereis Meus discípulos, e conhecereis a verdade, e a
verdade vos libertará.” “Se pois o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis
livres.” João 8:31,32,36. Esta libertação vem a todo aquele que crê, porque a
todos os que crêem no Seu nome, dá o “poder de se tornarem filhos de Deus.” A
libertação da condenação vem para todos aqueles que estão em Cristo Jesus
(Romanos, 8.1), e colocamo-nos em Cristo pela fé (Gálatas 3:26,27). É pela fé
que Cristo mora nos nossos corações.
ILUSTRAÇÕES PRÁTICAS DA
LIBERTAÇÃO DA ESCRAVIDÃO
Façamos algumas
ilustrações do poder da fé para libertar da escravidão. Citaremos Lucas 13:10-17: “E ensinava no Sábado,
numa das sinagogas. E eis que estavam ali uma mulher que tinha um espírito de
enfermidade, havia já dezoito anos, e andava curvada, e não podia de modo algum
endireitar-se. E, vendo-a Jesus, chamou-a a Si, e disse-lhe: Mulher, estas
livre da tua enfermidade. E pôs as mãos sobre ela, e logo se endireitou, e
glorificava a Deus. E, tomando a palavra o príncipe da sinagoga, indignado
porque Jesus curava no Sábado, disse à multidão. Seis dias há em que é mister
trabalhar, nestes pois vinde para serdes curados, e não no dia de Sábado.
Respondeu-lhe, porém, o Senhor, e disse: Hipócrita, no Sábado não desprende da manjedoura
cada um de vós o seu boi, ou jumento, e não o leva a beber? E não convinha
soltar desta prisão, no dia de Sábado, esta filha de Abraão, a qual há dezoito
anos Satanás tinha presa? E, dizendo Ele isto, todos os Seus adversários
ficaram envergonhados, e todo o povo se alegrava por todas as coisas gloriosas
que eram feitas por Ele.”
Podemos passar por
cima da crítica do príncipe, para considerar o milagre. A mulher era escrava;
todos nós, através do receio da morte, temos estado nas nossas vidas sujeitos
ao cativeiro. Satanás tinha prendido a mulher; ele também tem armado laços para
os nossos pés, e tem-nos em cativeiro. Ela de maneira nenhuma podia liberta-se
a si mesma; as nossas iniquidades têm tomado conta de nós, de modo que não
somos capazes de olhar para cima. (Salmo 40:12). Com uma palavra e um toque
Jesus libertou a mulher das suas enfermidades; nós temos agora o mesmo
misericordioso Sumo-sacerdote nos céus, que sofreu as nossas enfermidades, e a
mesma palavra nos libertará do mal.
Com que propósito
foram escritos os milagres de curas realizados por Cristo? João diz-nos. Não
foi simplesmente para mostrar que Ele pode curar as enfermidades, mas para demonstrar
o seu poder sobre o pecado. (Ver Mt. 9:2-8). Porém João diz: “Jesus pois operou
também em presença de Seus discípulos muitos outros sinais, que não estão
escritos neste livro. Estes, porém, foram escritos para que creiais, que Jesus
é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em Seu nome.”
(João, 20:30,31).
Assim verificamos que
eles estão escritos simplesmente como exemplo do amor de Cristo, da Sua
prontidão para libertar do sofrimento, e do Seu poder sobre as obras de
Satanás, não importa que seja no corpo ou na alma. Mais um milagre deve ser
suficiente nesta conexão. É o que está escrito no terceiro capítulo de Actos.
Não citarei totalmente o acontecimento mas peço ao leitor que o siga
cuidadosamente com a sua Bíblia.
Pedro e João viram à
porta do templo um homem com mais de quarenta anos, que era coxo desde o
nascimento. Ele nunca tinha andado. Ele estava mendigando, e Pedro sentindo-se
impelido pelo Espírito para lhe dar qualquer coisa melhor do que a prata ou
ouro, disse: “ Em nome de Jesus de Nazaré levanta-te e anda. E tomando-o pela
mão direita, o levantou, e logo os seus pés e artelhos se firmaram. E, saltando
ele, pôs-se em pé, e andou, e entrou com eles no templo, andando, e saltando, e
louvando a Deus.” (Vers. 6,8).
Este extraordinário
milagre em alguém que todos viam produzia um milagre excitamento entre o povo;
e quando Pedro viu o seu espanto, prosseguiu explicando com foi realizado o
prodígio dizendo: “Varões Israelitas,
porque vos maravilhais disto? Ou, porque olhais tanto para nós, como se por
nossa própria virtude ou santidade fizéssemos andar este homem. O Deus de
Abraão, e de Isaque, e de Jacó, o deus de nossos pais, glorificou a Seu Filho Jesus;
a quem vós entregastes... e mataste o Príncipe da Vida, ao qual Deus
ressuscitou dos mortos, do que nós somos testemunhas. E pela fé no seu nome
fez o Seu nome fortalecer a este que vedes e conheceis; e a fé que é por
Ele deu a este, na presença de todos vós, esta perfeita saúde.” (Vers.
12-16.
Agora façamos a
aplicação. “ O homem era coxo desde o ventre da sua mãe” incapaz de se ajudar a
si mesmo. Ele de boa vontade teria andado, mas não podia. Da mesma maneira
podemos dizer com David. “Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me
concedeu minha mãe.” (Salmo, 51:5). Como uma consequência, nós somos por
natureza tão fracos que não podemos fazer aquilo que desejaríamos. Tal como
cada ano da vida do homem aumentava a sua incapacidade para andar, por causa do
aumento do peso do seu corpo, enquanto os seus membros cresciam sem força, do
mesmo modo a repetida prática do pecado, fortalece o seu poder sobre nós à
medida que crescemos. Era completamente impossível ao homem andar; contudo o
nome de Cristo, pela Fé, deu-lhe perfeita saúde e libertação da sua
enfermidade. Por tanto nós, pela fé que é por Ele, podemos ser feitos
completos, a capacidade para fazer aquilo que até agora tem sido impossível. Porque
as coisas que são impossíveis ao homem são possíveis a Deus. Ele é o Criador.
“Ao que não tem nenhum vigor Ele dá força.” Um dos milagres da fé, como se
mostra no caso dos homens notáveis da antiguidade, é que eles “fracos se
fizeram fortes.”
Por estes exemplos
vimos como Deus liberta da escravidão os que n’Ele confiam. Em seguida
consideremos o conhecimento de como é mantida a liberdade.
Já vimos que por
natureza todos somos servos do pecado e de Satanás, e logo que nos submetemos a
Cristo, tornamo-nos livres do poder de Satanás. Paulo diz: “ Não sabeis vós que
a quem vos apresentardes por servos para lhe obedecer, sois servos daquele a
quem obedeceis, ou do pecado para a morte, ou da obediência para a justiça.”
Romanos 6:16. Por isso, logo que nos tornamos livres do jugo do pecado,
tornamo-nos servos de Cristo. Na verdade, o próprio acto de ficarmos livres do
poder do pecado, em resposta à nossa fé, demonstra que Deus nos aceitou como
servos Seus. Na realidade, passamos a ser, os servos de Cristo; mas aquele que
é servo do Senhor é um homem livre, porque somos chamados para a liberdade.
(Gál. 5:13). E onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade (Cor. 3:17).
E agora vem novamente
o conflito. Satanás não está disposto a libertar-nos da sua escravatura tão
facilmente. Ele vem armado com o azorrague da feroz tentação, a fim de nos
levar de novo para o seu serviço. Sabemos pela triste experiência que ele tem
mais poder do que nós, e que sem ajuda não podemos resistir-lhe. Mas nós
tememos o seu poder, e clamamos por ajuda. Então recordamo-nos que já não somos
servos de Satanás. Já nos submetemos a nós mesmos a Deus, e por isso Ele
aceitou-nos como Seus servos. De maneira que podemos dizer com o salmista, “Ó
Senhor deveras sou Teu servo; sou teu servo, e filho da Tua serva.” Salmos
116:6. Mas o facto de Deus ter tirado as correias com que Satanás nos amarrou –
e Ele faz isto se nós acreditarmos que Ele o faz – é evidente que Ele nos
protegerá, porque Ele cuida do que Lhe pertence, e nós temos a certeza que Ele
tendo começado uma boa obra em nós “realizá-la-á até ao dia de Jesus Cristo.”
Fl. 1:6. E confiantes nisto somos fortes para resistir.
Outra vez, se nos
entregarmos a nós mesmo para servir a Deus, somos Seus servos, ou por outras
palavras, somos instrumentos de justiça nas Suas mãos. Lede Romanos 6:13-16.
Não estamos inactivos, sem vida, instrumentos mortos, como aqueles que os
agricultores usam, que nada podem dizer quanto a como devem de ser usados, mas
instrumentos vivos, inteligentes, a quem é permitido escolher o seu papel.
Apesar disso, o termo “instrumento” significa ferramenta, alfaia, – alguma
coisa que está inteiramente sobre controlo do operário. A diferença entre nós e
as ferramentas do mecânico é que nós podemos escolher quem nos pode usar, e em
que espécie de serviço nos devem empregar; mas havendo feito uma escolha, e
entregando-nos a nós mesmos nas mãos do operário estamos a ser nas suas mãos
exactamente como a ferramenta, que não diz como deve ser usada. Quando nos
entregamos a Deus, estamos a ser nas Suas mãos como o barro nas mãos do oleiro,
em que Ele pode fazer connosco o que lhe agradar. A nossa vontade assenta na
escolha se O deixamos ou não fazer em nós a obra que é o bem.
A ideia de sermos
instrumentos nas mãos de Deus, quando completamente alcançada, é uma
maravilhosa ajuda para a vitória da fé. Porque, notai, o que um instrumento
fará depende inteiramente da pessoa em cujas mãos está. Aqui, por exemplo, está
em cunho. Ele é suficiente em si mesmo, ainda que possa ser usada para os fins
mais básicos, também para aquilo que é útil. Se ele está nas mãos de um mau
carácter, pode ser usado para fazer uma moeda falsa. Isto certamente não será
usado para um bom propósito. Mas se estiver nas mãos de um homem honesto,
recto, possivelmente não poderá fazer qualquer dano. Da mesma maneira, quando
fomos servos de Satanás, não fizemos qualquer bem (Romanos 6:20); mas agora que
nos entregamos nas mãos de Deus, sabemos que não há injustiça n’Ele, e por
conseguinte um instrumento nas Suas mãos não pode usado para um mau propósito.
A entrega Deus tem de ser tão completa quanto o foi anteriormente a Satanás,
porque o apóstolo diz: “Falo como homem, pela fraqueza da vossa carne: pois
que, assim como apresentastes os vossos membros para servirem à imundície, e à
maldade para maldade, assim apresentai agora os vossos membros para servirem à
justiça para a santificação.” Romanos 6:19.
Todo o segredo do
triunfo, então está na primeira entrega total a Deus, com um sincero desejo de
fazer a Sua vontade; em seguida, sabendo que Ele nos aceita na nossa entrega
como Seus servos; e depois, na conversação dessa submissão a Ele, e ao
entregar-nos nas Suas mãos. Muitas vezes a vitória pode ser ganha somente pela
repetição consecutiva, “Ó Senhor, deveras sou Teu servo; filho da Tua
serva; soltastes as minhas ataduras.” Esta fé é uma forma simples e
enfática de dizer, “Ó Senhor, eu te entreguei-me nas Tuas mãos como instrumento
de justiça; para fazer a Tua vontade, e não segundo as tendências da carne.”
Mas quando podemos compreender a força daquela escritura e sentir na verdade
que somos filho de Deus, imediatamente virá o pensamento, ora, se sou na
verdade instrumento nas mãos de Deus, Ele não pode usar-me para fazer mal, nem
pode permitir-me fazer o mal enquanto eu estiver nas Suas mãos.
Ele tem que guardar-me
se eu me afastar do pecado, porque não posso guardar-me a mim mesmo. Mas Ele
quer guardar-me do mal, porque o tem demonstrado, e também o Seu poder para
cumprir a Sua vontade ao dar-Se a Si mesmo por mim. Por conseguinte, serei
guardado deste pecado.” Todos estes pensamentos podem passar pela mente instantaneamente;
e depois com eles, deve necessariamente vir um sentimento de alegria de que
estaremos guardados do temido pecado. Essa alegria encontra naturalmente expressão
nas acções de graças a Deus, e enquanto estamos agradecendo a Deus o inimigo
retira-se com as suas tentações, e a paz de Deus enche o coração. Então
verificamos que essa alegria é muito maior que toda alegria que possa vir da
indulgência do pecado.
Tudo isto é uma
demonstração das palavras de Paulo: “Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira
nenhuma, antes estabelecemos a lei.” Romanos 3:31. “Anular” a lei não é
aboli-la; porque nenhum homem pode abolir a lei de Deus, apesar do salmista
dizer que ela foi quebrantada. Salmo, 119:126. Anular a lei de Deus é algo mais
do que dizer que ela não tem qualquer valor; é mostrar pela vida que ela é
considerada sem importância. Um homem anula a lei de a Deus quando permite que
ela não tenha qualquer poder na sua vida. Em resumo, anular a lei de é
transgredi-la; mas a lei em si mesma permanece inalterável quer seja observada
ou não. Anulando-a apenas afecta a pessoa.
Portanto, quando o
apóstolo diz que nós não anulamos a lei de Deus pela fé, mas que, pelo contrário,
a estabelecemos, ele quer dizer que a fé não conduz à violação da Lei, mas à
obediência. Não, nós não devíamos dizer que a fé conduz à obediência, mas que a
fé, por si mesma obedece. A fé estabelece a lei no coração. “A fé é o firme
fundamento das coisas que se esperam.” Se aquilo que se espera é a justiça, a
fé a estabelece. A fé em vez de conduzir ao antinomianismo, é a única coisa
contrária a antinomianismo. Não interessa quanto uma pessoa se vanglorie na lei
de Deu; se rejeita ou ignora fé absoluta em Cristo, não está em melhor condição
do que o homem que ataca a lei directamente. O homem de fé é apenas aquele que
verdadeiramente honra a lei de Deus. Sem fé é impossível agradar a Deus
(Hebreus 11:6); com ela, tudo é possível (Mar. 9:23).
Sim, a fé faz o
impossível, e é exactamente isso que Deus requer que nós façamos. Quando Josué
disse a Israel. “Não podeis servir ao Senhor,” ele disse a verdade, ainda que
fosse um facto que Deus exigia que eles O servissem. Não está no âmbito do
poder de qualquer homem fazer justiça, mesmo que o queira. (Gl. 5:17); portanto
é um erro dizer que tudo o que Deus quer de nós é que façamos o melhor que
podermos. Aquele que não faz melhor do que isso não fará as obras de Deus. Não,
ele tem que fazer melhor do que pode. Ele tem que fazer aquilo que o poder de
Deus operando através d’Ele pode fazer. É impossível a um homem andar sobre a
água, mas Pedro andou quando usou a fé em Jesus.
Visto que todo o poder
no céu e na terra está nas mãos de Cristo e este poder está à nossa disposição,
vindo até o próprio Cristo morar no coração pela fé, não há lugar para queixas
de que aquilo que Deus requer de nós é impossível; porque “as coisas
impossíveis ao homem são possíveis a Deus.” (Lucas, 18-27). Por isso podemos
dizer com confiança, “O Senhor é o meu ajudador, e não temerei o que me possa
fazer o homem.” (Hb. 13:6).
Então “quem nos
separará do amor de Cristo? A “tribulação, a angústia, ou a perseguição, ou a
fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a Espada?” “Mas em todas estas coisas somos
mais do que vencedores, por Aquele que nos amou.” (Rm. 8:35,37). “Porque estou
certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as
potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem
alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo
Jesus nosso Senhor.” (Vers. 38,39).
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